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Moçárabe1
1. A dominação muçulmana
À morte do rei Vitiza (701-709) agravaram-se as dissensões na monarquia
visigótica, cujos reis ascendiam ao poder por eleição e não por sucessão familiar. O trono
foi entregue a Rodrigo, administrador duma província do sul, em detrimento de Áquila ou
de outro filho de Vitiza. Os vitizianos decidiram então em pedir ajuda aos árabes,
contando o apoio de Julião, governador de Ceuta e inimigo de Rodrigo. Assim entre abril e
maio de 711 vieram do Norte de África por Gibraltar e desembarcaram na Península
milhares de árabes e berberes, comandados por Tarik, que avançaram até Córdova, onde
se fixaria a capital do emirato (756-929) e depois cafilado (929-1031) peninsular. Até 756,
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Este esquema sintetiza sobretudo Joaquim CHORÃO LAVAJO, Islão e Cristianismo: entre a Tolerância e a
Guerra Santa, in HRP, I, 91-103.
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Em 756, Abderramão I, vindo do oriente, inaugurou em Córdova uma dinastia de príncipes omíadas,
independentes de Damasco, que continuaram a chamar-se emires, até que Abderramão III tomou o título
de califa em 929, mantendo-se, todavia, a mesma dinastia. O califado de Córdova manteve-se até 1031,
altura em que o seu declínio levou a que se dividisse em pequenos principados independentes, conhecidos
por taifas (partidos). De 1100 a 1145, os berberes almorávidas, vindos de África, impuseram o seu domínio
aos vários príncipes dissidentes, sem, contudo, impedirem o avanço da reconquista. Seguiu-se ainda a
dinastia dos berberes almóadas (1145-1269).
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Tal como no resto da Europa até ao séc. XII, também na Península durante a
dominação islâmica, foram os mosteiros, com as suas escolas, os centros representantes
e promotores da cultura. Em Córdova e arredores foram conhecidos quinze. Em Portugal
tiveram muita importância na região de Coimbra os de Lorvão e da Vacariça. Ao serem
incorporados nos novos reinos cristãos, os moçárabes levaram consigo e transmitiram o
legado da cultura formada no contacto com os muçulmanos. Restituíram assim ao
ocidente a sua cultura transformada pelas influências hispano-árabes.
Não podemos, contudo, exagerar o peso da influência moçárabe, porque em
muitos casos a memória ficou só nalguns termos toponímicos e onomásticos,
compreensível tendo em conta que os moçárabes do sul foram acolhidos com muitas
reservas pelos conquistadores, quando não eram massacrados ou escravizados. De facto,
à medida que a reconquista foi avançando, coube também aos mosteiros e às catedrais
restauradas a tarefa de recuperar a cultura visigótica, que tinha sobrevivido nas zonas
menos controladas pelos muçulmanos. Há, pois, que relativizar tanto a posição dos que
subestimam o contributo hispano-árabe para a constituição dos povos português e
espanhol (Alexandre Herculano; Sánchez Albornoz), como a dos que exageram a
dimensão desse contributo, acusando o norte de impor violentamente ao sul não só o
cristianismo, mas também os cânones culturais importados de além-Pirenéus (Borges
Coelho; Cláudio Torres).
3. A reconquista cristã
Entretanto, porém, foi-se desenvolvendo a reconquista. Trata-se do movimento
histórico responsável pela recuperação cristã do espaço hispânico, iniciado por um
pequeno grupo de asturianos, acantonados nos Picos da Europa. Liderados por Pelágio e
apoiados por alguns nobres visigodos, resistiram contra as forças islâmicas, que em vão
tentaram ultimar a conquista integral da Península. Foi a partir deles que se iniciou o
processo de reconquista:
− A luta pela sobrevivência. De início tratava-se de uma luta de sobrevivência
sem qualquer conotação nacionalista e cristã, como denotam as crónicas
hispânicas de 741 e 754. Lentamente o grupo assumiu como essencial à sua
luta pela liberdade as dimensões étnico-política e religiosa, como já mostram
as crónicas de Afonso III de Leão (866-910).
− O ermamento do território. Na arrancada militar que levou as forças asturiano-
leonesas até ao Douro, Afonso I (739-757) despovoou e arrasou o território
que separava os rios Douro e Minho, para criar um espaço que servisse de
barreira de proteção em relação aos muçulmanos. A Galiza ficava assim bem
demarcada em duas zonas:
o A do norte, mais povoada, que herdaria o nome original de Galiza.
o A do sul, em expansão rumo ao Mondego, que recebeu inicialmente o
nome do burgo que controlava a desembocadura do rio Douro e se
aplicava já ao território adjacente: Portucale ou Portugale. Este nome
viria a designar a região que viria a ser a Terra Portucalense, Província
Portucalense, Condado Portucalense ou simplesmente Portucale.
− O repovoamento do território. Sujeito ao ermamento que por mais de um
século a diferenciou da Galiza, a região de Portucale adquiriu maior coesão
com o repovoamento de que foi alvo durante os reinados de Ordonho I (850-
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