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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

KLAYTON ANDRADE DE SOUZA

A SEPARAÇÃO DOS PODERES NO BRASIL: UMA ANÁLISE COMPARATIVA


ENTRE AS CONSTITUIÇÕES DE 1824 E 1988.

Palhoça
2021
KLAYTON ANDRADE DE SOUZA

A SEPARAÇÃO DOS PODERES NO BRASIL: UMA ANÁLISE COMPARATIVA


ENTRE AS CONSTITUIÇÕES DE 1824 E 1988.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Graduação em Direito, da
Universidade do Sul de Santa Catarina, como
requisito parcial para obtenção do título de
Bacharel em Direito.

Orientador: Profª. Andréia Catine Cosme, Msc.

Palhoça
2021
KLAYTON ANDRADE DE SOUZA

A SEPARAÇÃO DOS PODERES NO BRASIL: UMA ANÁLISE COMPARATIVA


ENTRE AS CONSTITUIÇÕES DE 1824 E 1988.

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi


julgado adequado à obtenção do título de
Bacharel em Direito e aprovado em sua forma
final pelo Curso de Graduação em Direito, da
Universidade do Sul de Santa Catarina.

Palhoça, 10 de dezembro de 2021.

______________________________________________________
Profª. Andréia Catine Cosme, Msc.
Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________
Profª. Dagliê Colaço, Esp.
Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________
Prof. Dênis de Souza Luiz, Esp.
Universidade do Sul de Santa Catarina
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

A SEPARAÇÃO DOS PODERES NO BRASIL: UMA ANÁLISE COMPARATIVA


ENTRE AS CONSTITUIÇÕES DE 1824 E 1988.

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de
Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de
todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso.
Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso
de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça, 10 de dezembro de 2021

____________________________________
KLAYTON ANDRADE DE SOUZA
Dedico esse trabalho a Deus, por ter me dado
força para superar as adversidades e chegar a
esse momento tão gratificante.
AGRADECIMENTOS

Encerrar o período de 5 anos com esse trabalho é um dos momentos mais gratificantes
da minha vida. Entretanto, nada disso seria possível sem que houvesse pessoas tão especiais ao
longo dessa jornada, pessoas essas que tentarei citar e agradecer.
À professora e orientadora Andréia Catine Cosme, primeiramente por ter aceitado o
convite para me orientar, também por toda sua dedicação e zelo nesse período, o seu
conhecimento passado ao longo do curso é algo que ficará marcado em mim, a escolha do tema
no trabalho teve grande contribuição de suas aulas esplendorosas lecionadas de forma magistral.
Por tudo isso, quero deixar meus sentimentos de gratidão.
A todos os professores, que estiveram comigo no decorrer da graduação, sem dúvida
alguma foi um período de adversidades, principalmente pela pandemia que atingiu o mundo.
Todavia, isso não impediu o comprometimento com o ensino dos alunos.
Aos meus colegas de turma, que continuarão fazendo parte da minha vida. Não há
dúvida que a presença de cada um nessa jornada contribuiu em diversas áreas do conhecimento
e do crescimento pessoal, seria injusto citar o nome de amigos que fiz na universidade, ao
mesmo tempo, leviano, se deixasse de mencionar o nome de Mateus Felippe de Souza, amigo
esse que morreu no decorrer do curso, por causa de complicações hospitalares causadas pela
COVID-19. Seus exemplos de luta, perseverança e alegria impactaram a todos que tiveram o
prazer de conhecê-lo.
Ao meu pai Reginaldo, minha mãe Elaine e meu irmão Wellyngton, por todo apoio
dado, não apenas no decorrer do curso, mas ao longo da vida, espero transmitir parte dos
ensinamentos que me deram. Não há palavras que expressem a gratidão que tenho por fazer
parte de uma família tão maravilhosa, que me ensinou valores inenarráveis. Minhas maiores
referências sempre estiveram dentro do meu lar, e isso se deve a vocês.
Por fim, agradeço a Deus, pois somente ele para proporcionar pessoas tão especiais em
minha vida, evidentemente que não sou merecedor de nada disso, e a única explicação é sua
misericórdia, que dura para sempre.
“Não há nada de errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente
serão governados por aqueles que gostam”. Platão.
RESUMO

A presente pesquisa tem por objetivo a análise da separação dos poderes, tanto no aspecto
teórico, por meio de pensadores como Aristóteles, Platão e Montesquieu, bem como no sentido
prático, vendo a aplicabilidade da teoria na primeira e última constituição brasileira (1824 e
1988, respectivamente). Por conseguinte, os métodos de procedimentos utilizados serão
diversificados, estando inserido ao longo do trabalho os métodos dedutivo, histórico,
bibliográfico e documental, ou seja, o vasto sistema de pesquisa permitirá a análise do formato
geral ao específico, amparado na história brasileira através de fontes primárias e secundárias.
Ademais, a pesquisa contará com uma abordagem qualitativa, analisando de forma contextual
os acontecimentos históricos nacionais, inclusive por meio do procedimento comparativo, entre
as Constituições de 1824 e 1988. A pesquisa também seguirá o padrão monográfico, onde
poderá seguir de parâmetro para embasamentos futuros. A conclusão adquirida com o trabalho
revela a importância da tripartição dos poderes em um Estado democrático, além da forma como
o sistema de pesos e contrapesos ocorre de forma descritiva nas constituições analisadas.

Palavras-chave: Separação dos Poderes. Constituição de 1824. Constituição Federal de 1988.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 9
2 SEPARAÇÃO DOS PODERES ...................................................................................... 11
2.1 ORIGEM DA SEPARAÇÃO DE PODERES ................................................................. 11
2.2 A SEPARAÇÃO DOS PODERES EM MONTESQUIEU ............................................. 12
2.3 AS FORMAS DE GOVERNO EM MONTESQUIEU ................................................... 16
3 CONSTITUIÇÃO MONARQUICA DE 1824................................................................ 19
3.1 CONTEXTO HISTÓRICO PRÉ-ASSEMBLEIA CONSTITUINTE E CONSTITUIÇÃO
DE 1824 .................................................................................................................................... 19
3.2 ASSEMBLEIA CONSTITUINTE DE 1823 ................................................................... 21
3.2.1 Confederação do Equador .......................................................................................... 22
3.3 ASPECTOS GERAIS DA CONSTITUIÇÃO IMPERIAL ............................................. 23
3.4 A DIVISÃO DOS PODERES NA CARTA MAGNA DE 1824 ..................................... 26
4 CONSTITUIÇÃO CIDADÃ DE 1988 ............................................................................ 31
4.1 CONTEXTO HISTÓRICO PRÉ-ASSEMBLEIA CONSTITUINTE E CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988 ................................................................................................................. 31
4.2 COMISSÃO AFONSO ARINOS .................................................................................... 34
4.3 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 .......................................................................... 36
4.3.1 Aspectos gerais da Constituição de 1988 ................................................................... 38
4.4 A DIVISÃO DOS PODERES NA CONSTITUIÇÃO CIDADÃ .................................... 41
5 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 49
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 51
9

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho consiste na separação dos poderes no Brasil através de uma análise
comparativa entre as Constituições de 1824 e 1988, mostrando como o respeito às competências
entre poderes implica em um Estado Democrático consistente.
A escolha do tema foi feita com base em um interesse particular do pesquisador em
relação à matéria de teoria geral do estado, matéria essa estudada na primeira fase do curso de
direito, atrelado a isso, outro grande fator foram os estudos iniciados por ele em janeiro de 2021
para concurso público, onde uma das matérias do edital previa a história do Brasil.
A junção dos dois pontos levou à formação do tema, que, por sinal, é importantíssimo
para entender o perigo do enfraquecimento das instituições em detrimento de outra.
Tendo em vista a motivação para a escolha do tema, o desenvolvimento da presente
pesquisa foi formulado o seguinte questionamento: Como é entendida a separação dos poderes
nas Constituições brasileiras de 1824 e 1988?
O trabalho utiliza o método dedutivo, partindo do aspecto geral e chegando ao
minucioso a partir de uma construção lógica. A abordagem tem o cunho qualitativo, onde os fatos
serão analisados de forma exegética, levando em conta a situação em que se passaram. A
metodologia histórica também é fundamental para a melhor compreensão do tema, já que a lei
seca, por si só, não trará luz ao tema abordado. Com a finalidade da melhor conclusão sobre o
tema, as Constituições de 1824 e 1988 é objetos de estudo, assim, o procedimento comparativo
possui papel indispensável no trabalho. A pesquisa tem caráter monográfica, método esse que
parte do princípio de que o estudo de um caso em profundidade pode ser considerado
representativo de muitos outros ou mesmo de todos os casos semelhantes. A confecção do
presente trabalho não deixa de contar com dados secundários, método esse conhecido como
bibliográfico.
Por último, a pesquisa documental é imprescindível. Esse método de pesquisa muito e
se assemelha à pesquisa bibliográfica. A diferença essencial entre ambas está na natureza das
fontes, enquanto a bibliográfica utiliza fundamentalmente das contribuições de diversos autores,
a documental vale-se de materiais que não receberam, ainda, um tratamento analítico, podendo
ser reelaboradas de acordo com os objetos da pesquisa.
O presente trabalho é estruturado em cinco capítulos: introdução, três capítulos de
desenvolvimento e conclusão. O segundo capítulo aborda a origem da separação dos poderes,
passando por alguns pensadores e chegando a Montesquieu, descrevendo, por meio de seus
escritos, a visão que ele tinha sobre as formas de governo e a separação deles.
10

O terceiro capítulo apresenta todo o enredo da Constituição Monárquica de 1824,


apresentando o contexto histórico em que ocorreu, além da Assembleia Constituinte dissolvida
e da outorga do texto constitucional por D. Pedro I, em 1824, ficando a separação entre os
poderes divididas de forma peculiar.
O quarto capítulo traz a Constituição Federal de 1988, os fatos históricos que permearam
a história brasileira, como o regime ditatorial (1964-1985), eleições, a Comissão Afonso Arinos,
além da própria Constituição de 1988, dividida entre aspectos gerais e a forma como os poderes
são divididos.
Por fim, encerra-se com a conclusão, em que é apresentado um panorama geral sobre a
divisão dos poderes no Brasil.
11

2 SEPARAÇÃO DOS PODERES

Neste capítulo serão apresentados registros e conceitos históricos sobre a divisão dos
poderes ao longo da história, a forma como alguns pensadores viam tal assunto, além da
constante evolução que esse processo de pensamento passou ao logo dos tempos, partindo da
Idade Antiga, por meio de Aristóteles, e chegando à Idade Moderna, através de John Locke e
Montesquieu.
Evidente que esses são alguns dos pensadores que falaram da separação dos poderes em
alguma de suas obras, mas ao longo da história houve diversos outros; importante também
salientar que Montesquieu recebe certo destaque nesse capítulo, já que ele é o responsável por
consolidar a teoria tripartite, além de abordar de forma minuciosa as consequências de excessos
nos governos monárquicos e republicanos.

2.1 ORIGEM DA SEPARAÇÃO DE PODERES

Como bem pontua Ferreira Filho (2015, p.67) a origem da separação dos poderes é, de
certa forma, controversa. Por determinados teóricos, ela já pode ser encontrada na antiguidade,
outros somente a veem na modernidade. Há os que afirmam ser, naquela idade, obra de
Aristóteles, enquanto não faltam os que a entendem um arranjo empírico que este sistematizou.
Sustentam numerosos juristas que surgiu em tempos modernos, tendo sido formulada pela
primeira vez por Montesquieu, no Espírito das Leis.
Para Aristóteles (1991, p.93), filósofo grego nascido em 384 a.C. em sua obra A
Política, o governo é o exercício do poder supremo do Estado; nessa mesma obra, pontuaram-
se três tipos de atos estatais de forma isolada, sendo eles o ato deliberativo, que é “aquele que
delibera sobre os negócios do Estado, a Assembleia tem a competência sobre a paz e a guerra,
realizar alianças ou rompê-las, fazer as leis e suprimi-las, decretar a pena de morte, de
banimento e de confisco, assim como prestar contas” (PELICIONI, 2006, p.3); o executivo, que
consiste em “todas as magistraturas ou poderes constituídos, isto é, aqueles de que o Estado
precisa para agir, suas atribuições e a maneira de satisfazê-las” (ARISTÓTELES, 1991, p.113);
por fim, o jurisdicional, mostrando oito espécies de tribunais e juízes (ARISTÓTELES, 1991,
p.125-127).
Outro nome de extrema relevância em tal assunto é John Locke, expoente da filosofia
inglesa do século XVII, nasceu em Wrington, na Inglaterra, em 1632. Suas obras principais são
12

O Primeiro Tratado Sobre o Governo Civil, O Segundo Tratado Sobre o Governo Civil, Ensaio
Sobre o Intelecto Humano e Cartas Sobre a Tolerância Religiosa. (MONDIM, 1982, p. 102).
Apesar de estar entre os três principais nomes – ao lado de Thomas Hobbes e Rousseau
– quando o assunto é contrato social/estado de natureza, afirma, em sua teoria, que no estado
de natureza, cada um tem “o poder executivo da lei da natureza” e cada homem é juiz em causa
própria. Isso produz confusão e desordem, e a solução para esse impasse é o governo civil.
(LOCKE, 1994, p. 89).
Contudo, quando o assunto é separação dos poderes, em seu livro Segundo Tratado
Sobre o Governo Civil, publicado em 1689, no capítulo XII, Locke garante que há três poderes
que se convertem em dois: o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Federativo. A
competência do Poder Federativo é de administrar a segurança e o interesse público externo e
a competência do Poder Executivo é a da execução das leis internas (LOCKE, 1994, p. 171).
No entanto, posteriormente, afirma que esses dois Poderes estão “quase sempre unidos” e
embora os Poderes Executivo e Federativo sejam distintos em si, “dificilmente devem ser
separados e colocados ao mesmo tempo nas mãos de pessoas distintas”, uma vez que “submeter
a força pública a comandos diferentes” causaria “desordem e ruína”. (LOCKE, 1994, p. 171-
172).
Quando se trata de separação de poderes, diversos teóricos abordaram tal assunto em
perspectivas diferentes; todavia, passou a ter grande relevância na idade moderna, com John
Locke (já mencionado), Maquiavel, no Século XVI, em sua obra O Príncipe (2007) e
Montesquieu, o grande teórico da teoria tripartite, em sua obra O Espírito das Leis, publicado
pela primeira vez em 1748.
Realizado o breve apanhado histórico sobre a evolução da separação dos poderes ao
longo da história, o próximo item apresentará um pouco da história pessoal de Montesquieu,
bem como sua principal obra, responsável pela consolidação da teoria tripartite, como
conhecemos hoje.

2.2 A SEPARAÇÃO DOS PODERES EM MONTESQUIEU

Charles-Louis de Secodatt ou Barão de la Brède e de Montesquieu (1689-1755), foi um


aristocrata pertencente às famílias nobres francesas e um dos teóricos mais influentes da sua
época, escrevendo várias obras que se tornariam célebres.
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O contexto histórico que o rodeou foi determinante para as suas teorias, pois é possível
verificar nestas o seu cariz iluminista. Entre suas funções, ocupou o cargo de Presidente do
Parlamento de Bordeaux, para atuar em questões judiciais e administrativas da região. Durante
11 anos ele esteve envolvido em julgamentos e aplicações de sentenças, mas acabou abdicando
posteriormente, para se dedicar inteiramente à pesquisa e teorização, acarretando a publicação
das mesmas. Possui entre suas obras mais célebres Cartas Persas, de 1721 e O Espírito das Leis,
de 1748. (LARA, 2015).
Embora o tema da separação dos poderes tenha sido abordado por outros teóricos que
antecederam Montesquieu, a corrente majoritária entende que é com ele, por meio de seu livro
O Espírito das Leis, que efetivamente nasce a doutrina da separação dos poderes, onde marca a
ideia de uma divisão funcional do Poder em vista da liberdade e segurança individual. No
capítulo VI – Da Constituição da Inglaterra, do Livro XI dessa obra, intitulado – Das leis que
formam a liberdade política em sua relação com a constituição –, claramente expõe-se a ideia
de que três são as funções que se identificam no Estado: a de estabelecer leis – função
legislativa; a de executar – função executiva; e a de julgar – função judiciária. Funções cujos
exercícios devem caber a Poderes diferentes, como condição da liberdade e da segurança dos
seres humanos. De fato, essa separação produziria um sistema de freios e contrapesos, um
sistema de equilíbrio, em que o poder deteria o (outro) poder, impedindo o abuso. (FERREIRA
FILHO, 2015, p. 68).
Nas palavras de Montesquieu (2020, p. 229, grifo nosso) “é uma experiência eterna a de
que todo homem que tem poder é levado a abusar dele; ele vai em frente até encontrar limites.
Quem diria! A própria virtude precisa de limites”, e, em uma das suas mais célebres falas, ele
conclui “para que não se possa abusar do poder, é preciso que, pela disposição das coisas, o
poder detenha o poder”.
Importante ressaltar que, para ele, havia três formas de governo, sendo elas a
republicana, monárquica e déspota, em suas palavras:

o governo republicano é aquele em que o corpo do povo, ou somente parte do povo,


tem o poder soberano; o monárquico, aquele em que só um governa, mas por leis fixas
e estabelecidas; ao passo que no despótico um só, sem leis e sem regra, tudo
determinado por seus caprichos. (MONTESQUIEU, 2020, p.55).

Como no despotismo o detentor do poder não se submete nem mesmo as leis que ele
mesmo cria, não teria como falar em uma divisão de poderes, “o déspota não tem regra
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nenhuma, e os seus caprichos destroem todos os outros”. (MONTESQUIEU, 2020, p.77),


portanto, só se poderia falar em repartição de poderes na monarquia e na república.
Ademais, Montesquieu é categórico em diferenciar a natureza e o princípio de cada
governo, segundo ele “natureza é o que faz ser tal”, por exemplo, no governo monárquico, sua
natureza é que o príncipe tenha o poder soberano, mas que se submeta as leis constituídas, já o
princípio é “o que faz agir”. (MONTESQUIEU, 2020, p.77). Na monarquia, seu princípio é a
honra; na república, a virtude; no despotismo, o medo.
Montesquieu não se restringe apenas em apresentar a separação dos três poderes, mas
expõe as consequências que o Estado se submete quando a mesma pessoa exerce mais de uma
função:

Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura o poder é reunido ao


poder executivo, não há liberdade; porque é de temer que o mesmo monarca ou o
mesmo senado faça leis tirânicas, para executá-las tiranicamente.
Tampouco há liberdade se o poder de julgar não for separado do poder legislativo e
executivo. Se estiver unido ao poder legislativo será arbitrário o poder sobre a vida e
a liberdade dos cidadãos; pois o juiz será legislador. Se estiver unido ao poder
executivo, o juiz poderá ter a força de um opressor. (MONTESQUIEU, 2020, p.230).

Tendo em vista as consequências ocasionadas pelo exercício de duas funções na mão da


mesma pessoa, quando esse mesmo governante exerce todas elas de forma conjunta, não
poderia resultar em outra coisa, senão o poder de “devastar o Estado com suas vontades gerais,
e, como tem também o poder de julgar, pode destruir qualquer cidadão com suas vontades
particulares”. (MONTESQUIEU, 2020, p.231).
Como bem pontua Juliana Santos Guedes (2007, p.5) “precisa-se, pois, de um
mecanismo eficiente que impeça o poder exercido sem limites. Por isso, faz-se necessário a
separação dos poderes, para que seja o poder descentralizado e, dessa forma, alcançar uma
forma de governo ideal”.
É por esse motivo que Montesquieu defende que o poder legislativo deveria estar
submetido à escolha do povo, segundo ele:

Como num estado livre todo homem que se considera ter uma alma livre deve ser
governado por si mesmo, o povo como um todo deveria ter o poder legislativo; mas,
como isso é impossível nos grandes estados e está sujeito a muitos inconvenientes nos
pequenos, é preciso que o povo faça por meio de seus representantes tudo o que não
pode fazer por si mesmo.
Conhecemos muito melhor as necessidades da nossa cidade do que as das outras
cidades; e avaliamos melhor a capacidade dos nossos vizinhos do que a de nossos
outros compatriotas. Os membros do corpo legislativo, portanto, não devem ser
tirados em geral do corpo da nação; mas convém que em cada um dos principais
lugares os habitantes escolham um representante. (MONTESQUIEU, 2020, p.233)
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Embora Montesquieu defendesse um legislativo representativo, ele não pensava da


mesma forma quando se tratava do poder executivo, para Montesquieu, a monarquia era a
melhor forma de governo, pois esse poder é melhor exercido por uma única pessoa, já que
precisa tomar decisões imediatas. (MONTESQUIEU, 2020, p.235). No entanto, o poder
executivo não teria poder para agir de forma irrestrita, visto que, “Se num Estado livre, porém,
o poder legislativo não deve ter o direito de deter o poder executivo, tem o direito e deve ter a
faculdade de examinar de que maneira as leis que fez foram executadas; e essa é a vantagem.
(MONTESQUIEU, 2020, p.237).
Uma palavra que evidencia ainda mais a relação de divisão de poderes, principalmente
no direito, é a legitimidade, pois, quando falamos dela, vem de imediato a ideia de órgão
competente para desempenhar determinada função, nas palavras de Eduardo Henrique Cortese
Magalhães (2019, p.18):

As legitimidades dos poderes são de extrema importância, para que eles possam atuar
nas suas respectivas áreas, com certa liberdade, para poderem tomar as melhores
decisões para as diversas pautas de responsabilidade de cada um dos poderes, atuando
de forma correta, como diz na Carta Magna, não podendo ter interposição dos poderes
sobre os poderes. Já que eles precisam responder por suas respectivas competências,
não sendo responsáveis, por matérias de fora das suas áreas de atuação.

Importante frisar que Montesquieu não defendia apenas a independência entre os


poderes, mas a liberdade entre eles, permitindo que um poder confrontasse o outro, atuando
como instâncias moderadoras, impedindo abusos, principalmente por parte do executivo.
(MAGALHÃES, 2019, p.20).
De forma inversa podemos muito bem comparar essa relação Divisão de Poderes versus
Despotismo, talvez o exemplo mais clássico seja o do Rei Luis XIV, o monarca que reinou pelo
maior período de tempo, entre os anos de 1643 até 1715, ele é a figura responsável por
pronunciar uma das frases mais emblemáticas quando se trata de patrimonialismo, já que é de
sua autoria a afirmação “L´etat c´est moi" (O Estado sou eu), traduzindo claramente o poder
ilimitado que se encontrava nas mãos dos monarcas. É por meio de Luis XIV que podemos
perceber de forma clara como o absolutismo teve seu grande período de reinado, já que era por
meio dele que se exercia o poder legislativo, executivo e judiciário. (ALMEIDA, 2017, p.66).
Diante de tal autoritarismo, qualquer ideia de transferir poderes a outras instituições
soaria de forma absurda, afinal, o rei representava a autoridade divina na terra (principalmente
na ideia do rei Luis XIV).
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É justamente por isso que a divisão de poderes vai em sentido reverso ao despotismo,
como bem pontua Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2015, p. 69):

O objetivo da separação dos poderes é o estabelecimento de um governo limitado,


moderado, respeitoso dos direitos fundamentais e apto à realização do interesse geral.
Por isso, como está no art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de
1789, é ela inerente à (verdadeira) Constituição, portanto, imprescindível ao
constitucionalismo.

Montesquieu é o principal responsável pela teoria tripartite, e é por meio dele que, no
ocidente, não conseguimos falar em um Estado democrático sem a divisão de poderes bem
definidas, estabelecendo direitos e deveres para cada um dos poderes, tal teoria já transcorreu
período superior a duas décadas, e o passar do tempo só tem a tornado mais indispensável, pois,
à medida que, mesmo em países que adotam essa teoria, determinado poder começa a se
sobrepor ao outro, os abusos acabam sendo consequências quase que imediatas, visto que um
poder passa a assumir funções não compatíveis com suas atribuições.
Realizada a descrição da teoria tripartite escrita por Montesquieu, no próximo capítulo
será apresentada as formas de governos também descritas por ele, afinal, elas estão intimamente
ligadas à teoria tripartite, ademais, o assunto se relaciona com a importância em analisar
determinado estado de forma minuciosa, para depois caracterizá-lo, tendo em vista que os
governos não costumam oficializar que seu país vive em uma ditadura, sendo assim, tal
conclusão só pode ser feita olhando as medidas adotadas pelo líder.

2.3 AS FORMAS DE GOVERNO EM MONTESQUIEU

Quando se fala em um Estado Democrático de Direito em que há o respeito às liberdades


individuais dos cidadãos, automaticamente deveria vir à mente pesos e contrapesos que
equiparam essa relação entre os poderes que compõe o Estado. Não há que se falar em defesa
de um Estado democrático de direito sem que se fale da defesa de instituições fortes e
autônomas.
Nas palavras de Dirley Cunha Júnior:

os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário sejam desempenhados por órgãos


diferentes, “de maneira que, sem nenhum usurpar as funções dos outros, possa cada
qual impedir que os restantes exorbitem da sua esfera própria de ação”. Só assim é
possível o controle do poder pelo poder, só assim é possível a plena realização da
separação de Poderes, que se traduz – sintetizamos – na separação funcional (cada
função deve ser confiada a cada órgão da maneira mais especializada possível) e na
separação orgânica (os órgãos da soberania devem ter independência mútua e devem
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estar, em tudo, em idêntico pé de igualdade). É essa a essência da doutrina da


separação de Poderes. (CUNHA JÚNIOR, 2010, p. 522).

É importante saber que Montesquieu baseia o governo republicano sob a égide da


virtude, sendo assim, a aplicabilidade da lei torna-se condição sine com a non para a sua
eficácia. Para ele, quando, em um governo popular, as leis deixam de ser executadas, a única
explicação para isso se dá pela corrupção, e, estando o Estado nessa situação, a consequência é
a perdição. (MONTESQUIEU, 2020, p.70).
A defesa de um país democrático vai além da defesa de tripartição dos poderes, na
realidade, isso mostra a saúde democrática de um estado; todavia, ela acaba sendo a causa de
outros fatores, os pontos que entornam a separação dos poderes mostram muito a eficiência em
que esse modelo terá em determinado país. (MONTESQUIEU, 2020, p.34).
A virtude narrada por Montesquieu não se trata do tipo de virtude habitualmente
comentada, trata-se, efetivamente, da quebra do chamado patrimonialismo, ou seja, a
consciência de que a apropriação daquilo que é público para benefício próprio (privado) é um
retrocesso, enquanto menos os poderes do Estado souberem separar os interesses nacionais dos
individuais, mais desajustes estão sujeitos a ocorrer no modelo tripartite; portanto, a virtude
consiste no amor ao bem público acima das paixões e interesses pessoais. É justamente por isso
que Montesquieu acha o republicanismo mais frágil que a monarquia, pois depende das pessoas
e, por isso, é permanentemente ameaçada pela desigualdade e a corrupção. Evidentemente que
a monarquia também possui riscos, segundo Montesquieu, já que o monarca pode corromper a
nobreza; todavia, colocando os pontos negativos de cada formato de governo, o modelo
monárquico acaba superando o republicano, passando uma segurança superior.
(MONTESQUIEU, 2020, p.34).
Já se tratando do despotismo, Montesquieu descreve como um governo insustentável,
especificamente por ser baseado no medo, e por isso, as instituições que podem preservá-lo
destroem a própria paixão que o sustenta. (MONTESQUIEU, 2020, p.34).
Na realidade, não é observando determinada forma de governo que um país diz adotar
que definirá isso, é preciso uma análise minuciosa, pois até mesmo as ditaduras dizem governar
pelo povo. Se, em um modelo tripartite, os pesos e contrapesos não funcionam adequadamente,
esse modelo já está quebrado em sua essência. (MONTESQUIEU, 2020, p.33).
É claro que um governo que se diz democrático procura colocar em prática o seu
autoritarismo da forma mais sutil possível, Montesquieu relata em seu livro uma história
interessante nesse aspecto relacionada ao império romano, segundo ele:
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O povo romano ficou indignado com Augusto, por causa de certas leis muito duras
que fizera: mas, tão logo ele trouxe de volta o comediante Pílades, que as facções
haviam expulsado da cidade, o descontentamento cessou. Tal povo sentia mais
vivamente a tirania quando se expulsava um palhaço do que quando lhe tiravam todas
as leis. (MONTESQUIEU, 2020, p.406-407).

Essa metodologia é visível ao longo da história, ações populistas feitas por parte dos
detentores do poder com a finalidade de alcançar fins escusos e antidemocráticos, que tem como
fim vitimar o povo.
Nesse capítulo, foi apresentado um panorama inicial sobre a origem da separação dos
poderes, tendo em vista sua evolução ao longo da história, iniciando na Idade Antiga, por meio
de Aristóteles, e chegando à Idade Moderna, com John Locke, Maquiavel e Montesquieu,
evidente que o capítulo não trouxe todos os pensadores que abordaram o tema, mas com certeza
os pensadores mencionados no capítulo estão entre os principais nomes relacionados ao
assunto.
A partir da obra O Espírito das Leis foi apresentado o pensamento de Montesquieu
referente à tripartição dos poderes, pois através dele que tal pensamento se consolidou, tendo
em vista que sua obra pontuou de forma cirúrgica a divisão entre poder legislativo, executivo e
judiciário, expondo que cada poder deveria ter atribuições e deveres, em um formato onde o
poder limitaria o próprio poder.
Por fim, fez-se um apanhado sobre as formas de governo que Montesquieu acreditava
existir, sendo elas a república, tendo como base a virtude, a monarquia, tendo como base a
honra, e o despotismo, tendo como base o medo.
Assim, o próximo capítulo apresentará a primeira constituição brasileira (1824) e a
forma como ocorria a divisão dos poderes a partir dela, inclusive apresentando os artigos que
abordavam o assunto.
19

3 CONSTITUIÇÃO MONARQUICA DE 1824

Esse capítulo abordará os fatores históricos que antecederam a Constituição de 1824, a


situação em que se deu a outorga do texto e o conteúdo da primeira carta magna brasileira.
A fim de aprofundar o exposto, na próxima seção serão apresentados fatores
fundamentais que implicaram a outorga do texto constitucional por D. Pedro I.

3.1 CONTEXTO HISTÓRICO PRÉ-ASSEMBLEIA CONSTITUINTE E


CONSTITUIÇÃO DE 1824

No ano de 1818, após a morte de Dona Maria I, a louca, João foi coroado rei de Portugal
com o título de João VI. Entretanto, permaneceu na colônia brasileira, acarretando insatisfação
dos portugueses a ponto de ameaçarem, no sentido de: ou João VI voltava para Portugal e jurava
sobre uma constituição, ou os portugueses escolheriam outro rei. Esse episódio ficou
popularmente conhecido como Rebelião Liberal do Porto, ocorrida em 1820.
(VASCONCELLOS, 2020, p. 4).
Importante pontuar que durante todo o período colonial, que na prática se encerrou em
1808, com a chegada da família real no Brasil colônia, não vigorou nenhuma constituição nem
na Metrópole (Portugal) nem na colônia (Brasil). (VILLA, 2011, p. 13).
Tendo em vista toda situação, João VI regressa a Portugal em 1821; todavia, D. Pedro,
filho de João VI, permanece na colônia como príncipe regente, insatisfeitos, os portugueses
exigiram o retorno do filho do rei, com a finalidade de que ele terminasse os estudos; contudo,
em 9 de janeiro de 1822 ocorre um fato histórico memorável, um documento com mais de 8
mil assinaturas pedia que D. Pedro não retornasse a Portugal, esse episódio ficou denominado
Dia do Fico, tal fato evidenciou que a proclamação da república ocorreria em questão de tempo.
(VASCONCELLOS, 2020, p. 4).
Em maio de 1822, o príncipe regente recebeu o título de Protetor e Defensor Perpétuo
do Brasil, concedido pelo senado da Câmara do Rio de Janeiro. Em 3 de junho do mesmo ano,
D. Pedro I expediu um decreto convocando uma assembleia constituinte, não estavam claras
quais eram suas atribuições, já que em Portugal estava em andamento a redação de uma nova
constituição, que serviria para todo Império, incluindo obviamente o Brasil. (VILLA, 2011, p.
14).
Com a independência em 7 de setembro de 1822, D. Pedro I, agora imperador, teve que
resolver diversos levantes militares em províncias que se mantinham fiéis a Portugal. A medida
20

mais absurda tomada por ele foi a contratação de mercenários ingleses para assegurar o controle
dos conflitos internos. (VASCONCELLOS, 2020, p. 4).
Como é sabido, há alguns pontos importantes para a caracterização de um Estado, sendo
eles a soberania, território e povo; no entanto, o reconhecimento é algo fundamental para isso
(algo que exemplifica muito bem é a votação da ONU, ocorrida em 1947, em que o brasileiro
Oswaldo Aranha presidiu a sessão, que determinou a criação do Estado de Israel), sendo assim,
para que o Brasil tivesse condições de estabelecer um Estado autônomo e soberano, era preciso
articular o reconhecimento de sua independência no âmbito internacional. Os Estados Unidos
foi o primeiro país a reconhecer a independência brasileira, fato ocorrido em 1824
(VASCONCELLOS, 2020, p. 4).
O reconhecimento americano obviamente não era suficiente, o fator principal para a
solidificação da independência seria o reconhecimento da coroa portuguesa. Para solucionar a
situação, a Inglaterra exerceu importante papel diplomático e viabilizou a assinatura do Tratado
de Paz e Aliança (ou Tratado Luso-Brasileiro), firmado em agosto de 1825, onde Portugal
reconheceu o Brasil como país independente. (VASCONCELLOS, 2020, p. 5).
Segundo José Antonio Pimenta Bueno (1857, p. 20).

os governos são instituidos para o bem-ser dos povos, e não estes para o bem-ser dos
governos, tendo o direito e os meios necessarios para emancipar-se, proclamárão sua
separação; e a sua independencia legitima e gloriosa foi, como devia ser, reconhecida
não só pela generalidade das nações, mas tambem por sua antiga metropole
portugueza, pelo tratado de 29 de agosto de 1825.

O tratado também teve consequências ao Brasil, como bem pontua Daniel Vasconcellos
(2020, p. 5):

o governo brasileiro deveria pagar uma indenização de dois milhões de libras


esterlinas para que Portugal aceitasse a independência do Brasil. Além disso, dom
João VI, rei de Portugal, ainda preservaria o título de imperador do Brasil. Essa última
exigência, na verdade, manifestava o interesse que o monarca lusitano tinha em
reunificar os dois países em uma só coroa. O Brasil não tinha condições de pagar a
pesada indenização estabelecida pelo tratado de 1825. Nesse momento, os ingleses
emprestaram os recursos que asseguraram o pagamento deste valor. Na verdade, o
dinheiro nem chegou a sair da própria Inglaterra, já que os portugueses tinham que
pagar uma dívida equivalente aos mesmos credores.

Ressalta-se que, com a independência do Brasil em setembro de 1822, a primeira função


da assembleia constituinte era redigir a primeira constituição pátria, assembleia esta constituída
por 100 deputados de 14 províncias, sendo que 20 deles pertenciam à Minas Gerais. Iniciava-
se apenas mais um período turbulento no Brasil. (VILLA, 2011, p. 14).
21

Feito o apanhado sobre o período que rodeava toda situação brasileira, em conjunto com
as relações diplomáticas, cabe agora tratar sobre a assembleia constituinte de 1823, além de
revoltas e mortes ocasionados pelo desfecho final.

3.2 ASSEMBLEIA CONSTITUINTE DE 1823

Embora a convocação da Assembleia Constituinte ocorreria em 1822, a primeira reunião


foi somente no ano seguinte, aproximadamente 8 meses depois, em 3 de maio; evidentemente
o imperador discursou na sessão de abertura e, já naquele momento, ficou claro seu
autoritarismo, tendo em vista que falou, no final do discurso, que a carta deveria merecer sua
imperial aceitação. (VILLA, 2011, p. 14).
Nas palavras de D. Pedro I:

Afinal raiou o grande dia para este vasto Império, que fará época na sua história. Está
junta a assembléia para constituir a nação. Que prazer! Que fortuna para todos nós!
Como Imperador Constitucional, e mui especialmente como defensor perpétuo desse
Império, disse ao povo no 1º dia de dezembro do ano próximo passado, em que fui
coroado e agrado, que com minha espada defenderia a pátria, a nação e a constituição
se fosse digna do Brasil e de mim. (ALMEIDA, 1972, p. 5).

O deputado constituinte Luiz Inácio de Andrade e Lima rebateu a fala do imperador dias
depois, ao dizer:

A fala de Sua Majestade Imperial está sem dúvida concebida em termos


constitucionais, mas nota-se no fim dela algumas palavras ambíguas, cujo sentido não
é bem claro. Diz que espera que a assembléia faça uma Constituição digna dele e do
Brasil e que, sendo assim, a defenderá; ora, constituísse nesse caso juiz em causa
própria, e sendo ao mesmo tempo defensor do Brasil, poderá inferir-se que Sua
Majestade pretende por si só julgar da vontade da Constituição. (ALMEIDA, 1972, p.
5).

Como bem pontua José Antonio Pimenta Bueno (1857, p. 29):

Para que um governo mereça o nome de constitucional não basta que elle seja
instituido pelo consentimento nacional; é de mister além disso que a natureza e a
extensão dos poderes politicos, e suas attribuições sejão expressamente fixadas, e
limitadas por disposições que estabeleção o fundamento, a norma invariavel, a regra
fixa e suprema, assim do governo, como dos direitos e obrigações dos cidadãos. A
constituição é a lei fundamental, que divide, organisa e estabelece os limites e modo
por que os poderes políticos devem funccionar, e as garantias dos cidadãos.

Evidentemente que as expectativas não corresponderam com a realidade, a Assembleia


Constituinte até teve diversas sessões e debates, mas o projeto constitucional não foi do agrado
22

de D. Pedro I, “era muito liberal para um autocrata. Impedia, por exemplo, que dissolvesse a
Câmara”. (VILLA, 2011, p. 14).
À medida que o tempo ia passando, a tensão também aumentava, por fim, no dia 11 de
novembro de 1823 a Assembleia declarou-se em sessão permanente, e no dia seguinte a
Assembleia foi dissolvida: o local estava cercado por centenas de soldados, Antônio Carlos, um
dos constituintes e também um dos grandes defensores da liberdade dos legisladores para
redigir a carta magna, passou ao lado de uma peça de artilharia e disse ironicamente “respeito
muito seu poder”. (RODRIGUES, 1974, p. 216-217).
O decreto expedido naquele dia 12 de novembro pelo imperador continha o texto:

Havendo EU convocado, como tinha direito de convocar, a Assembléia Geral


Constituinte e Legislativa, por decreto de 3 de junho do ano próximo passado, a fim
de salvar o Brasil dos perigos que lhe estavam iminentes, e havendo dita Assembléia
perjurado ao tão solene juramento, que prestou à Nação de defender a integridade do
Império, sua Independência e a Minha Dinastia: Hei por bem, como Imperador e
Defensor Perpétuo do Brasil, dissolver a mesma Assembléia, e convocar já uma outra
na forma das instruções feitas para a convocação desta, que agora acaba, a qual deverá
trabalhar sobre o projeto da Constituição, que Eu lhe hei de em breve apresentar, que
será duplicadamente mais liberal que o que a extinta Assembléia acabou de fazer.
Os meus Ministros e Secretarios de Estado de todas as diferentes Repartições o
tenham assim entendido e façam executar, a bem da salvação do império.
(ALMEIDA, 1972, p. 8, grifo nosso).

Era claro que o imperador não estava preocupado com o liberalismo da constituição ou
com o Estado brasileiro, sua preocupação estava na concentração de poderes, qualquer Carta
que o restringisse estava sujeita ao mesmo fim.
Os irmãos Andrada (José Bonifácio, Antônio Carlos e Martim Francisco) e mais três
deputados foram deportados à França, a justificativa das prisões também não poderia ser outra
“as prisões agora feitas serão pelos inimigos do Império consideradas despóticas. Não são. Vós
vedes que são medidas da polícia próprias para evitar a anarquia e poupar as vidas desses
desgraçados, para que possam gozar ainda tranquilamente delas e nós de sossego”. (VILLA,
2011, p. 16).
Cabe agora descrever a importante revolta ocorrida no Nordeste, tendo com um dos
maiores motivos a dissolução da Assembleia Constituinte.

3.2.1 Confederação do Equador

A dissolução da constituinte acabou acarretando outros problemas a D. Pedro I, o maior


deles talvez tenha sido a revolta popular ocorrida no Nordeste, tendo início em Pernambuco. O
23

movimento se espalhou rapidamente pela região nordestinas (Ceará, Paraíba, Rio Grande do
Norte) e ficou denominado como Confederação do Equador. (VASCONCELLOS, 2020, p. 7).
Entre os ideais pretendidos pela revolta popular, estava a convocação de uma nova
Assembleia Constituinte para elaboração de uma nova Constituição de cunho liberal. Para se
ter uma ideia, Manuel de Carvalho Pais de Andrade, presidente da província de Pernambuco,
proclamou a Confederação do Equador unindo Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do
Norte. Adotando a Constituição colombiana de imediato até que pudessem elaborar uma nova.
(VASCONCELLOS, 2020, p. 7).
Com a revolta os rebeldes também foram reprimidos violentamente, além de ocorrer a
morte de diversos líderes. Frei Caneca foi condenado à forca e, diante da recusa do carrasco,
acabou sendo fuzilado em janeiro de 1825, no Recife. (VILLA, 2011, p. 16).
A repressão organizada pelo imperador foi feita de forma peculiar. Segundo Daniel
Vasconcellos (2020, p. 7):

Como não existia um exército organizado, contratou o mercenário Lord Cochrane,


que comandou as forças navais, e o brigadeiro Francisco de Limas e Silva, que
liderava as forças terrestres. Em agosto de 1824 as forças do governo derrotam os
revoltosos em Recife e Olinda. Nos meses seguintes tomam também o Ceará.

Mesmo com a derrota dos revoltosos, D. Pedro acabou saindo desgastado, tendo em
vista que usou de recursos de tributos de brasileiros para massacrar brasileiros. O
descontentamento com o imperador foi crescente. (VASCONCELLOS, 2020, p. 7).
Feitas as considerações sobre a revolta nordestina, cabe agora abordar, efetivamente, a
Constituição de 1824.

3.3 ASPECTOS GERAIS DA CONSTITUIÇÃO IMPERIAL

Depois de todo o estrago feito com a dissolução da constituinte, D. Pedro I convocou


eleições para uma nova constituinte em 17 de novembro de 1823, mas não estabeleceu data, na
realidade tudo não passou de uma artimanha, e logo o projeto foi esquecido. Em 25 março de
1824 o Imperador outorgou a primeira constituição brasileira. (ALMEIDA, 1972, p. 9).
Como bem aponta Marco Antônio Villa (2011, p. 17):

Fingindo humildade, logo na apresentação, dizia que enviou o projeto às Câmaras


aguardando sugestões, que, evidentemente, não ocorreram – nem seriam aceitas. Tudo
24

fez, como escreveu, para a “felicidade política” do povo brasileiro. Não esqueceu de
destacar que a Constituição foi outorgada “em nome da Santíssima Trindade”.

Examinando a Constituição de 1824, como primeiro texto da história constitucional


brasileira, não se pode esquecer de que ela é fruto da frustração da dissolução da Constituinte
de 1823, que não apenas começou a gerar o divórcio entre a Coroa e a opinião pública, mas
manchou de sangue o governo de D. Pedro I, com a reação pernambucana de 1824
(Confederação do Equador), marcando de forma inesquecível o autoritarismo do Monarca.
(NOGUEIRA, 2012, p. 13).
A Constituição de 25 de março de 1824 possuiu 179 artigos, distribuídos em oito títulos
que tratavam: Título I — Do Império do Brasil, do Território, Governo, Dinastia e Religião;
Título II — Dos Cidadãos Brasileiros; Título III — Dos Poderes e Representação Nacional;
Título IV — Do Poder Legislativo, compreendendo seis capítulos (Poder Legislativo —
capítulo I; Da Câmara dos Deputados — Capítulo II; Do Senado — Capítulo III; Da proposição,
discussão, sanção e promulgação das leis — Capítulo IV; Dos Conselhos Gerais das Províncias
e suas atribuições — Capítulo V; Das Eleições — Capítulo VI); Título V — Do Imperador,
compreendendo oito capítulos (Do Poder Moderador — Capítulo I; Do Poder Executivo —
Capítulo II; Da Família Imperial e sua dotação — Capítulo III; Da Sucessão do Império —
Capítulo IV; Da Regência na menoridade ou impedimento do Imperador — Capítulo V; Do
Ministério — Capítulo VI; Do Conselho de Estado — Capítulo VII; Da Força Militar —
Capítulo VIII); Título VI — Do Poder Judicial, com um único capítulo: — Dos Juízes e
Tribunais de Justiça; Título VII — Da Administração e Economia das Províncias,
compreendendo, três capítulos (Da Administração — Capítulo I; Das Câmaras — Capítulo II
— Da Fazenda Nacional — Capítulo III); Título VIII — Das disposições Gerais e Garantias
dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros. (BRASIL, 1824, p. 1-25).
Ao longo dos 179 artigos, 88 eram reservados ao Poder Legislativo, mas isso não
significava um apreço por esse poder, tanto que o Imperador manteve ele fechado por dois anos
e meio, abrindo somente em 1826. Sem falar que o seu período de funcionamento ficou
reduzindo, sendo de apenas 4 meses ao ano (VILLA, 2011, p. 17), conforme dizia a
Constituição, em seu artigo 17 “Cada legislatura durará 4 anos, e cada sessão anual, 4 meses”,
essa legislatura refere-se aos deputados, e não aos senadores. (BRASIL, 1824, p. 4).
Como todo bom imperador absolutista, vide Luís XIV, a preocupação com suas posses
não era de se deixar de lado, visto que, para isso, ele reservou 11 artigos da constituição,
localizado no Capítulo V do Título III, onde fala das dotações da família imperial, talvez os
artigos mais marcantes deles sejam:
25

Art. 107. A Assembléia Geral, logo que o Imperador suceder no Império, lhe assinará
e à Imperatriz Sua Augusta Esposa uma dotação correspondente ao decoro de Sua
Alta Dignidade.
Art. 108. A dotação assinada ao presente Imperador, e à Sua Augusta Esposa, deverá
ser aumentada, visto que as circunstâncias atuais não permitem que se fixe desde já
uma soma adequada ao decoro de Suas Augustas Pessoas, e dignidade da Nação.
Art. 115. Os palácios e terrenos nacionais, possuídos atualmente pelo Senhor D. Pedro
I, ficarão sempre pertencendo a seus sucessores; e a Nação cuidará nas aquisições e
construções, que julgar convenientes, para a decência, o recreio do Imperador e sua
família. (BRASIL, 1824, p. 12).

Há que se falar também da relação entre Estado e igreja nesse período, a Constituição
de 1824 foi a única Constituição brasileira que adotou de forma oficial uma religião, fato é que
ela foi outorgada “em nome da Santíssima Trindade” (BRASIL, 1824, p. 1), como é sabido, a
Igreja Católica sempre foi um dos pontos fundamentais de grande parte das monarquias
Europeias, tanto é que o rei costumava ser visto como uma autoridade instituída por Deus na
terra. Como aponta Cássia Maria Senna Ganem (2018, p.2):

No período colonial brasileiro, manteve-se a hegemonia da Igreja Católica. Somente


os católicos gozavam do benefício da coroa portuguesa. Havia forte vínculo entre a
Igreja e o Estado – temia-se que o não católico enfraquecesse a estrutura colonial
desenvolvida em parceria com a religião. Nesse contexto, tipificava-se a heresia e a
apostasia como crime.
A liberdade era muito restrita, permanecendo ainda a união entre a Igreja e o Estado:
a religião católica era a religião oficial. Quanto às outras religiões, portanto, havia
liberdade de crença, mas não de culto. O art. 5º da Constituição de 1824 preceituava
que “a religião católica apostólica romana continuará a ser a religião do Império.
Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em
casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo”. Mais adiante, no §
5º do art. 179, estabelecia que “ninguém pode ser perseguido por motivo de religião,
uma vez que respeite a do Estado, e não ofenda a moral pública”.

A relevância entre a separação de Estado e igreja no Período Imperial não era algo a ser
questionado, afinal, um sustentava o outro, fator que é inconcebível em tempos atuais, como
aponta Celso Ribeiro Bastos (2000, p. 192) “o Estado deve manter-se absolutamente neutro,
não podendo discriminar entre as diversas igrejas, quer para beneficiá-las, quer para prejudicá-
las”.
A importância em professar o catolicismo era tanta que o artigo 95 da constituição previa
que “Todos os que podem ser eleitores são hábeis para serem nomeados deputados. Excetuam-
se: III) Os que não professarem a religião do Estado”. (BRASIL, 1824, p. 12).
Essa influência católica não foi uma característica presente apenas no reinado de D.
Pedro I; na realidade, D. Pedro II, que era maçom, sofreu por “bater de frente” com a igreja:
em 1872, uma Bula Papal proibia a participação de membros ligados à maçonaria na vida
religiosa da Igreja. Quando dois bispos resolveram seguir as ordens do Papa Pio IX, o imperador
26

ordenou que fossem presos. Embora tenham sido libertos em 1875, isso não foi suficiente para
amenizar o estrago para a imagem do Império. (VASCONCELLOS, 2020, p. 39).
Atualmente, os meios de comunicação e redes sociais são utilizados por lideranças
políticas, ou por populares, para propagar seus ideais e valores. No século XIX, a Igreja Católica
era a instituição responsável por fazer propaganda para a monarquia brasileira. Entretanto,
diante da ruptura, todo o clero da Igreja começou a fazer propaganda contra D. Pedro II, fazendo
com que a população criasse um sentimento de aversão ao imperador e tudo que a monarquia
representava, assim, a ruptura com a igreja fez com que o Império perdesse seu apoio
ideológico. Esse é um dos pontos apontados para que a queda do império acontecesse.
(VASCONCELLOS, 2020, p. 39).
Tratados alguns aspectos da Carta Magna, cabe agora a análise da relação entre os
poderes descritos na Constituição.

3.4 A DIVISÃO DOS PODERES NA CARTA MAGNA DE 1824

Há grande diferença entre o projeto de 1823 e o outorgado em março 1824. O primeiro


projeto estabeleceu um predomínio do poder político do legislador (portanto, na Assembleia),
que sanciona leis, e da própria Carta Constitucional, independentemente da autorização do
poder executivo ou da determinação de que tipos de projetos de lei cabem ao Imperador, aos
deputados ou aos senadores (artigos 114 e 121 do projeto). Sendo assim, a Assembleia Geral
vale-se da sua condição de exceção (da ausência de atribuições constitucionais aos poderes)
para dispor sobre qualquer matéria, decretando leis sem a sanção do Imperador. (OLIVEIRA.
2005, p. 19).
A Constituição de 1824 privilegia, de seu lado, o poder real; isto é, o Imperador possui
instrumentos de interferência no legislativo, no judiciário e nas administrações provinciais,
através do poder moderador – inclusive de sancionar os decretos da Assembleia Geral que
tenham força de lei (Art. 101 da Constituição de 1824, § 3). (OLIVEIRA. 2005, p. 19).
Essa divisão consistente em quatro poderes estava prevista logo no início do texto
constitucional, especificamente no artigo 10, que dizia “Os Poderes políticos reconhecidos pela
Constituição do Império do Brasil são quatro: o Poder Legislativo, o Poder Moderador, o Poder
Executivo e o Poder Judicial”. (BRASIL, 1824, p. 3).
27

Outro aspecto importante é que a Constituição Inglesa foi uma das bases para a primeira
Carta Magna Brasileira (ALMEIDA, 1972, p. 5), sobre a Constituição de 1824, aponta Daniel
Vasconcellos (2020, p. 5):

Sua característica mais marcante é a existência da Divisão dos Três Poderes


(Executivo, Legislativo, Judiciário) de Montesquieu submetidos ao Poder Moderador
que era exercido pelo Imperador. Em outras palavras, D. Pedro criou uma fachada
constitucionalista para que exercesse o poder absolutista. Sempre que houvesse
divergência entre os três poderes, o Poder Moderador do Imperador era evocado,
realizando sempre o desejo de D. Pedro.

Octaciano Nogueira (2012, p. 32-33) também aponta:

a concepção do Poder Moderador exerce o seu papel conceitual de “chave de toda a


organização política”. Sem a existência do Poder Moderador, segue-se o modelo
clássico do parlamentarismo inglês, segundo a máxima de que “o rei reina, mas não
governa”. Com as amplas atribuições do Poder Moderador, como no modelo
brasileiro, o parlamentarismo deixa de ser possível, torna-se impraticável.

A estratégia de D. Pedro I foi de, na divisão dos poderes políticos, colocar um poder
predominando sobre os demais. A narrativa que o Imperador utilizou para usar desse artifício
foi a máxima do direito romano, denominada salus Populi suprema lex est (a salvação do povo
seja a suprema lei). (OLIVEIRA. 2005, p. 19)
No Antigo Regime, a tradução para salus populi era “salvação do Estado”,
explicitamente alusiva ao reino e era um dever prioritário do monarca. Então, salus populi é um
poder usado de forma extraordinário para “benefício geral do povo”, cuja singularidade é ser
um poder que atua além do funcionamento ordinário do poder judiciário. Extrapolando o
exercício regular do poder político, tudo isso devido à própria condição excepcional que o leva
a agir. (OLIVEIRA. 2005, p. 19).
Vale lembrar que a justificativa para dissolução da Assembleia Constituinte de 1823
utilizada por D. Pedro I foi sob o fundamento de que sua ação estava assentada na disposição
de exercer um poder supremo de salvação por aquele Estado: “a salvação da Pátria, que me está
confiada, como defensor perpétuo do Brasil, e que é a Suprema Lei, assim o exige”
(OLIVEIRA. 2005, p. 19), foi exatamente a justificativa da salus populi que D. Pedro também
se valeu para abrir uma brecha para o fechamento do congresso, vide artigo 101, inciso V da
Constituição. (BRASIL, 1824, p. 13).
Como já mencionado no capítulo 2, não é observando o que o governante fala que
definirá a sua real intenção, tendo em vista que até os líderes mais autoritários dizem governar
28

pelo povo ou em benefício nacional (MONTESQUIEU, 2020, p.33). No caso do imperador


brasileiro, a suas palavras falavam o inverso de suas ações.
Entrando em algumas interferências previstas no poder legislativo, o artigo 101, inciso
V previa que o imperador poderia dissolver a Câmara dos Deputados, podendo inclusive
convocar outra que a substituísse. “Artigo 101. O Imperador exerce o Poder Moderador. V.
Prorrogando, ou adiando a Assembléa Geral, e dissolvendo a Câmara dos Deputados, nos casos,
em que o exigir a salvação do Estado; convocando imediatamente outra, que a substitua.”
(BRASIL, 1824, p. 13, grifo nosso), essa medida foi utilizada mais de 10 vezes durante o Brasil
Império. (NOGUEIRA, 2012, p. 17).
A questão dos senadores, que obviamente pertenciam ao Poder Legislativo, também era
singular, afinal democracia, para o imperador, era boa, desde que controlada, sendo assim a
função política de senador seria vitalícia, e o imperador escolheria um senador entre os três
mais votados para o cargo, conforme artigos 40 e 43 da Constituição (BRASIL, 1824, p. 6), a
crítica a essa medida permaneceu por todo período monárquico, principalmente pelo lado dos
liberais, mas não gerou mudança alguma. (NOGUEIRA, 2012, p. 44).
Houve também a limitação de quem deveria ser eleitor, conforme artigos 92 e 94
(BRASIL, 1824, p. 12). Aliás, é importante ressaltar que no projeto inicial da Constituinte o
direito ao voto estava ligado com a renda referente a alqueires de farinha de mandioca, daí a
expressão Constituição da Mandioca. (VILLA, 2011, p. 17).
Em meio ao seu desassossego, digno de um imperador ultracentralizador, até mesmo o
governador da província seria nomeado pelo imperador, conforme previa o artigo 165 “Haverá
em cada província um presidente, nomeado pelo Imperador, que o poderá remover, quando
entender que assim convém ao bom serviço do Estado” (BRASIL, 1824, p. 21), medida essa
que também foi adotada pelo Estado Novo (1937-1945) e pela ditadura militar (1964-1985),
onde os governadores estaduais eram apenas delegados do poder central. (VILLA, 2011, p. 19).
Como aponta Octaciano Nogueira (2012, p. 22):

Todas essas preocupações deviam estar presentes no rigoroso centralismo que a Carta
de 1824 estabeleceu, ao criar um Estado unitário em que, a rigor, não havia poder
local. Toda autoridade era rigorosamente centralizada na capital do Império e nos
poderes que a Constituição criou e dos quais derivavam todas as emanações da força
do Estado.

O poder judiciário até possuía autonomia, afinal o artigo 151 dizia “O Poder Judicial é
independente”, mas isso não passava de fachada. A Constituição reservou apenas 14 artigos a
esse poder – três a mais que os reservados aos recursos pecuniários da família real (VILLA,
29

2011, p. 19). Mas nos artigos 101, inciso VII e 154, havia previsão para a suspeição de juízes,
suspeições essas feitas pelo poder moderador (BRASIL, 1824, p. 21).
Como muito bem ressalta Octaciano Nogueira (2012, p. 29-30):

Se todos esses precedentes deixam claro que, não dispondo de garantias, a


Magistratura que constituía o Judiciário não configurava um poder verdadeiramente
independente ante os demais, há na Constituição outra prescrição que, mais
claramente ainda, tirava ao Judiciário a sua condição de Poder. Trata-se do art. 15,
que cuidava das atribuições do Legislativo, concedendo à Assembleia Geral,
constituída da Câmara e do Senado, a faculdade inscrita no item 80 de “fazer leis,
interpretá-las, suspendê-las e revogá-las”. As velhas Ordenações do Reino davam à
Casa da Suplicação a faculdade de, como se dizia, “tomar assentos”, unificando a
enorme jurisprudência do vasto Império português. A lei que criou o Supremo
Tribunal de Justiça, previsto na Constituição de 1824, porém, não lhe concedeu a
mesma prerrogativa. Não houve, portanto durante largo tempo, enquanto vigorou a
Constituição do Império, como veremos, um Tribunal que unificasse a jurisprudência.
E o que é mais grave: como o poder de interpretação legal jamais foi exercido pelo
Legislativo, a prerrogativa terminou absorvida pelo Executivo, durante todo o
Império.

Diante de todos os pontos já abordados, fica claro que a longevidade no poder não
recairia sobre D. Pedro I, não sem motivos abdicou do trono em 1831, após forte pressão
popular e sem apoio militar. (VILLA, 2011, p. 19).
Por fim, como extraordinariamente ressalta Marco Antônio Villa (2011, p. 20):

Não é acidental que o autoritarismo esteja tão presente no Brasil. O país já nasceu
com uma organização política antidemocrática. E o poder nunca se reconheceu como
arbitrário. Ao contrário, D. Pedro I inaugurou o arbítrio travestido de defensor das
liberdades.

Nesse capítulo foi apresentada por diversas perspectivas a Constituição de 1824, o


contexto histórico internacional que rodeava o Brasil Colônia (tendo talvez como ponto
principal a volta de João VI para Portugal), a primeira Assembleia Constituinte, ocorrida após
a independência em 7 de setembro de 1822, que acabou sendo dissolvida, revoltas populares
por causa do ato autoritário de D. Pedro I, sendo o mais marcante deles a Confederação do
Equador.
Por fim, nesse capítulo foi apresentado tanto aspectos gerais da constituição outorgada
pelo imperador como a forma em que se deu a divisão dos poderes (executivo, legislativo,
judiciário e moderador), além da maneira como um poder se sobrepunha ao outro de forma
expressa no texto constitucional.
Como forma de montar um paralelo entre constituições, especificamente a primeira
(1824) e a última (1988), o próximo capítulo apresentará a atual constituição brasileira de 1988,
30

e a forma como ocorre a divisão dos poderes a partir dela, inclusive apresentando artigos que
abordam o assunto.
31

4 CONSTITUIÇÃO CIDADÃ DE 1988

Como o presente projeto tem por finalidade apresentar uma análise da separação dos
poderes desenvolvida ao decorrer dos séculos e sua relação com a Constituição de 1824
(primeira constituição brasileira) e a Constituição de 1988 (constituição vigente atualmente),
esse capítulo abordará os fatores históricos que antecederam a Constituição Federal de 1988, a
situação em que se deu a promulgação do texto e o conteúdo da atual constituição brasileira.
A fim de aprofundar o exposto, na próxima seção serão apresentados fatores
fundamentais que implicaram a confecção de uma nova constituição.

4.1 CONTEXTO HISTÓRICO PRÉ-ASSEMBLEIA CONSTITUINTE E


CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A Nova República é um período da História do Brasil que tem início com o final da
Ditadura Militar (1985). Teve como ponto fundamental a mobilização de inúmeros setores da
sociedade, principalmente com as manifestações das Diretas Já. (VASCONCELLOS, 2020, p.
5-6).
Entre o período de 1964 a 1985, os presidentes do Brasil foram generais. Houve um
grande endurecimento do Regime até que ocorresse a abertura política. O fator mais marcante
de autoritarismo nesse período provavelmente tenha sido o Ato Institucional número 5 (AI-5)
em 1968, acarretando o fechamento do Congresso, suspenção das eleições e instituição do
estado de sítio. No período do regime, houve perseguição política, expulsão de brasileiros do
país, os quais viveram no exílio em outras nações, nesse período da história brasileira ocorreu
até mesmo o cometimento de torturas e assassinatos por parte do Estado. (VASCONCELLOS,
2019, p. 36).
À medida em que o tempo foi passando, a impopularidade do governo também
aumentou, alguns atos mais pluralistas até foram tomados, como por exemplo a revogação do
Ato institucional número 5, em outubro de 1978, mas isso não significou o fim da truculência
ditatorial. (VASCONCELLOS, 2019, p. 44).
Tratando-se do fechamento do congresso e desse processo de abertura, Paulo Bonavides
e Paes de Andrade (1991, p. 451-452) aponta:

Determinou o chefe militar naquela ocasião o recesso do congresso, num ato de


fechamento temporário, mas sobremaneira radical. Partira precisamente de quem, a
seguir, com nítida inflexibilidade de propóstas, inauguraria breve a aplaudida política
32

de refluxo à legitimidade e à restauração constitucional. Começou então um processo


de transição, lento e gradualista, a chamada abertura, que durou cerca de dez anos.

Importante frisar que o estado de Santa Catarina teve um papel importante no combate
ao autoritarismo, como aponta Daniel Vasconcellos (2019, p. 45) “Em 30 de novembro de 1979,
em Florianópolis, ocorreu uma grande manifestação popular contra o Regime Militar
implantado em 1964. A Novembrada, como ficou conhecida, ocorreu durante uma visita do
então presidente João Batista Figueiredo”.
Já no fim do regime, houve uma grande luta política para compor maioria no Colégio
Eleitoral, tendo em vista que a eleição presidencial ainda era indireta, o Partido Democrático
Social (PDS) – partido formado pelos militares, que outrora chamava-se ARENA – conseguiu
formar maioria para eleger de forma indireta o presidente da república em janeiro de 1985, mas
isso não impediu que a oposição vencesse em estados importantes. (VILLA, 2011, p. 111).
Algo fundamental que fez parte de todo contexto eleitoral foi a Emenda Constitucional
apresentada pelo deputado Dante de Oliveira, do Mato Grosso, em 1983, onde versava sobre o
reestabelecimento das eleições diretas para presidente da república, tal emenda acabou
empolgando a população, tanto que, em 16 de abril de 1984, a manifestação reuniu milhões de
pessoas em São Paulo para uma das maiores campanhas democráticas da história do Brasil. No
entanto, a proposta não foi aprovada pela Câmara dos Deputados, tendo em vista que faltou 22
votos para atingir o quórum necessário de 320, isso impediu que a proposta fosse votada até
mesmo pelo Senado. (VILLA, 2011, p. 112).
Como apontam João Alberto de Oliveira Lima, Edilenice Passos e João Rafael Nicola
(2013, p. 20):

as multidões acorreram entusiásticas aos comícios em prol da eleição direta do


Presidente da República, interpretando o sentimento da Nação, em busca do
reequilíbrio da vida nacional, que só poderia consubstanciar-se numa nova ordem
constitucional que refizesse o pacto político-social. Frustrou-se, contudo, essa grande
esperança.

Com a derrota da emenda que, por sinal, contou com o governo federal, incluindo Paulo
Maluf e José Sarney, presidente do PDS, os quais pressionaram os deputados de todas as formas
possíveis para que a emenda não fosse aprovada, a saída encontrada pela oposição foi o
lançamento da candidatura de Tancredo Neves, governador de Minas Gerais, a articulação
política foi complicada, afinal, Ulysses Guimarães (o mesmo que seria presidente da
Assembleia constituinte) teve que ser convencido a abrir mão de sua candidatura, pois ele foi o
grande líder da campanha das Diretas Já. O empecilho não era apenas esse, tendo em vista que
33

o PDS possui maioria no Colégio Eleitoral para eleger o próximo presidente, era preciso dividir
o partido, coisa que acabou ocorrendo. (VILLA, 2011, p. 112).
Foi lançada a Aliança Democrática, união composta por PMDB e os dissidentes do PDS.
O candidato à presidência seria Tancredo Neves mas, ironicamente, a articulação gerou a
obrigação de indicação à vice-presidência pelo PDS, e o nome indicado foi José Sarney,
obviamente que a rejeição ao nome do senador maranhense era grande, pois foi um grande
apoiador do regime e tinha rompido de última hora com a candidatura de Paulo Maluf, sem
falar que foi um dos articuladores para que a emenda constitucional de Dante de Oliveira não
fosse aprovada. (VILLA, 2011, p. 112).
A vitória de Tancredo Neves em 15 de janeiro de 1985 foi fruto de uma ampla aliança
que começou com o PMDB, se estendeu aos dissidentes do PDS, e também contou com PDT,
PTB e até pelo PT (VILLA, 2011, p. 112). A tão esperada posse de Tancredo, no entanto, nunca
ocorreu. No dia 14 de março, véspera de assumir o cargo, o ex-governador de Minas Gerais
teve de ser operado às pressas no Hospital de Base, em Brasília. Era o início de um pesadelo
que exigiria outras seis intervenções cirúrgicas e se estenderia até sua morte, anunciada em 21
de abril (VASCONCELLOS, 2019, p. 48).
Tancredo havia assumido um compromisso público de convocar uma Assembleia
Constituinte e, no intuito de agilizar os trabalhos, propôs criar uma comissão para dar celeridade
ao processo, assim, seria elaborado um anteprojeto para depois ser enviado pelo executivo aos
constituintes, essa foi a forma mais prática pensada para que o país pudesse ter uma nova
constituição o mais cedo possível, mas sua morte acabou interrompendo seus planos (VILLA,
2011, p. 112).
Como aponta Daniel Vasconcellos (2019, p. 48-49):

Tancredo Neves era um mestre na arte de tecer acordos políticos. Nascido na cidade
mineira de São João del Rey, foi vereador, deputado estadual, deputado federal,
ministro da Justiça (no governo constitucional de Getúlio Vargas), primeiro-ministro
(no governo parlamentarista de João Goulart), senador e governador de Minas
(escolhido pelo voto direto em 1982). Também participou ativamente da campanha
das “diretas já”, que culminou nos comícios de mais de 1 milhão de pessoas no Rio
de Janeiro e em São Paulo. Essa capacidade de negociar foi fundamental na hora da
disputa no Colégio Eleitoral. Para bater seu adversário, o paulista Paulo Maluf,
Tancredo teve de se acertar com setores governamentais hostis à candidatura
situacionista, como o maranhense José Sarney, que abandonou a presidência do PDS,
carregando consigo uma dissidência numerosa de parlamentares. Seu grupo fundou o
Partido da Frente Liberal, enquanto ele se filiava ao PMDB para se tornar o vice na
chapa do mineiro, ajudando a assegurar a vitória. A contagem final: 480 votos a favor
contra 180, com dezessete abstenções. O preço dessa costura política foi o descaso
com a própria saúde. Tancredo sabia que estava muito doente. Ao mesmo tempo,
temia que o presidente João Figueiredo não transmitisse o cargo a Sarney. Por isso,
resolveu aguentar firme até a posse: “Depois façam de mim o que quiserem”, dizia
34

aos médicos. Ao ser internado na noite de 14 de março no Hospital de Base de Brasília,


para a retirada de um tumor que se rompera em seu abdome, só assinou a autorização
para a cirurgia após obter a garantia oficial de que o vice estaria em seu lugar no dia
seguinte. A doença e a morte de Tancredo causaram imensa comoção. Era nele que o
povo depositava suas esperanças.

Feito o apanhado sobre o período que rodeava toda situação brasileira, principalmente
na questão do cerceamento das liberdades individuais e manifestações contra o autoritarismo,
cabe agora falar sobre a Comissão Afonso Arinos: seu início, composição e desfecho final.

4.2 COMISSÃO AFONSO ARINOS

Com a morte de Tancredo em 21 de abril de 1985, José Sarney, seu vice, assume a
presidência da república; começa no Brasil um novo ciclo. Esse período inicia com a saída do
general Figueiredo da presidência e a entrada de um civil no cargo. Ocorre o nascimento de um
período democrático, em oposição ao antigo governo que representava a censura, falta de
democracia e repressão aos movimentos sociais. (VASCONCELLOS, 2020, p. 5-6).
O falecimento de Tancredo gerou no povo um sentimento de desesperança, afinal,
Sarney não tinha a história política e a legitimidade de Tancredo, tendo em vista que sempre
esteve ao lado do autoritarismo, mas isso não impediu que ele desse sequência às promessas de
Tancredo Neves. (LIMA; PASSOS; NICOLA, 2013, p. 21).
Comprometido com os mesmos compromissos do estadista mineiro, Sarney enviou, em
junho de 1985, ao Congresso Nacional, mensagem com a proposta de convocar uma
Assembleia Constituinte. Resultando na Emenda Constitucional nº 26, de 27 de novembro de
1985, que previa logo no primeiro artigo “Os Membros da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal reunir-se-ão, unicameralmente, em Assembléia Nacional Constituinte, livre e soberana,
no dia 1º de fevereiro de 1987, na sede do Congresso Nacional”. A Emenda Constitucional nº
26 também tratava, em sua maior parte, da anistia, a previsão estava no artigo 4º, sendo que
possuía 8 parágrafos – na Emenda, era o único artigo com parágrafos. (BONAVIDES;
ANDRADE, 1991, p. 453).
Como mencionado no item anterior, a ideia de Tancredo era a confecção mais célere
possível de uma constituição para o Brasil, assim, ele montaria uma comissão – denominada
Afonso Arinos, já que tinha ele como presidente – com alguns integrantes (BONAVIDES;
ANDRADE, 1991, p. 453), com a finalidade de enviar um anteprojeto à Assembleia
Constituinte. (VILLA, 2011, p. 112).
Segundo Marcus Vinícius Fernandes Bastos (2018, p. 20):
35

Concebida pelo então candidato à presidência Tancredo Neves no bojo de sua


campanha nas eleições presidenciais indiretas de 1985, a Comissão Provisória de
Estudos Constitucionais era tida por seu idealizador como ato político apto a deflagrar
o debate constituinte e símbolo da conciliação nacional (daí a seleção de Afonso
Arinos, histórico udenista, para ser seu presidente). A ideia original de Tancredo, já
acertada com Arinos, era a de que a comissão produzisse um distinto anteprojeto
constitucional, que então serviria de texto-base para os trabalhos da Assembleia
Nacional Constituinte – outra promessa de campanha da Aliança Democrática.

A comissão inicialmente teria certa de 12 integrantes, consequentemente agilizando os


trabalhos, já que o baixo número de integrantes diminuiria os debates e reuniões, ocorre que
Sarney aumentou esse número para 50 integrantes, o que dificultou muito os trabalhos. (VILLA,
2011, p. 113).
Como descreve Paulo Bonavides e Paes de Andrade (1991, p. 453) “composta de 50
membros, os chamados notáveis, sua tarefa consistia em desenvolver pesquisas e estudos
fundamentais no interesse da Nação brasileira”.
Ao contrário do que era esperado, o anteprojeto, na prática, recebeu do governo federal
o tratamento de um relatório ou documentário e não de um ponto de partida que serviria aos
constituintes, o mais sensato a se fazer, depois de centenas de reuniões e a elaboração do
anteprojeto, era remetê-lo à futura constituinte, mas Sarney apenas enviou por despacho, datado
em 24 de setembro de 1986, ao Ministério da Justiça. (BONAVIDES; ANDRADE, 1991, p.
453-454).
Segundo Marcus Vinícius Fernandes Bastos (2018, p. 12):

Inicialmente concebida com a missão precípua de elaborar um anteprojeto


constitucional a ser adotado como texto-base pela Assembleia Nacional Constituinte,
a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais [...] acabou não conseguindo
cumprir o referido propósito, tendo sido o seu anteprojeto relegado pelo próprio
Executivo que a convocara. O texto nunca foi oficialmente enviado à Constituinte,
que, ao final, atuou sem texto prévio.

Sarney teria engavetado o anteprojeto, em tese, por razões contrárias ao seu pensamento
político, já que o anteprojeto tinha um caráter progressista e adotava o sistema parlamentarista.
(LIMA; PASSOS; NICOLA, 2013, p. 21).
O projeto terminou com 436 artigos, além de mais 32 nas disposições transitórias,
obviamente, havia de tudo no projeto constituinte, o artigo 410, por exemplo, tratava da pesca
da balei – não que não fosse um assunto louvável, mas está longe de ser algo que deva ser
tratado em uma constituição. (VILLA, 2011, p. 113).
36

Feito o apanhado sobre o enredo da Comissão Afonso Arinos, denominada


pejorativamente de Comissão dos Notáveis, cabe agora entrar especificamente nos fatos
históricos finais e no texto constitucional em si.

4.3 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A eleição para definir os membros da Assembleia Constituinte estava definida para


ocorrer dia 15 de novembro de 1986, onde seriam eleitos 487 deputados e 72 senadores, mas
uma grande crise ocorria no Brasil em um período que antecedeu as eleições. (BONAVIDES;
ANDRADE, 1991, p. 454).
Sarney adotou o Plano Cruzado em fevereiro de 1986, congelando preços e salários –
medida claramente intervencionista. (VILLA, 2011, p. 113). Sobre o intervencionismo, Ludwig
Von Mises, ilustre economista austríaco do século XX, já apontava os principais fatores que
levavam um governo a adotar essa medida (2009, p. 48):

Em geral, os governos recorrem ao controle de preços depois de terem inflacionado a


oferta de moeda e de a população ter começado a se queixar do decorrente aumento
dos preços. Há muitos e famosos exemplos históricos do fracasso de métodos de
controle dos preços.

O exemplo dado pelo economista para explicar as razões pelas quais tal medida não é
eficiente ocorre de maneira simples e didática, digamos que o preço do leite está muito caro –
é inquestionável a importância do leite, principalmente para bebês e crianças –, no intuito de
aumentar sua popularidade, o governante decide fixar um valor máximo para a venda do
produto, preço esse que seria inferior ao preço vendido pelos mercados. A consequência
imediata é o aumento da demanda, já que outrora diversas pessoas não conseguiam comprar o
produto, mas a medida tem um segundo aspecto, os produtores começam a ter prejuízos, visto
que o preço estabelecido de forma estatal é inferior aos custos de produção. Como o empresário
nunca irá arcar com o prejuízo sozinho, e sabendo que ele não pode aumentar o valor da
mercadoria, a única medida cabível é deixar de produzir leite, sendo assim, ele procurará obter
lucro de outra forma, seja vendendo as vacas ou produzindo derivados como manteiga, queijo,
etc. (MISES, 2019, p. 49-50).
De início a medida até causa uma impressão de eficiência, e foi o que ocorreu no
governo Sarney, durante três meses tudo ocorreu bem, mas em junho os produtos começaram
a desaparecer das prateleiras, Sarney então resolveu tomar medidas para garantir o
37

abastecimento, até a Polícia Federal foi usada para procurar rebanhos bovinos. Surgiu também
nesse período os chamados Fiscais do Sarney, a própria população averiguava se os valores dos
produtos nos locais de venda estavam de acordo com os estabelecidos pelo governo. (VILLA,
2011, p. 113).
Sarney queria se aproveitar da situação, mesmo às custas de uma crise econômica, pois
sabia que em alguns meses ocorreria a eleição, e foi justamente o que ele fez e conseguiu, o
PMDB, partido que ele integrava, venceu em 22 estados e o PFL (Partido da Frente Liberal),
em outro. A AD, portanto, ganhou em todos os estados, formando grande maioria na
Constituinte. (VILLA, 2011, p. 113).
Ocorreu a instalação da constituinte no dia 1 de fevereiro de 1987, como estava previsto.
A direção dos trabalhos foi feita pelo presidente do STF, Moreira Alves, e estavam à mesa José
Sarney, presidente do país, o senador Humberto Lucena, presidente do senado e o deputado
Ulysses Guimarães, presidente da câmara dos deputados, o mesmo que seria eleito no dia
seguinte, em 2 de fevereiro de 1987, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, com 425
votos a favor (o deputado Lisâneas Maciel, do PDT, obteve 59 votos). (BONAVIDES;
ANDRADE, 1991, p. 454).
O ponto de partida da Assembleia Constituinte foi dificultoso, afinal, não tinham de
onde partir, a constituição de 1967 não servia de parâmetro para esse novo momento histórico,
a situação era bem diferente de todos os outros momentos em que o país passou e que levou à
formulação de uma nova Carta Magna ao país (BONAVIDES; ANDRADE, 1991, p. 454-455).
Como aponta Paulo Bonavides e Paes de Andrade (1991, p. 455):

O governo não considerou o anteprojeto da Comissão Afonso Arinos um projeto do


governo, mas um simples texto de curiosidades e sugestões, ao mesmo nível de
quantos haviam sido elaborados e oferecidos à Assembléia por juristas insuladamente
ou por entidades da sociedade civil, como a OAB, do Rio Grande do Sul. Em suma,
tinha os constituintes de partir do ponto zero.

Passados 19 meses, a Constituição, depois de muito debate, foi aprovada na sessão de


22 de setembro de 1988, onde recebeu 474 votos favoráveis e 15 contrários (todos da bancada
do PT, que argumentavam dizendo que a Carta era elitista e conservadora). A carta, no entanto,
foi promulgada em 5 de outubro de 1988, data escolhida por ser o aniversário de Ulysses
Guimarães. Nesse período, foram apreciadas 65.809 emendas, 21 mil discursos e 9 projetos.
(VILLA, 2011, p. 115).
A Constituição terminou com 250 artigos, além de 70 Atos das Disposições
Constitucionais Transitórias (ADCTs), formando um total de 320 artigos, a Constituição de
38

1988 é a mais extensa que o Brasil já teve, mas pode se considerar que ficou menor do que o
esperado, tendo em vista que na primeira versão havia 501 artigos, chegando a 334, e votada,
por fim, com 250 artigos. (VILLA, 2011, p. 115).
O enredo que permeou a confecção da constituinte ocorreu de forma única no Brasil,
resta analisar os aspectos gerais da constituição.

4.3.1 Aspectos gerais da Constituição de 1988

Os pontos que indicam o quão eficiente é uma constituição são dos mais variados, mas
um deles costuma ser o mais citado, que é a longevidade. Segundo Octaciano Nogueira (2012,
p. 10):
O que deve medir a eficácia de qualquer documento constitucional é exatamente a sua
longevidade. Uma Constituição é tão mais eficiente quanto maior for a sua duração.
Afinal, o que se espera de qualquer documento constitucional é que ele possa regular
de maneira estável, e sem necessidade de frequentes mudanças, a vida institucional
do país, inclusive nos momentos de crise.

Já Paulo Bonavides e Paes de Andrade lançam um contraponto (1991, p. 455) “O mito


da Constituição americana, da sua durabilidade e resistência, não nos ajuda a entender nossa
realidade, mas antes, turva nossa reflexão. Grande número de Constituições não significa
necessariamente instabilidade”.
Obviamente que a Constituição Americana é referência em durabilidade e estabilidade,
afinal, trata-se de uma constituição de 1787, e que, ao longo de quase 235 anos, recebeu apenas
27 emendas, a Constituição Brasileira já recebeu mais de 100 emendas em um período inferior
a 35 anos. Há aspectos antagônicos nas duas cartas, a Constituição Americana é a mais longeva
do mundo, mas também é a menos extensa (possui apenas 7 artigos), isso ajuda a explicar parte
de seus predicados. A carta brasileira é a segunda maior do mundo, perdendo apenas para a
indiana, que possui 448 artigos, mas que mesmo assim, com quase o dobro de artigos em relação
à Constituição Brasileira, sofreu um pouco mais de 90 emendas, vale ressaltar que se trata de
uma constituição de 1950. Só nos resta concluir que esse é um dos motivos que aponta de onde
vem tamanha insegurança jurídica no Brasil. (NOGUEIRA, 2012, p. 10)
Outro aspecto interessante a se apontar é o fator constitucional do mundo ao longo do
tempo, menos de 10% de todas as constituições vigentes são anteriores à Segunda Guerra
mundial, não é só isso, mais de 50% dos Estados tiveram mais de uma constituição depois do
conflito mundial de 1945 – países como Síria e Tailândia já passaram por nove constituições
nesse período. (NOGUEIRA, 2012, p. 10)
39

No caso do Brasil, e mais especificamente a Constituição de 1988, a enorme minúcia


explica muito bem grande parte das alterações, se não bastasse, a Constituição apresenta
inúmeros artigos que não mereciam ser tratados propriamente na carta, além de haver pontos
retrógados até mesmo para a época. (VILLA, 2011, p. 116-117).
Sobre o direito dos trabalhadores urbanos e rurais (art. 7º da CF), o inciso XXVII é, no
mínimo, antiquado, pois prevê a “proteção em face da automação, na forma da lei”. (BRASIL,
1988, p. 9). Como comenta Marco Antônio Villa (2011, p. 116) “o processo de revolução da
produção, do aumento da produtividade e da riqueza está, em tese, vedado”.
É como se Ned Ludd tivesse sido o autor do inciso, afinal, ele foi o principal nome
responsável pelo movimento ludista. Sobre o assunto, aponta o livro Ética, Tecnologia e
Democracia (BOURDEAU, 2011, p. 129).

O ludismo designa um episódio particularmente violento de destruição de máquinas


em Inglaterra entre 1811 e 1817. Durante esse período, contam-se cerca de 1400
máquinas de tecer destruídas nas Midlands. Nos condados de Derby e de Nottingham,
cerca de 10% das máquinas são quebradas. No Lancashire, várias fábricas são
totalmente destruídas.

Outro ponto pouco abordado sobre a Constituição de 1988 é o mandato presidencial,


aspecto esse que foi alvo de imenso debate na constituinte. Na reta final da ditadura militar o
mandato presidencial foi aumentado para 6 anos (João Figueiredo foi o único presidente que
ocupou a cadeira da presidência da república por esse período, sendo o último presidente do
regime). Ocorre que a AD havia firmado aliança para que o mandato presidencial fosse de 4
anos, mas José Sarney usou de todos os meios imagináveis para obter um mandato de 5 anos,
ponto esse que acabou sendo um grande balcão de negócios, para se ter ideia, essa foi a única
votação onde compareceram todos os constituintes (559). No fim, Sarney conseguiu alcançar
seu objetivo, a votação foi 328 votos pelo mandato de 5 anos e 222 contra. Ficou definido na
Constituição “O mandato do Presidente da República é de cinco anos, vedada a reeleição para
o período subseqüente, e terá início em 1.º de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição”.
(BRASIL, 1988, p. 45). Posteriormente a Emenda Constitucional nº 5 de 1994 acabou alterando
o dispositivo, reduzindo o período presidencial em 1 anos e mantendo a proibição à reeleição.
Em 1997 houve outra mudança, o período permaneceu o mesmo, mas a reeleição foi autorizada
(art. 14, §5º). (BRASIL, 1988, p. 10).
Partindo agora aos fatores quase que exclusivos da Constituição de 1998 – e não no
sentido positivo –, a minuciosidade da Carta foi tamanha que nem mesmo a regulação de
propaganda comercial de tabaco, bebida alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias
40

ficaram sem regulamentação, como é descrito no artigo 220, parágrafo 4º (BRASIL, 1988, p.
99):

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob


qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o
disposto nesta Constituição.
[...]
§ 4.º A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos,
medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do
parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios
decorrentes de seu uso.

Os constituintes não se privaram nem mesmo de definir a taxa de juros, afinal, tinha que
“promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade”. O
artigo 192, inciso VIII e parágrafo 3º dizia (BRASIL, 1988, p. 99):

As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações


direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a
doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de
usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar.

Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 40 de 2003 acabou revogando maior parte


do capítulo IV da constituição (que tratava do sistema financeiro nacional), deixando
praticamente apenas o caput do artigo, mas com alterações.
Nem mesmo a justiça desportiva foi privada de ganhar uma seção na constituição (Seção
III, art. 217). (BRASIL, 1988, p. 98).
Por fim, talvez um dos parágrafos mais cômicos da Carta é o §2º do artigo 242, onde
diz que “O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita
federal”. (BRASIL, 1988, p. 99).
O regime militar brasileiro foi marcado por um período turbulento, a situação mundial
era de extrema tensão, afinal, a Guerra Fria ainda não tinha chegado ao fim. Internamente havia
influência tanto dos Estados Unidos da América quanto da União Soviética, e, como se sabe, a
ala americana acabou vencendo, o que levou os militares ao poder, isso não impediu que atos
de violência e assassinato ocorressem de forma institucional, em contrapartida, existiam
movimentos de guerrilhas para se opor ao regime, promovendo até mesmo ataques terroristas,
como, por exemplo, a bomba no aeroporto de Recife, em julho de 1966, que provocou a morte
2 duas pessoas, e mais 14 feridos. (VASCONCELLOS, 2019, p. 40-41).
A extensão da Constituição Federal de 1988 pode ser explicada pelo contexto que
antecedeu a constituinte, o Brasil foi marcado por conflitos por um grande período, sendo até
41

mesmo privado de direitos fundamentais básicos, a válvula de escape foi o fim da ditadura,
início de um governo civil exercido por Sarney, e a promulgação da Carta de 1988, assim, o
sentimento reprimido entre 1964 a 1985 pode ser transcrito ao longo dos 250 artigos da
constituição.
É inegável que a Carta Magna de 1988 possui diversos pontos desnecessários, mas isso
não ofusca a conquista do país no que diz respeito às liberdades individuais, como escreve João
Alberto de Oliveira Lima, Edilenice Passos e João Rafael Nicola (2013, p. 27):

os direitos humanos passaram a ter consideração popular, a fazer parte do cotidiano


das pessoas, o que é o melhor instrumento de sua eficácia, com repulsa consequente
do arbítrio e do autoritarismo. Nenhuma Constituição anterior teve consideração
popular como a atual.

Feito o apanhado sobre diversos aspectos da constituição de 1988, cabe agora falar da
divisão dos poderes na Carta Magna atual do Brasil.

4.4 A DIVISÃO DOS PODERES NA CONSTITUIÇÃO CIDADÃ

Ao longo de todos os capítulos, foi descrita a importância da autonomia entre os poderes,


iniciando de forma teórica por pensadores e, tendo como foco, Montesquieu, já que ele foi o
responsável por criar a teoria tripartite, influenciado na obra aristotélica denominada Política, e
no Segundo Tratado do Governo Civil, obra essa composta por John Locke. (MAGALHÃES,
2019, p. 18).
A forma prática como a Constituição Imperial fez o uso da separação dos poderes
também ficou demonstrada, já que a própria constituição abordava de forma expressa a
existência do poder executivo, legislativo e judiciário, além de um quarto poder que se
sobrepunha aos outros, o moderador. (BRASIL, 1824, p. 3).
Em 2023 a Constituição Cidadã completa 35 anos de existência. Ela representa a
vitória do povo em relação ao autoritarismo, a conquista da liberdade nunca antes saboreada
pelo povo brasileiro, como escrevem Paulo Bonavides e Paes de Andrade (1991, p. 488) “no
exame da nossa História constitucional, constatamos que a passagem do nível legal para a
realidade das relações sociais tem sido extremamente penosa e na maioria das vezes
fracassada”. A Carta Magna atual retrata uma das grandes conquistas ao longo de uma história
de populismo, patrimonialismo, golpes e ditaduras, mas não significa que a tripartição dos
poderes prevista na constituição não seja passível de críticas.
42

O artigo 2º da Constituição Federal é o que trata da divisão dos poderes, onde diz “São
Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário”. (BRASIL, 1998, p. 2).
A separação dos poderes, com previsão legal no artigo 2º da Constituição, não é passível
de mudança em caso algum, já que se trata de cláusula pétrea, com amparo no artigo 60,
parágrafo 4º e inciso III da constituição, que diz (BRASIL, 1988, p. 39) “Art. 60. A Constituição
poderá ser emendada mediante proposta: [...] § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de
emenda tendente a abolir: [...] III - a separação dos Poderes”.
A previsão ocorre pela importância com que é vista a teoria tripartite, uma quebra em
seu funcionamento pode representar o início do autoritarismo praticado pelo Estado. Mas a
previsão constitucional não é uma garantia, por si só, de que a separação e o sistema de pesos
e contrapesos estão funcionando adequadamente. Na realidade, é preciso que haja um respeito
às legitimidades, somente assim poderão agir em suas respectivas áreas. (MAGALHÃES, 2019,
p. 18).
É indispensável saber que mesmo com suas atribuições típicas, cada poder também
possui funções atípicas, e que, em uma ótica superficial, pode parecer representar o acúmulo de
poder indevido, mas que a finalidade objetiva a interdependência de um em relação aos outros.
(GUEDES, 2007, p. 5).
É sabido que o Congresso Nacional brasileiro funciona de forma bicameral, composto
por Câmara dos Deputados (513), responsáveis por representar o povo (art. 45 da CF) e o
Senado (81), responsáveis por representar os estados e o Distrito Federal (art. 46 da CF).
Todavia, mesmo fazendo parte do poder legislativo, a Câmara e o Senado possuem
competências privativas, descritas, respectivamente, nos artigos 51 e 52 da Constituição. Esse
poder, no âmbito federal, está estruturado e delineado nos artigos 44 a 75 da Constituição
Federal. (BRASIL, 1988, p. 31-44).
Embora o Poder Legislativo possua a atribuição típica de legislar e fiscalizar o poder
executivo, ele também exerce funções atípicas, competências essas realizadas em casos
específicos, como, por exemplo, a promoção de férias, licenças, dispor sobre sua organização
(funções executivas) ou uma ainda mais clara, que caracteriza a realização do poder judiciário
pelo legislativo, que é a previsão do artigo 52, incisos I e II da Constituição Federal (BRASIL,
1988, p. 33-34), casos onde o senado processa e julga presidente, ministros do Supremo
Tribunal Federal, entre outros. (MAGALHÃES, 2019, p. 29).
Já o Poder Judiciário é regulado pela Constituição Federal nos seus artigos 92 a 126.
Possui, como função principal, a atividade jurisdicional, julgando de acordo com as normas
43

redigidas pelo legislativo (MAGALHÃES, 2019, p. 34). Suas funções não se restringem
somente a isso, as funções atípicas do judiciário podem ser divididas em Natureza Legislativa
e Natureza Executiva, como apontam Daniel Otávio Genaro Gouveia e Sérgio Tibiriçá Amaral
(2008, p. 22):

A função atípica de natureza legislativa é a independência que o Poder Judiciário tem


em estabelecer seu regimento interno. Aqui tal situação é mencionada de forma
genérica, uma vez que cabe aos tribunais que compõe o Poder Judiciário em
estabelecê-los.
Quanto à função atípica de natureza executiva, atribui-se ao Poder Judiciário,
administrar seus serviços e servidores, como, por exemplo, conceder licenças e férias
aos seus magistrados e serventuários, conforme se denota da leitura do artigo 96,
inciso I, alínea f da Constituição Federal.

Fica evidente que as funções exercidas pelos poderes legislativo e judiciário não
representam uma ameaça ao sistema de pesos e contrapesos descritos por Montesquieu, já que
são casos pontuais de mudança de prerrogativa que busca manter a independência entre os três
poderes. Todavia, as funções atípicas exercidas pelo Poder Executivo têm sido passíveis de
muitas críticas, pois mostram uma certa temeridade em relação ao acúmulo de poder.
(GUEDES, 2007, p. 6).
Como diz Paulo Bonavides e Paes de Andrade (1991, p. 483):

Todos temos o direito de nos rebelar contra qualquer espécie de coerção e abuso de
poder, em qualquer instância em que se manifestem: nossa arma chama-se
Constituição. Ela é a resposta à exigência também de Montesquieu, há mais de dois
séculos: “para que não se possa abusar do poder, é preciso que, pela disposição das
coisas, o poder freie o poder”.

O Poder Executivo encontra-se descrito nos artigos 76 a 91 da Constituição Federal em


que, conforme a redação do artigo 76, diz que “O Poder Executivo é exercido pelo Presidente
da República, auxiliado pelos Ministros de Estado”. (BRASIL, 1988, p. 44). A função
primordial do poder executivo é de administrar o Estado em consonância com as leis aprovadas
pelo legislativo.
No entanto, ao se observar os poderes do executivo, é possível perceber uma
preponderância em relação aos outros poderes, tendo em vista que se concede a ele poderes os
quais desvirtuam o propósito da doutrina estudada. (GUEDES, 2007, p. 6).
Como argumenta Eduardo Henrique Cortese Magalhães (2019, p. 22-23):

Defende-se que a forma como se encontram dispostos os poderes da República acaba


por favorecer clima propício para o florescimento da corrupção. Isso ocorre devido ao
44

fato de não se observar, no Brasil, as leis da política sistematizadas por Montesquieu,


leis essas que por este pensador foram elaboradas, mas que antecede à sua própria
existência, devendo, portanto, serem atendidas.

O maior exemplo dessa interferência de poderes é a atribuição do presidente em relação


às medidas provisórias, previsão essa amparada no artigo 62 da Constituição Federal. (BRASIL,
1988, p. 40).
Como apontado por Lucas José melo da Cunha (2017, p. 11):

A medida provisória fora adaptada seguindo o modelo do provvedimenti provvisori


con forza di legge in casi straordinari di necessità e di urgenza previsto no art. 77 da
Constituição italiana de 1947, país que adota o sistema parlamentarista de governo,
fato que difere do Brasil, já que o seu sistema é o presidencialista, ou seja, a separação
entre os Poderes é mais evidente, onde um deve harmoniosamente respeitar o pleno
exercício, pelos demais, de suas respectivas funções típicas.

Da mesma forma, destaca Michel Temer (2008, p. 153):

A Constituição italiana foi o modelo inspirador do constituinte brasileiro. Ocorre,


entretanto, que entre as medidas provisórias da Itália e as do Brasil há grande
diferença. Lá o sistema do governo é parlamentar e a Constituição prescreve que o
“Governo” (no caso, o Gabinete, por meio do Primeiro-Ministro) editará a medida
provisória sob sua responsabilidade. O que é responsabilidade no sistema
parlamentar? É aquela de natureza política. Portanto, o que ocorre se a medida
provisória não for aprovada pelo Parlamento italiano? O Gabinete (Governo) cai.

O debate sobre tal medida já era, de certa forma, antigo, no período da República
Populista (1945-1964), o Congresso era criticado veementemente por seu ritmo de trabalho,
alegava-se sua morosidade e como dificultava a ação administrativa do Executivo. Com a
redemocratização, foi implementado a medida provisória, onde o Congresso teria 30 dias para
apreciar, aprovar ou rejeitar, sem nenhuma restrição em relação à matéria, mas sob os
pressupostos de que deveriam ser editadas apenas em casos de relevância e urgência. (VILLA,
2011, p. 119).
Como é evidente, essa é uma intervenção clara do Poder Executivo em relação ao Poder
Legislativo. Diante da abrangência material e as reiteradas reedições das medidas provisórias,
foi promulgado no dia 11 de setembro de 2001 a Emenda Constitucional n.º 32, trazendo regras
mais rígidas ao referido ato normativo. (CUNHA, 2017, p. 13). Não obstante, ampliou-se o
período da medida provisória para 60 dias, prorrogáveis pelo mesmo período, chegando ao total
de 120 dias. Mesmo sob a égide dos pressupostos de relevância e urgência, na prática, não era
o que ocorria. (BRASIL, 1988, p. 43).
45

Sobre a relação entre a teoria tripartite e essa prerrogativa presidencial que desvirtua os
pesos e contrapesos da teoria de Montesquieu, aponta Juliana Santos Guedes (2007, p. 7):

Conceder poderes exorbitantes ao Poder Executivo acarreta no desvirtuamento dos


ocupantes das suas cadeiras. Isso ocorre, pois a eles é oportunizado “abusar” dos
poderes que lhe são concedidos. Este fato possibilita, também, que sejam, tais
ocupantes, alvos de pressões e influências que deveriam ser afastadas pela disposição
estatal dos poderes. A solução para essa problemática é a segunda lei da política de
Montesquieu, qual seja: “Para que não possam abusar do poder é necessário que, pela
disposição das coisas, o Poder freie o Poder.” (MONTESQUIEU, 1987, p. 198). É
pela falta de atendimento desta segunda lei de Montesquieu que ocorre a crise da
separação de poderes no Brasil. O poder executivo não se encontra “freado”.

Na prática as medidas provisórias têm servido ao Executivo como forma de legislar,


tendo em vista que grande número de medidas provisórias não cumprem os requisitos básicos
previsto no artigo constitucional, sendo eles a relevância e urgência. (VILLA, 2011, p. 120).
Os dados fornecidos pela Câmara dos Deputados só corroboram com os argumentos já
mencionados (BRASIL, 2020, p. 2):
46

Desde a Emenda Constitucional nº 32, de 2001, mais de 1000 medidas provisórias foram
editadas até novembro 2020, isso é um dado alarmante, pois as medidas provisórias editadas
anualmente superam o número de 50, o que mostra a interferência direta entre os poderes.
(BRASIL, 2020, p. 2).
Sobre as medidas provisórias, Alexandre de Moraes (2006, p. 1184-1185) menciona
importante trecho do voto do ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Melo, RTJ
151/331:

O que justifica a edição dessa espécie normativa, com força de lei, em nosso direito
constitucional, é a existência de um estado de necessidade, que impõe ao Poder
Público a adoção imediata de providências, de caráter legislativo, inalcançáveis
segundo as regras ordinárias de legiferação, em face do próprio periculum in mora
que fatalmente decorreria do atraso na concretização da prestação legislativa. (...) O
que legitima o Presidente da República a antecipar-se, cautelarmente, ao processo
legislativo ordinário, editando as medidas provisórias pertinentes, é o fundado receio,
por ele exteriorizado, de que o retardamento da prestação legislativa causa grave lesão,
de difícil reparação, ao interesse público.

A questão é que a previsão para editar medida provisória é subjetiva, não se consegue
definir de forma clara o que caracteriza relevância e urgência, são termos genéricos, e, com
isso, abrem o leque para interpretações. (GOUVEIA; AMARAL, 2008, p. 7).
Para se ter ideia de como os governos utilizam a medida protetiva de forma demasiada,
em 3 de novembro de 1988, a constituição ainda não tinha completado 1 mês, e foi editada uma
medida protetiva que tratava sobre a proibição da pesca de espécies em período de reprodução.
(VILLA, 2011, p. 120).
Um bom exemplo de matérias estranhas inseridas em medidas provisórias é a MP nº
668/2015. O texto original tinha quatro artigos, mas depois de tramitar pela Câmara voltou ao
Senado com vinte e sete artigos. A MP nº 668 modificava a lei de aumento de alíquotas da
contribuição para o PIS/Pasep-Importação e da Cofins-Importação, com a finalidade de
aumentar a arrecadação do governo. (SOUZA, 2015, p. 24-25).
Wadih Damous e Flávio Dino (2005, p. 99-100) exemplificam a banalização do uso das
medidas provisórias com a edição da “MP nº 105, de 13 de novembro de 1989, cujo texto
inscreve os nomes de Tiradentes e de Deodoro da Fonseca no Livro dos Heróis da Pátria”.
As constituições de 1824 e 1988 evidentemente são antagónicas, e um dos principais
fatores é o lapso temporal entre elas, mas fazendo uma análise minuciosa, é possível perceber
que há uma disparidade no sistema de pesos e contrapesos descritos por Montesquieu. Enquanto
47

na Constituição de 1988 isso ocorre de forma sutil, na Constituição de 1824, ocorre o reverso.
(VILLA, 2011, p. 17-125).
Uma das definições de poder é caracterizada pela capacidade de impor a própria vontade
em relação ao outro, mesmo que com resistência. (WEBER, 1999, p. 33).
Há dois aspectos muito interessantes, principalmente no campo diplomático, que são as
formas de poderes, Joseph Nye (2002, p. 123) aponta duas delas, denominadas como hard
power e soft power, ambas tratam da imposição das vontades, no entanto, manifestam-se de
formas diferentes, a primeira seria uma forma mais truculenta e agressiva, a qual adota o uso
da força, podendo ou não implicar as vias de fatos, alguns exemplos do uso dessa força pode
ser a ameaça ou até mesmo o uso da violência para alcançar o objetivo. O soft power também
trata da capacidade de conquistar o próprio objetivo, mas a forma como ocorre não é a mesma
do hard power. Na realidade o soft power utiliza de meios sutis para alcançar o objetivo final,
muitas das vezes acontecem até mesmo de formas imperceptíveis, por meio de influência ou
convencimento, exemplo claro disso são as propagandas de produtos ou até mesmo
propagandas eleitorais, um dos objetivos de partidos políticos em conquistar grande bancada
no Congresso Nacional é por saber que isso irá gerar, entre outras garantias, um grande tempo
de propaganda eleitoral, o que acarreta uma influência maior em relação aos telespectadores.
Por obvio, se um político possui mais tempo televisivo, a probabilidade de convencer o
telespectador sobre as próprias intenções acaba sendo maior, isso nada mais é do que o uso do
soft power.
As Constituições de 1824 e 1988 podem se diferir na forma como utilizam para alcançar
seus objetivos, mas ambas possuem formatos que permitem a disparidade entre a separação dos
poderes, enquanto na Constituição de 1824 isso ocorria de forma explícita e impositiva
(BRASIL, 1824, p. 3)., na Constituição de 1988 isso acontece de forma sutil e quase
imperceptível. (BRASIL, 1988, p. 43).
Nesse capítulo, foi apresentada por diversas perspectivas a Constituição Federal de
1988, o contexto histórico em que ela ocorreu, principalmente a descrição de alguns fatores da
ditadura militar (1964-1985), a Aliança Democrática formada para que houvesse a vitória na
eleição indireta de 1985, além de uma das manifestações mais importantes do brasil, as Diretas
já.
Ademais, foi abordada de forma sucinta a Comissão Afonso Arinos, que serviria como
um anteprojeto para que os constituintes eleitos em 1987 pudessem ter uma base inicial para
redigir a constituição depois do fim do regime ditatorial, já que a Carta de 1967 não serviria
48

como ponto de partida, no entanto, o anteprojeto foi finalizado, mas não chegou a ser enviado
por Sarney aos constituintes.
Por fim, neste capítulo foram apresentados tanto aspectos gerais da constituição
promulgada como a forma em que se deu a divisão dos poderes (executivo, legislativo e
judiciário), além da maneira como o poder executivo interfere, de certa forma, no sistema de
pesos e contrapesos.
49

5 CONCLUSÃO

O pesquisador apresentou, através do Trabalho de Conclusão de Curso, a estrutura da


divisão dos poderes em momentos fundamentais da história brasileira, divisão essa abordada
por pensadores que transcenderam sua época, como Aristóteles, John Locke e Montesquieu, foi
exatamente esse o principal aspecto tratado no capítulo dois, com uma descrição sucinta da
separação dos poderes em sua origem, por meio da obra A Política, de Aristóteles, não só isso,
John Locke, séculos depois, também abordou o assunto em seu livro Segundo Tratado sobre o
Governo, por fim, provavelmente a obra mais consolidada sobre o assunto, O Espírito das Leis,
onde houve a consolidação da teoria tripartite por meio de Montesquieu, livro esse em que ele
descreve de forma clara a importância da separação dos poderes, demonstrando o benefício de
instituições autônomas, que respeitam suas atribuições. Do mesmo modo, as formas de governo
apresentadas por Montesquieu também foram tratadas, já que ele mesmo relaciona a divisão
dos poderes com cada um dos formatos de governo.
O terceiro capítulo trouxe como objeto de estuda a Constituição de 1824, constituição
marcada por ser a mais longeva da história brasileira, além de ter sido a única do período
monárquico, ficou demonstrado no capítulo todo o contexto histórico em que ocorreu a
Assembleia Constituinte, bem como a outorga do primeiro texto constitucional brasileiro, feito
por D. Pedro I, de forma impositiva e com a dissolução da constituinte alguns meses antes.
Ademais, houve uma análise sobre assuntos gerais do texto constitucional, bem como da forma
como ocorria a separação dos poderes, forma essa caracterizada pela divisão desigual entre os
poderes, já que o imperador outorgou uma Carta onde havia a divisão entre os poderes
legislativo, executivo e judiciário, além de um quarto poder, o moderador, que se sobrepunha
aos outros, permitindo ao imperador que exercesse seu autoritarismo sempre que conveniente
a ele.
O quarto capítulo teve como base a mesma análise feita em relação à Constituição
Imperial, só que abordando a atual constituição brasileira, a Constituição de 1988, trazendo o
contexto histórico em que ela foi formulada, já que o Brasil havia acabado de sair de um regime
ditatorial, com diversos absurdos cometidos por parte do governo, além de uma eleição
presidencial cheia de peculiaridades. Com a vitória de Tancredo Neves e sua morte antes
mesmo de assumir a presidência, Sarney, seu vice, acaba assumindo a cadeira presidencial, e
forma-se a Comissão Afonso Arinos, comissão que tinha por objetivo formular um anteprojeto
para enviar à Assembleia Constituinte, dessa forma, os constituintes teriam um anteprojeto para
trabalhar, já que a constituição do regime militar não serviria. Finalizado o anteprojeto, ele
50

sequer foi enviado aos constituintes, fator esse que tornou praticamente desnecessária a
formação da constituição, assim, os constituintes eleitos tiveram que partir do zero e
confeccionaram a constituição em 19 meses, aprovada com ampla maioria. Dito isso, houve
uma análise sobre aspectos gerais da constituição, e por se tratar da maior constituição que o
país já teve e a segunda maior vigente no mundo, levando em conta sua minuciosidade, fica
evidente que vários artigos não são dignos de estarem escritos em uma constituição, isso explica
o motivo pelo qual a atual constituição passou por várias alterações desde quando foi
promulgada. Por fim, foi tratado da separação dos poderes mostrando funções típicas e atípicas
de cada um deles, com foco no poder executivo e medidas que proporcionam a disparidade
entre em relação aos pesos e contrapesos da teoria tripartite.
A problemática que permeou todo o trabalho foi “Como é entendida a separação dos
poderes nas constituições brasileiras de 1824 e 1988?”, foi a partir dessa perspectiva na qual se
deu todo o andamento no decorrer dos capítulos.
A história brasileira é composta em grande parte por autoritarismo e patrimonialismo,
na verdade, esses são termos que andam paralelamente, afinal, é por não conseguir distinguir a
diferença entre público e privado que, de certa forma, acaba acarretando medidas pouco
republicanas. A primeira constituição brasileira é exemplo expresso disso, onde se previa de
forma positivada a preponderância de um poder em detrimento de outro. Mais de 150 anos se
passam e o país chega a sua sétima constituição, essa transpira um ar de alívio e liberdade. No
entanto, a conquista nacional não ofusca o fato de que o Brasil possui uma constituição muito
extensa, marcada por sua minúcia e artigos que passaram por mudanças diversas vezes ao longo
de pouco tempo, a separação dos poderes também não funciona adequadamente nos termos
descritos por Montesquieu, na realidade, observa-se uma preponderância do poder executivo
em relação aos outros, principalmente em relação às medidas provisórias, que caracteriza de
forma visível o apossamento de função típica do legislativo.
Essa pesquisa é uma pequena demonstração da importância de instituições fortes e que
respeitam suas atribuições através de uma análise de momentos diferentes do país. Todavia,
esse não é o único fator gerador de problemas no cenário nacional, vale lembrar que o Brasil é
marcado pelos maiores escândalos de corrupção na história, além de interferências explícitas
em órgãos de investigação do poder público. No Brasil, o que se tem visto nas últimas décadas
é a apropriação do bem público em benefício próprio, independente de correntes ideológicas
que ocupam o poder. O presente trabalho é apenas uma pequena contribuição em meio a um
assunto com vasto campo de pesquisa.
51

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