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R esumo : O presente ensaio, aqui publicado em tradução original para Português, cons
titui uma secção m uito significativa da conhecida obra de Giovanni B. Sala sobre
Lonergan e a sua relação com Kant. Trata-se de um estudo comparativo das teo
rias do conhecimento de Im manuel Kant e de Bernard Lonergan, tomando-se como
ponto de partida uma análise do estatuto do a priori no conhecimento hum ano tal
como no-lo apresenta a Crítica da Razão Pura, de Kant, para depois se apresentarem
as respectivas lacunas, insuficiências e contradições mediante o recurso a Insight,
a obra mestra de Bernard Lonergan. Para o filósofo jesuíta, com efeito, o interesse
primordial consiste em realçar a possibilidade do conhecimento do ser, possibilidade
essa fundamentada na natureza do juízo e na natureza do questionamento humano.
Para além disso, mostra-se também como em ordem a ultrapassar a impossibilidade
do conhecimento numénico, a reflexão lonerganiana sublinha o conhecimento como
estrutura empírica, inteligente, racional e responsável, capaz de captar a realidade,
uma vez que esta é, segundo Lonergan, intrinsecamente inteligível.
A priori; Categorias; Conceito; Conhecimento; Dinamismo da
P a l a v r a s -C h a v e :
consciência; Entendimento; Espaço e Tempo; Estrutura do conhecimento; Expe
riência; Fenómeno; Incondicionado; Inteligibilidade; Introspecção; Intuição;
Juízo; Kant, Immanuel (1724-1804); Lonergan, Bernard (1904-1984); Método
transcendental; Númeno; Objecto; Postulado; Pré-compreensão; Processo
cognitivo; Questão; Razão; Realidade; Sensibilidade; Ser; Sujeito; Viragem para
o sujeito.
A bstrac t: The present text is a translation into Portuguese o f a section o f a work by
Giovanni Sala on Lonergan and his relation with Kant. It am ounts to a compara
tive study o f the gnoseologies o f Kand and Lonergan, whereby the starting point is
an analysis o f the statute o f the a priori in hum an knowledge such as we find it in
the Critique of Pure Reason o f Kant, so that in the process the author also shows
the corresponding insufficiencies and contradictions by means o f a reading o f the
work Insight by Bernard Lonergan. For the Jesuit philosopher, the main interest o f his
gnoseology consists in an affirmation o f the possibility o f knowing being, possibility
that is grounded in the nature o f judgment itself and in the nature o f hum an interro-
* Hochschule für Philosophie München (Munique. Alemanha). - Tradução de Luís Loia. a partir
da seguinte edição: S ala. Giovanni B. - lonergan and Kant: Five Essays on Human Knowledge.
Translated by Joseph Sporel: edited by Robert M. Doran. Toronto; Buffalo; London: University
of Toronto Press, 1994.
gation. Moreover, the article also shows how in order to overcome the impossibility o f
noumenal knowledge, the lonerganian reflexion underlines knowledge as an empirical
structure, intelligent, rational and responsible, able to capture reality. In the end, this
is possible due to the fact that, for Lonergan, the real is intrinsically intelligible.
Ke y Words: A priori; Being; Intelligibility; Categories; Cognitive process; Concept;
D ynam ism o f consciousness; Experience; Introspection; In tu itio n ; Judgm ent;
Kant, Im m a n u el (1724-1804); Knowledge; Lonergan, Bernard (1904-1984);
N oum enon; Object; Phenomenon; Postulate; Pre-comprehension; Question;
Reality; Reason; Sensibility; Space a n d time; Structure o f knowledge; Subject;
Transcendental m ethod; Turn to the subject; U nconditional; Understanding.
1 Norman K. S mith - A Commentary to Kant's Critique of Pure Reason. New York: The
Humanities Press, 1950, p. 561.
2 Bernard J. F. Lonergan - Insight: A Study o f Human Understanding (primeira edição,
London: Longmans, Green & Company, 1957); uma segunda edição revista foi publicada em
1958; agora disponível como volume 3 em "Collected Works of Bernard Lonergan", ed. Frederick
E. Crowe e Robert M. Doran, Toronto: University of Toronto Press, 1992. As referências a este
volume, no presente artigo, também serão dadas no texto, com acrescentada ênfase em alguns
casos, ao contrário das notas de rodapé. Os números de página serão: primeiro, os da segunda
edição de 1958 e depois os da edição de "Collected Works” (por ex., 332/356).
Talvez a relação entre Kant e Lonergan neste estudo deva ser clarificada. Directamente,
este ensaio é um estudo de Kant: é, no entanto, um estudo crítico, uma critica da crítica. Mas uma
crítica procede de horizontes, pressuposições, premissas e posições que são as da própria crítica.
Mais, a própria crítica da razão pura de Kant procede da sua posição acerca da relação do
entendimento com o empírico e das pressuposições que estão por traz dessa posição. De modo
semelhante, a nossa crítica de Kant procede de pressuposições sustentadas pelo autor e essas
pressuposições são derivadas da teoria cognitiva da obra Insight de Lonergan. Contudo, julga
mos ser legítimo omitir aqui uma apresentação detalhada de Lonergan; certamente que não nos
enganamos ao pensar que as ideias básicas de Insight são já familiares aos nossos leitores.
Pode, contudo, existir alguma dúvida acerca de algumas ideias particulares, quer tenham
sido ou não suprimidas por Lonergan em obras posteriores, mas tal teria que ser provado caso a
caso. De facto, Lonergan dá as suas próprias considerações mais recentes sobre Insight no artigo
"Insight Revisited,” in: A Second Collection, ed. William J. Ryan e Bernard J. Tyrrell. London:
Darton, Longman & Todd, 1974, pp. 263-278. e, embora indique algumas ideias que se subme
teram a revisão no seu pensamento nos últimos vinte anos, não existe o mínimo apontamento
que demonstre que a sua teoria cognitiva básica e a sua epistemologia, que estão pressupostas
no presente ensaio, tenham sido abandonadas. Pelo contrário, repete e sublinha o seu propósito
básico e a estratégia presente em Insight. O mesmo pode ser inferido das suas referências contí
nuas a esse trabalho nos seus escritos mais recentes, onde é claro que o considera como expres
são da sua posição filosófica fundamental. Veja-se, por exemplo, o index de Method in Theology.
London: Darton, Longman & Todd, 1972 (reimpresso pela University of Toronto Press, 1990),
sobre Insight.
funções, que obriga as testem unhas a responder aos quesitos que lhes form ula. Assim,
a p rópria física tem de agradecer a revolução, tão proveitosa, do seu m odo de pensar,
unicam ente à ideia de p ro cu rar na natureza (e n ão im aginar), de acordo com o que a
razão nela colocou, o que nela deverá ap ren d er e que p o r si só não alcançaria saber;
só assim a física enveredou pelo trilho certo d a ciência, após tantos séculos em que foi
apenas tacteio. (B xm-xiv).
Sublinhemos a frase ‘o que nós mesmos nelas pomos', assim como a ques
tão do método experimental e concentremo-nos no juiz3. Por hipótese, o juiz
nada sabe sobre um determinado caso mas mesmo assim o seu julgamento
é-lhe confiado. Porquê? Porque ele possui a ciência jurídica e por isso coloca
questões precisas à testemunha. As testem unhas são homens de senso comum
e por isso conhecem os factos a partir dos slogans sobre a violência, a tra
gédia, a crueldade e assim por diante. Mas o conhecimento a partir desses
slogans não interessa ao juiz. Para ele, o que a testem unha diz - tirando a
questão da veracidade - não é ainda a realidade que ele procura conhecer;
os seus testemunhos são apenas data para os seus propósitos que, através da
sua inquirição devem sofrer um a dupla promoção. Primeiro, os dados que
são compreendidos devem ser promovidos ao nível do entendimento; depois,
o juiz deve exercer a sua ciência jurídica através de um a reflexão crítica que
pese todos os factores pertinentes para um juízo legal; deste modo, os dados
são promovidos ao nível da evidência suficiente e o juiz atinge o conheci
m ento do facto juridicam ente determinado - foi apenas esta realidade jurí
dica que desejou verificar.
Neste caso, é fácil ver qual é o a priori do juiz: a ciência jurídica. Não parece
correcto afirmar, de acordo com qualquer significado aceitável da expressão,
que existe algo que o próprio juiz 'colocou' na realidade juridicamente deter
minada. Por outro lado, devemos afirm ar que ele elaborou por si próprio
um elemento e o colocou entre os dados recebidos. Qual é esse elemento?
São as questões que levantou a partir do seu conhecimento. Perguntando,
procurando, rejeitando, o juiz alcançou o conhecimento da realidade.
Deixem-nos ir, agora, para além deste a priori específico. A ciência jurí
dica no juiz, o tipo de conhecimento da testem unha dito de senso comum,
as várias mentalidades que formam a pré-compreensão (Vorverstàndnis) pela
qual um homem é um engenheiro, outro um sociólogo, um terceiro um poeta;
todas são especificações de um a única pré-compreensão básica, igual para
todos e pela qual todos, quer conheçam este ou aquele âmbito, conhecem
sempre o ser ou a realidade.
Mais, afirm ar que existe um a priori na raiz do conhecimento é afirm ar
que a aprendizagem não parte do nada. Mas, enquanto que no caso do juiz o
3 Aqui expandimos a análise de Lonergan encontrada nas notas policopiadas do seu curso
na Universidade Gregoriana, “De methodo theologiae“ (Rome, 1962) p. 49.
4 Martin H eidegger - Kant und das Problem der Metaphysik. Frankfurt am Main: Klostcr-
mann, 1965, p. 29.
o objecto é-nos dado, através do Denken é pensado; ver, por exemplo: A 15/
B 29, A 50/B 74, B 146, etc. Com base nestes excertos podemos estabelecer
a seguinte conclusão: existem muitas actividades que contribuem para a
constituição do nosso conhecimento; mas se perguntarm os o que constitui
o conhecimento como conhecimento de um objecto, ou ainda como conheci
mento em si5, temos que responder: é a intuição. Sejam quantas forem as rela
ções mediadas que outras aptidões possam ser capazes de estabelecer com o
objecto, se quisermos evitar o absurdo de um a séria de mediações, sem que
nenhum a alcance a realidade a ser mediada, temos que afirm ar que existe um
tipo de actividade cognitiva cuja própria natureza consiste em fazer a ponte
entre o conhecedor e o conhecido. Esta é a intuição. Assim, o conhecimento
é essencialmente intuição e, por isso, a intuição deve encontrar-se em todo o
conhecimento.
Seria difícil exagerar a im portância do princípio da intuição na episte-
mologia de Kant. Está presente em todo o lado e comanda as soluções para
os vários problemas que vão surgindo na k r v . Isto não é dizer que constitui
toda a epistemologia de Kant. A análise transcendental, que é o objectivo
da k r v , implica uma mudança de consideração dos actos cognitivos e, mais
genericamente, da consideração do sujeito. Agora, tal análise conduz a uma
doutrina que está em desacordo com o princípio intuitivo: queremos dizer a
doutrina do conhecimento como estrutura. Esta doutrina aparece na k r v de
um modo bastante complexo. Diferentes enumerações de actos e faculdades
encontram-se em diferentes secções, muitas vezes até na mesma secção, mas
não encontramos quaisquer meios de as reduzir a um a unidade ou esquema
tizar claramente todo o percurso do processo cognitivo. Kant contenta-se em
estudar de acordo com as circunstâncias deste ou daquele aspecto do conhe
cimento, sob a pressão dos problemas que lhe vêem à mão, sem se vir a preo
cupar de como é que as várias faculdades e actos se com binam para constituir
um único processo
Existe um a tensão entre o princípio intuitivo e o princípio de estrutura, na
medida em que o primeiro tende per se a excluir o segundo. O objecto é dado
na intuição; por isso Kant tende a reduzir o conhecimento a este único acto.
Daí a obscuridade em que toda a Analítica Transcendental está envolvida: de
que uso são as fases do pensam ento e do juízo que recaem sobre a intuição?
Sejam quais forem as funções que lhe atribuam os, não podemos dizer que são
Se por ser querem os dizer o objectivo do p uro desejo do conhecim ento, o objectivo da
inquirição inteligente e da reflexão crítica, o objecto da com preensão inteligente e da
afirm ação razoável, então tem os que afirm ar a intrínseca inteligibilidade do ser. Dado
que definim os o ser pela sua inteligibilidade... negam os que o ser seja algo à parte, para
além ou diferente do inteligível. (Insight, p. 499/523)
5. O a priori da sensibilidade
6 Kants gesammelte Schriften. Berlin: Preussische Akademie der Wissenschaften, 1910-, vol. 8,
p. 222. [Doravante referiremos esta edição das Obras de Kant mediante a sigla GS.]
6. O a priori do Verstand
que faz com que o inteligente seja inteligível, é a priori. O conceito, qualquer
conceito, é o produto desta inteligência em funcionamento, nunca a norma
última do seu funcionamento.
Descobrir esta inteligibilidade operativa é descobrir o verdadeiro a priori
do Verstand, que trabalha dentro de uma estrutura muito precisa mas sempre
superior aos seus produtos. "A mente não é apenas uma fábrica com um con
junto fixo de processos; pelo contrário, é uma maquinaria universal que faz
funcionar todos os tipos de fábricas, ajustando-as e melhorando-as e, even
tualmente, fragmentando-as em favor de formas radicalmente novas. Por outras
palavras, não existe qualquer conjunto fixo de sínteses a priori" (Insight,
p. 406/430-31). Não há qualquer dúvida que Kant tende a conceber as cate
gorias como um sistema de processos fixos e é por essa razão que Lonergan
critica o seu a priori como sendo muito rígido (Insight, p. 423/448).
Esta insuficiência manifesta-se ainda mais se considerarmos a segunda
concepção das categorias que está estritamente relacionada com a rigidez
que mencionámos. Queremos dizer, a concepção do conteúdo-objectivo ou do
objecto-constitutivo. Mesmo antes da tábua de categorias encontramos isto:
O mesmo entendimento, pois, e isto através dos mesmos actos pelos quais realizou
nos conceitos, mediante a unidade analítica, a forma lógica de um juízo, introduz
também, mediante a unidade sintética do diverso na intuição geral, um conteúdo trans
cendental nas representações do diverso; por esse motivo se dá a estas representações
o nome de conceitos puros do entendimento, que se referem a priori aos objectos [...]
(A 79/B 105)
Não insistimos na afirmação de um conteúdo que fosse peculiar às catego
rias l0, uma afirmação que está em oposição com outros textos que afirmam
que as categorias não têm conteúdo (A 349, A 77/B 102). A diferença entre as
duas séries de textos parece, no mínimo, verbal e pode ser meramente verbal.
Muito mais probatório da segunda concepção de categorias é a forma como
Kant edifica a sua inquirição pelo a priori. Na Introdução B, Kant refere-se à
teoria tradicional da composição do conhecimento como a base da sua inqui
rição sobre o a priori:
Se, porém, todo o conhecimento se inicia com a experiência, isso não prova que todo ele
derive da experiência. Pois bem poderia o nosso próprio conhecimento por experiência
ser um composto do que recebemos através das impressões sensíveis e daquilo que a
nossa própria capacidade de conhecer (apenas posta em acção por impressões sensí
veis) produz por si mesma, acréscimo esse que não distinguimos dessa matéria-prima,
enquanto a nossa atenção não despertar por um longo exercício que nos tome aptos a
separá-los." (B 1-2).
O que quer que o a priori possa provar ser no decurso da inquirição de
Kant, será, em qualquer caso, um acrescento feito pela faculdade cognitiva
à material bruta das impressões sensíveis. O contexto não nos permite inter
pretar este acrescento de qualquer outro modo que não seja um conteúdo
objectivo acrescentado a esse outro conteúdo objectivo que é a matéria bruta
que vem dos sentidos.
O a priori é, então, um conteúdo objectivo paralelo ao conteúdo objectivo
a posteriori. Certamente que o a priori é o elemento formal no que é conhe
cido mas isso não o tom a menos objecto. No estudo da Estética vimos que
o a priori sensível é a diversidade da intuição que pode ser por si mesma o
objecto do conhecimento “em que nada se encontra que pertença à sensação."
(A 20/B 34). A mesma concepção do conteúdo-objectivo aplica-se tam bém ao
entendimento a priori’, de facto, é referida, no texto, muitas mais vezes do
que a concepção operativa. Nesta base, Kant fala de um a priori do conheci
mento de objectos. Tal afirmação é aceitável se for sustentada pela noção de
um a priori que é em si mesmo um objecto, visto que só é aceitável se compor
tar algum número de qualificações e se se basear na assunção de um a priori
heurístico. Mais ainda, toda a problemática da aplicação dos conceitos puros
do entendimento a uma intuição correspondente só faz sentido apenas porque
o conceito puro do entendimento é precisamente um conteúdo para ser apli
cado. Do mesmo modo, a descrição do a priori como algo disponível na mente
(<Gemiit), ou no Verstand, indica obviamente que é um objecto. Finalmente,
a afirmação de que o a posteriori da intuição empírica é a única ocasião ou
oportunidade para a mente retirar de si mesma os elementos formais a priori
que já possui apontam na mesma direcção, porque no que diz respeito a um a
priori heurístico, o dado é muito mais do que um a mera ocasião.
É verdade que, desde o começo, Kant afirma que “Pensamentos sem con
teúdo são vazios; [...]" (A 51/B 75), o que quer dizer que o conteúdo é dado
pela intuição (Anschauung). Afirmações semelhantes ocorrem ao longo da
KRV. Mas devemos notar nestes textos a prevalência do princípio intuitivo que
perm anece num a relação de tensão com a concepção das categorias como
conteúdos que são para ser acrescentados aos conteúdos a posteriori da sensi
bilidade, mas também e em geral, com a concepção do conhecimento como
estrutura, da qual a doutrina das categorias faz parte. O princípio intuitivo
tomado em todo o seu rigor exclui não apenas a concepção das categorias
como conteúdos a priori, mas também a sua concepção como um a activi-
dade sintética do Verstand em busca de um conteúdo objectivo inteligível.
De facto, de acordo com o princípio intuitivo, um conteúdo de conhecimento
só é possível quando existe um a actividade sem elhante à intuição. Mas a pró
pria exclusão de um conteúdo objectivo, conhecido pela actividade do enten
dim ento exercida sobre os dados sensíveis leva Kant a m anter um conteúdo
a priori: precisamente, os conceitos puros.
Extremamente im portante para determ inar a noção das categorias é a
ampla secção da Analítica conhecida como dedução transcendental dos con-
7. O a priori da Vernunft
Para fazer um paralelo entre o que afirmamos sobre o universo como pro
porcionado ao nosso conhecimento, nomeadamente, de que não é um único
terreno fechado sobre si de relações internas mas um universo de factos,
temos que clarificar a natureza da actividade discursiva das nossas m en tes,2.
Anterior à razoabilidade encontrada nos silogismos que lidam com a lógica
formal, existe um a actividade, genericamente denominada raciocínio, que é
um movimento em direcção à compreensão. Nele devemos distinguir dois
níveis: o movimento para a compreensão directa e o movimento para a com
preensão reflexiva. O prim eiro é um movimento para aquela síntese inteligível
que é expressa no conceito, o segundo para o conteúdo que denominamos
como o virtualmente incondicionado. Assim que o conteúdo tanto da expe
riência sensível e o da compreensão directa entram na constituição do conhe
cimento humano, também com a mesma veracidade formam os conteúdos
da compreensão reflexiva um a parte constitutiva do mesmo conhecimento.
Sobre isto é fundado o acto do juízo.
12 Cf. Bernard Lonergan - Verbum: Word and idea in Aquinas. Edited by David B. Burrell.
Notre Dame: University of Notre Dame Press, 1967, pp. 54-55.
13 1. Kant - Vorlesungen über die Metaphysik. Erfurt: Keyser, 1821, Photomechanischer Nach
druck, Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1964, p. 40. (GS 28, p. 554).
14 Nestes textos a 'coisa em si’ significa a coisa fora do conceito. Quer pertença à realidade
como aparência, quer à realidade absoluta, é um problema futuro que Kant não coloca nesta fase.
,5 1. Kant - Reflexão 6276 (GS 18. p. 543): “Durch das Prädikat dies Daseins tue ich nichts
zum Dinge hinzu, sondern das Ding selbst zum Begriffe.”
9. Expansão do a priori:
Do conhecimento da natureza à constituição do mundo humano