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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO

DEPARTAMENTO DE AGROTECNOLOGIA E CIÊNCIA SOCIAIS

CURSO DE DIREITO

RAILSON RAMOS DE SOUZA

A EFETIVIDADE DAS NORMAS SOB A PERSPECTIVA DA NOVA LEI DE


DROGAS (LEI 11.343/06)

MOSSORÓ-RN

2018
O tema aqui tratado diz respeito à efetividade das normas jurídicas.
Efetividade aqui tomada em seu sentido geral corresponde a aptidão que uma
norma jurídica possui em produzir efeitos. E a depender do tipo de efeito que
produzir receberá um nome específico, podendo ser: efetividade jurídica ou
efetividade social [1].

Para carregar efetividade jurídica, a norma jurídica, deve ter,


obrigatoriamente, como elementos, por exemplo, hipótese, disposição e sanção,
estando apta, portanto, a gerar efeitos materiais (na realidade concreta), seja
quando respeitada ou até mesmo ao ser transgredida.

Por outro lado, a efetividade social acontece quando uma norma jurídica é
respeitada e, portanto, fruto de uma aceitação ou reconhecimento por parte da
sociedade em relação ao direito e a mesma sociedade cumpre com as suas regras.

De forma simples , para que ocorra a efetividade das normas nos âmbitos jurídico e
social é importante que elas sejam interpretadas sistematicamente (de modo
sintático), que os valores estabelecidos nas normas jurídicas estejam em sintonia ou
de acordo com a história e os anseios do corpo social (de maneira semântica), e que
constantemente a sociedade civil pressione a elite (alta sociedade ) econômica e
política a fim de que cumpram com o acordado nas leis e efetivem os preceitos,
princípios e valores nelas previstos (Plano Pragmático), desviando-se , portanto de
uma viável crise institucional do direito estatal.

Segundo o dicionário Leib Soibelman, efetividade é: “Efetividade, derivado de


efeitos, do latim effectivus, de efficere (executar, cumprir, satisfazer, acabar), indica a
qualidade ou o caráter de tudo o que se mostra efetivo ou que está em atividade.
Quer assim dizer o que está em vigência, está sendo cumprido ou está em atual
exercício, ou seja, que está realizando os seus próprios efeitos. Opõe-se assim ao
que está parado, ao que não tem efeito, ou não pode ser exercido ou executado”.

O próprio jurista, professor , magistrado brasileiro e atualmente ministro do


Supremo Tribunal Federal (STF ) ,Luís Roberto Barroso, discorre, de modo sintético,
a respeito da efetividade , dizendo : “a efetividade significa, portanto, a realização do
Direito, o desempenho concreto de sua função social. Ela representa a
materialização dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima
quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social.” (Barroso,
1993, p. 79).

E é nessa perspectiva que abordamos a efetividade da Lei de Drogas (Lei n.


11.343/2006) ,12 anos após sua criação, aliás, não com muita comemoração. A
certeza que temos é que a guerra contra as drogas não deu certo e que a atual
conjuntura da lei que tenta inibir o consumo e o tráfico sob o manto de uma política
criminal repressiva foi um fracasso e só aumentou o encarceramento no Brasil.

De início choca constar que de 1990 a 2016 observamos um salto


extraordinário em número de prisões por tráfico de entorpecentes, saltando de 90 mil
para mais de 726 mil, o que acaba qualificando o perfil majoritário das pessoas que
entram no sistema prisional brasileiro como envolvidas em crimes de tráfico de
drogas. [2]
[3]
Conforme o 27º relatório global da organização Human Rights Watch , em
2005, no Brasil, 9% dos presos brasileiros o eram por crimes relacionados com as
drogas. No ano de 2014 a realidade era outra, e maior, 28%. Segundo a ONG, a
falta de clareza da própria lei é que permitiu o crescimento da população carcerária,
sobretudo porque muitos usuários foram apreendidos -equivocadamente- na
condição de traficantes.

A nova Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) trouxe uma novidade em relação a lei
[3]
anterior – de 1976: diferenciando usuário e traficante . Da mesma forma a posse
de droga para o uso pessoal passa a ser compreendido como delito pequeno, já o
tráfico como grave, levando a prisão do indivíduo. Cabendo aos primeiros uma pena
de advertência, sendo muitas vezes revertida em serviços comunitários ou a
atividades de cunho educativo; e aos segundos, uma pena maior, que não serviços
comunitários, mas a prisão de 5 a 15 anos.

Os especialistas falam que o aumento explosivo de encarceramentos é


decorrente de uma imprecisa definição sobre o que é uso e o que é tráfico de
drogas, assim como o mal-uso da lei. Uma pessoa ao portar uma certa quantidade
de droga pode ser concebida como uma traficante, sendo um absurdo, uma vez que
o próprio Estado não consegue provar que essa pessoa de fato é uma traficante. E
em consequência disso, diante dessa imprecisão normativa, os próprios jovens,
negros, favelados e desempregados se veem na dificuldade de provar a sua
inocência quando abordados por autoridades policiais nas ruas.

A Lei de Drogas leva em consideração critérios subjetivos, o que dá a


responsabilidade de enquadramento do indivíduo como usuário ou traficante ao
[3]
magistrado. Em breve trecho do art. 28 da referida lei tem-se o seguinte: “Para
determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e
à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se
desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e
aos antecedentes do agente”. Portanto, não é nenhum disparate associarmos a
atual configuração do sistema carcerário brasileiro (isto é, sua superlotação) e a
forma de abordagem subjetiva recaída sobre o magistrado na aplicação da norma.

Ademais, a atual legislação falha também quando não inibe a entrada de


drogas de outros países no território nacional. E isso é bastante notável quando
[5]
observamos o Relatório Sobre Drogas de 2016 , no qual o Brasil é citado como a
principal rota de passagem de cocaína proveniente da Colômbia, Peru e Bolívia,
enviada consequentemente a países da Ásia e Europa. Da mesma forma acontece
com a maconha, além do país ser rota, também é um grande consumidor da
mesma.

Indiscutivelmente uma outra questão que se relaciona com as drogas é a


questão da violência. E, atualmente, segundo dados da OMS, o Brasil se consagra
como o 9° país mais violento do mundo [5], muito em vista da atuação da sua fadada
política de combate as drogas e atuação das facções criminosas que dominam o
tráfico de drogas no país, contribuindo para destaca-lo como a 3ª maior população
carcerária do mundo [6].

A Política Brasileira de Drogas está muito a quem de outros países. Para se


ter noção do grau de diferença, nos Estados Unidos, a maconha é liberada para uso
medicinal em cerca de 30 territórios da federação .Aqui ,no nosso vizinho da
América do Sul, o Uruguai, já se comercializa e distribui-se a Cannabis nas próprias
farmácias cabendo sob ônus do Estado .Em Portugal a descriminalização da
maconha já vigora desde o ano de 2001. O Canadá tem uma política voltada para o
tratamento de viciados com heroína, uma droga bastante destrutiva.

O Brasil, no ano de 2014 experimentou um projeto de política menos restritiva


em relação às drogas. Foi na cidade de São Paulo, sob o nome de “De Braços
Abertos”. A proposta diferente desse programa era olhar para a questão da droga
sobre um novo prisma, buscando diminuir os prejuízos biológicos e sociais dos
usuários a longo prazo e não uma proposta ilusória de tentar acabar com o crack
imediatamente.

Enfim, fica claro que a atual Lei de Drogas não tem surtido o efeito desejado,
visando diminuir o número de dependentes, traficantes e de encarceramento nos
presídios brasileiros. O efeito foi contrário, como resultado de uma Política
repressiva desastrosa que não conseguiu atingir a questão no seu âmago, mas
apenas nos seus efeitos e, em pleno 2018, 12 anos após a sua promulgação, ainda
estamos aqui pensando em alternativas para resolver esse problema que não se
trata apenas de uma questão criminal, mas também de saúde pública.

Referências:

[1] https://jus.com.br/artigos/4731/a-efetividade-das-normas-constitucionais

[2] http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-06/lei-de-drogas-tem-
impulsionado-encarceramento-no-brasil

[3] https://extra.globo.com/noticias/brasil/relatorio-aponta-lei-de-drogas-como-causa-
principal-da-superpopulacao-carceraria-20763447.html

[4] https://www.nexojornal.com.br/explicado/2017/01/14/Lei-de-Drogas-a-distin
%C3%A7%C3%A3o-entre-usu%C3%A1rio-e-traficante-o-impacto-nas-pris
%C3%B5es-e-o-debate-no-pa%C3%ADs
[5] https://unaids.org.br/2016/06/unodc-lanca-relatorio-mundial-sobre-drogas-de-
2016/

[6] https://veja.abril.com.br/brasil/brasil-tem-a-3-maior-populacao-carceraria-do-
mundo/

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