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Gianfracesco Guarnieri - O Cimento
Gianfracesco Guarnieri - O Cimento
GIANFRANCESCO GUARNIERI
O teledrama O CIMENTO foi apresentado, em 1962, pela TV Excelsior,
canal 9, de São Paulo, com direção de Flávio Rangel, tendo como
principais intérpretes Itala Nandi e Fernando Peixoto. Este espetáculo foi
também gravado em video-tape, em 1964, pelo canal 4 de Montevidéu,
Uruguai, com o elenco do Teatro Oficina de São Paulo, sob a direção de
Fernando Peixoto.
Ato I
Ao término dos slides, corte para ferro suspenso por uma corda
que serve de sineta; a mão de um operário faz soar o ferro com
batidas rápidas.
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se a casinhola-escritório. Os operários passam diante dela,
recebendo com um gesto mecânico o envelope que lhes é
estendido por um jovem, funcionário dos escritórios da
Construtora, enquanto o Mestre da obra chama os operários um
por um.
PEDRICO — E Murilico?
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PEDRICO — Eu? Quem dera fosse!
MARIA I. — Vela pra Julião, isso é que sim. Nem foi trabaiá, garrado no
menino que nem avô.
Surge o Mestre.
PEDRICO – Vô de avião!
MURIÉ — Onde?
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TOLENTINO — Lá, olha! Um... dois... três... quatro. No quarto andá...
segunda janela, de cortina verde!
TOLENTINO — Sei lá. Mas que mexe com a gente, mexe. Tem um sorriso
gaiato! Bonita, bonita pode sê que não seja, mas é linda, viu? E depois,
o que vale é que já me fez sinal.
TOLENTINO — Fez sinal uma vez, fiz outro pra confirmação. Confirmô!
Fiz um terceiro, só pra evitá miragem, e lá foi: abriu em um sorriso que
nem na janela cabia!... Quase que me atiro cá de cima!
MURIÉ — Sei lá o que é. Já há dias me vem dando isso; uma cisma com as
altura, pavor dos andaime. Pra pedreiro isso não é bom, não!...
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que Deus me livre!
TOLENTINO — Entendeu sim, ela vem! (Saltitando) Ah, ah, moçada, que a
vida é boa! Ela vem, seu Murié — eu bem que tava sentindo... um nó
nas tripa que nunca me deu. Fisgada gostosa!
FERREIRA — Oba!
PEDRICO — Oba!... Esse cimento não segura nem papel, água pura!
PEDRICO — Pouca vergonha, isso é que é... Ah, meu camarada, queria ter
um por cento do que tá sendo roubado nessa construção!
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FERREIRA — Acho bom falá com o Mestre.
PEDRICO — Eles estão tudo combinado. Então o Mestre não ganha o dele?
PEDRICO — Pois sim. Já viu ele subi alguma vez? Fica aqui de fora, só
manjando... Na hora do aperto vai sê o primeiro a correr!
FERREIRA — Tem um edifício que vai começá perto daqui. Quando precisá
mão-de-obra, te aviso.
PEDRICO — É um favor.
C. segue Ferreira que empurra o carrinho,
deixando-o junto de Juca Arigó.
ARIGÓ — Ó, num diz que eu falei!... Mas o Maranhense me bateu com a pá!
ARIGÓ — Não! Diz que quem bate em companheiro nunca chega a oficial!
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ARIGÓ — Doeu!
Surge o Mestre.
Arigó sai.
FERREIRA (Sorrindo amedrontado) — Hã! Pois é! Ele diz que o edifício vai
caí!
MESTRE (Falando para o alto) — Vamo apressá esse muro aí! Três ano pra
fazê um murinho!
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MESTRE — Pois o senhor agora é engenheiro?!
PEDRICO — Posso não ter estudo, mas prática é o que não me falta. Desde
criança, da roça pra construção. Cimento é água, num segura...
MESTRE — Ninguém lhe paga pra dá opinião. Meta-se com o seu trabalho.
Talvez saia mais bem feito.
MESTRE — Pois então, pra lhe evitá susto. Deixa outro cuidando.
Aproxima-se Arigó.
Depois de pausa.
MESTRE — O que foi aí?... Olha, Pedrico, tua fama de arruaceiro chegô até
aqui e tá enfeiando tua ficha. Acho melhor cuidá do teu serviço!
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PEDRICO (Voz surda) — Vou subi.
MESTRE — Não é ainda não, mas pode ficar. É só ter ouvido aceso. Sacudi
essa cabeça tonta e prestá atenção.
MESTRE — Ninguém pode saber. E se eu descobrir que você não faz o que
eu mando — záz! — pra rua, e adeus trabalho de oficial, hein?
TOLENTINO — Oilá, seu Pedrico. Manja só, no quarto andá ali em frente,
segunda janela à esquerda. Aquela lá é minha namorada!
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da vida!
MURIÉ — Pra depois ficá que nem eu? Mulher gorda-balão, cinco filhos de
berreiro... Aí tu pensa...
MURIÉ — Lá em cima?!
PEDRICO — Falei com o Mestre. Fez que não era com ele. Tão tudo na
gaveta!
TOLENTINO — Desabá?
PEDRICO — Eles tão crente que não, pelo menos não tão já... Eu, por mim,
não espero nem mais mês. Fim da quinzena me arranco!
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PEDRICO — Lá em cima você namora até melhó!
MURIÉ — Vou explicá pro Mestre... Isso até que humilha. Palavra que me
dói. A gente tem orgulho, sabe. Eu era que parecia cabrito. Edifício
aprontava eu era o último a saí. Parecia dono de tudo. Tô um caco é o
que é!
MURIÉ — Tá.
TOLENTINO — Coitado do seu Murié. Pra mim, ele não tem mais um ano
de trabalho.
PEDRICO — É ...Velhice!
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TOLENTINO — É o que eu penso.
PEDRICO — Quer dizer que você só vê ela daqui. Ainda nem chegô perto?
TOLENTINO — Dora é bacana. (T) Aquela moça que veio até o portão é sua
mulher?
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PEDRICO — Maria Inês agüentô o inferno comigo. Do sertão da Bahia pra
Salvador numa penúria que eu nem conto. De Salvador pra Goiás, de
Goiás pra S. Paulo... Teve filho na estrada, bem na beira... O menino
nasceu e morreu logo; fez tudo de uma vez!
PEDRICO — Que o quê! Chega um ponto que tu nem sente mais... A gente
só sentiu mesmo alívio. O cabrinha ia sofrê um pedaço. Viagem dura!
PEDRICO — E faz bem!... Chegando aqui eu disse pra Maria Inês: “Maria
Inês, tu é forte e valente, mulher pra homem que nem eu, vamo deixá
nossa raça seguindo... Tão forte quanto Maria Inês!” — Ela riu pra mim
e caímo um no outro. Tudo virô um abraço só. Era tanto amor que nem
mais existia o tempo!
PEDRICO — Nem chegô perto dela ainda, fica falando! Mas foi assim,
Tolentino, que Murilico nasceu! Tá parecendo que Deus num gostou de
nosso pedido ou sei lá, foi amor demais que ofendeu os santo; sei só que
também nasceu definhando... Tá hoje aí, assustando a gente!
PEDRICO — Tem de ficar, filho de Maria Inês... Pois não é pra continuá a
raça?
TOLENTINO — Olha lá! Outro sinal. Ela tá que nem eu! Já não agüenta de
esperá!
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TOLENTINO (Mandando o beijo) — Vai!
MESTRE — Pedrico Santarém que não se meta! E pode dizê pra ele que
mais uma confusão que me arrume vai pra rua. Tô cansado disso aqui!
Me faça o favor, seu Murié, tenha paciência, vá pro seu trabalho ou peça
a conta. Sinto muito!
MURIÉ — Pois tá bom. Nem quero que pense que seje preguiça... Tenho
meus anos de trabalho. Sou profissioná querido e respeitado. É o corpo
que não mais comanda. E eu nada posso fazer.
MESTRE — Pois suba que não lhe acontece nada. Se fosse trinta andares
ainda vá lá. Mas uma alturinha dessa, com franqueza, seu Murié!
MURIÉ — Eu subo!
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Tomada do Mestre escrevendo. Pedrico surge em quadro
na porta do escritório.
PEDRICO — Por causa do velho, vim lhe pedi! Ele não pode mesmo,
Mestre. Eu fico lá em cima e, garanto, não precisa se preocupá comigo,
eu não quero confusão. Fique com os seus negócios que eu não me
meto.
MESTRE — Ouça aqui, seu Pedrico Santarém, na saída, pode cobrá seu dia.
Amanhã não precisa voltá!
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MARIA I. — Nem se mexe, Julião!
MARIA I. — Amém.
Vai ao berço.
MURIÉ — O pior é que elas parece que me chama. Dá uma vontade danada
de espiá a altura, e sei que depois é cair. Mas dá vontade de saber...
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PEDRICO — Não queira sabê não. Fica lá no centro bem no seguro.
Qualquer coisa é só chamá..
MURIÉ — Olha pro alto, Pedrico. Vê só que mundo grande, nem tem légua
pra medi! Vida besta a nossa!
PEDRICO — É
Ato II
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MURIÉ — Bom! Vou voltá pro poleiro!
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ANTÔNIO — Puxa vida!
PEDRICO — Isso é com o Mestre. Por mim, mandava logo pôr reforço. E
nem sei se ainda dá jeito!
PEDRICO — Agorinha!
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PEDRICO — Tô dizendo o que é certo!
MESTRE — Mas que é? Todo mundo tremendo agora? Nunca viram uma
viga rachá? Pois isso acontece! Parece tudo mulher medrosa. Vão
trabalhá que é melhor! Já falei com o engenheiro, ele vem vê!
MESTRE — Meta-se com sua vida que vagabundo nenhum me ensina o que
fazer!
PEDRICO — Vagabundo não! Óia o jeito de falá que não sou seu moleque!
PEDRICO — Ah!...
PEDRICO — Culpa é nossa! Quando ele levá uma invertida, perde essa
mania de mando.
FERREIRA — Eu sei lá! Comigo é assim, não tenho corage de discuti com
ele. Eu por mim dava o fora dessa obra em três tempos, mas não posso perde o
emprego, né!
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Pedrico sobe.
TOLENTINO — Tou mandando ela vim pelos fundo. Pra gente se encontrá.
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Tolentino dá-lhe um violento pontapé
derrubando a lata. Está furioso.
PEDRICO — Não tem razão pra isso tudo... Vai embora, companheiro, vai...
Tô pedindo!
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TOLENTINO — Sei lá o que deu. Dora pra mim virô coisa sagrada... de
repente.
TOLENTINO — Sempre tive. Nunca fui de valentia. Bem que dizem que
mulher vira a cabeça!
MESTRE — Alô? Dr. Moraes, por favor... Pronto! Dr. Moraes?... Sou eu
sim... É, vai mal, dr. — muito mal. As colunas estão começando a
ceder!... Bastante, sim. A do centro está com uma rachadura que vai de
lado a lado.. O jeito seria mandá reforçá, mas eu quero que o senhor
veja antes. Acho que nem reforço adianta mais!... Seria bom o senhor
vir hoje mesmo!... Mas que providência o senhor quer que eu tome?...
Essa não, dr. — eu tinha avisado que isso tava pra acontecer!... Mas é
perigoso esperar! Além disso, os homens já estão assustados!... Que
alarme falso o que, dr.!... Claro que acalmei, mas a coisa está feia!...
Não, não — o senhor pode verificá, é a quantidade de cimento que o
senhor mandô, nem mais nem menos. (Intencional) — Pois é, doutor, o
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erro é seu! Foi um pouco demais, né?... Em compensação, tem uma boa
notícia! Vendi mais cinqüenta sacas! (Ri.) Foi por isso, viu? Pagamento
à vista, claro. Já tá no bolso. (Rindo muito) O senhor é de morte, doutor!
Tá bem, até amanhã, pessoalmente a gente conversa... Até amanhã,
engenheiro!
MESTRE — Dou um jeito nele!... E do cimento que é bom, você não ouviu
nada?
ARIGÓ — Tou ouvindo tudinho, tudinho. Juro que tou ouvindo!... Mas
ninguém diz nada!
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MESTRE — Um dia, um dia! Faz o que eu mando que você chega lá...
MURIÉ — Pelo amor de Deus, Pedrico! Não posso mais!... Não posso mais!
MURIÉ — Não sei, coisa estranha! Veio vindo, veio vindo... vontade danada
de me aproximar da beirada, vontade doida de saber o que é lá
embaixo... tudo embaçado!... Ah, que coisa, Pedrico!
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atrapalhando, não é?
PEDRICO — Qual o quê! Acho bom cuidá desse corpo. Desleixado pode
piorá.
MURIÉ — Descanso! E gente como nós pode descansá? Só uma vez, irmão,
pra sempre.
MURIÉ — Pensei que dessa vez eu não ia agüentar. Puxa, não sei o que fazia
sem você aqui.
MURIÉ — Foi por minha culpa, eu sei. O Mestre já estava de cisma contigo.
Piorei as coisas.
MURIÉ — Não te preocupa irmão. Te arrumo serviço nem que seja pra
procurá o dia inteiro!
MURIÉ — Mas vou procura, nem que seja pra sossego meu!
MURIÉ — Ai, amigão! Agora tou melhorando... Sabe do que acho que me
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vem essa agonia?
PEDRICO — Hum?
PEDRICO — Isso eu tenho também. Começo a cismá nas coisa e uma vai se
misturando com a outra que a gente nem sabe mais o que é...
MURIÉ — Isso mesmo. Foi o que me deu há pouco. (Pausa.) Vê daí, esses
três edifício grande? O primeiro tem dois andar do Murié, o segundo um
andar do Murié, o terceiro, três andar do Murié!...Olho pra essa cidade,
me dá a impressão de que fiz ela!
PEDRICO — É.
MURIÉ — Quanto mais a gente faz, mais a gente vai ficando pequeno...aí a
cidade vem e te engole...
MURIÉ — Quanto mais a gente faz, menos a gente tem. Nem a beleza de ter
feito. Vê aqui? Nem bem se levanta, a obra tá pra caí... Cada tijolo que
eu ponho é um desperdício... Nem pra dizê: taí fiz! Até o gosto pelo que
faz a gente perde. Palavra, meu amigo Pedrico Santarém — gritei por
você, chamando, mas preferia já está lá embaixo, esquecido!
PEDRICO — Vá! Tem a sua gorda, a filharada... Quanta coisa pra interessá!
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PEDRICO — Sério?!
MURIÉ — Pra mais de dez ano! Estupidez que me bateu. Resolvi largá,
larguei... Procurá liberdade!
PEDRICO — Não é razão pra ficá desse jeito. Todo mundo tem seus galho.
O bonito é enfrentá! Dá um jeito de encontrá eles de novo!
MURIÉ — Fiz de tudo. Até anúncio em rádio. Que o quê, nem sombra!...
PEDRICO — É...
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Alicerces do edifício. Ferreira caído está
sendo socorrido pelos companheiros.
MESTRE — É, seu Ferreira, vamo deixá de fita, não está doendo tanto
assim!
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ARIGÓ — Mentira! Não...
MESTRE — Vamo, vamo!... Não foi nada, não! Vamo continuá o trabalho.
Pedrico, você e esse outro, providencia reforço pra viga que caiu, pede
ajuda pro Maranhense também!...
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Ato III
Dora encabuladíssíma.
Dora obedece.
TOLENTINO — Mas ser assim... gaiato é bom. É isso que faz eu achá você
tão bacana!
Dora sorri.
TOLENTINO — Sabe, eu não sei... mas achei.... quer dizer... Eu não sei o
seu nome, mas todo o jeito é de Dora!
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TOLENTINO — O que? É Dora mesmo, acertei?
TOLENTINO — Eu também sou. Quer dizer, sem jeito. Primeira moça que
eu falo a sério, sem segunda intenção...
Dora sorri.
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DORA (Falsa) — T....em n... am... orada?
Dora sorri.
TOLENTINO — Por que você não fala comigo? Só fica rindo, me olhando
com esses olho que brilha!
TOLENTINO — Mas ora, que bobagem! Já é coisa feita; nós vamo acabá
casando. Sinto isso como é certo eu morrê um dia!
TOLENTINO — Não sei porquê! É uma beleza. Você não podia falá de outro
jeito — fica bem em você... Ajeita com o sorriso. Teu riso é assim
também, meio esticado...
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TOLENTINO (Imita-a) — Ocê nem parece desse mundo!
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MESTRE — Se a gente for atender a tudo quanto é caso isso vira um
hospício. Tem ordem e precisa cumpri. Imagina se cada um resolve
trazê a mulhé pro serviço!
MARIA I. — Mas tou dizendo que é urgente. Coisa que não pode esperá!
MESTRE — Pois então vai, vai falá com Pedrico. Tá despedido mesmo!
MARIA I. — Despedido?!
MESTRE — Não posso o quê? Não venha com choro que pra cima de mim
não adianta. Já agüentei demais. Paciência tem fim.
MESTRE — Podia mas não quis. Quer falá com ele ou não quer?
MURIÉ — Vamo!
PEDRICO — Ah, veio, hein. Foi bom. O rapaz tava quase louco na espera!
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TOLENTINO — Eu sabia que ela vinha...
PEDRICO — Nóis não. Mas se o Mestre vê, não ligue pra ofensa. É um
cavalo que anda solto por aí.
DORA — Nossa!
TOLENTINO — Não vai, não! Vou subi com ela, seu Pedrico. Mostrá o
muro da gente!
TOLENTINO — Tá segura!
PEDRICO — Pois, pra mim, é bem feito. Que nem palhaço, gostava de vê
tudo isso ir pro inferno!
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ANTÔNIO — Comigo longe, nem me incomodo!
MARIA I. — Pedrico!
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MARIA I. — Tava não. A gente é que queria!
PEDRICO — Pra que toda essa força que Deus nos deu? Pra que agüentar
pancada no lombo? Pancada e mais pancada. Esfola o corpo,
desgraçado, te mata, te mata e a toda esperança!... Pra que, Maria Inês?
Pra que? (Chora.)
TOLENTINO — Foi o que eu sempre quis ter. Mas mora na roça! Casa
própria, curral, cuida da terra... Já tão falando em reforma agrária!
TOLENTINO — Mas tem carroça, dois cavalo reforçado e vamo nóis cada
domingo, assisti o seriado. Que tal?
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DORA — P...enso na v...ida e me assusta. Que...ria s...ê v...idente, s...abê o
d... dia d...e amanh...ã!
DORA — Hum, pois sim. Na terceira aula apela pros gritos na quarta pra
sova! Sou burra, viu!
TOLENTINO — Não falei! Não falei!
DORA — O quê?
TOLENTINO — Eu disse que tu ia acabá falando sem arrastá... Você disse
tudo de vez!
DORA — Mesmo?
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TOLENTINO — Pois então!
MARIA I. — Julião até estranhou. Chora, ele dizia, chora por favor!... Não
houve jeito. Sequei de todo.
PEDRICO — Agora Maria Inês, é largá de ser besta! Vou voltá pra Bahia.
Vamo lá! É a tal da teimosia. Quem sabe voltando pro mesmo lugá a
gente pode recomeçá.
MARIA I. (Com alívio) — Pedrico! Até que enfim, acho que vou chorá!
MESTRE — Mas o que é que há? Não têm casa, precisa vir se abraçá no
serviço?!
PEDRICO — Deixa pra lá, Mestre, que a hora é dura pra nós!
MESTRE — Que dura, o quê! Vai arrumá suas coisa e pode dá o fora. Leve
sua mulher daqui!
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PEDRICO — Respeite a dô dos outro...
Aproximam-se operários.
PEDRICO — Fala com modos que eu sou homem que nem tu!
PEDRICO — Tira essa mão porca. Há tempo que eu quero lhe rachá essa
cara!
PEDRICO — Agora chega. Vamo tratá sem diferença, de cara a cara, igual
pra igual, vem me buscá!
PEDRICO — Com medo agora, não é? Pois até hoje ninguém enfrentô, não é
mesmo?
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PEDRICO — É papo! Você tava pensando que a turma ia apartá? Se
enganou. Olha, tá todo mundo segurando esse punhal!
DORA — É soldado?!
DORA — Em quê?
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Corte para os alicerces. Luta. Movimento rápido de Pedrico.
Revide do Mestre. Maria Inês observa. Calma. Durante a luta
os operários a princípio timidamente, depois com coragem
incentivam Pedrico.
VOZES — Maranhense... Ai, meu pai... Pedrico... Ai... segura... Levanta ele.
Gemidos.
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sobrá eu... logo eu! Sou um caco, não valho nada! E nem assim... Logo
eu pra sobrá!...
Superposição.
FIM
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