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Timo Bartholl
Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal Fluminense (UFF);
Bolsista FAPERJ; Orientador: Rogério Haesbaert
Pesquisa de doutorado em andamento (3° ano)
Email: timo.bartholl@gmail.com
INTRODUÇÃO
Esta questão, afinada em seus detalhes conforme o avanço da pesquisa, é uma
questão que deriva do trabalho de base e busca trazer conceitos genéricos, de luta, ao
encontro com pesquisas e formulações conceituais e teóricas de uma geografia e ciência
social crítica, comprometida com a transformação social emancipatória.
É uma questão que surge e que se entende parte de uma busca de analisar para
avaliar e de compreender para fortalecer. Este texto reflete o andar do processo de
investigação para contextualizar o caminho até então trilhado e discutir desafios e
perspectivas dos rumos futuros. Em diálogo com o tema geral do nosso congresso,
focalizo na discussão geográficametodológica do trabalho para contribuir com o debate
da relação da geografia com as diversas lutas sociais em curso no Brasil e na América
Latina. Proponho construirmos uma geografia em movimento que se insere nestas lutas.
OBJETIVOS
O objetivo específico desta pesquisa é acompanhar, refletir e discutir o trabalho
de movimentos sociais de base que atuam em favelas no Rio de Janeiro para alcançar
um melhor entendimento das formas de resistência e territorialização, expressas na
relação da favela como território e movimento social de base que nele se territorializa.
Participo, desde 2008 de processos de resistência popular, e questões a serem estudadas
neste processo surgiram das práticas destas lutas. Acompanhar, neste sentido, significa
tratar de contextos que eu mesmo estou envolvido, tanto como integrante de um grupo
de base, como no âmbito de uma rede de pessoas e grupos com os quais existem laços
de colaboração, apoio mútuo e construção coletiva. Parto da esperança de que a
compreensão do território como categoria analítica e como categoria da prática pode
contribuir tanto para uma geografia libertária e libertadora quanto para o trabalho de
base do movimento social urbano nas favelas.
Quanto à ciência morta, a ciência falsificada, cujo único objetivo é introduzir
no povo todo um sistema de falsas noções e concepções, ela seria para este
último verdadeiramente funesta; ela lhe inocularia o vírus oficial, de todo
modo, o desviaria, ao menos por um tempo, do que é hoje a única coisa útil e
salutar: a revolta (BAKUNIN 2009, p.24).
Nas ciências sociais críticas em geral e na geografia crítica em específico em
diversos momentos têm ocorrido importantes debates sobre o como de fazermos ciência
e o significado da mesma para além da academia. Na geografia, em diversos contextos
surgiram perspectivas críticas que renovaram o arcabouço teórico e conceitual no que
diz respeito a conceitos chaves como espaço, território ou lugar. Foi com os
movimentos sociais dos anos '60 que surgiu uma corrente de geografia radical nos
países anglofônicos e também na Espanha e França, com uma vertente predominante
marxista e outra, minoritária, libertária (PEET 1977; BREITBART 1989; SMITH 2001;
HARVEY 2001; LACOSTE 1989; SOUZA 2010).
A geografia: o que é, para que serve e a quem serve (MOREIRA 2011, p.87)?
No Brasil, a geografia crítica surge igualmente num contexto da necessidade de
repensar o papel da ciência. Rompendo com o neopositivismo, abordagens críticas para
analisar as relações sócioespaciais ganham força e formam uma importante, se não a
mais importante corrente da geografia humana brasileira (SANTOS 2002, CAMPOS
2001). Em outros países, tais como na Europa Central geografias nãocríticas
continuaram predominando, porém desde a entrada no século XXI alguns pesquisadores
conseguiram conquistar espaços nas universidades defendendo perspectivas que veem
na atividade científica um caminho para pensar e buscar fortalecer possíveis caminhos
de transformações amplas e radicais rumo a superação do capitalismo globalizado
(BELINA 2008).
E a geografia, tantas vezes a serviço da dominação, tem de ser urgentemente
reformulada para ser o que sempre quis ser: uma ciência do homem
(SANTOS 2002, p.261).
PESQUISA EM AÇÃO
La idea de la «coinvestigación», esto es, de una investigación social que rompe
con la división entre sujeto investigador y objeto investigado, en cambio, no
aparecerá hasta la década de 1950 (MALO 2004, p.17) ...
En la investigación militante el investigador se involucra al cien por ciento
con el método y el problema a trabajar. La investigación no puede ser
ejercida por un investigador no militante, pues es mediante la militancia
puesta en práctica que el investigador llega al núcleo del problema
(BORDA 2010).
A proposta de investigação militante baseiase na:
GEOGRAFIA EM MOVIMENTO
A geografia apresentase como uma ferramenta potente para conseguir realizar
reflexões aprofundadas e necessárias das lutas sociais da atualidade e das realidades nas
quais estas acontecem. Ao tomar a luta social e popular como ponto de partida
construímos uma geografia em movimento, encontrando nela um meio e catalisador
numa relação enriquecimento mútuo entre movimento social e ciência, no qual o
conhecimento circula e conecta diversos campos de atuação e reflexão e onde teoria e
prática são inseparáveis.
O debate acerca da relação entre ciência e classes populares ganha importância,
não somente, mas também devido a conquistas na luta dos setores populares pelo acesso
às universidades: uma relação na qual estudantes e pesquisadores vêm de classes
populares e seus movimentos sociais para as universidades e, numa estrada de via dupla,
estudantes e pesquisadores, vindo das universidades, se juntam a movimentos sociais.
Numa geografia em movimento, neste sentido, militantes de movimentos sociais
se tornam também pesquisadores, e pesquisadores se tornam militantes. O desafio
colocado é ver potenciais e limites nesta relação, e construir um caminho próprio de
uma relação de movimento social e geografia, que integra a segunda ao primeiro numa
perspectiva emancipatória, na qual lutamos para transformar, refletimos para
compreender e para potencializar a luta popular. Uma relação de movimento social e
geografia na qual a reflexão da luta pela transformação também é uma luta pela
transformação da reflexão.
Ao acrescentar este elemento de relação possível entre geografia e movimento
social não pretendo dizer que tem que ser assim, de que haja um caminho único e certo.
Defendo que haja pesquisadores e estudiosos cujo esforço primordial seja a reflexão e
elaboração de teoria, tal como defendo que haja militantes que não se deparem sempre
com a necessidade de teorizar profundamente. Mas vejo, neste campo, a possibilidade
de estabelecer um continuum, uma diversidade de relações possíveis entre pesquisa e
ação, e uma possibilidade neste campo contínuo é uma investigação que nasce como
necessidade do movimento social e é exercido e levado a frente pelo próprio
movimentos social, podendo envolver estruturas acadêmicas e mais estritamente
científicas ou não.
Nesse âmbito, a pesquisa em andamento, nesta altura, menos traz respostas bem
amarradas e sim aponta para questões que precisam ser aprofundadas e que nortearão
reflexões para além da conclusão do projeto, numa busca de contribuir para que a
geografia em movimento possa ser uma ponte entre universidade, classes populares e
suas lutas, para que possamos estar, como pesquisadores e militantes, juntos na luta:
Como militar enquanto geógrafo no movimento social e como pesquisar
enquanto militante na universidade?
Como podemos articular prática e teoria, luta popular e ciência social,
epistemologias, metodologias e conceitos para que integrem geografia e movimento
social?
Ao concordamos em enxergar na ciência social crítica uma ferramenta do povo,
da luta popular, quais as possibilidades de construir um campo de pesquisa e ação, uma
epistemologia nossa, libertadora, na qual não haveria por que distinguir intelectual e
militante enquanto sujeitos que se diferenciam, mas sim que se integram em um projeto
emancipatório?
Como construir um projeto no qual ideologia, teoria e prática têm seus devidos
lugares, nunca separados, mas também sem confundilos e no qual nós, sujeitos que
militamos e pesquisamos encontramos os nossos lugares numa relação contínua entre
teoria e prática?
Uma geografia em movimento tanto ganha em riqueza teóricaconceitual como
fortalece lutas sociais populares ao se conectar com elas na construção de um mundo
igualitário, um mundo no qual cabem muitos mundos.
TERRITÓRIO DE RESISTÊNCIA – CICLOS DE AÇÃO E REFLEXÃO
Durante o segundo ciclo da investigação, além da minha atuação contínua no
movimento social de base, grupos de diferentes favelas do Rio de Janeiro são
convidados de participarem de um processo de (auto)reflexão coletiva e construção do
livro: “Favelas em Luta. Reflexões dos territórios de resistência”. É um processo de
interação teoriaprática ao ponto que protagonistas de lutas de resistência se tornam
protagonistas da reflexão de suas próprias lutas. Com a forte de onda de protestos no
ano passado, muda a rotina dos grupo, e com isso a rotina da pesquisa. O processo do
livro, não somente um fim, e sim um meio, uma ferramenta de autoreflexão sofre uma
parada e é retomado no início do terceiro ciclo da pesquisa. Ao mesmo tempo, os
protestos fazem com que importantes bandeiras de luta das favelas ganham ampla
visibilidade no decorrer das lutas: a violência policial (“A polícia que reprime no asfalto
é a mesma que mata na favela”), o papel repressor das Unidades de Polícia Pacificadora
(UPP) (“Cadê o Amarildo”), entre outros. Moradores de diversas favelas encontramse
nas ruas. Alguns militantes de base de favelas e apoiadores de outros movimentos
sociais depois da onda de protestos formam o Fórum Popular de Apoio Mútuo, a
participação do qual trouxe elementos novos para as perspetivas tanto da luta, como
desta pesquisa.
No terceiro ciclo (2014) o foco esta em formas específicas de levantamento de
dados empíricos, durante o qual serão realizadas entrevistas com integrantes de
movimentos sociais de base e oficinas coletivas com grupos, buscando mapear nossas
resistências, acompanhar e avaliar os processos sócioterritoriais e as relações entre
resistências explícitas e implícitas, entre práxis populares e construção de poder
popular. As práticas de resistência dos grupos estão ou não em diálogo com as práticas
de resistência do cotidiano nas favelas? Como os integrantes dos grupos pensam e
colocam em prática suas lutas a partir de sua atuação e a partir das favelas onde atuam?
O ano 2015 será o ano para finalizar a tese baseada no acumulo dos três ciclos
de pesquisa e no estudo teórico e conceitual que acompanha todo o correr da pesquisa.
TERRITÓRIOS-(DE-RESISTÊNCIA-)REDE
Não para concluir e muito mais para abrir para o debate, apresento em seguida
uma tentativa de esquematizar relações de resistência em favelas do Rio de Janeiro
(p.10). Núcleos inseremse em contextos das favelas onde atuam, onde estabelecem
relações com “sociedades em movimento” que Zibechi (2009, p.6) caracteriza por “las
formas de resistencia de escasa visibilidad pero que anticipan el mundo nuevo que los
de abajo entretejen en la penumbra de su cotidianidad.” As relações entre núcleos são
marcadas por territorializações materiais e imateriais, simbólicas e concretas. Ao
mesmo tempo que existem relações entre os territórios das favelas, estas relações são
caracterizadas por descontinuidades, numa relação de territórios(deresistência)rede.
As conexões são construídas através de fluxos materiais e imateriais que atravessam
territórios onde formas de controle e poder transformam, reprimem, podem barrar ou
fortalecer esses fluxos. Barreiras materiais podem ser a distância, o alto custo de
transporte, engarrafamentos, restrições de ir e vir (milícia, UPP, tráfico, etc.). Uma
barreira imaterial seria, por exemplo, a nossa dependência da grande mídia para receber
notícias de outras. Um trabalho de resistência, tecendo uma rede de apoio e colaboração
entre grupos/núcleos (muitas vezes pequenos) que realizam trabalhos de base têm que
dar contas de compreender estas dinâmicas e encarar os desafios que vêm com as
mesmas. Isto acontece das mais diversas maneiras, as vezes como ações direcionadas,
muitas vezes também a nível inconsciente, no dia a dia.
Estamos realizando oficinas de autoreflexão com os núcleos de resistência e
ainda pretendemos realizar uma oficina de “mapeo colectivo” 1 nas quais discutimos
formas de construir resistências nas e através do território. Com quem temos relações e
como? Com quem colaborar e como fortalecer laços? São perguntas que estão sendo
abordadas no terceiro ciclo da investigação, de maneira multiescalar e o esquema
“Territórios(deresistência)rede” serve como uma contribuição ao debate e a
construção coletiva para encarar esta tarefa e demonstra como uma arcabouço e uma
discussão rica de relações territoriais na geografia pode ajudar tanto para compreender
como para fortalecer núcleosdebaseemrede em favelas cariocas.
1 Um proposta de oficina em: http://iconoclasistas.com.ar/pdfs_para_bajar/mapeo_colectivo.pdf
TERRITÓRIOS-(DE-RESISTÊNCIA)-REDE
Esquema de relações multiterritoriais e multiescalares
da atuação de núcleos de resistência em favelas no Rio de Janeiro
Mapa 1:
diversas favelas
BAIRROS NÃO
FAVELIZADOS
ÁREAS CENTRAIS
NÚCLEO EM
FORMAÇÃO
Conexões núcleo-núcleo,
núcleo-outros espaços FAVELA
ESPAÇOS/GRUPOS QUE
ATUAM NO TERRITÓRIO – NÚCLEO
Escolas, Igrejas, Associações de
Moradores, ONGs, etc.
DE APOIO
NÚCLEO
DE BASE
Timo Bartholl 06/2014
BIBLIOGRAFIA
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http://territorioautonomo.files. wordpress.com/2010/10/umageografiamarginalesua
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