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m ó d u l o

Ana Maria Serra - Ins titut o de Terapia Cognitiva São Paulo-SP

Objetivo: aprimorar os conhecimentos de estudantes


e profissionais da Psicologia sobre a Terapia Cognitiva.
Elaboração: Ana Maria Serra, PhD.
ITC – Instituto de Terapia Cognitiva, São Paulo-SP

resistência
pacientes difíceis
aliança terapêutica
questões relacionadas a treinamento
Coordenação: Claudia Stella, Psicóloga Clínica,
Doutora em Educação, Docente em Psicologia e
Editora da revista Psicologia Brasil.
Módulos: oito módulos que serão publicados em
revistas seqüenciais.

Conteúdo dos módulos:

1 Introdução à Terapia Cognitiva

2 Conceitos e preconceitos sobre Terapia Cognitiva

3 Terapia Cognitiva e Intervenção em Crise


Terapia Cognitiva e Depressão
Terapia Cognitiva e Suicídio

4 Terapia Cognitiva e Transtornos de Ansiedade


Tópicos especiais em Terapia Cognitiva aplicada aos
Transtornos de Ansiedade, TOC (Transtorno Obssessivo-
Compulsivo), Fobias, Transtorno de Pânico, TEPT (Transtorno
de Estresse Pós-Traumático), Ansiedade Associada à Saúde

5 Terapia Cognitiva e Dependência Química


Terapia Cognitiva e Transtornos Alimentares
Terapia Cognitiva nas Organizações

6 Terapia Cognitiva com Casais e Famílias


Terapia Cognitiva com Crianças e Adolescentes
Terapia Cognitiva e Prevenção de Depressão em
Crianças e Adolescentes

7 Terapia Cognitiva e Transtornos de Personalidade


Terapia Cognitiva e Esquizofrenia
Terapia Cognitiva e Transtorno Bipolar

8 8 Resistência em Terapia Cognitiva


Terapia Cognitiva com pacientes difíceis
A aliança terapêutica em Terapia Cognitiva
Questões relacionadas a treinamento em Terapia Cognitva
SUPERANDO A RESISTÊNCIA – como, por exemplo, “você somente poderá
EM TERAPIA COGNITIVA me validar concordando comigo em que não há
esperança para meu caso”. Conflitos potenciais
Robert L. Leahy, Ph.D.
entre o terapeuta e o paciente podem surgir
American Institute for Cognitive Therapy, NYC, EUA
quando o terapeuta orienta suas ações em
President, IACP-International Association for direção à execução de tarefas e vê a validação
Cognitive Psychotherapy como interferência com importantes metas
terapêuticas. O terapeuta pode abordar essas
preocupações, reconhecendo a necessidade
Os terapeutas cognitivos são freqüentemente
de validar a angústia e encorajar a mudança –
criticados por não lidar adequadamente com a
e que o paciente pode estar usando estratégias
relação transferencial – e com a resistência do
derrotistas a fim de ensejar a validação.
paciente à mudança. Comecei a reconhecer que
Se você não validar a resistência de validação,
muitos pacientes não respondiam às “técnicas” da
a terapia fracassará.
TC que eu estava usando – e, na verdade, alguns
desses pacientes respondiam com raiva. 2 Resistência de vitimização
Neste caso, o paciente acredita que sua identidade
Então, comecei a pensar: “talvez eu devesse ouvir
é definida apenas se ele se fizer de vítima – e
os críticos da TC e reconhecer que realmente há
que não há nada que ele possa fazer para mudar,
alguma coisa relativa à resistência ocorrendo”.
porque não causou seus problemas. A pessoa que
Comecei a escrever um livro, Superando
“encalha” neste papel terá regras específicas a
Resistência em Terapia Cognitiva; e, ironicamente,
respeito de como a mudança poderá ser alcançada
vi-me procrastinando a produção do livro! Eu estava
– “é assim que eu poderei melhorar”. Tentativas
resistindo a escrever um livro sobre resistência!
para encorajar o paciente a seguir adiante, em
De qualquer forma, o livro foi publicado em 2001 e, direção à mudança individual, somente o levarão
desde então, venho escrevendo sobre resistência, a ver o terapeuta como mais um vitimizador
transferência, contra-transferência, esquemas maligno. Intervenções úteis incluem reconhecer
emocionais e questões de personalidade. a legitimidade das queixas do paciente de que ele
Finalmente, superei minha própria resistência! é uma vítima – mas de que ele também pode se
Não aderência, resistência ou falta de progresso fortalecer através do foco em metas pessoais e
em terapia podem ser compreendidos, até certo ativação de recursos disponíveis.
ponto, como resultado de estratégias que o 3 Resistência moral
paciente usa e papéis que ele desempenha a fim Nesta situação, o paciente acredita que a mudança
de reforçar seus esquemas pessoais e evitar incorreria no risco de violar seus próprios padrões
maiores perdas. A pressuposição neste caso é morais ou éticos. Isto é especialmente verdadeiro
de que o paciente está tentando proteger-se de no caso de pacientes obsessivo-compulsivos, os
maiores perdas e está buscando alguma reação quais acreditam que seu senso aumentado de
(por exemplo, validação, legitimidade, sanção responsabilidade e receio de cometer um erro
moral) de parte do terapeuta. Vejo a resistência é baseado em um código moral. Dessa forma, o
como envolvendo várias dimensões – há mais de terapeuta que encoraja o paciente a abandonar
uma razão para as pessoas resistirem. Vejamos padrões exigentes de perfeição pode ser visto
algumas das dimensões da resistência: como facilitador de qualidades irresponsáveis e
1 Resistência de validação repreensíveis no paciente. Enquanto reconhecendo
O paciente “encalha” em sua demanda de que que há “deveres” legítimos que orientam o
você focalize exclusivamente a validação de comportamento, o terapeuta pode ajudar o
sua angústia. Ele pode perceber sugestões paciente a reconhecer que seus “deveres”
para ação ou pensamento alternativo como absolutos e perfeccionistas violam um código moral
invalidações: “você não compreende o quanto universal, que visa a fortalecer a dignidade humana
eu me sinto mal”. A suposta falha em validá- e garantir a justiça. Dessa forma, o terapeuta não
lo levará a um aumento nas queixas e no necessita rejeitar a “resistência moral” – mas, ao
sofrimento, até que a validação seja alcançada. contrário, ele pode reafirmar um código moral mais
Além disso, pacientes podem ter “regras” racional e razoável e que reconheça as diferenças
únicas e auto-sabotadoras para a validação e necessidades humanas.
4 Resistência esquemática sugere?”. Indivíduos que usam estratégias que
Neste caso, os esquemas pessoais do paciente (por refletem aversão a riscos têm maior tendência
exemplo, incapaz, abandonado, especial) limitam à depressão, ansiedade, preocupação excessiva,
a mudança terapêutica, desde que ele tenha uma dependência e personalidades evitativa ou
tendência a ver o passado, o presente e o futuro borderline. Estes indivíduos utilizam estratégias de
como evidências de que seus esquemas pessoais busca de segurança, espera, interrupção repentina
são válidos. Neste caso, o terapeuta pode utilizar de uma ação, desistência antes de se verem em
técnicas para modificar esquemas persistentes, risco, e a desvalorização de mudanças positivas,
como examinar a origem dos esquemas, explorar a fim de evitar que suas expectativas “saiam fora
esquemas alternativos mais adaptativos e de controle”. O terapeuta e o paciente podem
experimentar agir de forma contrária ao esquema. ter conflitos quando as sugestões do terapeuta
5 Compromisso com o self relativas à ativação e mudança comportamentais
Todos queremos acreditar que há alguma forem vistas como apresentando riscos
previsibilidade na vida – uma das razões pelas quais inaceitáveis ao paciente, o qual acredita que já
os esquemas têm uma natureza “conservadora”. acumulou perdas suficientes. As intervenções
Uma forma particular de compromisso com o incluem avaliação de formas alternativas e mais
self, da perspectiva da resistência, refere-se à flexíveis de calcular, de forma razoável, riscos
insistência em justificar decisões passadas que e oportunidades para mudanças, e de evitar
fracassaram – um processo conhecido como a interrupção prematura de uma ação ou a
“custo irrecuperável”. Neste caso, o paciente desistência prematura.
argumenta que ele não pode abandonar uma 7 Auto-incapacitação
seqüência de maus acontecimentos porque Alguns pacientes vêm para a terapia com
investiu muito nele (em seu fracasso!). Como habilidades para serem bem-sucedidos, mas
o terapeuta não necessita justificar erros com uma história de comportamento limitado e
passados, pode lhe ser difícil compreender como de auto-sabotagem. Rotulados de masoquistas
é para o paciente abandonar um compromisso ou derrotistas, esses pacientes ou abertamente
anterior consigo mesmo, mas que demonstrou resistem a tentativas de mudança, ou fazem
significar unicamente um “custo irrecuperável”. esforços fracos que resultam em fracasso. Em
Intervenções para modificar um comprometimento alguns casos, essa estratégia pode refletir uma
com uma situação que já implicou em um alto tentativa de esquivar-se de ser avaliado em
custo, mas sem retorno, incluem considerar a seu melhor desempenho. É melhor fracassar
rejeição do comprometimento anterior como como resultado de um esforço limitado – desde
uma oportunidade para novos ganhos, afastar-se que sempre se pode argumentar que “não me
desse comprometimento através da exploração de importava tanto” ou “eu não tentei de verdade”
conselhos que ofereceria a um amigo em situação – preservando dessa forma um pouco da auto-
semelhante, e considerar se ele próprio aceitaria estima, com base no que ele poderia realmente
o mesmo comprometimento caso tivesse que fazer sob condições ideais. O terapeuta pode
começar tudo novamente. ajudar o paciente a examinar seus padrões de
6 Aversão a riscos auto-incapacitação através da avaliação de suas
Indivíduos resistentes freqüentemente se envolvem idéias globais e constrangedoras sobre “fracasso”,
em estratégias para evitar riscos no processo de e ainda ajudar o paciente a fazer um progresso
tomada de decisões. Estas estratégias incluem gradual a fim de evitar que ele sinta que está “indo
altas demandas de informação, foco seletivo rápido demais”.
na probabilidade e magnitude de potenciais 8 Esquemas emocionais
resultados negativos, alta ênfase em lamentação, Em anos recentes, vimos nos concentrando em
e atribuição de baixo valor ou estimativa de baixa como as idéias dos pacientes a respeito de suas
probabilidade a eventos de utilidade positiva: “eu emoções interferem com a mudança clínica.
realmente necessito saber mais, porque muito Por exemplo, algumas pessoas temem emoções
provavelmente seria realmente terrível se as intensas – acreditando que perderão o controle
coisas não dessem certo e, então, eu me culparia. sobre as emoções, ou que elas poderão sobrepujá-
E, por quê? Quanto eu efetivamente apreciaria los ou que durarão para sempre. Outros se
se as coisas ocorressem da forma como você sentem confusos ou constrangidos sobre seus
sentimentos – e ainda outros acreditam que difícil” e apresentaremos algumas idéias sobre como
estão sós com seus sentimentos. Observamos terapeutas cognitivos podem encontrar maneiras
que é útil encorajar pacientes a ver emoções para se manter colaborativos e esperançosos, e
(até mesmo as mais dolorosas) como um sinal produzir resultados construtivos.
de vitalidade e uma fonte de informação sobre
suas necessidades. Explorar as “crenças sobre Quais são as características
emoções” também tem se mostrado útil em de Casos difíceis?
superar as resistências baseadas em validação 1 O paciente apresenta co-morbidade. Por
e vitimização – e em mudar esquemas mal- exemplo, uma paciente pode estar fazendo
adaptativos sobre si e sobre outros. progresso em direção ao alívio de sua depressão;
A conclusão a que chego é que a exploração mas então ela experiencia uma exacerbação de seu
da resistência pode conduzir a um senso mais abuso de álcool, ponto em que ela não comparece
significativo, mais existencial a respeito da mudança a algumas sessões. Em casa, a família da paciente
no indivíduo. De fato, como terapeutas cognitivos, está furiosa e ela se sente envergonhada e sem
podemos aprender das idéias psicanalíticas sobre valor. A paciente não deseja encarar seu terapeuta,
resistência – mas sugiro que podemos ser capazes e acredita que nada a pode ajudar, mesmo diante
de fazer até mais em direção à superação desses de evidências anteriores de que sua depressão
fatores, que representam obstáculos ao progresso poderia melhorar.
psicoterápico. 2 O paciente está correndo “alto risco” de
violência contra si ou outros. Por exemplo,
Sugestão de Leitura:
um paciente cronicamente suicida e furioso
LEAHY, R.L. (2001) Overcoming Resistance in ameaça ferir-se todas as vezes que o terapeuta
Cognitive Therapy. Guilford: New York. tenta estabelecer limites apropriados ou
sugere intervenções adicionais. O terapeuta é
freqüentemente obrigado a tomar decisões éticas
difíceis, com base nos princípios de gerenciamento
TERAPIA COGNITIVA COM CASOS DIFÍCEIS
de crises. O terapeuta experimenta um alto nível
Cory F. Newman, Ph.D., de estresse no trabalho com esse paciente,
University of Pennsylvania School of Medicine e freqüentemente tem dificuldade com os
Tradução: Ana Maria Serra, PhD procedimentos habituais de TC.
3 O paciente responde ‘subotimamente’ à empatia
do terapeuta. Por exemplo, o paciente não parece
Claramente, alguns transtornos são mais difíceis
ter uma reação positiva às tentativas do terapeuta
de tratar do que outros. Em conseqüência, há
de oferecer apoio, empatia acurada e/ou usar
uma necessidade hoje de se utilizar os melhores
apropriadamente o humor. Ele permanece quieto,
métodos da prática da TC a fim de atacar os casos
estóico e passivo, e não parece vincular-se ao
mais desafiantes. Isto requer que o terapeuta seja
terapeuta, independentemente do que este faça
diligente de várias formas, incluindo: 1) que faça
para ser útil e atencioso.
uma avaliação completa (diagnóstica e conceitual)
do caso e continuamente atualize essa avaliação, 4 O paciente não tem as habilidades para uma
à medida que novos dados se fazem disponíveis; atuação colaborativa (por exemplo, não faz as
2) que demonstre calor humano e aceitação, tarefas entre sessões). Por exemplo, o paciente
dentro do enquadre de uma relação terapêutica mantém crenças falhas sobre o processo
diretiva; 3) que seja um inabalável solucionador de terapêutico e não está disposto a modificar tais
problemas; 4) que utilize, de forma transparente, crenças. Crenças disfuncionais incluem “meu
conhecimentos sobre comportamento humano em terapeuta deveria fazer todo o trabalho para me
geral e sobre técnicas da TC em particular; e 5) que consertar (portanto, não há necessidade de que eu
seja psicologicamente resiliente diante de cenários faça trabalho algum)”, “todas as sessões deveriam
clínicos adversos, como, por exemplo, quando me fazer sentir-me melhor”.
um paciente ameaça suicidar-se ou expressa 5 As vulnerabilidades psicológicas do terapeuta
hostilidade contra o terapeuta. Nesta breve revisão, são expostas por um determinado caso. Por
examinaremos as características de um “caso exemplo, as próprias lembranças angustiantes ou
questões psicológicas do terapeuta são ativadas 2 A segurança do paciente e os comportamentos
pela história de vida e/ou por características que interferem com a terapia são as prioridades
pessoais do paciente. Isto dificulta que o terapeuta máximas para a agenda. Manter uma hierarquia
permaneça adequadamente objetivo, e o coloca em de importância dos tópicos terapêuticos é de
risco de altos níveis de estresse e erros na tomada grande ajuda, a fim de que os terapeutas possam
de decisões clínicas apropriadas. se manter focados e eficazes, mesmo quando os
6 O paciente freqüentemente experiencia um pacientes se apresentam de uma forma caótica,
“esquema de antagonismo”. Por exemplo, um confusa e até perigosa. Vários autores concordam
paciente demonstra esquemas de “dependência” em que a mais alta prioridade da terapia é a
e “desconfiança”. Qualquer um desses esquemas segurança do paciente e de outras pessoas, como,
individualmente representa um problema por exemplo, quando a ideação suicida ou homicida
significativo em terapia, mas juntos eles são está presente. Todos os demais tópicos que o
extremamente prejudiciais e podem colocar o paciente deseja discutir devem ser adiados, até que
paciente e o terapeuta em uma situação difícil. o perigo agudo seja suficientemente controlado.
O paciente angustia-se por se sentir próximo e Uma forma através da qual os terapeutas podem
envolvido com o terapeuta (porque na realidade fazer com que os pontos fortes dos métodos da
não consegue confiar nele); mas também se sente terapia cognitiva possam dar conta das demandas
disfórico ao acreditar que tem de manter distância dos itens de alta prioridade é continuar a examinar
do terapeuta a fim de sentir-se seguro (porque as crenças e esquemas que os pacientes mantém,
na realidade “necessita” que seu terapeuta cuide pertinentes a suas tendências suicidas ou
dele). Esta é uma típica situação em que se diz que homicidas e a suas dificuldades para engajar-se à
o terapeuta estará em dificuldades fazendo ou não terapia.
fazendo o que o paciente solicita. 3 Não expresse desesperança ou raiva em
relação ao paciente. Terapeutas são humanos
e algumas vezes sentem-se frustrados com a
Como terapeutas eficazes podem falta de colaboração de seus pacientes, suas
utilizar a TC para casos difíceis? altas demandas, as crises repetidas e os
Há várias publicações que examinam essa questão comentários provocativos (por exemplo, “você é
em profundidade. Considerando os objetivos deste exatamente igual às outras fraudes em sua área,
módulo, vamos simplesmente tocar em alguns dos que não se preocupam de verdade com os seus
princípios de orientação básicos que os terapeutas pacientes!”). Às vezes, terapeutas sentem como
cognitivos podem seguir, a fim de estar mais bem se houvessem atingido seu limite em tolerar
preparados para os casos mais difíceis. tal comportamento e correm o risco de fazer
1 Qualquer problema no tratamento fornece afirmações contraproducentes. Este é o momento
dados úteis. Algumas vezes, terapeutas se em que as habilidades interpessoais do terapeuta
sentem desencorajados quando seus pacientes são seriamente testadas. Se o terapeuta for capaz
não respondem bem à terapia, como, por exemplo, de se manter calmo e continuar a comunicar ao
quando eles continuamente contradizem ou paciente sua disposição para ajudá-lo, isso poderá
menosprezam as observações e sugestões clínicas resultar em um avanço no processo de tratamento.
do terapeuta, e se recusam a se engajar em 4 Utilize métodos psico-educacionais e solicite
técnicas potencialmente úteis, como “role plays”. “feedback”. Terapeutas cognitivos valorizam a
Embora esse comportamento dos pacientes arte de ensinar, à medida que tentam “treinar”
represente um impedimento ao progresso clínico, seus pacientes para o uso de uma variedade de
ele também fornece informações importantes habilidades de auto-ajuda e para a compreensão
para o terapeuta, que o auxiliará a obter uma de princípios importantes de função e disfunção
melhor compreensão sobre os problemas do psicológica (por exemplo, explicando o fenômeno
paciente. Ao invés de tentar “forçar” o paciente a dos esquemas, e como reconhecê-los quando eles
aceitar as intervenções (e dessa forma arriscar causam erros de julgamento e angústia emocional).
uma disputa por poder), terapeutas cognitivos Mesmo quando os pacientes são lentos em
podem refletir sobre as dificuldades que estão apreender o modelo cognitivo, e/ou mostram-se
encontrando, conceituar o problema e talvez relutantes em praticar as técnicas, o terapeuta
discutir abertamente o problema com o paciente. cognitivo continua tentando ensinar aos pacientes
toda a informação útil que eles puderem reter Tornando-nos Específicos em
para uso no presente e no futuro. Além disso, é Relação a Fatores Não Específicos:
importante pedir “feedback” aos pacientes, sobre O PAPEL DA ALIANÇA TERAPÊUTICA EM
suas reações emocionais à sessão de terapia TERAPIA COGNITIVA
e sobre a retenção dos pontos educacionais
Katherine P. Eisen, Ph.D. and David D. Burns, M.D.
importantes aprendidos durante a sessão.
Essa constitui uma maneira empática de dar Stanford University Medical Center
sustentação ao processo educacional, mesmo Department of Psychiatry and Behavioral Sciences
quando os pacientes expressam dúvidas sobre o
quanto eles serão capazes de aprender. Introdução
5 Esteja alerta aos seus próprios pensamentos Terapeutas humanistas e psicodinâmicos
automáticos e formule boas respostas sempre enfatizaram o papel da relação
racionais, a fim de permanecer profissional e terapêutica. Entretanto, a atenção devotada à
objetivo. Terapeutas cognitivos, que são adeptos Aliança Terapêutica (AT) tem sido relativamente
da aplicação do modelo terapêutico a si próprios, inconsistente entre praticantes da Terapia
estarão melhor posicionados para atender casos Cognitiva (TC). Alguns investigadores pensam
difíceis. Esses terapeutas estarão conscientes sobre a AT como um entre vários fatores não-
de seus próprios pensamentos problemáticos específicos, e pouco esforço tem sido feito com o
(por exemplo, aqueles que causam raiva e fim de operacionalizar o termo ou identificar suas
desesperança) e, assim, estarão capacitados a características definidoras. Devido a um volume
engajar-se em auto-intervenções silenciosas a fim crescente de literatura enfatizando a importância
de permanecer focados, ativos e colaborativos da AT, faz-se necessário disponibilizar a profissionais
diante de pacientes desafiadores. Além disso, clínicos os métodos práticos para avaliar a AT, bem
esses terapeutas servem como excelentes como estratégias efetivas para a construção de uma
modelos para seus pacientes, pois serão objetivos, AT mais positiva com seus clientes.
profissionais em sua postura e determinados a
serem bem-sucedidos. AT e Resultados Terapêuticos
6 Você não está só! Consulte um supervisor ou Historicamente, Carl Rogers foi o principal
colega. Alguns terapeutas se esquecem de que proponente da importância da AT. Na realidade,
não necessitam sempre tratar seus pacientes Rogers, em 1957, argumentou que a comunicação
sozinhos. As opções incluem: consultar um pelo terapeuta da compreensão empática e do afeto
supervisor; discutir casos em um grupo de positivo incondicional reflete as condições necessárias
profissionais; utilizar um co-terapeuta e/ou e suficientes para a mudança terapêutica.
comunicar-se com outro clínico que esteja Pesquisadores recentes sugerem que os “fatores
gerenciando um outro aspecto do caso (por não específicos”, como, por exemplo, a AT, podem ser
exemplo, quando um psicólogo e um psiquiatra até mais importantes do que as técnicas específicas
trabalham em conjunto para oferecer ao mesmo de cada forma de terapia, embora nem todos os
paciente terapia cognitiva e farmacoterapia). pesquisadores concordem a esse respeito.
Pedir ajuda a um par sobre um caso difícil não Beck adotou uma posição mais intermediária. Ele
deve constranger o terapeuta. Na realidade, é útil, propõe que uma boa relação terapêutica é uma
apropriado e necessário em muitas ocasiões. condição necessária em TC, embora não suficiente,
para a mudança terapêutica. Um volume crescente de
literatura oferece apoio a essa perspectiva. Utilizando
Sugestões de Leitura: técnicas estatísticas, Burns e Nolen-Hoeksema
BECK, A. T., Freeman, A., & Davis, D. D. (2005). encontraram um efeito causal moderado da
Terapia Cognitiva dos Transtornos de empatia terapêutica sobre a melhora terapêutica na
Personalidade, Porto Alegre: ArtMed. depressão. Esses investigadores também relataram
que a observância das tarefas entre sessões em TC
BECK, J. S. (2006). Terapia Cognitiva para Desafios exerce um grande efeito adicional sobre a melhora
Clínicos: O que fazer quando o básico não clínica e que pode ser separado dos efeitos da
funciona. Porto Alegre: ArtMed. empatia. Em outras palavras, embora a AT seja
importante, as técnicas específicas empregadas por tratamento e seu comprometimento com a execução
terapeutas cognitivos podem ter um efeito ainda mais das tarefas entre sessões, bem como qualquer
forte sobre o progresso clínico. sentimento negativo que possa emergir durante a
TC difere das terapias psicodinâmicas em termos sessão. Os pacientes podem completar essas escalas
do foco em uma ampla variedade de técnicas na sala de espera após o fim da sessão e deixar
que objetivam ajudar clientes a modificar seus o formulário para ser revisado pelo terapeuta. Os
pensamentos negativos e comportamentos pacientes também podem completar instrumentos
disfuncionais que perpetuam a angústia emocional. curtos de avaliação de depressão, tendências
Terapeutas cognitivos colocam menor ênfase na suicidas, ansiedade e raiva no início e no final de
relação terapêutica do que o fazem os terapeutas cada sessão. Essas escalas fornecem aos terapeutas
psicodinâmicos ou psicanaliticamente orientados, um feedback imediato e acurado sobre qualquer
sendo que o papel do terapeuta tende a ser mais ruptura potencial na aliança, bem como a respeito
colaborativo, ativo, focalizado no presente e orientado da eficácia de cada sessão.
a metas. Entretanto, a literatura sugere que os Alguns terapeutas relutam em usar esses
terapeutas cognitivos estabelecem relacionamentos instrumentos, devido a preocupações de que seus
que são pelo menos tão fortes quanto terapeutas de pacientes não serão honestos ao preencher essas
orientações distintas. escalas e que dirão aos terapeutas simplesmente o
que eles querem ouvir. A experiência clínica, porém,
Avaliação da AT não fundamenta tais preocupações. As escalas são
Ao mesmo tempo em que se observa ampla muito sensíveis até as menores rupturas na AT, e
concordância a respeito da proposição de que a maioria dos terapeutas recebe avaliações baixas
uma AT positiva pode facilitar a melhora clínica, da maioria de seus pacientes quando utilizam esses
poucos investigadores desenvolveram programas instrumentos pela primeira vez. Isto pode causar
de treinamento destinados a ajudar terapeutas a surpresa e angústia aos terapeutas. O verdadeiro
sistematicamente monitorar e aperfeiçoar a aliança. problema com esses instrumentos parece ser o fato
Diversos instrumentos foram desenvolvidos para de que os pacientes dizem a seus terapeutas o que
medir a AT, mas há pouco acordo em relação a qual estes não querem ouvir! Felizmente, os terapeutas
escala de avaliação seria considerada o “padrão que utilizam regularmente essas escalas e treinam os
de ouro”. Os instrumentos que avaliam a aliança procedimentos de treinamento da empatia descritos
variam em termos de perspectiva, conteúdo e abaixo, habitualmente experienciam rápida melhora
alternativas de resposta. Por exemplo, a AT pode ser em seus escores de empatia, em conjunto com
avaliada por clientes, terapeutas ou observadores aumentos substanciais, muitas vezes, dramáticos,
independentes. As avaliações por clientes são mais em sua eficácia terapêutica.
fortemente relacionadas aos resultados terapêuticos
do que as avaliações conduzidas pelos terapeutas ou Treinamento em Empatia
observadores externos. Na realidade, as avaliações da Enquanto que se pode argumentar que a habilidade
AT por terapeutas nem se correlacionam à melhora para ser afetuoso e empático é inata, acreditamos
clínica. Os estudos sugerem que as percepções pelos que seja possível para os terapeutas desenvolver
pacientes da qualidade da AT são válidas, enquanto essas habilidades tal como desenvolveriam qualquer
que as percepções dos terapeutas não são. outra. Contudo, o sucesso de um treinamento em
A maioria dos instrumentos avalia a concordância empatia parece depender de três fatores cruciais: a
entre terapeuta e paciente a respeito das metas avaliação da empatia em todas as sessões, exercícios
terapêuticas, as estratégias a serem empregadas de role-play com colegas, e humildade.
para se alcançar as metas, e a qualidade do vínculo Embora a maioria dos terapeutas acredite que eles
afetivo entre o terapeuta e o cliente. O vínculo sabem como seus pacientes se sentem, e como
afetivo inclui empatia acurada, afeto positivo, calor os seus pacientes se sentem a respeito deles, as
humano e genuinidade. pesquisas indicam que as percepções dos terapeutas
Burns desenvolveu instrumentos curtos e confiáveis tendem a ser altamente imprecisas.
para acessar a percepção dos pacientes sobre a Em outras palavras, se solicitarmos a terapeutas que
qualidade da empatia terapêutica, a utilidade de cada preencham as mesmas escalas que seus pacientes
sessão de terapia, a satisfação do paciente com o preenchem ao final de cada sessão, mas para tentar
adivinhar como seus pacientes os avaliaram, bem Este exercício é muito mais desafiador do que pode
como quanto eles estão se sentindo deprimidos, parecer à primeira vista, e quase que a totalidade dos
suicidas, ansiosos ou irados, os escores dados terapeutas é inicialmente avaliada desfavoravelmente.
pelos terapeutas serão alta ou completamente Alertamos os terapeutas para o fato de que isso é
não correlacionados com os escores efetivamente perfeitamente normal e os encorajamos a verificar
dados pelos pacientes às mesmas variáveis. Por seus egos desde o início; do contrário, o treinamento
esta razão acreditamos que é essencial avaliar se tornará demasiado angustiante e ameaçador para
objetivamente a empatia e outros sintomas em seus sentimentos e auto-estima. Embora o exercício
todas as sessões. seja emocional e tecnicamente difícil, ele pode
O programa de treinamento desenvolvido por conduzir a um aperfeiçoamento marcante e rápido na
Burns fornece aos terapeutas um conjunto de capacidade do terapeuta de gerar afeto e confiança,
técnicas concretas projetadas para melhorar a mesmo com os mais difíceis dos pacientes.
comunicação e fortalecer a empatia terapêutica. Todas as cinco técnicas de comunicação são
Terapeutas aprendem a usar os Cinco Segredos surpreendentemente difíceis de ser dominadas por
para uma Comunicação Efetiva (Tabela 1), terapeutas, mas a Técnica de Desarmamento é,
mediante a ajuda de exercícios de role-play. Um de longe, a técnica mais importante e desafiadora.
terapeuta desempenha o papel de um paciente Quando o terapeuta desarma um paciente raivoso,
raivoso, resistente e crítico, e o outro desempenha ele descobre a verdade presente no que o paciente
o papel de um terapeuta. O “paciente” ataca o está dizendo e reconhece que o paciente está certo.
terapeuta; por exemplo, ele diz: “você não está me A maioria dos terapeutas faz o oposto; eles sentem
ajudando. Você não entende como eu me sinto. um impulso quase irresistível a se defender e explicar
Na realidade, você nem se importa comigo”. O que as críticas do paciente estão “erradas”. Estas
“terapeuta” então responde respostas defensivas simplesmente reforçam
da forma mais habilidosa possível, usando várias a crença do paciente de que a crítica é válida.
das habilidades descritas pelos Cinco Segredos Em contraste, se o terapeuta puder aprender a
para uma Comunicação Efetiva. Após uma troca, reconhecer uma semente de verdade nas críticas
o role-play é finalizado, e o “paciente” critica o do paciente, então ele poderá tranqüilizá-lo. Burns
“terapeuta” em três áreas: chamou este quadro de “Lei dos Opostos”.
1 O terapeuta recebeu um A, B ou C? Alguns Acreditamos que a humildade é essencial para
terapeutas relutam em avaliar seus colegas, mas qualquer terapeuta que espera estabelecer alianças
esse passo é crucial. Por exemplo, um grau B+ mais efetivas com seus pacientes. Isto ocorre porque
reflete duas coisas. Primeiro, o terapeuta fez um os terapeutas farão avaliações sobre as percepções
trabalho mediano. Segundo, o terapeuta falhou pelo paciente da qualidade da aliança terapêutica, e de
e houve algo em sua forma de responder ao sua utilidade, que poderão ser desconcertantes. Além
paciente que simplesmente não funcionou. disso, discutir suas falhas com seus pacientes pode
2 O que o terapeuta disse foi útil, ou não? fazê-los sentir-se constrangidos. Alguns terapeutas
Eficaz ou ineficaz? temem que perderão o respeito de seus pacientes
se admitirem haver cometido um erro ou falha.
3 O terapeuta cometeu erros ao usar os Cinco
Outros poderão descartar as críticas de um paciente
Segredos para uma Comunicação Efetiva? Como
conceituando-as como uma distorção cognitiva
esses erros poderiam ser corrigidos para tornar
ou uma expressão da transferência do paciente.
a resposta mais adequada?
Acreditamos que nossas maiores falhas terapêuticas
Outros membros do grupo também podem podem freqüentemente tornar-se nossos maiores
oferecer feedback, fornecendo ao terapeuta uma sucessos, se as abordarmos de forma aberta, com
riqueza de informações sobre falhas na empatia respeito pelo paciente e com curiosidade. Devido
e sugestões concretas para aperfeiçoá-la. Então, ao fato de que nossos pacientes freqüentemente
o “paciente” e o “terapeuta” podem inverter os sentem-se alienados e experienciam uma falta de
papéis várias vezes, sempre com feedback, até confiança e intimidade em quase todos os seus
que ambos alcancem um grau “A” nos exercícios. relacionamentos, esses diálogos freqüentemente
Nesse ponto, os terapeutas estão prontos para oferecerão aos pacientes suas primeiras experiências
experimentar, empregar essas novas habilidades reais de intimidade e incentivarão avanços
com pacientes reais. terapêuticos muito significativos.
Tabela 1
Os cinco segredos para uma Comunicação Efetiva*

E = EMPATIA A = ASSERTIVIDADE
1 Técnica de Desarmamento 4 Afirmações do tipo “Eu sinto”
Encontre algo verdadeiro no que a outra Expresse suas próprias idéias e sentimentos
pessoa está dizendo, mesmo que pareça de forma direta e com tato. Use afirmações
totalmente não razoável ou injusto. que se iniciam com “eu sinto”, ao contrário
de afirmações que se iniciam com “você”,
2 Empatia
por exemplo “eu me sinto abalado”, ao invés
“Coloque-se no lugar” da outra pessoa e
de “você está errado” ou “você está me
tente ver o mundo através de seus olhos.
deixando furioso!”
Empatia de Pensamento
Parafrasear as palavras da outra pessoa.
Empatia de Sentimento R = RESPEITO
Reconhecer como a outra pessoa está
5 Afago
provavelmente se sentindo, com base no que ela diz.
Transmita uma atitude de respeito, mesmo
3 Questionamento que você se sinta frustrado ou furioso com a
Faça perguntas gentis e encorajadoras, outra pessoa. Encontre algo de genuinamente
a fim de aprender mais sobre como a outra positivo para dizer a outra pessoa, mesmo
pessoa está pensando ou se sentindo. durante o ápice da discussão.

* Copyright ã 1991 by David D. Burns, MD. Revised 2001.

Sugestões de Leitura: psicológicas, para várias classes de transtornos


e problemas. Estes tratamentos são oferecidos
Burns, D.D. (1989). The Feeling Good Handbook. New sem que isto implique em violação da consciência
York: William Morrow. dos profissionais que discutem e promovem
essas abordagens. Mas com mais de 500 tipos
Burns, D.D. & Auerbach, A. (2005) A Aliança
específicos de terapia em existência na atualidade,
Terapêutica em Terapia Cognitiva. In P.M. Salkovskis
perguntamo-nos: todas dispõem de evidências
(Ed.), Fronteiras da Terapia Cognitiva, São Paulo: Ed.
que respaldam seu uso? É possível que algumas
Casa do Psicólogo.
terapias, mesmo fazendo sentido intuitivamente,
não possuam o tipo de evidência que é necessário
para justificar seu uso? Ou até pior, na ausência
QUESTÕES RELACIONADAS A de estudos de pesquisa que demonstrem que uma
TREINAMENTO EM TC: PSICOTERAPIA forma particular de terapia funciona, é possível
BASEADA EM EVIDÊNCIAS que esses tratamentos até mesmo causem
danos? No mínimo, um tratamento ineficaz custa
Keith Dobson, PhD dinheiro e o cliente que paga por esse tratamento
Professor de Psicologia Clinica e Diretor do está potencialmente gastando tempo e dinheiro
Departamento de Psicologia da Universidade de preciosos que poderiam ser melhor empregados
Calgary, Alberta, Canadá. Presidente-Eleito da IACP- em outro tratamento mais eficaz.
International Association for Cognitive Psychotherapy

Introdução A emergência do conceito de


Conforme os leitores da revista Psicologia Brasil psicoterapia baseada em evidências
saberão há uma ampla variedade de teorias e terapias As preocupações mencionadas acima são centrais
a um interesse renovado na questão da saúde Critérios e Controvérsias
baseada em evidências. Na América do Norte, Embora a adoção de critérios comuns para o
todas as disciplinas de saúde, dentre as quais reconhecimento de terapias empiricamente
se inclui a Psicologia, estão sendo requeridas a fundamentadas seja visto como um desenvolvimento
aumentar seus níveis de prestação de contas positivo, uma série de controvérsias emergiu a
ao público, através da identificação de práticas respeito de seu uso. Uma dessas controvérsias
respaldadas por pesquisas. E, embora não refere-se à adequação, ou não, desses critérios
seja novo o debate a respeito de quais terapias a todas as formas de terapia. Notem que um
funcionam para quais tipos de clientes, as dos critérios para esta abordagem é de que as
respostas a essa questão estão tomando características das amostras de clientes devem
novas formas. ser claramente especificadas. Embora esse
Nos Estados Unidos, um impulso recente em critério não o afirme explicitamente, muitos o
direção à psicoterapia baseada em evidências interpretaram como significando que as amostras
ocorreu em 1995, quando a Divisão de devem ser diagnosticadas, com critérios claros
Psicologia Clínica da Associação Americana e limitados para a seleção dos sujeitos a serem
de Psicologia criou uma força-tarefa a fim de incluídos nas amostras. Foi sugerido que este
examinar a questão de qual base de evidências critério empurra o campo da Psicologia em direção
seria necessária a fim de determinar que um a uma abordagem mais médica à saúde mental e
tratamento fosse “empiricamente fundamentado”. ao uso de diagnóstico. Também foi sugerido que os
Esta força-tarefa debateu a questão e tratamentos que têm como objetivo metas mais
recomendou a adoção do critério reproduzido amplas, como, por exemplo, melhora na auto-estima
no Quadro 1. Indo mais além, o comitê listou os e mudanças de personalidade, não se enquadram
tratamentos que, com base em sua revisão da muito facilmente neste critério.
literatura, satisfaziam esses critérios. Uma segunda controvérsia surgiu, devido à
lista de tratamentos que foram reconhecidos
Métodos de Pesquisa como satisfazendo esses critérios. Conforme
Conforme demonstrado no Quadro 1, há visto nas listas, as terapias comportamental e
dois métodos de pesquisa reconhecidos que cognitivo-comportamental são proeminentes.
produzem evidências cientificamente aceitáveis, Em contraste, as terapias psicodinâmicas estão
da perspectiva da força-tarefa. Um método geralmente ausentes das mesmas listas. Este
utiliza um desenho experimental estrito, em que padrão levou alguns autores a sugerir que os
os pacientes são aleatoriamente designados critérios favoreciam as terapias de curto prazo
para uma de duas condições, experimental ou de e mais orientadas a resultados, como a terapia
controle, sendo que esses estudos são chamados cognitivo-comportamental. Considerando que esta
de estudos clínicos aleatórios (RCT-randomized seja uma preocupação válida (embora a maioria
clinical trial). O outro método refere-se a uma dos clientes preferisse tratamentos menos longos
série de estudos de caso, utilizando desenhos e menos caros, desde que eles funcionassem),
experimentais comportamentais. Na prática, outras abordagens terapêuticas podem estar em
o RCT rapidamente tornou-se a abordagem desvantagem em tais comparações.
predominante para o desenvolvimento e testagem Uma terceira fonte de controvérsia surgiu,
dos tratamentos psicológicos. Atualmente, envolvendo o argumento de que a abordagem
sabemos que há várias terapias que satisfazem direcionada a uma psicoterapia baseada
(e em alguns casos até excedem) os padrões em evidências centralizou a discussão sobre
enumerados no Quadro 1 (v. o seguinte website, técnicas e métodos de terapia. Notem que um
mantido pela Divisão de Psicologia Clínica, dos critérios do Quadro 1 refere-se à exigência
Divisão 12, da APA, para uma lista recente de de um manual de tratamento. Este critério faz
tratamentos reconhecidamente eficazes para as sentido se acreditarmos que os métodos podem
diferentes classes de transtornos: http://www. ser apresentados em forma de uma descrição
apa.org/divisions/div12/rev_est/index.html). de procedimentos. Mas e se a terapia for, ao
contrário, baseada em idéias relacionadas ao
uma agência independente, a NICE pode recomendar
processo interpessoal? Estas idéias podem ser
ao Ministério da Saúde certas práticas de saúde,
mais difíceis de descrever em forma de um manual.
e o Ministério já demonstrou sua disposição para
Além disso o foco em técnicas tende a reduzir o
modificar aspectos do Sistema Nacional de Saúde
foco sobre os aspectos não específicos da terapia,
com base nessas recomendações. Por exemplo,
como, por exemplo, uma relação terapêutica
aumentos significativos em treinamento e o apoio do
positiva, a natureza da aliança terapêutica, o valor
tratamento de transtornos de ansiedade e depressão,
de simplesmente falar sobre seus problemas, o
usando terapia cognitivo-comportamental, já estão
valor da liberação emocional, e outros fatores que
sendo financiados, com base na literatura sobre
se aplicam a diferentes modelos de terapia. Na
psicoterapia empiricamente fundamentada.
realidade, uma perspectiva alternativa recente
sobre a questão da psicoterapia baseada em Embora a abordagem adotada no Reino Unido
evidências é de que há fatores empiricamente seja de longe a mais radical em sua incorporação
fundamentados referentes ao relacionamento, que de práticas de serviços de saúde baseadas
estão presentes em muitos modelos de terapia, em evidências, modelos similares estão sendo
e que também necessitam ser examinados e examinados em outros países da União Européia,
compreendidos. Pode ser que, à medida que o bem como ao redor do mundo.
campo avança alguma integração, entre as idéias
das terapias empiricamente fundamentadas e os Psicoterapia baseada em
fatores relacionais empiricamente fundamentados, evidências no Brasil?
ocorrerá e refletirá o modelo terapêutico ótimo. Tal modelo poderia funcionar bem no Brasil?
Provavelmente poderia. Como o sistema de saúde
Psicoterapia baseada em evidências e o no Brasil é relativamente bem regulamentado
treinamento de profissionais através do Governo Federal, padrões nacionais de
A despeito das controvérsias acima, é claro que a atendimento e oferta de serviços de saúde poderiam
idéia de terapias que contam com apoio empírico ser estabelecidos. Hospitais e clínicas regionais
está influenciando o treinamento e os serviços poderiam ser encorajados, através de financiamento,
oferecidos em vários países. No Canadá e nos a oferecer psicoterapias baseadas em evidências.
Estados Unidos, o critério de treinamento para Mas um sistema como esse deveria ser introduzido
ambos os psicólogos clínicos e os psiquiatras exige no Brasil? Somente se houver evidência de que os
exposição a terapias apoiadas empiricamente tratamentos funcionam. Embora pareça improvável
e treinamento. Os programas de treinamento que os tratamentos psicológicos que funcionam
em Psicologia clínica no Canadá se voltaram em bem na América do Norte e no Reino Unido não
direção às terapias comportamental e cognitivo- funcionariam bem no Brasil, será importante avaliar
comportamental como as abordagens dominantes essa proposição através de pesquisas conduzidas
dos programas de treinamento para a próxima no país, com várias amostras diferentes de seus
geração de clínicos. habitantes. Neste sentido, os critérios apresentados
no Quadro 1 poderiam representar um bom ponto de
O exemplo do Reino Unido partida, para se começar a avaliar as evidências que
respaldam os resultados da psicoterapia.
Mas em nenhum outro país o efeito dos serviços
de saúde baseados em evidências foi maior do que
Sugestões de Leitura:
no Reino Unido. Lá, o governo estabeleceu uma
organização nacional, denominada de Instituto DOBSON, K.S. (Ed.) (2005) Manual de Psicoterapias
Nacional para Saúde e Excelência Clínica (NICE- Cognitivo-Comportamentais, Porto Alegre: ArtMed.
National Institute for Health and Clinical Excellence,
NORCROSS, J.C. (Ed.). (2002). Psychotherapy
http://www.nice.org.uk/), que tem a incumbência
relationships that work: Therapist contributions
de revisar a literatura de pesquisa em todas as
and responsiveness to patient needs. New York:
áreas de serviços de saúde, e recomendar a
Oxford University Press.
avaliação de práticas e tratamentos. Embora seja
CONCLUSÃO
“A Terapia Cognitiva ocupa uma posição vantajosa, logrado sucesso. Meus associados no ITC-Instituto
em relação às demais abordagens psicoterápicas, de Terapia Cognitiva e na ABPC-Associação Brasileira
por unir a teoria à técnica, o caráter breve a de Psicoterapia Cognitiva, os quais, percebendo
eficácia, o modelo prescritivo a criatividade e a oportunidade do projeto para o avanço da TC
intuição do terapeuta, o caráter estruturado a alta no Brasil, instaram-me a aceitá-lo e apoiaram-me
“treinabilidade” de seu modelo estruturado. Em de várias formas em sua produção. Aos autores,
resumo, a TC, em sua proposição e desenvolvimento, nacionais e internacionais, amigos incondicionais
reflete admiravelmente a engenhosidade de seu e líderes em suas áreas de especialidade, os quais
criador, Aaron Beck, e de seus seguidores, dentre generosamente se disponibilizaram a colaborar e,
os quais meus associados e eu temos a honra de dessa forma, partilharam conosco seu conhecimento
nos incluir. Os módulos, embora de forma breve e expertise. À Revista Psicologia Brasil, pelo convite
e resumida, versaram sobre temas variados na e pelo apoio durante a elaboração dos artigos, em
área da Terapia Cognitiva, com o objetivo último particular, à Editora, Claudia Stella, cuja competência
de informar, motivar, esclarecer e avançar o refletiu-se em orientação segura, especialmente ao
conhecimento de iniciantes e adeptos. A quantidade nos auxiliar a reduzir artigos brilhantes ao espaço
de feedbacks generosos, recebidos ao longo de todo disponível para cada módulo. Aos leitores, que
o projeto, sugerem que alcançamos esse objetivo. generosamente enviaram mensagens reforçadoras e
A organização dos módulos mensais da série cuja satisfação refletiu-se em aumento no número de
intitulada “Estudos Transversais em Psicologia”, assinaturas anuais da Revista.
na área da Terapia Cognitiva, muito nos honrou e A todos, minha gratidão e desejos de sucesso pessoal
entusiasmou: a Terapia Cognitiva foi escolhida e profissional em 2007.
como o tema de abertura da série e nós fomos
convidados a organizá-los. Ana Maria Serra
Neste projeto, contamos com a valiosa colaboração Amsterdam, Holanda
de inúmeros experts, sem os quais não teríamos 12 de dezembro de 2006”

Caro assinante,
Ana Maria Serra
na próxima edição, nº 38,
PhD em Psicologia e Terapeuta Cognitiva
de fevereiro de 2007,
pelo Institute of Psychiatry da
enviaremos a Capa do
Universidade de Londres, Inglaterra.
ESTUDO DA TERAPIA COGNITIVA:
Presidente Honorária da ABPC
UM NOVO CONCEITO EM PSICOTERAPIA,
– Associação Brasileira de Psicoterapia
para você anexar todos os módulos. Aguarde! Cognitiva. Diretora do ITC – Instituto
de Terapia Cognitiva, que atua nas
áreas de clínica, pesquisa, consultoria e
treinamento de profissionais, oferecendo
regularmente Cursos e Palestras, dentre
os quais um Curso de Especialização em
Terapia Cognitiva credenciado pelo CFP
– Conselho Federal de Psicologia.
E-mail: itc@itc.web.com
Site: www.itc.web.com
© Ana Maria Serra, PhD.
Todos os direitos reservados. Publicação e reprodução
exclusivamente mediante autorização expressa da autora.

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