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Faculdade de Letras

Universidade de Lisboa

Ano Lectivo: 2017/2018 – 2º Semestre

Curso: História

Cadeira: História Moderna (Economia e Sociedade) TP1

Docente: Doutora Maria Leonor García da Cruz

CLIVAGENS NA SOCIEDADE FRANCESA: DAS


GUERRAS DE RELIGIÃO À REVOLUÇÃO

(Séculos XVI-XVIII)

Aluno: Vasco Martins Henriques

Nº: 149283
Resumo

Guerras Religiosas em França: causas e consequências das clivagens na sociedade.

Ligas militares lideradas por facções nobiliárquicas.

Emergência do Calvinismo: Campo vs Cidade

Quebra dinástica dos Valois, ínicio da dinastia Bourbon, Absolutismo

A Sociedade do Ancién Régime

‘Invasão’ da burguesia aos Ofícios de Estado

Palavras-chave: guerras religiosas, tolerãncia religiosa, ligas militares, Ancién Régime,


ofícios, venalidade dos ofícios, Terceiro Estado, burguesia, nobreza de robe;

Synthesis

Religious Wars in France: causes and consequences of cleavages in society.

Military leagues led by nobiliarchic factions.

Emergence of Calvinism: Field vs City

Dynastic break of the Valois, beginning of the Bourbon dynasty, Absolutism

The Society of the Ancién Regime

'Invasion' of the bourgeoisie to the State Offices

Keywords: religious wars, religious tolerance, military leagues, Ancién Régime,


offices, venality of offices, Third State, bourgeoisie, nobility robe;

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Índice

Repercussões Socias das Guerras de Religião…………………………3

Sociedade do Ancién Régime……………………………........................13

Bibliografia……………………………………………………………….22

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Repercussões Sociais das Guerras de Religião

O que foram as Guerras de Religião em França?

As guerras de Religião em França, foram um período de guerra civil e de acções


militares entre duas facções, a Católica e, do outro lado da barricada, a dos Huguenotes
– estes, que eram Protestantes, na sua maioria, Calvinistas. O Protestantismo foi
inicialmente introduzido em França já durante o reinado de Francisco I, que se opôs
firmemente, no entanto sem resultados, tentou encontrar um meio de dirimir este
conflito religioso, mas como também se encontrava bastante ocupado na sua guerra
contra Espanha, principalmente Carlos V, esta tentativa saiu, portanto, gorada.
Assim que os Huguenotes ganharam influência suficiente para demonstrar a sua teoria
religiosa livre e publicamente, a hostilidade por parte da facção católica aumentou
exponencialmente e portanto, desencadeou a partir dai o que viria a ser as oito guerras
civis que se fizeram sentir por todo o século XVI em França, de 1562 a 1598.
No entantanto, por trás do aspecto da religião, havia, sem dúvida a acrescentar a disputa
entra as maiores casas aristocraticas francesas da época, a casa de Guise e a de Bourbon,
as quais era patrocinadas por facções estrangeiras interessadas em desmembrar o
poderio francês da altura.
A França, por si mesma vivia sobre um regime do mote, ‘Une foi, un loi, un roi’
demonstrando assertivamente que a tradição de o facto de o Estado, sociedade e religião
viverem todas elas sobre um mesmo tecto, e isto estava mais que generalizado na mente
das pessoas e na sua própria experiência de vida, portanto, era intrinseca esta situação
em que o privado e o público não possuiam qualquer tipo de distinção entre eles, e a
base deste consenso era perpetuada pela própria Igreja, que manteve o consenso social
por cerca de mais de um milénio, e no caso da França, já o vinha a fazer desde o tempo
de Clóvis, pois a Igreja santificava o direito de governar por parte dos monarca em troca
de protecção militar e civil. E é caso para se poder afirmar que a Igreja em França no
século XVI estava colocada sob as ordens da monarquia – graças à Concordata de
Bolonha (1516) – que permitia aos monarcas franceses de poderem dispôr dos bens
eclesiàsticos, convocar concílios, nomear bispos e mesmo até a usar as rendas dos
bispados vagos.
Era considerada a ‘primeira filha da Igreja’ e o seu rei ‘Le roi trés chrétien’ (O Rei mais
crente), e era impensavel pensar-se de qualquer outra maneira que não esta, pois a ‘fé
única’ era tido como que essencial à ordem civil – de que outra maneira poderia a
sociedade manter-se una? – se se não seguisse a fé, como se poderia agradar a Deus, que
mantinha a ordem natural, caso contrário seria a desgraça. E com o surgimento das
ideias de Martinho Lutero - que circularam desimpedidamente pelo território francês
apesar de Francisco I se opôr firmemente, existia dificuldade em saber de que forma o
Protestantismo era herético - e por consequência de Calvino, um francês que havia
nascido na Picardia em 1509, e que havia fugido da França, em 1536, após o Caso dos
Cartazes.
Caso dos Cartazes

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O caso dos cartazes foi um incidente envolvendo a afixação de cartazes anti-católicos na
noite de 17 para 18 de Outubro de 1534 em Paris. Este incidente marcou o fim das
políticas conciliadoras do rei Francisco I da França, que passou a perseguir os
protestantes. Estes cartazes criticavam a celebração da missa tal como ela era feita
oficialmente pela Igreja Católica, particularmente atacavam a repetição cerimonial da
morte de Cristo, simbólica, no altar. Se o sacrifício já foi consumado, por que se
apoderavam os sacerdotes católicos deste ritual simbólico? Os argumentos teológicos
dos protestantes fundamentavam-se na Epístola de São Paulo aos Hebreus. A Commented [VH1]: “ Olhando para Jesus autor e
propaganda protestante pretendia transmitir a ideia de que a eucaristia seria uma consumador da fé,o qual pelo gozo que lhe estava proposto
suportou a cruz,desprezando a afronta, e assentou-se à
blasfémia, uma vez que a morte de Cristo não se podia repetir. A situação tornou-se destra do trono de Deus.Considerai pois aquele que
particularmente crítica e desencadeou uma reacção brutal por parte da Igreja católica e suportou tais contradições dos pecadores contra si
do monarca francês que em Janeiro de 1535, organiza uma procissão macabra pelas ruas mesmo,para que não enfraqueçais,desfalecendo em vosso
ânimo." (Hebreus 12:2-3)
de Paris. A procissão desaguou em 6 locais distintos e em cada uma das paragens existia
um pódio onde o rei, os embaixadores e dignos membros do "parlement" se instalavam
de modo a assistir à morte pela fogueira de 6 "heréticos" envolvidos.
Demonstrativo, este caso, que em França testemunhava-se uma sociedade em que a
tolerância religiosa estava de facto posta de parte – que hoje nos parece uma virtude da
vida pública – a heresia era algo visto como que traição, adoptada por gente corrupta
que aos olhos da sociedade eram cínicos que havia esquecido do papel de Deus e que já
não tinham lugar para se preocupar com o seu próprio bem-estar.
A somar a isto também era o medo das inovações, pois estas traziam lugar a duvida e a
questionar o próprio papel de Deus, como acontecerá posteriormente com o Iluminismo,
as coisas eram simplesmente o que eram, e estas inovações só dariam azo à anarquia e
destrucção. Niguém queria ser visto como um ‘inovador’, para dar um exemplo, o
Renascimento pensava de si mesmo como que um processo de redescoberta de um
tempo passado mais puro, a própria Reforma foi um retorno ‘necessário’ ao simples, a
verdadeira religião do início dos tempos do Cristianismo.
Por outro lado, não deixa de ser impressionante o facto de o Calvinismo ter tido, de
facto, aderência nas diversas ordens sociais presentes na França, de frades que
desprezavam o opulência dos grandes cargos hierárquicos que não desmonstravam
qualquer tipo de vocação espiritual para os lugares que ocupavam, converteram-se
ajudando na própria propagação das ideias protestantes, mas também de burgueses que
viam o poder económico da Igreja a ser desperdiçado nas mãos destes altos mandatários
da fé cristã, e igualmente por parte de nobres, uns que até consideravam os pergaminhos
teóricos de Calvino correctos e outros por sentirem que esta adesão a fé Protestante era
um via razoável de modo a combater o crescente poder por parte do monarca.
Francisco I, acaba por falecer em 1547, tendo sido sucedido por Henrique II, que
continuou a prosseguir a política de perseguição religiosa levado a cabo pelo seu pai no
últimos anos do seu reinado. Este que em 1551, emite o Édito de Châteubriant, que
proíbia, a associação, reunião, ou até mesmo de discutir religião no emprego, nos
campos ou mesmo à refeição.
Independentemente deste facto, ao longo da década de 50 do século XVI, os Calvinistas
ou Huguenotes, organizaram-se na Suíça, e despoletaram a criação de organizações
clandestinas de congregações Calvinistas no território francês que permitiram, além

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disso, estabelecer com certos membros da nobreza de modo a garantir uma acção mais
directa de modo a ganhar controlo politico e religioso sobre os Católicos, que lhes valeu
também uma oposição mais hostil, apesar da monarquia francesa tentar amenizar a
situação através da publicação de éditos de tolerância de modo a máscarar a crescente
hostilidade.
E, subitamente, com a morte de Henrique II em 1559, é criando um enorme vazio de
poder na coroa francesa, e será esta mesma razão que levará ao aumento de tensões, e
impreterivelmente esta escalada de tensão levará ao confronto entre as várias casas
nobiliárquicas mais ambiciosas, caso da casa do Duque de Guise, uma casa ramo da
casa de Lorraine ( um ducado imperial independente), que lideraram a França durante o
reinado de Francisco II, que à data da morte de Henrique II, tinha apenas 15 anos e
curiosamente estava casado com Maria da Escócia, sobrinha do próprio duque de Guise.
Esta aliança com os Guise, ameaçou grandemente a casa de Montmorency, uma casa de
linhagem antiga que gozou de imenso prestígio e proeminência política sob Henrique II,
assim como a casa de Bourbon, que como primeiros príncipes de sangue tinham direito
sobre os Guise de tutoria sobre o monarca, que apesar de não ser menor de idade, era
fisicamente muito fraco e debilitado e sempre se pensou que o seu reinado não iria ser
duradouro.
Primeira Guerra (1562-1563)
Estas tensões dinásticas interligaram-se com as tensões religiosas e sociais que se
faziam sentir, levando à constituição das duas facções, por um lado a Protestante,
liderada pela casa de Bourbon e a Católica liderada pela casa de Guise.
A própria Catarina de Médicis, esposa e rainha de Henrique II, tentou promover a paz
através da publicação de Éditos de tolerância, em 1562, fazendo com que a prática da
religião Protestante deixasse de constituir um crime, contudo não em praça pública, o
que não foi de todo bem recebido por parte das pretensões católicas, e a primeira Guerra
de Religião Francesa surge no Massacre de Vassy no mesmo ano, no qual o duqe de
Guise voltando para as suas propriedades decide parar em Vassy no domingo, de modo
a ouvir a missa, e quando alguns dos seus serventes entraram em escaramuças com
alguns Huguenotes da mesma localidade, que atendiam a uma missa na sua
congregação, a facção de Guise abriu fogo sobre estes que se encontravam desarmados
e também incendiaram a Igreja ao qual se encontravam.

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Figura 1 Massacre de Vassy

É a partir daqui que os Huguenotes deixam de ser liderados pelos seus pastores, para
passarem a ser liderados pelos seus ‘protectores’, especialmente Luís, Príncipe de
Condé. Que conduziu os Huguenotes às armas, e toma de seguida várias localidades
estratégicas, e contando com o apoio de líderes protestantes da Alemanha e de
Inglaterra,tendo em vista amealhar tropas e dinheiro.
Por outro lado, os Guise vão procurar no Papa e em Filipe II de Espanha auxílio, mas o
duque de Guise acaba por ser assassinado em Órleans, eliminando assim o líder da
facção Católica, enfraquecendo deste modo a própria coroa e, por isto mesmo, Catarina
de Médicis esforça-se por obter um acordo levando a um cessar dos conflitos após o
Édicto de Amboise de 1563.
Segunda Guerra (1567-1568)

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Apesar da morte do Duque de Guise, esta facção continuou a ser podereosa e
extremamente influente, permitindo deste modo ao Cardeal de Lorraine a consolidação
do seu poder ainda mais, argumentando por uma maior repressão aos Huguenotes em
resposta à insurreição protestante que se fazia sentir nos Países Baixos, que foram
rapidamente reprimidos pela Espanha, isto tudo quando a rainha Catarina de Médicis
acompanhava o seu
filho Carlos IX num
‘tour’ pelas
províncias de modo a
apresentar uma
imagem de união
com a nobreza, e é
aqui que Catarina se
encontra com o
Duque de Alba,
responsável pela
repressão em
território holandês, o
que alarmou
definitivamente a
comunidade
Protestante. Com a
presença de tropas
espanholas, na “Via
Espanhola” que ia da
Itália à Flandres,
levou ao pânico no
território francês.
Existia o rumor que
Catarina se aliasse a
Espanha, que levou
Figura 2 O Protestantismo Francês (1560-1685) aos Huguenotes a
um golpe ao rei, que
falhou e provocou a segunda guerra, que levou a um conjunto de guerras parecida à
primeira, e que teve igualmente um acordo de paz, o de Longjumeau, semelhante ao de
Amboise.
Terceira Guerra (1568-1570)
Esta terceira fase das guerras, propriamente ditas, foi somente encerrada com a Paz de
Saint Germain.
No meio de todo esse sofrimento, as igrejas reformadas cresciam em muitas regiões,
principalmente no Sul de França. Esse crescimento gerava intensa preocupação em
alguns círculos políticos e religiosos. Além de esta ter sido uma guerra que se alastrou
igualmente para muitas outras partes do território frânces gerando o caos na sociedade
francesa.

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Nos conflitos, verificou-se um padrão: os huguenotes costumavam atacar edifícios
católicos e destruir objetos sagrados. Os católicos reagiam atacando e matando pessoas.
O episódio mais brutal dessas hostilidades foi o massacre do dia de São Bartolomeu no
dia 23 de Agosto de 1572. Já no dia anterior - quatro dias depois do casamento de
Henrique de Navarra com Margarida de Valois, irmã do rei Carlos IX, o almirante de
Coligny escapou por pouco de uma tentativa de vida. Em Paris, a tensão era muito forte;
numerosos nobres protestantes haviam comparecido ao casamento. Durante a noite de
23 a 24 de agosto - Dia de São Bartolomeu - o Conselho Real se reuniu, durante o qual
foi decidida a eliminação dos principais líderes huguenotes. Coligny e muitos outros
nobres protestantes foram assassinados no Louvre e também na cidade. Esta execução
de um número limitado de líderes huguenotes foi seguida por um massacre selvagem
que se prolongará até ao dia 29 de agosto com cerca de 4000 vítimas. Os massacres
estenderam-se a outras cidades: Orléans, Lyons, Rouen, Saumur, Bourges, Meaux,
Bordeaux e Toulouse. Uma estimativa conservadora calcula que houve 3000 vítimas em
Paris e outras 8000 no interior de França.
No mesmo dia, Henrique de Navarra e o Príncipe de Condé, também ele Henriques,
foram obrigados a
converteram-se ao
catolicismo, caso
contrário seriam
executados,
obrigando Henrique
de Navarra a ser
prisioneiro da corte
durante os quatro
anos seguintes.
Os anos de
perseguição levaram
a que a comunidade
Figura 3 Massacre do Dia de São Bartolomeu
protestante a que se
tornasse uma
estrutura celular de congregações, onde as pessoas ficavam juntase se ajudavam
mutuamente, assemelhando-se a outras minorias, como os judeus, e isto levou à
desconfiança, por parte dos Católicos, das suas actividades religiosas, principalmente
em relação à participação activa das mulheres, como igualmente do seu literacismo para
os estudos da Bíblia.
Quarta Guerra (1572-1573)
A violência perpretada contra eles (Henrique de Navarra, Condé e Coligny, que acabou
por ser morto no massacre) forçou muitos protestantes reformados a renunciar ou fugir
para os países de “refúgio”: Genebra, Suíça, as províncias do norte dos Países Baixos ou
Inglaterra. Mas, no oeste e no sul de França, as batalhas alastraram-se uma vez mais.
Nîmes e Montauban recusaram-se a aceitar as guarnições reais. La Rochelle foi sitiada,
mas resistiu. O cerco foi levantado em 6 de julho de 1573 e o rei concedeu aos
Huguenotes um édito de pacificação: o Édito de Boulogne, foi registado pelo

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Parlamento em 11 de julho de 1573, menos favorável do que o decreto anterior. Os
protestantes mantinham a liberdade de consciência, mas a liberdade de culto é
concedida apenas a três cidades: La Rochelle, Nîmes e Montauban.
Quinta Guerra (1574-1576)
O duque de Alençon - o irmão mais novo do rei - assumiu a liderança de um movimento
composto de Protestantes e Católicos moderados. Essa aliança dos “descontentes”
considerava que a tolerância ao culto reformado era primariamente uma questão de
reforma política. O movimento estipulou algumas demandas por tais reformas.
Após a morte de Carlos IX (a 30 de maio de 1574), Henrique III foi coroado em 13 de
fevereiro de 1575, inicialmente recusou os pedidos dos descontentes, mas logo foi
obrigado a lidar com eles, pois as suas tropas eram muito menores comparadas às deles.
Foi, portanto,
obrigado a
assinar um
tratado de paz
em Etigny,
denominada "paz
de Monsieur". O
Édito de
Beaulieu (6 de
maio de 1576)
confirma a
vitória dos
descontentes,
permitindo a
liberdade de
culto, excepto
em Paris e numa
área em redor da
cidade. Aos
protestantes
reformados
foram atribuídos
oito redutos e
câmaras
limitadas em
Figura 4 Acontecimentos e Locais das Guerras de Religião todos os
parlamentos.
Sexta Guerra (1576-1577)
Desde o início, o Édito de Beaulieu provou que teria dificuldades para se impôr e
levantou forte oposição, a facção Católica era hostil e reuniu-se, unindo-se em ligas
defensivas. Os Estados Gerais foram convocados e tiveram lugar em Blois, numa
atmosfera que era mais desfavorável para os huguenotes. A abolição do decreto (Édito)
por parte da assembleia resultou na retomada do conflito. Mas a falta de ajuda

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financeira para ambas as partes obrigou-os a iniciar negociações. Um compromisso foi
encontrado e a paz de Bergerac (14 de setembro de 1577) foi confirmada pelo Édito de
Poitiers, assinado em outubro de 1577.
Sétima Guerra (1579-1580)
A guerra estourou mais uma vez em áreas locais: o Príncipe de Condé capturou La Fère
na Picardia e em abril de 1580, Henrique de Navarra - à frente do partido Protestante
desde 1575-1576 - resistiu às provocações do tenente-general de Guyenne e tomou
posse da cidade de Cahors. Alguns combates esporádicos ocorreram até a assinatura do
tratado de Fleix em 26 de novembro de 1580. Esse tratado confirmou o texto de
Poitiers. Como havia sido acordado em Poitiers, as fortalezas capturadas pelos
Protestantes seriam restauradas dentro de seis anos.
Oitava Guerra (1585-1598)
Com a morte em 1584 de François d'Alençon, Duque de Anjou e o último irmão do rei,
Henrique de Navarra tornou-se o legítimo herdeiro do trono. Para se opôr a esta
candidatura ao trono, os católicos constituiram a Liga ou "União Santa". O seu líder era
Henrique de Guise,que que obrigou Henrique III a assinar o tratado de Nemours (1585),
decreto registado pelo Parlamento em 18 de julho de 1585, refutando o status político de
tolerância civil.
Estipulou, igualmente, que os Calvinistas (Huguenotes) tinham seis meses para escolher
entre a abjuração e o exílio, e que os ministros da religião fossem proibidos e que as
fortalezas fossem devolvidas. O resultado foi um forte declínio no número de
protestantes em todo o país. Mas Henrique de Navarre, vitorioso em Coutras, ainda
detinha as províncias do sul.
Enquanto que a Liga Católica assumia o controle do norte da França. Em Paris, uma
outra liga de “commons” foi constituída independentemente da liga dos príncipes,
unido-se posteriormente à facção Católica. No dia 12 de maio de 1588, a cidade revolta-
se: este era o “dia das barricadas” e Henrique III teve que fugir, refugiando-se em Blois
onde iniciou negociações com a Liga Católica, apesar de o poder adquirido pelo facção
dos Guise preocupar-lhe seriamente. Suspeitando de conjuras e para evitar a perda do
decidiu ordenar que o duque Henrique de Guise e o seu irmão, o cardeal de Lorraine,
fossem assassinados.
Henrique III procurou reconciliação com Henrique de Navarra. Os seus dois exércitos
juntaram forças e dirigiram-se para Paris, no entanto, os cidadãos de Paris insurgiram-se
contra o rei, que se havia aliado ao movimento protestante, o que levará ao assassinato
de Henrique III por um membro da Liga, o monge Jacques Clément, em 1589,
juntamente à morte do monarca, igualmente a do Duque de Anjou, abriu as portas a
Henrique de Navarra para se tornar Henrique IV. Só que Paris estava nas mãos dos
leaguers e o rei teve que conquistar o seu próprio reino, em março de 1590, na
conhecida batalha de Ivry, que levou ao cerco de Paris.
Em 1593, Henrique IV manifestou sua intenção de renunciar e submeter-se à instrução
religiosa católica. Somente a unção e a coroação do rei em Chartres conseguiram
superar a reserva parisiense. Paris rendeu-se em 1594 e abriu as suas portas a Henrique

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IV. Só em 1595, Henrique IV recebe a absolvição por parte do Papa e declara guerra à
Espanha, cujas numerosas tropas que ajudaram a Liga ainda estavam presentes na
França.
Em 1598, por meio do Tratado de Vervins, obteve a partida das tropas espanholas.
Henrique IV obteve igualmente a submissão do duque de Mercoeur, governador de
Bretagnes, que havia unido forças com os espanhóis.
Édito de Nantes (30 de abril de 1598)
Foi em Nantes, que Henrique IV assinou o famoso decreto que põe fim às guerras
religiosas que assolaram a França por cerca de 36 anos. Este edital é mais completo que
os precedentes, ele estabeleceu uma tolerância civil limitada e inaugurou um tempo de
coexistência religiosa. O serviço reformado de culto foi autorizado em todos os lugares
onde existiu em 1597 e o acesso a todos os ofícios foi garantido aos Protestantes
Reformados.

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A Sociedade do Ancién Régime
O Ancién Régime (em França) é, na verdade, o nome dado ao regime político que
prevaleceu em França durante os dois séculos antes da Revolução Francesa (1789 ou
1792 se considerarmos a abolição da monarquia). Alexis de Tocqueville consolida essa
com a sua obra The Ancien Régime and the Revolution (1856). A maioria dos
historiadores do século XIX é igualmente da opinião em que este período inicia-se com
a ascensão ao trono de França por Henrique IV em 1589, iniciando assim a dinastia da
casa Bourbon.
A população francesa é então sub-dividida em três ordens cujas funções são
hierarquizadas em dignidade: o clero, a nobreza e o Terceiro Estado ("sociedade de
ordens"). Essa separação é baseada numa ideologia e na tradição, não por um critério de
mérito pessoal.
A afirmação do poder real é a causa do desenvolvimento de uma administração que
permanece relativamente modesta. O reino de França é uma aglomeração de
comunidades pré-existentes que são governadas por estatutos diferentes, específicos
para cada sujeito jurisdicional e cujos perímetros se emaranham. A lei e o sistema
judicial não são unificados. No nível local, as cidades são centros de influência através
do controle de seu interior, mas também de trocas comerciais e financeiras a distâncias
maiores.
As ordens do sistema é desestabilizado por vários desenvolvimentos: a desvalorização
do papel da nobreza tradicional pelo desenvolvimento do reino, o sucesso material das
camadas superiores do Terceiro Estado que passam a deter uma maior participação em
assuntos públicos, o declínio da fé religiosa ... primeiro expressa de um modo
principalmente satírico, sistema de ordens vai-se tornando cada vez mais teórica no final
do reinado do Rei Sol para finalmente, com os filósofos do Iluminismo para passar a
existir um novo sistema de valores. A Revolução Francesa acabou com o sistema de
encomendas e desigualdades legais entre os franceses, que passaram para o estatuto de
cidadãos, com a abolição dos privilégios, dos direitos senhoriais no dia 4 de agosto de
1789.
A estrutura da sociedade do Ancién Régime
As fundações
Na sociedade do Ancién Régime, os indivíduos têm uma existência social e legal
através das comunidades de que são membros e que os representam. Todo o corpo, toda
a comunidade, todos as ordens têm o seu status, os seus deveres e os seus privilégios
que os identificam e os distinguem dos outros. Não é o indivíduo que tem personalidade
jurídica ou existência política, mas a grupo social a que pertence. Há uma
multiplicidade de grupos socias: famílias, comércios, comunidades rurais ou cidades,
senhorios, ordem religiosas... Assim, em eleições que são numerosas, não são os
indivíduos que votam, mas o líder de cada comunidade.
A organização social em três ordens
Como em toda a Cristandade, e de acordo com a Cristandade, a sociedade é
considerada como um todo orgânico onde cada uma das partes vive em simbiose com
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outras.Sob o Ancién Regime, a sociedade é distinguida em três ordens que
correspondem a três funções. Cada uma das três ordens definidas desde a Idade Média e
deve ser complementar às outras duas: os monges rezam pela salvação dos leigos; os
cavaleiros colocam seus braços a serviço da Igreja e protegem os fracos; finalmente, os
camponeses cultivam a terra para alimentar as duas primeiras ordens. As funções são
hierárquicas em dignidade, em outras palavras, a lógica espiritual da primeira ordem
prevalece sobre a política da segunda, que prevalecem sobre todas as necessidades
económicas. A sociedade do Ancién Régime é, portanto, o oposto de uma sociedade
materialista em que a economia impõe sua lógica ao conjunto da sociedade. Dentro de
cada ordem, essa hierarquia recusa a ordem de todas as funções sociais. Assim, na
ordem económica, o sector primário é considerado o mais digno socialmente
(agricultura, mineração, pesca, silvicultura), seguido do artesanato e depois do
comércio, que estão um pouco acima das actividades comerciais mais indignas: a usura
(banca) e a prostituição. Com efeito, a conduta nobre é aquela que se sacrifica pela
honra (para o interesse geral), enquanto as actividades económicas buscam um ganho,
um lucro, maior para o comerciante em comparação ao agricultor e no usurário em
comparação ao comerciante.
As duas primeiras ordens acarretam em si funções caras ao serviço público para serem
executadas. De facto, o clero assume o culto público, o status civil, a educação pública e
a assistência pública. A nobreza assume as funções reais, como a defesa da sociedade
com o exército e na justiça na alta administração. Enquanto a terceira ordem, que inclui
todas as atividades económicas, tem funções que são lucrativas. Como resultado, a
maioria dos impostos é baseada no terceiro pedido, para manter os dois primeiros.
As origens históricas da sociedade de ordens
Esta tripartição do sistema ideológico da sociedade cristã medieval foi identificada
como característica das sociedades indo-europeus como o trifuncionalismo pelo
comparatista e filólogo Georges Dumézil. A existência desta trifuncionalidade observa-
se a partir do Império Romano cristão (os sacerdotes, os nobiles e os pauperes) e nos
textos irlandeses do século VIII (o Druid formado pelos druidas e padres, a Flaith
formado pela aristocracia militar e Bo-airig, homens livres para o trabalho) . E são
trazidos de volta pelos monges Haymon e Heiric Auxerre do século IX e por dois
bispos carolíngios, Adalberão de Laon e Gerard de Cambrai, que teorizam este tipo
de organização social, num momento em que a França passava por uma crise política
em torno do ano mil.
No século XVI, com a ascensão do Absolutismo, o jurisconsulto Charles Loyseau
fornece uma definição legal das três ordens. Ele escreveu um ordens tratadistas e
dignidades simples em 1610 em que descreveu a separação das três ordens, ele também
chamados de "estados", insistindo na obediência ao rei. Ele observa que cada ordem é
subdividida em categorias mais específicas.
Esta construção ideológica (a classe dominante, os bellatores que exercem poder e
oratores que legitimam esse poder, e uma classe dominada, os laboratores), são descritas
em detalhe pelo historiador Georges Duby, que reconhece a sua dívida para com a
teoria marxista do materialismo histórico.

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Uma sociedade católica
O catolicismo é a religião da coroa. O protestante Henrique de Navarra, embora
herdeiro do trono, teve que se tornar rei da França. No momento da sua coroação, o rei
jurou defender a Igreja Católica, como também igualmente para extinguir a heresia no
seu reino.
Como a família, a paróquia é o quadro básico da vida religiosa, mas também civil. A
grande maioria dos franceses são guiados desde o nascimento (com o baptismo) à morte
(com a extrema-unção) pelos preceitos da Igreja Católica Romana. O padre católico é
uma das engrenagens da vida da aldeia ou da comunidade do bairro. Ele distribui os
sacramentos, mas também é conselheiro em assuntos privados. Todo os grupos na
sociedade tem o seu santo padroeiro. A vida colectiva é pontuada pelos feriados
religiosos católicos.
O culto protestante, cuja existência é disputada por uma secção influente da opinião
católica, é finalmente permitida, mas restrita pelo Édito de Nantes em 1598. O culto
católico tem um novo ímpeto no contexto da Contra-Reforma. Esse movimento
encorajou Luís XIV a proibir o culto protestante em 1685, a custo da emigração para os
estados protestantes. Quanto aos judeus, eles são proibidos de permanecer na maior
parte do reino.
As três ordens da sociedade

O clero
O clero é a primeira ordem na
hierarquia social da era moderna. O
clero realiza reuniões gerais e tem seus
próprios tribunais. Em princípio, ele
recebe o imposto do dízimo
correspondente a um décimo das
colheitas e dos primeiros frutos. Na
realidade, a maioria de seus recursos
vem da renda da terra.
Os clérigos estão isentos de tamanho
(imposto) e serviço militar, no entanto
permanecem sujeitos a certos outros
impostos, como a regalia ou a
Figura 5 Caricatura das três ordens: um membro dos
dizimação. Ao clero é dada a
'páysans' carrega nas costas um mebro da nobreza e outro responsabilidade de, além do culto,
do clero; caricatura anónima, 1789 próprio do seu status civil, a
organização de festas (religiosas), a
educação pública, tanto ao nível de pequenas escolas e universidades, também ele é
responsável por todas as funções de assistência social e médica, criando e mantendo
hospitais, hospícios e orfanatos.

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A condição do clero é extremamente variada: os membros do alto clero, que são os
arcebispos, os bispos, os abades das grandes abadias, são os beneficários das mais
importantes receitas. Muitas vezes, mas não necessariamente a partir das fileiras da
nobreza, eles são nomeados pelo rei desde a Concordata de Bolonha, obtido por
Francisco I em 1516. Alguns bispos também são senhores temporais: por exemplo, o
Bispo de Mende é igualmente Conde de Gevaudan.
Os clérigos seculares (que vive no "século", a partir do saecularis Latina), entre os
leigos, desempenham um papel importante na vida da comunidade: padres e vigários
mantêm os registros de baptismo e sepultura, distribuem os sacramentos como o
casamento, ouvem as confissões, celebram a missa, organizam festas, frequentam a
educação primária. Os padres são nomeados por um colador, o fundador da paróquia ou
seu sucessor. Eles têm uma pequena porção do dízimo, mas geralmente estão a salvo da
indigência. Após o Concílio de Trento, eles são obrigados a residir em sua paróquia e
são melhor treinados; agora há um seminário em cada bispado. A França é dividida em
140 dioceses de tamanho muito variável. Eles são mais numerosos no sul, onde alguns
assentos episcopais são apenas grandes cidades.
O clero regular vivia consoante a "regra" (regularis Latina) numa ordem de um
mosteiro, um convento, na Idade Média estabeleceu-se a distinção entre as ordens
contemplativas dedicados à oração (beneditinos, cistercienses ...) e as ordens
mendicantes (franciscanos e dominicanos) dedicadas à pregação. As ordens recebem
cadetes de famílias abastadas que são excluídas das sucessões familiares pelo direito de
primogenitura.
A nobreza
Em França, as funções e condições da nobreza variaram consideravelmente ao longo
dos doze séculos da história da realeza. A principal função da nobreza era garantir a paz
e a justiça; detinha o monopólio da força e da guerra. Não são indivíduos nobres, mas as
linhagens que preservam transmitem funções nobres hereditárias. A nobreza antiga é
imemorial, tem suas raízes na linhagem galo-romana e anteriormente gaulesa. Na Idade
Média, o acesso à nobreza é feito muito pelo cavalheirismo, o que lhe dá o ideal cristão
de colocar força a serviço dos fracos. A nobreza mais recente deve seu status ao rei, que
sozinho tem o poder de enobrecer por cartas patente ou pela venda de acusações.
Os arquivos que registram os direitos senhoriais são mantidos nos castelos.
Como o clero, a nobreza tem privilégios: não está sujeita ao imposto real. Ela tem o
direito de usar a espada e caçar. É julgado por tribunais específicos. Subsiste pelo
aluguer pago pelos trabalhadores. A nobreza está sujeita à lição da casa, deve derramar
o seu sangue, devido à sua presença lugares no exército e na administração, mas a
maioria das atividades profissionais é negada. Qualquer nobre francês que não respeite
esses deveres pode ser derrogado e, portanto, ser destituído da sua condição.
Tornar-se nobre permanece um ideal, mas a nobreza não forma um corpo organizado.
No topo, alguns grandes senhores acumulam os favores reais, eles são os príncipes do
sangue ou são frequentemente favoritos ou os seus descendentes. Sob a dinastia dos
Bourbon, os príncipes do sangue são principalmente o duque de órleans, os príncipes de

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Condé e Conti. Na parte inferior da escada, muitos senhores vivem com moderação com
as rendas das suas propriedades.
Terceiro estado
A última ordem da sociedade do Ancién Regime é composta de todos os que não
pertencem ao clero, nem à nobreza e exercem atividades económicas: agricultores,
artesões e comerciantes, isto é, a maioria da população. Como em outras ordens, a
condição dos plebeus é extremamente variada: alguns burgueses são muito ricos e
poderosos.
A população é essencialmente rural. A vida dos camponeses é devida à abundância das
culturas, especialmente porque estão sujeitas a muitas obrigações, em particular:
Pagamento ao senhor
 do imposto sobre o uso da terra
 banalidades, sob o uso do moinho, forno e prensa
 de champart

Ao clero
 do dízimo

Para o rei
 de tamanho em renda ou propriedade
 sobre o sal
 tarefas que servem o Senhor e o Rei
 o serviço na milícia criada por Luís XIV
Os habitantes da cidade incluem comerciantes e artesões que trabalham nas suas
oficinas e pertencem a uma corporação. Na cidade também há muitos trabalhadores e
servos.
O termo Terceiro Estado só se tornará comum a partir da Revolução Francesa de 1789.
Embora a população camponesa constitua 80% da população francesa, não haverá
camponeses nas assembleias, tanto durante a Convocação dos Estados Geral 5 de maio
de 1789, como durante o resto da Revolução. O Terceiro Estado será quase
exclusivamente representado por burgueses instruídos, com empregos em cargos
jurídicos, empresas comerciais e bancos ou escritórios financeiros. As eleições para os
Estados Gerais são feitas por distrito, com um voto por chefe de família. (Em 1789, as
eleições para os Estados Gerais foram feitas com uma participação maciça da
população, pelo menos em seu componente masculino. A primeira assembleia de 1791
será eleita por voto popular; a Convenção Nacional de 1792, eleita por sufrágio
universal.
"Qual é o terceiro estado? Tudo. O que tem sido até agora na ordem política? Nada. O
que ele pergunta? Ser algo." - Emmanuel Joseph Sieyès
Organização da sociedade do Ancien Régime: As autoridades
Realeza

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O rei governa assistido pelo seu conselho. Aos poucos, partindo de homens como
Philippe Le Bel e seu filho Philippe Le Long, o Conselho experimentou uma dupla
evolução. Por um lado, deu origem a orgãos mais especializados. Por outro lado, os
grandes senhores foram expulsos em favor de indíviduos instruídos mais profissionais.
As sugestões de conselheiro são ouvidas, mas o rei escolhe os titulares das funções
importantes.
O chanceler impõe o selo real sobre as ações: ele representa a justiça eterna. A
Controladoria Geral financia as receitas e despesas. O papel dos quatro secretários de
estado (transferidos para a marinha, a guerra, os negócios estrangeiros e a casa do rei)
evolui do funcionário para ministro.
A autoridade real é aplicada nas províncias por 33 intendants nas generalidades. O
mordomo também é um valioso meio de informação para o governo central. Ele
intervém na distribuição do principal imposto direto, o tamanho. Treze cortes de conta
dedicam-se a verificar as contas dos agentes do Estado e a preservar o patrimônio real.
Doze tribunais de assistência prestam justiça em última instância em questões fiscais. O
tamanho é tomado de acordo com as províncias por oficiais que ocupam cargos,
falsamente chamados de "eleitos", ou estados provinciais, assembleias de notáveis.
A arrecadação de impostos indiretos é assegurada pelo sistema de locação: um grupo de
financeiros avança a soma global ao rei e então organiza-se a percepção do imposto,
com lucro. O principal imposto indireto é o imposto sobre sal.
O sistema judicial
Indivíduos e grupos sócio-económicos têm as suas relações reguladas por costumes
seculares que, de facto, formam o direito privado. Estes costumes são diferentes de
acordo com as regiões:. Eles também são diferentes de acordo com os grupos sociais em
que estão inseridos: a nobreza e o terceiro estado geralmente não têm as mesmas regras
em relação à herança.
A justiça em si é processada primeiro pelos bailiados e depois pelas presidências.
Dezoito tribunais de justiça soberanos, incluindo quatorze parlamentos, julgam em
última instância. O poder do Parlamento de Paris é o mais efectivo, mas abrange apenas
uma parte do território: o coração histórico do domínio real (Anjou, Auvergne, Berry,
Champagne, Ilha de França, Orléanais, Picardia, Poitou e Touraine). Os parlamentares
possuem os seus ofícios, que compraram. A sua integridade é muitas vezes
questionada,no entanto, não os impede de se posicionar contra o poder real como
defensores dos direitos e liberdades públicas.
Comunidades
As Cidades
O desenvolvimento de intercâmbios na Idade Média e a necessidade de garantir a
segurança das cidades durante a Guerra dos Cem Anos favoreceram o surgimento de
autoridades municipais.

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As grandes cidades são principalmente centros administrativos, como Rouen, a capital
histórica da Normandia, que atrai advogados. Deste ponto de vista, o mapa judicial da
França moderna ainda reflete a era da influência urbana do Ancién Régime.
As grandes cidades são igualmente centros económicos, os negócios são organizados
em cada cidade em corporações ou comunidades estabelecidas (sujeitas a um acordo).
Os privilégios reais são concedidos a eles por via de uma carta patente com o objetivo
declarado de garantir a qualidade das produções e a remuneração justa de cada membro,
cada empresa controla o acesso à profissão, que também defende contra concorrências
injustas. As corporações serão abolidas com a Revolução.
Algumas cidades desenvolveram intercâmbios em larga escala, como Lyon, no Sena,
La Rochelle no Atlântico ou Marselha no Mediterrâneo. Nantes e Bordeaux prosperam
graças ao comércio com as Antilhas. A prosperidade de Bordeaux se reflete no novo
urbanismo da cidade preservado até hoje. A burguesia de Bordeaux é iniciada à filosofia
do Iluminismo, seguindo Montesquieu e especialmente na Maçonaria. Ela participará
ativamente da Revolução Francesa, dando nome a um movimento político, os
Girondinos.
O desenvolvimento de cidades concorrentes, Nantes e Rennes, na Bretanha,
Montpellier e Toulouse, no Languedoc, dará origem, no século XX, à criação de novas
regiões em torno de cada uma dessas cidades que se tornaram grandes metrópoles.
As aldeias
Os camponeses, que compõem a grande maioria da população, raramente lidam com a
autoridade real. O padre anuncia as notícias oficiais e mantém o status civil. O Senhor
faz justiça. A assembleia dos principais proprietários distribui o imposto e recruta o
mestre da escola.
Em relação à colecta de impostos, a assembleia da aldeia designa, todos os anos, as
pessoas que se encarregam de cobrar o valor do imposto devido pela comunidade. Esta
responsabilidade é temida, porque as pessoas designadas correm o risco não só de atrair
inimizades na distribuição do imposto, mas também de ter que avançar as quantias não
pagas, sob a ameaça de sanções que podem ir até prisão.
Os agricultores possuem terras, equipamentos para agricultura e pecuária. A principal
actividade fabril da época era a fabricação de têxteis, que muitas vezes é difundida pelo
campo, organizada por empreendedores que fornecem a matéria-prima e, depois as
levam para a cidade para acabamento e comercialização.
Mobilidade e relações sociais
As três ordens do Ancien Régime não são imutáveis. Os sectores mais modestos da
população podem entrar no clero e desfrutar de seus privilégios: o clero está aberto a
outras ordens, desde que tenham vocação e adoptem os desígnios da castidade. Uma
fracção dos leigos é anticlerical, culpando a Igreja pelo seu obscurantismo e pelas
conexões do alto clero com a nobreza.
Os burgueses procuram imitar o modo de vida da nobreza, principalmente no que toca a
opulência. Certos cargos municipais permitem a sua integração na nobreza conhecida

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como "cloche". Ao deterem estes cargos, os ofícios, eles elevam-se ao nível de uma
nobreza de toga. O rei irá procuras nessa venda de cargos o lucro ao passo que vai
permitir, pelo mecanismo do paulette, a criação de dinastias de oficiais que podem
escapar de seu controle. A secretaria do rei é o cargo mais apetecível, por isso muito
procurada. A partir da segunda metade do século XVIII, os cargos militares também
permitem o acesso à nobreza. Estes novatos na alta sociedade são vistos com um mau
pressentimento pela velha nobreza.
A Venalidade dos Ofícios
A venalidade dos ofícios refere-se ao sistema que esteve vigente durante o Ancién
Régime, no qual as funções e encargos são concedidos consoante um pagamento. Em
outras palavras, a pessoa que deseja ocupar uma posição deve pagar por ela uma certa
quantia de dinheiro. Este sistema opõe-se a outros sistemas de alocação de encargos,
incluindo mérito, antiguidade, etc.
Roland Mousnier, autor da obra “A venalidade dos ofícios sobre Henrique VI e Luís
XIII” afirma que na sociedade do Ancien Régime, um ofício é "aquele ofício de estado,
uma parcela de autoridade pública, de justiça, de finanças ou de administração,
comprada pelas famílias abastadas do reino". Uma síntese, por assim dizer, poder
público e propriedade privada .
Desenvolveu-se amplamente a partir dos reinados de Luís XII e Francisco I. O primeiro
praticou amplamente enquanto proibia em 1493. Em 1520, o segundo funda o escritório
de festas casuais, especificamente responsável pela venda de escritórios. Entre 1515,
início do reinado de Francisco I e 1610, fim do reinado de Henrique IV, os escritórios
venais aumentaram de 4-5.000 para cerca de 25.000. A herança dos encargos foi
institucionalizada pelo Paulette, um imposto estabelecido em 1604 e cujo pagamento
garantiu a transmissão do encargo, por sucessão ou por venda.
Foi durante o reinado de Luís XIV que o sistema atingiu o auge de sua importância,
apesar das tentativas de Colbert de reduzi-lo. Em 1664, eles são estimados em 45.780,
tomou uma escala sem precedentes. Em 1618, a receita da venalidade das cobranças
fornece 40% da receita do Tesouro, sendo que só será abolida com a Assembleia
Nacional Constituinte.
Aqueles que compraram sua carga não são mais dependentes do rei e deixam a
pirâmide administrativa, cujo rei é o topo e no qual eles devem ser aninhados. O rei não
tem poder sobre eles. O monarca, ao formalizar a venalidade, perde a gestão da
administração. Além disso, o rei vai ficando financeiramente ligado à venalidade e
devido a isso multiplica as distribuição de cargos para aumentar sua renda e não para
apressar os que adquiriram o cargo.
Causas da Revolução
A Fronda, ou as Frondas, foi uma série de guerras civis ocorridas na França entre 1648
e 1653, em plena Guerra Franco-Espanhola (1635-1659), e alguns anos após a Guerra
dos Trinta Anos. Manifestação palpável da decomposição do Estado e da sociedade
francesa, no seio de uma conjuntura económica deprimida, e com graves problemas de
organização política e coesão social sem solução, tinha, por objetivos iniciais, limitar o

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poder real e discutir abusos cometidos pela Corte. Ainda mais a Fronda por si foi uma
revolta da nobreza contra a “invasão” da burguesia nos cargos de Estado, permintindo
notar no horizonte os primórdios da Revolução Francesa.
A somar-se a isso, existe, a partir do séc XVIII, uma população melhor nutrida está
mais inclinada a protestos políticos. Os direitos feudais são menos aceitos pelos
camponeses, porque os senhores já não desempenham seu antigo papel de protetores,
demonstrando a fragilidade da velha nobreza.
A Revolução Francesa marcará o advento da sociedade burguesa e capitalista na
história de França. A sua característica essencial consistirá em ter realizado a unidade
do país através da destruição do regime senhorial e das ordens feudais privilegiadas.

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Bibliografia

TOCQUEVILLE, Alexis de – O Antigo Regime e a Revolução, Editorial Fragmentos,


Lisboa, 1989
ELIAS, Norbert – A Sociedade de Corte, Editorial Estampa, Lisboa, 1987
MOUSNIER, Roland – La vénalité des offices sous Henri IV et Louis XIII, Géneve
Mégariotis, 1979
COBBAN, Alfred – A Interpertação Social da Revolução Francesa, Gradiva, Lisboa,
1988
MANDROU, Robert – La France aux XVII et XVIII siécles, Presses Universitaires de
France, Paris, 1970
VOVELLE, Michel – A Mentalidade Revolucionária: Sociedade e Mentalidades na
Revolução Francesa, Edições Salamandra, Lisboa, 1985
SOBOUL, Albert – Revolução Francesa, Teorema, Lisboa, 1988
 https://plataforma.elearning.ulisboa.pt/file.php/8007/ml-garciacruz-CD-HMES-
2018-Livro.pdf , pp. 80-83.

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