Sentado nos cornos de um veado com uma espingarda na mão faz pontaria ao
seu retrato. ‒ O meu nome é América! Milhares de coelhos de todo o continente correm, juntam-se à sua volta, farejando e mordendo-lhe os pés cheios de veneno.
. . . . .
O Xamã mexia na terra. Entre as folhas e o estrume descobriu um homúnculo.
Disputou-o com uma raposa, conseguiu arrancá-lo dos seus dentes. Entregou-o nos braços de um casal que quase não se mexia. Havia fotografias, papel de parede, uma ventoinha lenta, uma planta de folhas enormes. Cheirava a papel machê. O ar era seco, demasiado seco para o bebé. O bebé começou a salivar. Trouxeram um vaso porque ele cuspia muito. E punham terra por cima, por causa do cheiro. Finalmente o bebé parou. E em pouco tempo começou a falar. Estavam todos admirados e, distraídos com o bebé, não repararam na árvore que crescia no vaso. Só quando o cheiro dos frutos lhes seduziu a atenção se viraram. Não compreendiam bem o que era aquilo, mas o doce dos frutos dizia- lhes que sim, é para pôr na boca. Só aqueles com faro para o negócio é que sabiam não os comer.
O Xamã foi-lhe ensinando a crescer:
‒ Não olhes para os outros. É tudo uma ilusão. A humanidade apareceu para poderes existir. Eles esticam os braços, e milhões de braços é onde te sentas.
Quando parou de crescer, mandou-o chamar:
‒ Quem sou eu? Ao fim de nove dias, o Xamã desenterrou uma televisão no quintal. ‒ Tu podes ser quem quiseres. És tu que te constróis com as mãos. Carregou no comando; mudou de canal. Já não havia mais nada que lhe pudesse ensinar: rasgou a sua pele e de si próprio fez-lhe um tapete.
E agora ele olha para o seu pénis. Família, Império, História:
‒ Tudo isso começa aqui. Não há nada antes de mim; tudo vem depois pensa ele, no exacto momento em que a ciência diz: buraco negro. Uma vagina de puro prazer; onde tudo é absorvido, de onde não pode nascer nada. Dirige-se ao telescópio para ver o rosto da mãe pela última vez. As suas feições, rugas de mãe: as dobras do espaço-tempo. ‒ A História é a minha história. Eu sou o primeiro homem. Mãe, quando virás? Será que chegarás a existir? diz, apenas por hábito. Já não é a angústia que lhe percorre o corpo: tem em si a certeza que sim, que a sua mãe existe algures no futuro. Na parede em frente está o mapa dos Estados Unidos. Foi-se parecendo cada vez mais com a sua cara. Agora, com a sua última decisão, a última operação plástica ao país, as duas já não se distinguiam. As expressões foram expulsas do rosto, empedernido, abandonado. Mas talvez a mãe assim o possa ver do espaço, do futuro, um dia. Ainda que ele seja mais pequeno que o mundo. Lentamente levanta-se e abandona a espingarda. Na outra sala, há um sarcófago de gelo. Deita-se. No lugar do coração estava a última das pirâmides, o grande mistério da humanidade: qual era o sonho deste homem?