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24º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

VIII-004 - A DRENAGEM URBANA SOB O ENFOQUE DA FORMAÇÃO EM


ENGENHARIA

Talita Fávaro Noccetti(1)


Engenheira Civil (UFSCar – São Carlos). Especialista em Gestão Ambiental (UFSCar – São Carlos e IBEAS).
Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana (UFSCar – São Carlos).
João Sérgio Cordeiro(2)
Engenheiro Civil (EESC - USP), Mestre em Engenharia Hidráulica e Saneamento (EESC – USP), Doutor em
Engenharia Hidráulica e Saneamento (EESC – USP), Presidente da Associação Brasileira de Ensino de
Engenharia – ABENGE, Professor Colaborador do Programa de PPG-HS (EESC – USP) e Professor Adjunto
(UFSCar – São Carlos).

Endereço(1): Rua São Sebastião, 1040, apto 22, Bairro Centro, Ribeirão Preto – SP. E-mail(1):
tfn81@yahoo.com.br, E-mail(2): cordeiro@power.ufscar.br.

RESUMO
Este trabalho faz uma abordagem sobre o ensino de engenharia civil e direciona-se principalmente ao estudo
sobre o ensino de drenagem urbana. Os sistemas de drenagem urbana no Brasil vêm passando por situações
de risco e desastres freqüentes e, considerando que grande parte dos problemas é resultado de soluções pouco
eficazes, a preparação dos futuros profissionais da engenharia que irão atuar no meio urbano é de grande
importância para a qualidade dos serviços oferecidos à população e também a qualidade das soluções
escolhidas.
Foram pesquisadas as instituições de ensino superior em Engenharia Civil do sudeste brasileiro com intuito de
realizar um estudo sobre o ensino da drenagem urbana e também de disciplinas que auxiliam nos projetos
deste sistema. Neste estudo foram avaliadas disciplinas específicas de drenagem e disciplinas relacionadas
com este tema.
Os principais resultados obtidos apontam para a pouca ênfase dada ao sistema de drenagem urbana e em
alguns casos também aos temas relacionados. Assim sendo a principal conclusão é que este artigo representa
um alerta para que as instituições de ensino proponham-se a preparar os recursos humanos de melhor forma,
tentando indiretamente, trazer melhorias sensíveis aos municípios brasileiros.

PALAVRAS-CHAVE: Ensino em Engenharia, Drenagem Urbana, Recursos Humanos.

INTRODUÇÃO
O meio urbano concentra complexas relações, e nelas os recursos hídricos são um dos pontos que precisam ser
discutidos e geridos com a premissa principal de manter satisfatória a qualidade de vida.

Muitas das adversidades sofridas pelos recursos hídricos, dentre elas escassez, poluição e enchentes, são
causadas por fatores externos e em parte das vezes a identificação destes fatores não é simples. Eles estão
ligados à: ocupação indevida e descontrolada do solo, falta de zoneamento urbano, crescimento populacional
descontrolado, erros nos projetos ou até mesmo falta de projetos adequados, falhas de funcionamento de
sistemas existentes, desorganização institucional, falta de recursos financeiros, humanos, materiais, dentre
outras causas.

A drenagem urbana é uma delicada vertente na gestão de recursos hídricos. Ela, segundo o Ministério das
Cidades (2003), é de responsabilidade das Prefeituras Municipais. Conforme a qualidade e quantidade de
conflitos, área de influência e danos apresentados passa a ter proporcional importância, podendo ser de
responsabilidade do Estado ou até mesmo da Federação.

Os recursos humanos atuantes no sistema de drenagem são desde o gerador da água pluvial em seu lote,
passando pelos responsáveis por projeto, execução e manutenção, pelas pessoas que convivem no meio
urbano e pelo Poder Público (responsável pela regulamentação e fiscalização do sistema).

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A falta de preparo dos recursos humanos que têm responsabilidade sobre projeto, execução e manutenção do
sistema de drenagem são agravantes para a situação em que o sistema se encontra na maioria dos municípios
brasileiros. A formação profissional, que é de competência das instituições de ensino normalmente de
engenharia, não é suficiente nem eficiente o bastante para que o controle das águas de escoamento superficial
seja sustentável e adequado à realidade das aglomerações humanas.

Segundo pesquisa de Vaz Filho (2000), os geradores só tomam conhecimento do problema e põe o assunto em
pauta nas épocas chuvosas, quando também a imprensa se mobiliza a noticiar as ocorrências negativas no
sistema.

Já o Poder Público não toma iniciativas de regulamentação para que o sistema de drenagem seja visto sob
outras perspectivas. Segundo Baptista e Nascimento (2002), investimentos em órgãos específicos responsáveis
pela drenagem urbana não são acessíveis a todos os municípios, principalmente devido à demanda ou a falta
dela em localidades de pequeno porte.

Sendo assim, o essencial é que o profissional de engenharia, mesmo sendo parte integrante de uma Secretaria
Municipal de Obras, tenha formação técnica suficiente para lidar com os problemas do escoamento de águas
pluviais já que o Brasil é um país onde a pluviosidade é muito intensa. Vaz Filho (2000) discute em seu
trabalho que para minimizar os problemas da drenagem no meio urbano é necessário que haja projetos bem
criteriosos e bem elaborados, manutenção constante: preventiva e corretiva e, para tanto, são imprescindíveis
profissionais conscientes devidamente capacitados.

JUSTIFICATIVA E OBJETIVO
Grande parte das patologias apresentadas por sistemas de drenagem urbana ocorre devido às falhas humanas
no processo de produção ou manutenção do sistema de drenagem urbana. Com esta discussão pode-se
justificar o tema desenvolvido neste artigo, que tenta apresentar um panorama das instituições formadoras de
profissionais da Engenharia Civil do sudeste brasileiro, ou seja, os futuros responsáveis pelo sistema de
drenagem urbana.

O objetivo principal desta pesquisa é analisar um panorama que informe as características gerais dos cursos
existentes no sudeste brasileiro que realmente se preocupam com a formação dos futuros engenheiros civis
que atuarão no processo de produção e manutenção dos sistemas de drenagem urbana.

Assim, a pergunta principal que deverá ser respondida é: “As instituições de ensino, principalmente de
Engenharia Civil, realmente estão preocupadas com a formação adequada de um profissional que atuará
mitigando problemas existentes e evitando a criação de novos problemas no desenvolvimento de um conceito
mais adequado para a drenagem urbana?”

A hipótese inicial é que poucas são as instituições que estão voltadas para o ensino da drenagem urbana em
seu conteúdo curricular regular. Supõe-se também que as instituições ensinam algumas disciplinas que têm
relação com a drenagem, mas que não aprofundam o conhecimento do profissional, fazendo com que o
mesmo não esteja realmente preparado para atuar. Assim sendo, os erros já cometidos e conhecidos são
revividos no meio urbano a cada estação chuvosa.

MATERIAIS E MÉTODOS
Inicialmente foram levantados dados acerca de Recursos humanos atuantes nas prefeituras municipais
brasileiras, junto ao IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e também outras informações
relevantes, relacionadas aos sistemas de drenagem urbana e suas condições nos municípios brasileiros.

Em segunda etapa, obteve-se junto ao MEC (Ministério da Educação e Cultura), que possui um sistema de
busca, os cursos de graduação em Engenharia Civil da Região Sudeste. Foram analisados 58 cursos de
graduação em Engenharia Civil (MEC, 2006, disponibilizado na Internet).

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Localizadas as instituições que possuem curso de graduação em Engenharia Civil o enfoque deu-se em
municípios do sudeste brasileiro, sendo que as instituições consultadas foram tanto as Instituições de Ensino
Superior (IES) públicas quanto privadas.

A busca considerou somente instituições que disponibilizassem de endereços na internet e que nestes
houvesse informações sobre conteúdos curriculares. Para instituições que não disponibilizaram a estrutura em
suas home pages, foi enviado um e-mail com a solicitação da mesma. Ainda assim houve instituições que não
disponibilizaram, via e-mail, a estrutura curricular e por este motivo foram desconsideradas na pesquisa.

Concluídas as buscas e pesquisas sobre ementas e estruturas curriculares das instituições, obtiveram-se um
total de informações, passíveis de análise, de 48 IES.

A seqüência de levantamento de dados e os critérios de análise obedeceram as seguintes diretrizes:

• A análise foi baseada apenas no nome e descrição do conteúdo das disciplinas, sem qualquer
aprofundamento na metodologia, seqüência didática e detalhes da disciplina a serem oferecidos aos alunos;
• As disciplinas foram divididas inicialmente em quatro grupos para organização dos dados: disciplinas
relacionadas à drenagem e regulares, disciplinas relacionadas1 a drenagem e optativas, disciplina específica2
para drenagem regular à estrutura curricular e disciplina específica para drenagem optativa à estrutura
curricular;
• Foram contabilizadas como relacionadas à drenagem disciplinas como: hidrologia, hidráulica,
saneamento básico, saneamento ambiental, ciências do ambiente, recursos hídricos, geologia de engenharia e
correlatas. Portanto, foram contabilizadas as instituições como contendo disciplinas relacionadas quando
englobavam no mínimo três disciplinas das citadas em conjunto;
• Foram contabilizadas como disciplina específica para drenagem apenas disciplinas que incluíssem o
tema drenagem urbana explícito, julgando que estas disciplinas realmente influenciam positivamente na
formação no futuro profissional da engenharia civil;
• Finalmente foram elaborados gráficos que elucidam as relações existentes entre os dados. Partindo
dos gráficos e das análises foram tecidos comentários e discussões sobre o ensino de drenagem na engenharia
civil.

LEVANTAMENTO DE INFORMAÇÕES SOBRE OS RECURSOS HUMANOS ATUANTES NOS


MUNICÍPIOS BRASILEIROS
Para a realização de mudanças na visão sobre o sistema de drenagem, é importante que haja vontade política
para a mudança. Ao abordar este assunto deve-se considerar capacidade dos gestores (conhecimento técnico,
tomada de decisões, discernimento, ética, bom senso, etc.), partidos políticos no poder, participação popular,
pressões de diversas origens (políticas, econômicas, ambientais, sociais, etc.), dentre outros.

Para obtenção de informações sobre quem está atuando nas prefeituras municipais brasileiras a seguir são
abordados dados relativos ao grau de instrução dos recursos humanos dentro das municipais brasileiros para o
ano de 2005. Figura 1 seguinte aponta o nível de instrução dos prefeitos dos municípios brasileiros.

1
Disciplinas Relacionadas: são consideradas neste trabalho como sendo disciplinas que abordam temas e assuntos que
são aplicados no projeto e execução de sistemas de drenagem urbana, embora não necessariamente tratem especificamente
de sistemas de drenagem urbana. O objetivo destas disciplinas não é a preparação do aluno para atuação única e exclusiva
em drenagem, portanto estas disciplinas colaboram para entendimento de processos importantes na atuação do profissional
nesta área.
2
Disciplinas Específicas: são consideradas neste trabalho como sendo as disciplinas cujo único objetivo seja tratar de
temas e assuntos que se relacionem com a drenagem urbana, e o objetivo final das mesmas é preparar o aluno para atuar
nesta área.

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100%

80%

Pós-graduação
60% Superior completo
Superior incompleto
Médio completo
40%
Médio incompleto
Fundamental completo
20% Fundamental incompleto

0%
Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Brasil

Figura 1 Nível de instrução do prefeito. Fonte: IBGE, 2005.

Observa-se que a região Norte possui grande parte de seus prefeitos com nível médio incompleto e é a região
que concentra a menor quantidade de prefeitos com pós-graduação (apenas 5,35%). A região Nordeste possui
36,64% de prefeitos com nível superior completo e tem uma grande porcentagem (23,70%) para prefeitos com
ensino médio completo.
Na região Sudeste está um grande paradoxo, pois esta região concentra a maioria dos prefeitos com ensino
fundamental incompleto (10,19%) e, além disso, possui, em contrapartida, o maior índice de prefeitos com
ensino superior completo (39,39%) e o segundo maior índice para prefeitos com pós-graduação completo
(8,93%).
No Sul há 31,82% de prefeitos com superior completo e é a região que mais possui prefeitos pós-graduados
(9,60%), além disso, possui 10,27% de seus prefeitos com curso superior incompleto (a maior porcentagem
para este nível) o que pode significar que os prefeitos ainda estão estudando ou que houve desistência do
curso iniciado. No Centro-Oeste a maioria dos prefeitos possui ensino médio completo (34,12%) e em seguida
estão prefeitos com nível superior completo (33,05%), portanto nesta região há o menor número de prefeitos
com nível fundamental incompleto, apenas 6,22% (abaixo do nível nacional, que é de 8,9%).
Agora, com enfoque nos funcionários públicos da administração direta, o IBGE (2005) levantou a
escolaridade de funcionários estatutários (servidores titulares de cargos públicos, sob vínculo estatutário ou
institucional – regidos pelo Regime Jurídico Único, RJU) e de funcionários celetistas (servidores ocupantes de
empregos, sob vinculo celetista ou trabalhista – Consolidação das Leis do Trabalho, CLT - de natureza
contratual não passível de modificações).
Dentre os funcionários estatutários há maior porcentagem com pós-graduação (3,74% contra 1,63% dos
celetistas) e maior porcentagem com ensino superior (22,41%, contra 19,8 dos celetistas). A grande maioria
dos funcionários, em ambas as situações estão enquadradas no nível de escolaridade do ensino fundamental e
médio. Estes dados apontam para um baixo nível na escolaridade dos funcionários diretos das prefeituras
municipais.
Para uma avaliação geral observa-se a Figura 2. Nela é possível entender um pouco mais sobre a divisão dos
níveis de instrução do pessoal ocupado na administração direta levando em consideração o Brasil como um
todo e de ambos os tipos (celetistas e estatutários).

13,21% 1,45% 8,74% Nenhum

Fundamental

Médio

34,14% Superior

Pós-
42,46% graduação

Figura 2 Pessoal ocupado na administração direta. Fonte: IBGE, 2005.

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É importante notar que, de um modo geral, o universo total brasileiro possui pouquíssimos funcionários
capacitados até o nível superior e de pós-graduação. Somados estes dois itens não atingem 15% dos
funcionários que atuam diretamente nas prefeituras.
É possível analisar também os funcionários da administração indireta (que compreendem a funcionários de
empresas públicas municipais, fundações, sociedades de economia mista, autarquias, etc.). Neste caso,
funcionários estatutários têm novamente maiores índices de pós-graduação que funcionários celetistas. Entre
funcionários estatutários há também melhores índices para funcionários com ensino superior, exceto para a
região norte.
A Figura 3 aponta para porcentagens referentes ao universo total do Brasil. A quantidade de profissionais na
administração indireta que possuem pós-graduação é maior que os funcionários da administração direta
(3,43%). Portanto a soma entre pós-graduados e funcionários de nível superior é bem semelhante do gráfico
anterior: 15,02%. É importante notar que dos pouco mais de 3,6 milhões de funcionários públicos existentes,
apenas 200 mil são da administração indireta e o restante é da administração direta nos municípios. Assim
sendo, apesar de os funcionários da administração indireta possuírem nível educacional um pouco melhor no
item pós-graduação, eles representam uma parcela muito pequena dos funcionários da administração (6,15%).

3,43% 2,30% Nenhum


11,59%
Fundamental

Médio

Superior
27,71% 54,98%
Pós-graduação

Figura 3 ocupado na administração indireta. Fonte: IBGE, 2005.

Analisando todas as informações referentes aos prefeitos, funcionários da administração direta e indireta,
conclui-se que a escolaridade é baixa e torna-se muitas vezes uma barreira importante para a melhoria da
gestão e das condições gerais dos municípios, mudanças de paradigma e demais inovações que necessitam do
conhecimento.

ASPECTOS GERAIS SOBRE SISTEMAS DE DRENAGEM URBANA NOS MUNICÍPIOS


BRASILEIROS
Segundo o IBGE na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) de 2000 todos os municípios
brasileiros com mais de 300 mil habitantes têm sistema de drenagem, portanto o IBGE assume que a pesquisa
apenas afere a existência do sistema e não sua qualidade, abrangência ou extensão da rede. Portanto, ao
afirmar que um município possui o sistema de drenagem, não há possibilidade de interpretar como um trunfo
para o mesmo, já que a simples existência de uma rede pouco extensa e isolada caracteriza para a pesquisa a
existência do sistema em questão.

O serviço de drenagem é executado pelas prefeituras municipais em 99,8% dos casos, ou seja, quase que a
totalidade dos municípios. Apesar disso, em 73,4% dos municípios não há instrumentos reguladores do
sistema (legislação municipal, a lei de uso e ocupação do solo, plano diretor ou plano urbanístico global, por
exemplo).

Para as ocorrências de inundações ou enchentes, segundo o IBGE (2000), as prefeituras municipais


enumeraram quatro fatores agravantes principais: dimensionamento inadequado de projeto; obstrução de
bueiros/bocas de lobo; obras inadequadas e; adensamento populacional. Em grande quantidade,
aproximadamente 20% dos problemas nacionais, aparece o dimensionamento inadequado de projeto, item
diretamente ligado aos técnicos (projetistas, executores, etc.) envolvidos no processo da drenagem urbana.

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Segundo IBGE (1999) aproximadamente 30% dos municípios brasileiros possuem populações que residem em
áreas de risco e, além disso, aproximadamente 23% dos municípios sofreram algum tipo de problema
relacionado à drenagem urbana entre os anos de 1998 e 2000 (segundo o IBGE, 2000).

Há duas possibilidades para os sistemas de drenagem, aqui denominados como: “sistemas clássicos” ou
“tradicionais” e “sistemas alternativos”, estes últimos baseiam-se em “técnicas compensatórias” (BAPTISTA
et al, 2005). O Quadro 1 a seguir aponta para as diferenças entre componentes de ambos os sistemas. No
Brasil a solução adotada para a drenagem na quase totalidade dos municípios é a visão tradicional, portanto o
colapso que vem ocorrendo neste sistema é resultado de uma não adequação das técnicas utilizadas às
necessidades apresentadas.

Quadro 1 Diferenças básicas entre Sistemas Tradicionais e Sistemas Alternativos de Drenagem Urbana.
Sistema Tradicional Sistema Alternativo
Componentes Componentes
Estruturas de infiltração (trincheiras, valas, poços,
Sarjetas, tubulações subterrâneas, bocas-de-lobo, valas, etc.), estruturas para armazenamento temporário
pavimentos impermeáveis, poços de visita, sarjetões. de água (estacionamentos, terrenos esportivos, etc.),
pavimentos permeáveis.
Microdrenagem

Objetivos Objetivos
Captação de toda água da superfície (telhados,
Infiltrar a maior quantidade possível de água a
pavimentos, etc.) e encaminhamento para o sistema de
montante para que não haja acumulação a jusante.
macrodrenagem.
Principais Conseqüências Principais Conseqüências
Grande escoamento superficial, problemas com Grande infiltração de água, possibilidades para recarga
pavimentos e carregamento de solo e de partículas de aqüíferos, diminuição do escoamento superficial,
diversas (entulhos, resíduos sólidos, etc), pouca diminuição da vazão nos fundos de vale,
infiltração de água no solo, erosão, grande aumento da amortecimento de cheias a montante sem grandes
vazão nos fundos de vale. prejuízos a jusante.
Componentes Componentes
Canais Naturais e Artificiais, galerias pluviais, Canais Naturais e Artificiais com técnicas que
estruturas auxiliares (bacias de retenção, reservatórios, favorecem o escoamento lento, reservatórios de
etc.), obras de prevenção e proteção contra riscos a detenção (temporários e de infiltração), parques
Macrodrenagem

erosão, escorregamentos, etc. lineares e áreas de lazer.


Objetivos Objetivos
Captação de toda água proveniente do sistema de Retenção de vazões e possibilidade de infiltração,
microdrenagem e encaminhamento para cursos d’água diminuição das vazões e velocidades de escoamento,
e finalmente para fora do meio urbano. criação de áreas de lazer nos centros urbanos.
Principais Conseqüências Principais Conseqüências
Grande infiltração de água, recarga de aqüíferos,
Grandes vazões e velocidades de escoamento,
diminuição do escoamento superficial, diminuição da
enchentes, poluição, prejuízos diversos, erosão,
vazão nos fundos de vale, amortecimento de cheias,
desmoronamentos, etc.
prevenção de enchentes.

Os dados citados neste item indicam que é relevante e imprescindível a preparação dos recursos humanos
(principalmente os técnicos) que atuam no meio urbano. Uma forma de avaliar e interferir nesta preparação é
analisar o ensino nas IES de Engenharia Civil, instituições estas que injetam no mercado de trabalho muitos
profissionais todos os anos.

RESULTADOS
Ao longo da pesquisa foi observado que muitas vezes há disciplinas que enfocam assuntos correlacionados
com a drenagem, portanto não há especificidade necessária para que o futuro profissional atue contornando
problemas existentes no meio urbano e contribuindo para a não repetição de erros já cometidos com o sistema
tradicionalmente utilizado.

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Para disciplinas específicas de drenagem urbana, pode-se observar na Figura 4. Nela é notável que as
disciplinas relacionadas à drenagem urbana são freqüentes, aproximadamente 96% dos cursos analisados
possuem alguma disciplina das consideradas e apresentadas na metodologia(hidrologia, hidráulica,
saneamento básico, saneamento ambiental, ciências do ambiente, recursos hídricos, geologia de engenharia e
correlatas). Apesar deste fato, não há garantias de que a drenagem urbana realmente é um conteúdo presente e
nem mesmo haja estudos que favoreçam a melhoria nos projetos de drenagem que serão realizados pelos
futuros profissionais. Disciplinas relacionadas a drenagem mas optativas aparecem em 12,50% dos cursos, e
neste número é preciso notar que existem cursos que possuem tanto disciplinas regulares como optativas (2
possuem disciplina específica tanto optativa quanto regulares e 5 possuem disciplinas relacionadas com
drenagem tanto optativas quanto regulares).

Disciplinas específicas para o tema drenagem urbana, em sua maioria (18,75% contra 10,42%) aparecem nos
currículos dos cursos consultados como sendo regulares.

100% 95,83%
90%

80%

70% Disciplina Específica para a


Drenagem(regular)
60%
Disciplina Específica para a
50% Drenagem(optativa)
40% Disciplina relacionda a
drenagem(regular)
30%
18,75% Disciplina relacionada a
20% drenagem(optativa)
10,42% 12,50%
10%

0%

Figura 4 Distribuição das instituições conforme metodologia descrita em relação às disciplinas de


drenagem urbana.

Para avaliar o ensino de drenagem é preciso constatar também a existência de disciplinas que sejam acessórias
e necessárias a este estudo. Na Figura 5 encontra-se dados retirados das ementas das IES pesquisadas neste
trabalho e referem-se a disciplinas regulares relacionadas com drenagem urbana. Esta figura aponta para quase
totalidade das instituições com disciplinas relacionadas a sistemas de água e esgotos sanitários (97,96%). Este
número demonstra principalmente a grande ênfase que é (e sem dúvida deve ser) dada a estes sistemas, e ainda
assim, aproximadamente 2% das instituições pesquisadas não possibilitam aos seus alunos o aprendizado
destes assuntos.
Com valores bem próximos (ainda na Figura 5) estão disciplinas de Hidráulica e Hidrologia (com 89,58% e
87,50%, respectivamente). Juntas estas disciplinas são imprescindíveis para aplicações de conhecimentos em
drenagem urbana e correspondem a grande parte dos conceitos utilizados, principalmente na drenagem
tradicionalmente construída nos municípios brasileiros. As disciplinas relacionadas com o meio ambiente são
cotadas em aproximadamente 65% das instituições e, embora seja uma quantidade significativa, espera-se que
este valor aumente cada vez mais já que há grande necessidade para o profissional de engenharia civil que
intere seus projetos ao meio ambiente em que ele se encontra.
Finalmente na Figura 5, menos de 20% das instituições oferece disciplinas de Geologia de Engenharia (que
sucintamente trata de problemas gerados por obras de engenharia) e disciplinas de Gestão (Ambiental,
Saneamento e Recursos Hídricos). Este número está abaixo das expectativas, pois este tipo de conhecimento é
determinante para o profissional de engenharia lidar em um nível macro com questões que abrangem os
sistemas de saneamento urbanos (água, esgotos, drenagem e resíduos sólidos), organização de ações, atuação
pró-ativa, percepção de problemas, levantamento de soluções e ainda solução de intervenções mal sucedidas
(muito recorrentes em drenagem), dentre outros.

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Água/esgoto
100%
90%
Geologia de engenharia
80%
70% Ciências do Ambiente
60%
50% Gestão
40% (Ambiental/Saneamento,
Recursos Hídricos)
30% Hidráulica
20%
10% Hidrologia
0%

Figura 5 Existência de Disciplinas Regulares Relacionadas com Drenagem Urbana, conforme


porcentagem de Instituições de Ensino.
A Figura 6 refere-se a disciplinas optativas relacionadas com drenagem urbana. Nela observa-se que poucas
das instituições (menos de 5%) possuem disciplinas optativas para Ciências do Ambiente, Gestão, Hidráulica
e Hidrologia. Nenhuma das instituições possui Geologia de Engenharia e um número um pouco maior aponta
para disciplinas optativas para água e esgoto. Sendo assim, mesmo que a instituição não enfatize
conhecimentos necessários à drenagem em sua ementa regular e obrigatória, se o aluno se interessar por algum
dos conhecimentos citados não terá possibilidade de aprender sobre o mesmo, prejudicando assim sua futura
atuação.

100%
Água/esgoto
90%
80% Geologia de engenharia
70%
60% Ciências do Ambiente

50%
Gestão (Ambiental/Saneamento)
40% Manejo de Bacias
30% Hidráulica
20%
Hidrologia
10%
0%

Figura 6 Existência de Disciplinas Optativas conforme porcentagem de Instituições de Ensino.

Relacionando os gráficos das figuras anteriores (Figura 5 e Figura 6 ) é preciso ainda considerar que: sete
cursos possuem disciplinas de saneamento tanto optativas quanto regulares (14,6%). Apenas um curso (2%)
possui disciplinas de gestão tanto optativas quanto regulares para Gestão (Ambiental/Saneamento/Manejo de
Bacias) e dois cursos (4%) possuem disciplina Hidrologia optativa e obrigatória.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A partir da presente pesquisa conclui-se que apesar de a Drenagem Urbana representar um grande problema
para as cidades brasileiras, as instituições de ensino não estão adequando-se às necessidades dos municípios,
pois deixam a desejar no treinamento e capacitação dos futuros profissionais da área: os engenheiros.

Conforme a contagem dos resultados observou-se que o ensino do tema drenagem urbana deixa a desejar ou
não está presente em muitos dos cursos de Engenharia Civil analisados. Existem algumas disciplinas
auxiliares, mas falta a discussão de temas que realmente modifiquem a forma com que atualmente os
municípios tratam das águas do escoamento superficial.

Esta pesquisa foi apenas um levantamento inicial, que demandará futuramente uma pesquisa mais
aprofundada, que tenha abrangência nacional e componha-se de dados mais específicos levantados mais

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diretamente junto às instituições de ensino. Sugere-se que os dados abordem profundamente os tópicos
ensinados em cada disciplina.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Disponível em: www.ibge.gov.br.
2. MEC (Ministério da Educação). Disponível em http://portal.mec.gov.br/, acessado em junho de 2006.
3. MINISTÉRIO DAS CIDADES. A Questão da Drenagem Urbana no Brasil: Elementos Para a
Formulação de Uma Política Nacional de Drenagem Urbana. Texto para discussão. Secretaria
Nacional de Saneamento Ambiental Programa de Modernização do Setor Saneamento – PMSS II, versão
01. 2003.
4. BAPTISTA, Márcio Benedito e NASCIMENTO, Nilo de Oliveira. Aspectos Institucionais e de
Financiamento dos Sistemas de Drenagem Urbana. RBRH – Revista Brasileira de Recursos Hídricos,
Belo Horizonte, v.7, nº.1, p. 29-49. jan./mar. 2002.
5. BAPTISTA, Márcio Benedito; NASCIMENTO, Nilo de Oliveira e BARRAUD, Sylvie. Técnicas
Compensatórias em Drenagem Urbana. ABRH (Associação Brasileira de Recursos Hídricos), 2005,
266p. Porto Alegre, Brasil.
6. VAZ FILHO, Paulo e CORDEIRO, J. S. Gerenciamento de Sistemas de Drenagem Urbana: Uma
Necessidade Cada Vez Mais Intensa. Revista Engenharia, São Paulo, nº. 541, 2000.

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