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Precariedade habitacional e urbanização de

favelas: noções gerais


Karina Leitão
maio de 2017
Precariedade no mundo
foto M.L.ZUQUIM
foto M.L.ZUQUIM
E no Brasil?
CASA AMARELA RECIFE
O que há de comum ?
• Callampas de Quito e Santiago
• Vilas Miseria de Buenos Aires
• Cantegriles de Montevidéu
• Tugurios de Bogotá
• Barrios de Caracas
• Favelas no Brasil
– Países lusófonos - Bairro de Lata (Portugal),
Musseque (Angola), Caniço (Moçambique)
COVA DA MOURA EM LISBOA P
MUSSEQUE, FAVELA EM ANGOLA - LUANDA
FAVELA, CANIÇOS - MAPUTO
Generalização dos assentamentos
precários
SLUMS, cf. ONU, 2002.

Local onde há falta de pelo menos um dos seguintes


indicadores:

- Oferta de água potável

- Acesso à rede de esgotamento sanitário

- Área suficiente para moradia (não maior do que 3 hab/


- cômodo)

- Habitação durável

- Segurança na posse
Tipos de precariedade/
informalidade no Brasil

GENERALIDADE DO PROBLEMA
• Cortiços
• Conjuntos Habitacionais Irregulares
• Loteamentos Irregulares
• Favelas
(comunidades, baixadas, áreas de posse,
vilas, invasões, ocupações...)
Imóveis adaptados precariamente para
para uso como cortiços (luiz kohara)
Cortiços e edfs enconrtiçados - Edf. Julia Cristianini – foto Aline aup 274
Morro da Favela- Tarsila do Amaral - 1924
População em assentamentos
precários no mundo (ONU, 2010)
• 32,7% das pessoas que vivem no mundo urbano dos
países em desenvolvimento moram em SLUMS = 828
milhões de pessoas
• Na África a proporção é de 50%
• Na Ásia, 30%
• Na AL e Caribe , 23,5%

• NÚMEROS SUB-ESTIMADOS ! E MISTURAM MUITAS


TIPOLOGIAS!
Assentamentos precários no
mundo
. Mais de 200 mil favelas no mundo
Só o sul da Ásia tem 15 mil favelas - 20
milhões de habitantes
( Karachi, Mumbai, Delhi, Calcutá e Daca -
Bangladesh)

Favelas no Brasil não são as maiores do


mundo! São as mais antigas, a maioria
cresceu a partir de ´60, no Brasil,
remetem-se ao fim do sec XIX.
30 maiores favelas do mundo (unhabitat 2005)
POPULAÇÃO URBANA EM FAVELAS
(unhabitat 2005)

██ 0-10%
██ 10-20%
██ 20-30%
██ 30-40%
██ 40-50%
██ 50-60%
██ 60-70%
██ 70-80%
██ 80-90%
██ 90-100%
██ Sem informação
30 maiores favelas do mundo (DAVIS, 2006)
1 - Cidade do Mexico - Neza, Chalco, Izta 15- Luanda - Cazenga (0,8 milh hab)
(4 milhoes hab) 6 x pol, 30 x tam rocinha 16 - Mumbai - Dharavi (0,8 milh hab)
2- Caracas - Libertador (2,2 milhoes hab) 17- Nairobi - Kibera (0,8 milh hab)
3- Bogota - El Sur, Ciudad Bolivar (2 18- La Paz - El Alto (0,8 milh hab)
milhoes hab) 19- Cairo - City of the Dead (0,8 milh hab)
4- Lima - San Juan de Luringancho (1,5 20- Caracas - Sucre (0,6 milhoes hab)
milhao hab)
21 - Teera - Islamshahr (0,6 milhoes hab)
5- Lima - Cono Sur (1,5 mihoes hab)
22 - Cidade do Mexico - Tlapan (0,6 milh
6- Lagos - Ajegunle (1,5 mihoes hab) hab)
7- Bagda - Sadr City (1,5 mihoes hab) 23- Durban - Inanda INK (0,5 milhoes hab)
8- Gauteng - Soweto (1,5 mihoes hab) 24- Cairo - Manshiet Nasr (0,5 mil)
9- Palestina - Gaza (1,3 milhoes hab) 25- Ankara - Altindag (0,5 mil hab)
10- Karachi - Orangi Townsship (1,2 26- Nairobi - Mathare (0,5 milh hab)
milhoes hab)
27- Cali - Aguas Blancas (0,5 mil hab)
11 - Cape Town - Cape Flats (1,2 milhoes
hab) 28- Lagos - Agege (0,5 milhoes hab)
12- Dakar - Pikine (1,2 milhoes hab) 29- Port-au-Prince - Cite Soleil (0,5
milhoes hab)
13- Cairo - Imbaba (1 milhao hab)
30- Kinshasa - Masina (0,5 milh hab)
14- Cairo - Ezbet El-Haggana (1 milhao
hab)
NEZA – CHALCO – IZTA MÉXICO
Assentamentos précarios

• Sem arquitetos, engenheiros,


planejadores, investimentos públicos,
códigos de obras, leis urbanas .

• “Terra de ninguém”, sem lei

Onde a ausência do Estado é ocupada por


um poder alternativo
(cf. Maricato, 2012)
Traços comuns
Propriedade da terra x exploração da pobreza

• Elites proprietárias concentram terra rural


e urbana no 3º mundo – não raro
explorando pobreza (Davis, 2006)
– Concentração de terra fantástica no Brasil, e
sobretudo na África e Ásia.
- 56% da terra do SE asiático pertence a 5% dos grandes proprietários
de terra – 50% da terra em Manila pertence a meia dúzia de famílias.

- Na Índia, ¾ do espaço urbano pertence a 6% das famílias residentes


urbanas – 91 pessoas controlam terrenos vagos em Mumbai.
Traços comuns
O nó da terra

.A especulação e a valorização
imobiliárias engendram a escassez da
moradia, o enriquecimento de poucos,
com ajuda do Estado.
. O patrimonialismo no mundo
subdesenvolvido conforma sociedades
que não conheceram o pleno acesso à
moradia, assim como à previdência social
e ao trabalho.
Obs: Há também informalidade no centro do capitalismo (Nápoles,
Madrid, EUA).
NAPOLES
SLUMS – PROBLEMA ESTRUTURAL NO
CAPITALISMO

- Concentração de riqueza nas mãos de


poucos

- Falta de condições de vida no campo

- Concentração de terras

.... Generalizam as slums...

E O MAIS GRAVE – AS CONDIÇÕES


INSALUBRES DE VIDA
Traços comuns
Crise ambiental e sanitária
. Condições favoráveis a incêndios, alagamentos e
desmoronamentos
. Apropriação de reservas ambientais vulneráveis
. Vivendo sobre o esgoto
Ex: Índia – mulheres só usam latrina quando
escurece
(DAVIS, 2006)
Indonesia
India
Gana
ALTAMIRA PARÁ
Foto Gabriel Nilson
ALTAMIRA PARÁ
Foto Gabriel Nilson
Traços comuns
Favelas são oriundas de:

. Superurbanizações com pobreza


. Expulsões/migrações por guerras, catástrofes
. Processos de segregação, racismo etc.
. Recessões econômicas (como na AL)
. Altíssimo crescimento urbano/econômico sem
desenvolvimento social(ex:Índia e China)
. Tragédias como desmoronamento, enchentes, incêndios,
terremotos

URBANIZAÇÃO ALIADA A SALÁRIOS QUE NÃO


INCLUEM O VALOR DA MORADIA E MERCADOS
HABITACIONAIS QUE NÃO ATINGEM A BAIXA RENDA
Um pouco de ciência e os saberes sobre a favela...
No capitalismo a apropriação da riqueza se dá
de forma diferenciada no espaço, pelo espaço

CHAVE PARA ENTENDER AS CONDIÇÕES DE


MORADIA DA CLASSE TRABALHADORA
SERVIÇO
ARQUITETURA SOCIOLOGIA
SOCIAL E URBANISMO

ANTROPOLOGIA GEOGRAFIA ENGENHARIAS

DIREITO HISTÓRIA SAÚDE PÚBLICA

( OUTRAS ...)

Campos de conhecimento que se misturaram...


“Toda grande cidade possui uma ou várias favelas (slums) onde a classe trabalhadora se
concentra. É verdade que a pobreza muitas vezes habita em becos escondidos perto dos
casarões dos ricos, mas, em geral, lhe é destinado um território separado, no qual, longe dos
olhares das classes mais favorecidas, tem de se virar sozinha da melhor maneira que puder.
Estas favelas estão dispostas mais ou menos da mesma maneira em todas as grandes cidades
do país– as piores casas nos piores bairros da cidade; geralmente barracos de um ou dois
andares em longas filas (...). Essas casas de três ou quatro cômodos e uma cozinha
constituem as habitações típicas da classe trabalhadora.
As ruas são geralmente não pavimentadas, acidentadas, sujas, cheias de dejetos vegetais e
animais, sem esgoto ou drenagem pluvial, mas, em contrapartida, repletas de charcos fétidos
e estagnados. Além disso, a ventilação é impedida pelo péssimo e confuso método de
construção em todo o bairro, e dado que aqui vivem muitas pessoas amontoadas num espaço
pequeno, é fácil imaginar o ar que se respira nesses bairros (...)”
Os sentidos da urbanização
- A urbanização, o fenômeno complexo de tornar urbano, é estudado pela
economia, geografia, antropologia, sociologia e o urbanismo, sob
diversos prismas...

- Trataremos aqui da URBANIZAÇÃO de assentamentos precários, nos


termos que os profissionais das favelas utilizam (correlato a SLUM
UPGRADING)

- URBANIZAÇÃO – REURBANIZAÇÃO – REFORMA (J. PETRAROLLI, 2015)


A questão da habitação x a urbanização com
baixos salários
Explicações importantes em:
- OLIVEIRA, 1977
- KOWARICK, 1979
- MARICATO, 1982
- VILLAÇA, 1986, etc.

*O problema da habitação não está na habitação! Salário não garante!

*Habitação – mercadoria especial no capitalismo, vide sua vinculação


com a terra, seu preço, seu longo período de construção e circulação!
Os sentidos da articulação entre os diversos
campos
- Não faz sentido entender as favelas como espaços marginais

- As favelas são uma fatia importante do mercado habitacional popular

- Em geral os moradores são contrários à remoção e favoráveis à


extensão dos serviços urbanos aos seus espaços de moradia

- Só pelo trabalho de campo é possível conhecer as favelas, seus


moradores, seu funcionamento (Licia Valladares, 2005)
Os pioneiros da articulação entre os diversos
campos
* PE LEBRET, SAGMACS E A INFLUENCIA DA ESCOLA DE CHICAGO
-observação participante , orientada para ação social, multidisciplinar

* OS VOLUNTÁRIOS DO PEACE CORPS - E sua transformação em antropólogos


urbanos pelo antropólogo Anthony Leeds

* A SOCIOLOGIA DA FAVELA - O MUSEU NAICIONAL DE ANTROPOLOGIA e


academia brasileira reforçam esse campo
(IUPERJ, UFMG, UNICAMP, UFPE, UFBA, UFRGS ... CEBRAP, USP...)
(Licia Valladares, 2005)
Um pouco de história sobre o fazer ...
As diferentes razões para o trabalho na favela
Trabalho na favela:

- por caridade, filantropia, benemerência

- por projetos a serem reconhecidos e louvados (best practices)

- por reconhecimento de direitos

- por reconhecimento de uma inteligência na forma de organização


socioespacial
DO PROBLEMA À SOLUÇÃO
- A EXPERIÊNCIA DE BRÁS DE PINA – PIONEIRA NA URBANIZAÇÃO

- OS ENSAIOS METODOLÓGICOS PARA UMA URBANIZAÇÃO


PARTICIPATIVA

- UM MARCO POIS SE CONTRAPÕE A TENDÊNCIAS AUTORITÁRIAS DE


ERRADICAÇÃO DE FAVELAS
A solução passa pelo planejamento, pelo projeto...
. solução não é pontual!!!
. não é incremental!
. não é pintar a favela, dar um ‘tapa’ no bairro
. não é o teleférico em cima do assentamento sem esgoto
. não é ‘best practice’ (como quer o establishment)
. não é o projeto espetáculo, da fachada cara para poucos!
O que fazer?
• Dar visibilidade aos "invisíveis" , mostrando a
cidade real com os seus NÚMEROS REAIS de
pessoas excluídas e assentamentos ilegais.
• Desmontar a representação ideológica da cidade
nas academias, governo, mídia e colocar a
cidade real em lugar de destaque
• Elucidar conflitos sociais e ampliar os espaços de
participação e controle social sobre o Estado
• Procurar uma abordagem integrada do urbanismo
ao meio ambiente.
(Maricato, 2006).
A informalidade/precariedade no Brasil

. 88,6% favelas do país nas 11 metrópoles


brasileiras (IBGE, 2010)

. Cidades médias estão crescendo e se


favelizando (fluxos devido a atividades na mineração, madeireira e
agronegócio)

. Mas também há precariedade no meio rural e


nas cidades pequenas (4458 municípios no país tinham
menos de 100 mil hab – IBGE, 2000)
Quantas pessoas vivem em
favelas no Brasil?
Em:
• São Paulo?
• Rio de Janeiro?
• Belém?
• Salvador, São Luís, Recife?
Em:
• Rm São Paulo? Mais de 11%
• Rm Rio de Janeiro? Mais de 14%
• Rm Belém? Mais de 53%
• Salvador, São Luís, Recife? Prox a 25%

NO BRASIL, MAIS DE 11,4 MILHÕES. NOS


ÚLTIMOS 20 ANOS O NÚMERO
PRATICAMENTE DOBROU (IBGE, 2010)
A precariedade e irregularidade no Brasil
Em 2010:

11,4 milhões de pessoas vivem em assentamentos subnormais no


Brasil

6 milhões estão nas metrópoles

(cf IBGE, 2010)

DADOS SUB-ESTIMADOS! TIPOLOGIAS POUCO EXPLORADAS!


A ‘cara’ da precariedade urbana na região NORTE:
-predominância de áreas alagadiças
- dificuldade de mensuração
Belém - Jurunas
Fonte: XIMENES ET AL (in IPEA) 2016
Manaus – Ig Mestre Chic
A ‘cara’ da precariedade urbana na região NORDESTE:
-em áreas ambientais, centrais e de expansão
- dificuldade de mensuração
Recife – Brasília Teimosa
Recife – Comunidade do Pilar
- Recife não tem cadastro dos
assentamentos precários

- Mapa do observatório das metrópoles


Salvador – Cosme de Faria
Salvador - Alagados
A ‘cara’ da precariedade urbana na região CENTRO-OESTE:
-Satélites de cidades planejadas
-Favelas recentes, padrão horizontal
- dificuldade de mensuração
Brasília - Ceilândia
Cuiabá - Pedregal
A ‘cara’ da precariedade urbana na região SUL:
-Também há favelas, ainda que áreas das cidades sejam
livres de assentamentos precários
-Precariedade se intensifica
Assentamento Colombo
CURITIBA
FONTE: IPARDES
Curitiba
Porto Alegre – Bom Jesus
A ‘cara’ da precariedade urbana na região SUDESTE:
-Favelas mais antigas
-Representação hegemônica da favela brasileira
-Mensuração já conhecida
SP
RJ

ES
BH
Risco de
escorregamento
concentrado no
SE e SUL

Fonte IPEA 2016


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