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50111-Texto Do Artigo-61943-1-10-20130118 PDF
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EDUARDO DULLO
É freqüente lermos, na literatura antropo- lacuna. Levar a sério o discurso nativo e ao me-
lógica, textos que não informam a idade dos nos tentar não constituir uma relação de po-
nativos. As pesquisas (em geral) são feitas com der em relação de sentido signi�ca, neste caso,
adultos, o que pode ser interpretado como apreender o mundo social a partir da constru-
conseqüência da importância que nossa socie- ção simbólica das crianças, fazendo desta ex-
dade confere a esta faixa etária, em detrimen- periência peculiar uma diferença qualitativa ao
to de outros períodos – a velhice e a infância invés de quantitativa.
– como locus de produção de signi�cados e Seu texto preocupa-se, desde o início (e re-
re�exões acerca da vida social. Tornado claro tomando a discussão ao �nal), em esclarecer a
desde o início pela autora, o debate sobre uma particularidade da Antropologia, diferencian-
Antropologia da criança trata de uma revisão de do-a dos mais antigos estudantes do tema: psi-
conceitos fundamentais que, originando-se na cólogos, psicanalistas e pedagogos. Assim, além
década de 1960, estende-se às teorias contem- de uma “antropologia da criança”, a autora nos
porâneas, articulando uma revisão da noção expõe sua visão do que caracteriza uma pesqui-
de pessoa e da criação de uma antropologia da sa da disciplina. Não é na metodologia de co-
cognição. É frente a este complexo debate que leta de dados que reside a especi�cidade, mas
opto por situar a importante contribuição que no cuidado com a contextualização e com os
este pequeno livro (como de praxe da coleção, “pressupostos analíticos e no arcabouço concei-
60 páginas) apresenta. tual” (:48). Com isto em mente, ela lembra que
O convite para escrever este número da co- “não podemos falar de crianças de um povo in-
leção “Passo a Passo”, baseou-se em sua compe- dígena sem entender como esse povo pensa o
tente – apesar de relativamente breve e recente que é ser criança e sem entender o lugar que
– produção e na (não tão breve assim, 12 anos) elas ocupam naquela sociedade – e o mesmo
pesquisa com crianças dentre os Kayapó-Xi- vale para as crianças nas escolas de uma metró-
krin do Bacajá. Por tratar, em sua dissertação pole” (:9).
de mestrado, sobre a concepção de infância e Sua introdução é, portanto, mais que um
aprendizado nesse contexto, traz numerosas preâmbulo para a discussão bibliográ�ca que
contribuições sintetizadas (o que não quer vem em seguida; é a assunção de uma postura
dizer, necessariamente, simpli�cadas) a partir teórico-metodológica com a qual irá debater
dessa experiência etnográ�ca. com autores e escolas. Nesse sentido, importa-
Esse terreno da disciplina só recentemente se em realçar a distinção entre nature e nurture
foi visto com a adequada sistematização, ainda realizada por Margareth Mead na tentativa de
em curso, que evita a de�nição pela negativa. entendimento da parcela cabível à natureza e
Uma das principais proposições que a exposi- à cultura no comportamento dos não-adultos
ção de Clarice Cohn visa é a de suprimir essa (tendo os norte-americanos como contraponto).
Recebido em 15/02/2006
Aceito para publicação em 19/05/2006