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odemos localizar temporalmente rendo em nosso sistema de ensino no Rafael Haag
a segunda metade do século intuito de preparar nossos alunos e-mail: haag@if.ufrgs.br
XVIII como o ponto de partida para darem conta desse novo mundo Ives Solano Araujo
de um processo de transformação informatizado que os cerca. Entretan- e-mail: ives@if.ufrgs.br
socioeconômica como poucas vezes to, na escola atual, o computador está e
antes foi vista na história da huma- sendo explorado prioritariamente na Eliane Angela Veit
nidade, a chamada revolução indus- construção de materiais (como textos, e-mail: eav@if.ufrgs.br
trial. Este período foi caracterizado apresentações e páginas na web), Instituto de Física, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul
pela substituição do modo de produ- como fonte de consulta de informa- ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

ção artesanal pelo sistema fabril, ções e como meio de comunicação. É


impulsionado pelo advento das má- indiscutível a importância da aborda-
quinas a vapor. Devido a esta notável gem de tais temas pela escola, porém
evolução tecnológica, hábitos e cos- visualizamos outras aplicações perti-
tumes humanos foram drasticamente nentes, particularmente ao ensino-
modificados, tornando necessária aprendizagem de Ciências, que não
uma adaptação dos sistemas de ensino podem ser suprimidas no Ensino Mé-
da época de modo a capacitar os indi- dio, sob pena de comprometer a for-
víduos a lidarem com esta tecnologia. mação da cultura científica e tecno-
Nas últimas três lógica do aluno, ali-
décadas pudemos Nas ciências em geral e na jando-o da educa-
presenciar outra Física em particular, o ção e alfabetização
grande transforma- computador vem sendo científicas [1].
ção com um impac- maciçamente utilizado para a Dentre as diver-
to gigantesco sobre criação de complexos sas aplicações das
a estrutura de nossa modelos científicos que não tecnologias de in-
sociedade como um poderiam ser realizados sem formação e comu-
todo. Desta vez, o o seu auxílio. Entretanto, na nicação na forma-
computador ocupa escola atual, ele serve ção do cidadão, des-
o papel principal prioritariamente como tacamos duas como
neste processo, sen- simples fonte de consulta e particulares do en-
do raras as áreas do apresentação de textos sino de Ciências: o
conhecimento hu- computador como
mano nas quais não está presente. Nas instrumento para a modelagem
ciências em geral e na Física em parti- científica e como suporte ao laborató-
cular, o computador vem sendo ma- rio. Neste trabalho nos concentramos
ciçamente utilizado para a criação de no segundo tipo de aplicação, enfo-
modelos científicos altamente comple- cando a aquisição automática de da-
xos, que não poderiam ser realizados dos no laboratório didático de Física. No presente trabalho abordamos o uso de aqui-
sem o auxílio de algum recurso tecno- Nos países do primeiro mundo, isto sição automática de dados no laboratório didá-
lógico a ele relacionado. Tal importân- já vem sendo feito desde o início dos tico de Física, apresentando alguns conceitos
cia adquiriu esta ferramenta em nosso anos 90 [2-3], enquanto nas escolas básicos sobre o tema e exemplos ilustrativos.
Diversas referências com detalhes técnicos sobre
cotidiano que poderíamos imediata- brasileiras pouco se avançou nesta os sistemas de detecção, sobre os softwares uti-
mente imaginar as mais incríveis área. Esta defasagem se deve, primor- lizados e com a descrição de experiências vol-
transformações que estariam ocor- dialmente, a três fatores: i) somente tadas para o ensino médio são sugeridas.

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nos últimos anos microcomputadores têxtil, por exemplo. Entretanto, para
estão sendo introduzidos nas escolas, que consigamos atingir este objetivo,
ii) até recentemente os sistemas de o sistema de aquisição não pode ser
aquisição de dados disponíveis reque- visto como uma caixa-preta. É preciso
riam interfaces externas ao computa- desmistificar o processo de aquisição
dor, importadas e caras (só muito automática de dados, permitindo que
recentemente surgiram ofertas nacio- o aluno manipule os sensores, que
nais) e iii) o desconhecimento por faça medidas manuais, para observar
parte da maioria dos professores da o efeito de variações de grandezas fí-
possibilidade de confecção de sistemas sicas sobre os sensores, que trabalhe
de aquisição automática de baixo com sistemas de detecção, que explore
custo e fácil desenvolvimento [4-12] Figura 2. Medidas da velocidade de rotação softwares para, somente então, operar
e, especialmente, da possibilidade de de um pião. O sistema de detecção envolve sistemas automáticos de aquisição de
uso do próprio microfone [13-17] ou um sensor ótico construído com fotodio- dados. Também é imprescindível
dos (ou fototransistores). A leitura da en-
da entrada auxiliar [18] do PC para abandonar os roteiros de laboratório
trada digital da porta de jogos é feita com
medida em diversas áreas da Física. a linguagem Visual Basic Application, em tradicionais, que em muito se asseme-
uma planilha Excel. lham a uma receita de bolo, e introdu-
Por que inserir a aquisição zir atividades abertas, potencialmente
automática de dados no queiram um longo período de tempo. mais propícias para aprendizagem da
laboratório de Física? Nestes casos, o registro de dados pode física envolvida no experimento [22].
Vários motivos podem ser aven- ser possível manualmente, mas tor-
na-se tedioso. (Veja Fig. 4.) [21]; Que tipos de sensores
tados para introduzir aquisição auto-
• propiciar redução no tempo podemos utilizar?
matizada de dados em um laboratório
didático: gasto para a coleta de dados, permi- Todo sistema de aquisição de da-
• enriquecer as experiências de tindo que o aluno disponha de maior dos necessita de um sensor para con-
aprendizagem propiciando outras tempo para desenvolver outras habi- verter alguma grandeza física - como
alternativas para o aluno compreen- lidades e competências, como traba- temperatura, força, pressão - em um
der e relacionar os resultados obtidos lhar com planilhas eletrônicas [12]; sinal elétrico que posteriormente é en-
e os conceitos vinculados à funda- • obter mais medidas, com maior tregue ao microcomputador para a
mentação teórica do experimento e, precisão e mais rapidamente [4-15]. coleta e análise dos dados. Atualmente
assim, trazer a Física escondida entre Outra motivação, que considera- há no mercado uma enorme quanti-
os números e fórmulas para o “mun- mos ainda mais importante, diz res- dade de sensores e componentes ele-
do real” (Veja Fig. 1) [3]; peito à alfabetização científica. Viven- trônicos de baixo custo que podem ser
• permitir a realização de experi- ciar processos de medida em tempo utilizados para este fim. Um simples
mentos que envolvam medições de real e, simultaneamente, observar na potenciômetro (resistência variável),
tempo em frações de segundos e a tela de um computador a represen- se acoplado a uma haste metálica com
coleta manual é impossível (Veja Figs. tação dos dados colhidos, oportuniza uma massa na sua extremidade,
2 e 3) [11-13, 20]; uma melhor compreensão não só do transforma-se em um sensor que
• explorar experiências que re- estágio atual das Ciências, mas tam- possibilita a leitura da posição angu-
bém do que ocorre em um consultó- lar de um pêndulo em função do tem-
rio médico, quando são realizadas po [7]. Um termistor do tipo NTC1
ecografias, ou nos sistemas de contro- pode ser usado para medida de tem-
le de produção em uma indústria peratura2 [8, 21]. Até mesmo um

Figura 1. Posição em função do tempo. A


linha contínua representa o gráfico de um
movimento que se pretende reproduzir e
a linha pontilhada é uma tentativa de re-
produzi-lo, com um sistema CBL (Calcu-
lator Based Laboratory) [19]. Resultados de Figura 3. Dados coletados, com um equipamento da PASCO [20], para a força em função
pesquisa mostram que a interatividade do do tempo sofrida por um carrinho que sofre uma colisão. O fenômeno em estudo tem
aluno com este tipo de experimento é um duração de centésimos de segundos, e sua detecção só é possível com algum sistema
fator que contribuiu para a compreensão automático de coleta de dados. Neste exemplo, o software permite que seja avaliada a
de gráficos da cinemática [3]. área sob a curva, que fornece o impulso.

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to digital. Se desejarmos coletar dados
analógicos, devemos empregar uma
interface de conversão A/D para que
ele seja compreendido pelo microcom-
putador. Felizmente, existe uma in-
terface deste tipo em praticamente
todos os computadores pessoais: a
placa de som.
A placa de som, uma das interfa-
Figura 4. Curva de resfriamento (a) e aquecimento (b) de um líquido. No caso (a) o ces entre o microcomputador e o mun-
tempo total da coleta é de cerca de 1h, mas no caso (b) é de mais de 5h [21]. do externo, possui no mínimo uma
entrada e saída de áudio e, usualmente,
mouse com defeito pode ser aprovei- Como conectar os sensores ao uma entrada de jogos, com quatro en-
tado como sensor, bastando para isso, microcomputador? tradas analógicas e quatro digitais, que
retirar o conjunto de fotodiodos exis- podem ser utilizadas para aquisição
tente no seu interior. Um conjunto de O microcomputador é um equi- automática de dados. Nas Refs. [7-9]
fotodiodo emissor e receptor presta- pamento eletrônico que, para ser útil, encontram-se detalhes do circuito
se muito bem para medidas de tempo deve receber e transmitir informações elétrico da porta de jogos e as respecti-
[8, 12]. Uma atividade preliminar à ao usuário. Basicamente, todas as en- vas conexões do conector tipo DB15.
aquisição automática consiste em tradas que o computador utiliza para As quatro entradas digitais podem
propiciar aos alunos a oportunidade receber estas informações, como o ser conectadas a sensores digitais para
de manipular sensores e, com um mouse, teclado, porta de impressora, medida de tempo, por exemplo. As
multiteste, observar que a variação porta USB, entrada de jogos (joystick) entradas analógicas da porta de jogos
de intensidade luminosa, por exemplo, e entrada de microfone podem ser possuem uma resolução de 8 bits. Isto
produz uma variação da resistência utilizadas para aquisição de dados [9]. significa que é possível medir 28 (256)
em um LDR3 ou que a variação da Cada uma destas portas de comuni- valores distintos nesta entrada. Origi-
temperatura tem o efeito de variar a cação entre o microcomputador e o nalmente, cada entrada analógica da
resistência de um termistor. mundo externo possui características porta de jogos foi concebida para tra-
próprias que devem ser observadas balhar com um potenciômetro cuja
Sensores digitais e analógicos cuidadosamente antes de ligar os resistência varia desde zero até apro-
Os inúmeros sensores que podem sensores. Nas Refs. [5-13] encontram- ximadamente 100 kΩ. Assim, se a
ser utilizados para a coleta de dados se detalhes para a utilização de várias variação de resistência sofrida pelo
se dividem em dois tipos: analógicos destas entradas. sensor ao longo da experiência se
e digitais. Os analógicos apresentam Por que devo usar (ou não) aproximar de 100 kΩ, sem ultrapas-
resposta contínua em uma larga faixa uma interface analógico/ sar este valor, tem-se a melhor reso-
da grandeza física medida. Por exem- lução para a conversão analógico/
digital (A/D)?
plo, NTC’s usuais operam na faixa de digital possível com este sistema.
temperatura de -50 °C a 150 °C. Já Para a coleta de sinais analógicos Neste ponto, o leitor pode perceber que
os sensores digitais podem fornecer através do microcomputador há estas entradas analógicas existentes
apenas duas respostas na sua saída: necessidade de alguma forma de no conector de joystick, aceitam so-
ligado (nível alto) ou desligado (nível conversão deste sinal para a lingua- mente sensores que se comportam
baixo). O interruptor de luz é um gem digital, única que o microcompu- como resistências variáveis, como é o
exemplo de sensor digital. À primeira tador compreende. A Fig. 5 representa caso dos NTC, PTC, LDR, e potenciô-
vista, pode parecer que os sensores simbolicamente a conversão analó- metros. Para usar outros tipos de
digitais não possuem muita utilidade gico-digital (A/D). O sinal analógico sensores ou efetuar medidas de ten-
na aquisição de dados, mas este tipo captado, geralmente a diferença de po- são, por exemplo, é necessária uma
de sensor, se bem empregado, é muito tencial existente entre as extremidades
útil para a medida de tempo, veloci- de um sensor, é convertido numa in-
dade, posição, deslocamento e outras. formação binária composta pelos bits
Na família dos sensores digitais, além 0 (baixo) e 1 (alto), que é coletada por
dos fotodiodos, há os interruptores uma das portas de comunicação do
magnéticos (também chamados de microcomputador com o mundo
reed-switch ou reed-relay), que podem externo. A qualidade4 desta conversão
substituir com vantagens as tradicio- depende do número de bits utilizados.
nais fagulhas utilizadas em trilhos de Quanto maior a quantidade de bits,
ar [23]. A família dos analógicos inclui maior é a semelhança entre o sinal ori- Figura 5. O sinal analógico deve ser trans-
termistores, microfones, potenciô- ginal, presente na entrada do conver- formado em digital para poder ser inter-
metros e vários circuitos integrados. sor, e o sinal convertido para o forma- pretado pelo computador.

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interface A/D mais versátil. prio software, usando LOGO [8, 23, tion, que acompanha o Excel, permite
31], Visual Basic Application [12] ou que se faça a leitura da portas de jogo,
Pode-se construir interfaces consultando alguns dos códigos fon- tanto em sua entrada analógica quan-
A/D de baixo custo tes disponíveis na rede. A indústria to na digital, assim como a leitura da
Até alguns anos atrás, a constru- PICO [30] disponibiliza um software porta paralela (da impressora). As pla-
ção de uma interface analógico/digi- específico para o circuito integrado nilhas confeccionadas por Figueira e
tal era uma tarefa demasiadamente TCL548 (procure pelo modelo Veit [12] também se encontram dispo-
sofisticada para sua implementação ADC10) que é distribuído livremente níveis livremente em [32].
pelo professor com pouca aptidão em na web juntamente com o seu código
fonte em várias linguagens, entre elas Comece pelo mais simples: A
montagens eletrônicas, pois os com-
ponentes envolvidos eram em elevado a VISUALBASIC, DELPHI, C++ e entrada de microfone
número e nem sempre disponíveis no planilha Excel. Esta empresa também Se você quer ver resultados de
comércio eletrônico local. Atualmente comercializa unidades conversoras A/ imediato, ponha mãos à obra com um
podemos montar uma unidade con- D, porém o custo destas unidades é microfone e um software para leitura
versora A/D de baixo custo, usando relativamente elevado em comparação da entrada de áudio, como o Spectro-
apenas poucos com- com as unidades gram [25], Goldware [26] ou o Aware
ponentes eletrôni- Existem diversos softwares produzidas de mo- Audio [27]. Além de experiências em
cos. A Ref. [24] disponíveis livremente do artesanal. acústica, como a medida da velocidade
apresenta uma in- (freeware) ou parcialmente Para fins didá- do som (Fig. 6) e o estudo de timbre
terface que pode ser livres (shareware) na ticos, de particular de instrumentos musicais (Fig. 7),
construída em mi- Internet que podem ser interesse são as al- você poderá fazer experiências de
nutos, pois emprega usados para aquisição ternativas propicia- mecânica, como medir o coeficiente
um único compo- automática de dados das por planilhas de restituição em choques mecânicos
nente eletrônico, o eletrônicas, pois (Fig. 8) e determinar a aceleração de
próprio circuito integrado (TLC548), conforme sugerem Figueira e Veit [12]:
que é um conversor A/D. O TCL548 • “são altamente ajustáveis às ne-
é um conversor de 8 bits com um ca- cessidades em vários campos de ativi-
nal analógico de entrada com resposta dade, assim como na vida doméstica;
entre 0 e 5 V e resolução temporal • permitem cálculos numéricos sem
melhor do que 1 ms. Este circuito conhecimento de qualquer linguagem de
integrado pode ser ligado diretamente programação ou metáfora simbólica;
à entrada de impressora do micro- • cálculos com planilhas costumam
computador e basicamente necessita ser inteligíveis e apreciados por profes-
apenas da alimentação externa de 5 V sores de Ensino Médio, enquanto progra-
Figura 6. Espectro sonoro produzido em
para operação, simplificando a mon- mas escritos em linguagem de progra- um tubo de PVC [10]. A identificação da
tagem. Esta alimentação pode ser mação não têm a mesma receptividade; freqüência dos diversos harmônicos per-
retirada da entrada de jogos ou de uma • planilhas eletrônicas propiciam a mite determinar a velocidade do som no
bateria de 9 V e um circuito regulador construção de gráficos”. ar. Cavalcante & Tavolaro discutem em de-
de tensão de 5 V. Existem no mercado A linguagem Visual Basic Applica- talhe esta experiência [16].
várias outras opções de circuitos inte-
grados que podem ser adotados nesta
interface.
Não conheço nenhuma
linguagem de programação, e
agora?
Existem diversos softwares dispo-
níveis livremente (freeware) ou parcial-
mente livres (shareware) na Internet -
por exemplo nas Refs. [25-30] - que
podem ser usados para aquisição
automática de dados. Alguns são
específicos para a entrada de microfo-
ne ou a auxiliar5 [25-27] outros se
destinam à entrada paralela [30] e Figura 7 Espectros sonoros de uma mesma nota musical mostram que os instrumentos
outros às entradas de jogos [29]. O musicais vibram em várias freqüências distintas ao mesmo tempo e que a composição
leitor com alguma noção de progra- destas freqüências, cada uma com sua intensidade característica, é o que define o tim-
mação poderá implementar o seu pró- bre. Espectros obtidos com o software Spectrogram [24], apresentados na Ref. 10.

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trônicos e a análise envolvia o uso do
Excel. Os alunos despenderam um
tempo considerável para começar a
tomada de dados, pois não estavam
familiarizados com os instrumentos.
A nosso ver, esta é mais uma razão
para se inserir atividades deste tipo,
quer porque a familiarização com os
instrumentos necessários ao ensino de
Figura 8 Espectro sonoro de uma bolinha
Física é um dos objetivos das aulas de
que, largada de certa altura, quica no
chão. A partir do intervalo de tempo en- Figura 10. Pressão de vapor para o álcool laboratório, quer porque os questio-
tre duas colisões sucessivas é possível me- (azul) e água (cor de rosa) em função da namentos levantados costumam ser
dir o coeficiente de restituição na colisão. temperatura, obtido com um CBL (Cal- frutíferos, o que dificilmente aconte-
Detalhes na Ref. [13]. culator Based Laboratory) [33]. Os dados ceria na obtenção de medidas manuais
foram coletados com um intervalo de repetitivas.
queda de um corpo ou a velocidade 1 min, durante 1 h. Medeiros e Medeiros [37], citando
de uma bola de futebol, que é jogada representadas por pontos fora da cur- Härtel, enfatizam que “o valor edu-
contra uma parede [9] ou, ainda, va, assim como o significado de umi- cacional de uma simulação dependerá
investigar a Lei de Faraday-Lenz. dade relativa e de sua medida [33]. Os do fato de ela poder vir a representar
dados foram coletados com um sis- para o estudante um papel de auxiliar
Outros exemplos ilustrativos tema de aquisição automático (CBL - heurístico e não apenas cumprir um
Determinação da velocidade do Calculator Based Laboratory). papel algorítmico ou meramente
som no ar: dois microfones conecta- ilustrativo”. Também no caso da aqui-
dos à entrada auxiliar do microcom-
O microcomputador também sição automática esta colocação é
putador detectam um sinal sonoro pode se usado como gerador pertinente. É por isto que comparti-
(som da batida de uma colher em uma de sinais lhamos da visão de vários autores [4-
tampa de panela). Como os microfo- O microcomputador também 12] que evitam tratar o sistema de
nes estão situados a diferentes distân- pode desempenhar a função de um aquisição automática como uma cai-
cias da fonte geradora do som, um gerador de sinais, desde que se dispo- xa-preta e instigam alunos e profes-
dos microfones detecta o som antes nha de um software apropriado. Por sores para que participem ativamente
do outro, conforme pode ser visto na exemplo, Cavalcante e Tavolaro [34] de várias etapas do processo. Como
Fig. 9. Detalhes são discutidos por utilizam o software Sine Wave Genera- um contraponto ao uso exacerbado
Grala e Oliveira [18]. tor [35], para gerar um sinal elétrico dos tradicionais roteiros fortemente
Determinação da pressão de va- com freqüência definida, que acoplado estruturados em atividades experi-
por saturado: uma quantidade de a um alto-falante, gera ondas esta- mentais de cunho didático, conside-
água (álcool) é colocada em um reci- cionárias em cordas esticadas (veja ramos indispensável a apresentação de
piente hermeticamente fechado e a Fig. 11). alternativas metodológicas que enfa-
pressão de vapor é medida em função tizem a “análise e interpretação dos
da temperatura. Pode-se observar na Nem tudo são flores resultados, a reflexão sobre as impli-
Fig. 10 que para um mesmo valor de O argumento usual de que a in- cações destes e a avaliação da quali-
temperatura, a pressão de vapor é trodução do microcomputador como dade das evidências que suportam as
maior para o líquido mais volátil, no instrumento de medida no laboratório
caso o álcool. Sias e Ribeiro-Teixeira didático de Física, minimizando o
[33] discutem as situações físicas tempo necessário para a aquisição dos
dados, possibilita um tempo maior
para a discussão e análise dos fenôme-
nos físicos, nem sempre é correta. Em
atividades que presenciamos em sala
de aula com alunos do Ensino Médio
[36], este argumento mostrou-se ver-
dadeiro nas experiências de som para
as quais não era requerida montagem
de sistema de detecção e o sensor uti-
Figura 11. Onda estacionária produzida em
lizado era o microfone, mas não se uma corda esticada. O lado esquerdo da cor-
Figura 9. A onda sonora chega no mi- mostrou verdadeiro em atividades em da está preso a um alto-falante, que é acio-
crofone 1 antes de chegar no 2. A medida que a montagem experimental reque- nado por um sinal elétrico gerado pelo
deste intervalo de tempo permite deter- ria um sistema de detecção ótico microcomputador. Fotografia gentilmente
minar a velocidade do som no ar [18]. construído com componentes ele- cedida por Cavalcante & Tavolaro [34].

Física na Escola, v. 6, n. 1, 2005 Aquisição de Dados no Laboratório de Física? 73


conclusões obtidas”, como destaca envolvendo um grande volume de da- possibilidades fornecidas por esse tipo
Borges [22]. dos. Sem dúvida para estes casos, de ferramenta em um laboratório
coleta automatizada se mostra de didático de Física não leve ao seu em-
Concluindo grande valia, livrando o aluno do prego em experiências simples (do
Reiteramos que o uso do compu- “trabalho braçal” de anotar os resul- ponto de vista operacional), apenas
tador na aquisição automática de tados e permitindo que ele se concen- porque o recurso está disponível. Isto
dados é recomendável em medidas que tre no entendimento da Física rele- pode mascarar a Física a ser apreen-
tomam muito tempo ou, ao contrá- vante ao experimento. Entretanto, dida, tornando o experimento mais di-
rio, precisam ser feitas em frações de devemos tomar cuidado para que o fícil para os alunos compreenderem
segundo; ou, ainda, para experiências deslumbramento com as enormes do que o necessário.

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74 Aquisição de Dados no Laboratório de Física? Física na Escola, v. 6, n. 1, 2005

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