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LAVRAS-MG
2020
NÍKOLAS KELLER DE OLIVEIRA SILVA
LAVRAS-MG
2020
NÍKOLAS KELLER DE OLIVEIRA SILVA
LAVRAS-MG
2020
À Deus, por ser morada em todos os momentos e à minha família por demonstrar o amor em
sua forma mais genuína. O caminho até aqui traçado é obra, também, de vocês.
Dedico.
AGRADECIMENTOS
Precipuamente à Deus por todas as bênçãos derramadas em minha vida e por permitir
que eu chegasse até aqui.
Aos meus pais, que jamais mediram esforços para proporcionar os melhores cenários
em minha vida. Por jamais permitirem que a palavra “desistência” existisse em meus planos e
por serem significado de apoio incondicional durante esta trajetória.
À minha irmã pelo companheirismo e amor de sempre.
À todas as instituições que me proporcionaram crescimento profissional durante o curso.
Aos meus amigos da graduação e de Lavras.
Ao meu orientador Prof. Dr. Ricardo Augusto de Araújo Teixeira, por todo auxílio e
esforço investidos neste trabalho conjuntamente.
A todos: os meus mais sinceros agradecimentos!
RESUMO
O cenário atual do país demonstra a existência de patente clamor no que diz respeito à expansão
do Direito Penal. São variados os motivos pelos quais surge tal demanda, contudo o que se
percebe é que o principal deles advém da frequente propagação de insegurança gerada pelos
meios de comunicação, os quais disseminam um pânico social, apresentando como solução a
tipificação desenfreada de condutas e o enrijecimento das penas. O presente trabalho busca
traçar os limites do expansionismo penal, tendo como modelo a crise social brasileira, tentando
ainda explicitar os elementos capazes de legitimar a expansão jurídico-penal.
The current scenario in the country demonstrates the existence of a clamor for the expansion of
criminal law. The reasons for which such demand arises are varied, however what is perceived
is that the main one arises from the frequent spread of insecurity generated by the media, which
disseminate a social panic, presenting as a solution the unrestrained typification of conducts
and the stiffening of the feathers. The present work seeks to trace the limits of penal
expansionism, using the Brazilian social crisis as a model, trying to explain the elements
capable of legitimizing the legal-penal expansion.
1 INTRODUÇÃO............................................................................................................. 8
2 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA .......................................................... 10
5 SOCIEDADE DO RISCO....................................................................................................... 15
8 CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 22
1 INTRODUÇÃO
É certo que com a evolução da sociedade, suas percepções não se mantêm estáticas. O
pensamento coletivo evolui e, desta forma, novas visões surgem, vindo a modificar os cenários
político-sociais. Além disso, esta modificação é um fenômeno natural e necessário, servindo de
consolidação de uma nova base para a evolução do próprio direito. No direito penal, o panorama
se mostra ainda mais importante, vez que as demandas sociais interferem de maneira direta em
sua manutenção, sendo que os anseios sociais por vezes têm forçado uma revisão e novação
legislativa. Para além, trata-se de ramo jurídico que tutela os bens considerados primordiais
para a garantia do bem-estar social, podendo valer-se até mesmo da privação da liberdade para
tanto.
Ressalta-se que essas mudanças não legitimam, em hipótese alguma, a banalização dos
princípios e uma aplicação do direito à la carte, de modo que os limites existentes no
ordenamento pátrio devem ser analisados e levados em consideração antes da elaboração ou
aplicação de normas.
O presente artigo mostra-se relevante ao tratar de uma situação que se perpetua no
tempo, de um fenômeno atemporal. Ora, as mudanças sociais e econômicas permanecerão
ocorrendo, vez que vivemos a era dos avanços tecnológicos e científicos. Desta forma o direito
seguirá se adequando às alterações e necessidades que sobrevierem, de forma a responder às
novas demandas que surgirem ao longo do processo evolutivo social.
A seara penal não se mostra diferente. O crime também é um fenômeno social que se
encontra em constante transformação, sendo esta evolução ponto chave para a discussão da
expansão em apreço. Em um breve e sucinto exemplo podemos notar que em período passado
os crimes possuíam caráter primordialmente patrimoniais e de simples complexidade, o que
tornava o trabalho do legislados menos complexo e mais restritivo. Lado outro, nos dias atuais
nos deparamos com os mais variados ilícitos penais, os quais, com o advento da globalização,
já alcançaram há alguns anos o campo das novas tecnologias, impulsionando, assim, a
necessidade de tutela de novas condutas pelo direito penal.
É incontroversa a afirmativa de que novas situações, como a exposta anteriormente à
título de exemplo, irão novamente ocorrer. Diante disso é que surge a imprescindibilidade do
debate acerca do expansionismo penal, mormente por se tratar de fenômeno atual e contínuo o
qual, deve ocorrer de maneira “limitada”, é dizer, respeitando o caráter de ultima ratio do direito
penal.
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O direito penal pátrio é ensejado à luz de diversos princípios, sendo necessário, a priori,
tratar especificamente de um destes, o qual consolida o caráter de ultima ratio da esfera penal.
O princípio da intervenção mínima vem sendo frequentemente banalizado em função da
demanda social por punição, segurança e um ideal conturbado de justiça. Cresce na sociedade
o sentimento de insegurança e o anseio por punições penais para atos que não estão revestidos
de relevância suficiente para essa tutela. Nesse sentido, à luz da Constituição Federal e dos
ensinamentos doutrinários, é imperioso entender que a criminalização de determinada conduta
apenas ocorrerá quando os demais ramos do direito não forem capazes de tutelá-la. Nas palavras
de Rogério Greco (2016, p. 77):
(...) o princípio da intervenção mínima deixa de entrever a necessidade de o
Direito Penal ser aplicado de forma subsidiária, tendo em vista a drasticidade
de sua resposta, permitindo, assim, ancorado no princípio da dignidade da
pessoa humana, que outros ramos do ordenamento jurídico, com primazia,
procurem fazer a proteção dos bens jurídicos, somente sendo necessária a
interferência do Direito Penal quando esses outros ramos demonstrarem que
são ineficazes ou insuficientes à sua proteção.
A liberdade é uma garantia fundamental dos seres humanos, sendo que o que existe
dentro do ordenamento é uma simples abstenção de parte dessa para que se garanta o bem-estar
da totalidade. Contudo, isso não significa que a o legislador possa cercear a liberdade diante de
toda e qualquer situação que cause um distúrbio social. A privação dessa garantia fundamental
se dará em caráter extremamente excepcional, quando as demais áreas do direito não possuírem
condição de tutelar determinado bem e diante da relevância deste último.
À luz dos preceitos constitucionais pátrios, temos que as liberdades asseguradas na carta
magna, apesar de não possuírem caráter absoluto, devem constituir regra dentro de nosso
ordenamento, de modo que sua restrição ocorra, como já exposto, somente em cenário
excepcional, como bem colocado pelo autor Luciano Anderson (2007, p. 88):
A premissa norteadora da análise em foco é a de que a criminalização de
condutas deve ser uma exceção, não por escolhas doutrinárias ou políticas, de
ordem momentânea, mas por imposição constitucional, reflexo, portanto, da
escolha política perene, que funda a sociedade e o Estado. [...] E isto porque a
Carta Política apresenta-se, de um lado como o pressuposto legitimador de
existência, e de outro como o limite mais rigoroso do poder punitivo estatal.
O gravoso poder do Estado de intervir jurídico-criminalmente na sociedade,
ou seja, de exercer o ius puniendi, é antes de tudo limitado pelo diploma por
excelência das liberdades públicas.
Assim sendo, resta claro que a Carta Magna, na mesma medida em que legitima a
atuação do legislador penal, impõe limites para tanto. O poder exercido pelo Estado deve se dar
com a finalidade de guardar a ordem pública, tendo como verdadeiro norte o princípio da
proporcionalidade, que garante uma pena proporcional ao bem jurídico tutelado e à conduta
praticada, como bem alude Damásio (2011, p. 53): “Chamado também ‘princípio da proibição de
excesso’, determina que a pena não pode ser superior ao grau de responsabilidade pela prática do fato.
Significa que a pena deve ser medida pela culpabilidade do autor. Daí dizer-se que a culpabilidade é a
medida da pena.
Isto posto, mostra-se importante tratar, nesse momento, do bem jurídico penal, vez que
possui caráter fundamental no momento em que o legislador realiza sua atividade, pois seu grau
de relevância é imprescindível para determinação da tipificação ou não de certa conduta.
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O bem jurídico na seara penal é um dos conceitos mais relevantes para a tratativa do
tema abordado no presente trabalho. Tal fato se enseja no entendimento praticamente uníssono
entre os doutrinadores de que o delito consiste na lesão ou perigo de se lesionar bem jurídico
relevante. É essencial, desta forma, que se discorra acerca do conceito de bem jurídico e de que
forma este será considerado relevante o suficiente para que mereça a tutela penal pelo
legislador.
De início, em uma breve contextualização histórica, é importante recordar que a
expressão “bem-jurídico” não se fez presente em toda a trajetória do direito penal. No período
pré-iluminista os delitos eram considerados, antes de mais nada, uma afronta aos ensinamentos
e mandamentos religiosos, ou seja, eram considerados como pecados cometidos em desacordo
com os preceitos e orientações ensinados pela Igreja. Esse cenário apenas veio a ser modificado
com o desenvolvimento e difusão do pensamento iluminista, que trouxe uma ótica diferente
para a temática. Nesse contexto, passou-se a considerar delito todas as ações que, como
consequência, violavam o contrato social, trazendo uma desarmonia dentro da sociedade.
A partir desse pensamento, foi construída uma teoria acerca do delito, a qual aduz que
este está diretamente ligado à uma violação de um direito subjetivo. Este marco teórico
demonstra extrema relevância para a posterior inserção do termo “bem jurídico” dentro da
esfera criminal, pois em prima facie traz que “o delito é, assim, entendido como a conduta que
transgride um direito alheio, proibida pela lei penal, a qual tem por finalidade a proteção dos
direitos dos indivíduos e do Estado” (PRADO, 2019, p. 09). Assim sendo, com o evoluir dos
estudos que abarcam o delito, finalmente se chegou à inclusão do termo bem jurídico na teoria
do delito, o qual se mantêm até os dias de hoje. Entretanto, é importante distinguir e
contextualizar o bem jurídico penal.
possuem uniformidade, fato que impossibilita uma definição concreta e objetiva do bem
jurídico.
No entendimento do autor Welzel (2003, p. 15) trata-se de “bem vital da comunidade
ou do indivíduo, que por sua significação social é protegido juridicamente”. Já na visão de
Roxin, o bem jurídico é formado por:
pressupostos imprescindíveis para a existência em comum, que se
caracterizam numa série de situações valiosas, como, por exemplo, a vida, a
integridade física, a liberdade de atuação, ou a propriedade, que toda a gente
conhece, e, na sua opinião, o Estado social deve também proteger penalmente
(ROXIN, 1986, p. 27-28).
Não obstante exista divergência quanto ao conceito de bem jurídico penal, destoam-se
algumas semelhanças abordadas pelos autores, se fazendo presentes em boa parte das
conceituações. Pode-se afirmar ser quase um consenso que o bem deve ser de extrema
relevância social e possuir grande valoração às pessoas cada qual em sua individualidade. A
fim de exemplificar, Roxin (1986, p. 27-28) utiliza alguns exemplos como a vida, a integridade
física e as liberdades, como já exposto acima.
Desta forma, é notório constatar a necessidade de coexistência entre o bem jurídico e o
direito penal. Este último, com fulcro nos princípios históricos em que se debruça, deve ser
capaz de instituir uma política criminal que selecione apenas os bens jurídicos de maiores
relevâncias para que sejam tutelados. Nas palavras de Luiz Régis Prado (2019, p. 54):
Em um Estado democrático e social de Direito, a tutela penal não pode vir
dissociada do pressuposto do bem jurídico, sendo considerada legítima, sob a
ótica constitucional, quando socialmente necessária. Isso vale dizer: quando
imprescindível para assegurar as condições de vida, o desenvolvimento e a
paz social, tendo em vista o postulado maior da liberdade – verdadeira
presunção de liberdade – e da dignidade da pessoa humana.
5 SOCIEDADE DO RISCO
Nota-se que nem sempre a intervenção irá recair na esfera criminal. O ordenamento
jurídico brasileiro possui ramos capazes de tutelar efetivamente bens jurídicos que não o direito
penal. Até mesmo porque valer-se deste último de maneira ilimitada é incorrer para do
surgimento de um direito penal simbólico, que sequer cumpre com sua finalidade, como se pode
notar a seguir.
No contexto atual resta evidente que o direito penal pátrio se encontra diante de um
cenário dúbio e cerceado de contrastes, no qual o anseio pelas tipificações e o aumento de
criminalidade se contrapõem ao princípio da ultima ratio e, também, às garantias e liberdades
individuais.
Um dos elementos que solidifica este quadro é a atuação dos meios de comunicação,
que passam, frequentemente, a sensação de insegurança e impotência à população. Luciano
Anderson bem exemplificou a situação quando aduz:
(...) a manipulação do sentimento social se faz com recurso a argumentos
como o de que as penas previstas são brandas ou os mecanismos de atuação
do controle criminal são, agora, ineficazes, exigindo-se para a correção desta
situação geratriz de insegurança o endurecimento das penas e a tipificação de
condutas que, mesmo que ainda não tuteladas por outros mecanismos jurídicos
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Em razão destes conflitos, em sua maioria de política criminal, emerge o direito penal
simbólico. Sua função se mostra ineficaz no que diz respeito à prevenção e repressão dos
delitos, explica-se. O direito penal simbólico ergue-se, usualmente, após ampla divulgação
midiática acerca de crimes violentos, fato que culmina no clamor social por uma resposta
imediata do Estado, buscando, desta forma, uma maneira de reprimir as ações delituosas.
O que se percebe é que as medidas utilizadas para sanar o anseio popular não passam
de mero simbolismo, uma resposta sem efeitos práticos, com a real finalidade de apenas acalmar
o ânimo e a cobrança por parte da população em relação ao Estado. Em sua grande maioria,
essas normas simbólicas possuem fins exclusivamente político, buscando idealizar uma falsa
percepção de segurança dentro da sociedade.
Nesse sentido, consolidando os argumentos expostos, o autor Luciano Anderson de
Souza pontua que:
(...) os operadores do Direito não encontram soluções eficazes para a
criminalidade atual simplesmente expedindo-se simbolicamente normas
criminalizadoras, o que, por sua vez, na prática, acarreta uma deslegitimidade
do Direito Penal (...) (SOUZA, 2007, p. 21).
Destaca-se que o processo expansionista do direito penal pátrio tem como uma de suas
bases primordiais os riscos advindos do avanço tecnológico e social. Através dessa
transformação emerge uma nova realidade que traz à tona a necessidade de tutela de bens supra
individuais e o surgimento da denominada sociedade do risco e, em sua decorrência, do direito
penal do risco, que será abordado mais à frente.
Entretanto, em um Estado Democrático de Direito, como o que vivemos, é necessário
entender que a prima facie as garantias e liberdades individuais compõem a regra, sendo que o
ordenamento penal, no que diz respeito a sua possibilidade de privação de liberdades, constitui
a exceção.
Desta forma, ressalta-se a importância de se consolidar um equilíbrio entre as garantias
individuais de cunho constitucional e a expansão do direito penal, sendo certo que este último
não deve ser utilizado como política de controle comportamental ou como respostas ao anseio
de uma sociedade de risco.
Além da problemática do equilíbrio, a expansão do direito penal introduz consequências
ainda mais severas para o Estado.
Inicialmente, e com certa obviedade, é notório que com novas tipificações aumenta-se
consideravelmente o número de processos, o que implicaria em um provável colapso do
judiciário, o qual já enfrenta extremas dificuldades diante dos números exorbitantes de feitos a
serem julgados.
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O sistema carcerário brasileiro é mais uma das “vítimas” deste expansionismo. Vale
destacar que a crise penitenciária nacional já perdura anos e as soluções sequer existem, ou
quando implementadas algumas tentativas, nem mesmo chegam a trazer resultados
significantes. As condições experimentadas por aqueles que têm sua liberdade privada são de
extrema precariedade, não havendo estruturas mínimas de higiene e saúde nos estabelecimentos
prisionais.
É inaceitável que, em função de expansionismo penal falho e de um direito penal
simbólico, um indivíduo se encontre privado de garantias básicas e essenciais, vivenciando
diariamente um cenário em total descompasso com os direitos humanos. Outrossim, a
tipificação de condutas e o encarceramento desenfreado tornam ineficaz a função
ressocializadora prevista pelo legislador para a pena.
Isto posto, resta claro que a expansão penal, fenômeno global, deve ser realizada em
conformidade com as peculiaridades de cada sociedade, se legitimando em conformidade com
os princípios constitucionais e penais, visando não acarretar nas falências de garantias e
liberdades individuais.
Não é uma pretensão neste trabalho o posicionamento contrário ao expansionismo
penal, visto se tratar de um fenômeno natural e necessário diante das frequentes mudanças
político-sociais e a necessidade de se tipificar novas condutas que venham a lesar bem jurídicos
relevantes.
Contudo, é importante que o fenômeno da expansão penal seja mais debatido a âmbito
nacional por juristas, políticos, operadores da lei, entre outros. Como cediço, a expansão é
atemporal, a sociedade moderna vivencia grandes mudanças dia após dia, o que fatalmente
culminará em novas modalidades de práticas ilícitas, novos padrões de crimes. Cabe ao Estado
estar apto a instituir políticas criminais capazes de reprimir essas novas condutas, sem, contudo,
trivializar a existência do próprio direito penal, utilizando-o como verdadeira “moeda de troca”
a fim de convencer a população de um falso ideal de segurança, através da criminalização de
condutas que sequer merecem a tutela penal.
Desta forma, é imprescindível que se estipule caminhos a serem trilhados como possíveis
soluções para a expansão, buscando que essa se dê em conformidade com a função que o
legislador previu para o direito penal.
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Assim, segundo a teoria do autor espanhol em análise, estabelece-se que “na primeira
velocidade manter-se-iam as garantias constitucionais relativas ao núcleo duro do Direito Penal,
e persistiria a ameaça de imposição de pens restritivas de liberdade, assegurando-se as áreas
tradicionais de intervenção desta área do direito.” (OLIVEIRA, 2012, p. 61).
Em sentido oposto à rigidez do direito penal clássico e a efetivação de todas as garantias
da persecução penal, tem-se que:
A segunda velocidade estaria voltada para os tipos penais contemporâneos,
que tutelam condutas de difícil comprovação, de modo que se retiraria o rigor
das regras investigatórias, permitindo mais flexibilidade no processo
acusatório, e ampliando as funções preventivas inseridas em tipos penais. Em
contrapartida à menores garantias, exclui-se a possibilidade de cominação de
penas restritivas de liberdade para esses tipos. (OLIVEIRA, 2012, p. 61).
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Conclui-se que o direito penal de segunda velocidade proposto pelo autor valer-se-ia de
um procedimento mais célere, com relativização das garantias constitucionais e penais, sem,
contudo, previsão de penas privativas de liberdade.
No entanto, o cenário exposto é justamente o que enseja a crítica à sua teoria. Para o
autor, o direito penal de segunda velocidade surgiria para abarcar as novas criminalidades,
praticadas em desfavor da ordem econômica, tributária, contra o meio ambiente, entre outras,
que em sua maioria são delitos cometidos por indivíduos mais poderosos. Isto posto, apesar de
sofrerem uma relativização de suas garantias, estes agentes teriam sempre o benefício de não
incorrerem nas penas privativas de liberdade, enquanto os demais crimes, praticados muitas
vezes pelos marginalizados da sociedade, seguiriam prevendo o tolhimento de suas liberdades.
Mostra-se necessária, então, frente à crítica exposta, a abordagem de teoria distinta, que
consolida outro caminho a ser trilhado frente ao fenômeno da expansão do direito penal.
Winfried Hassemer (1999), assim como Jesús-María Silva Sánchez (2002), procura
delinear um caminho a ser traçado a fim de consolidar uma atuação menos incisiva do Direito
Penal, fazendo jus ao seu caráter de última rátio, mesmo diante da patente expansão que
enfrenta.
Para efetivar sua teoria, Hassemer (1999), precipuamente discorda de Jesús-María
(2002) quanto à possível relativização de garantias dentro do direito penal e processual penal.
Em razão disso, entende ser necessário a criação de um novo sistema, o qual denomina de
Direito Penal de Intervenção. Este novo diploma abarcaria as condutas emergentes da sociedade
de risco, de cunho coletivo e que não possuíssem relevância para ser tutelada pelo Direito Penal,
o autor cita como exemplos a tutela do meio ambiente e os crimes envolvendo a ordem
econômica.
Além disso, bem argumenta quando alude que os novos tipos penais, mormente em
relação à bens jurídicos coletivos, trazem, em grande excesso, redações com tipos penais
abertos, incompletas ou com definições vagas. Desta forma, o legislador retira do Direito Penal
sua própria função, diante da dificuldade de adequação da conduta ao tipo penal. No mesmo
sentido trata da responsabilização do agente nos crimes de caráter pluripessoal. Não são raras
as vezes em que a definição do autor torna-se um obstáculo para a aplicação da Lei Penal, ou
até mesmo para o início da persecução, sendo esse mais um dos fatores pelo qual Hassemer
pugna pela criação de um novo sistema sancionador, em suas palavras entende que:
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8 CONCLUSÃO
com uma banalização das garantias. Esta banalização não se mostra eficaz ou em
conformidade com as diretrizes do Direito Penal.
Já Hassemer (1999), aduz a possibilidade da criação de um novo sistema
sancionatório, que tutelaria os novos interesses sociais, principalmente a criminalidade
econômica e do meio ambiente. Entretanto, não parece ser a melhor opção legislar sobre todo
um novo sistema, sendo que existem hoje no ordenamento pátrio searas do direito capazes de
tutelar muitos dessas novas demandas, tais como o Direito Civil e Direito Administrativo.
Ante o exposto, resta evidente que o legislador, mais do que qualquer outro indivíduo,
deve ser capaz de fazer uma análise minuciosa acerca da real necessidade da tutela de um
bem jurídico pelo Direito Penal. Para tanto deve levar em consideração as conotações
existentes entre o bem jurídico penal e a constituição, os princípios penais e processuais e a
possibilidade de tutela dos novos riscos por outras áreas do direito, sob o risco de banalizar a
real finalidade para que o Direito Penal foi criado e retirar seu caráter essencial de ultima
ratio.
Sem a finalidade de esgotar as possibilidades, a teoria do Direito Penal de Intervenção
parece se mostrar, no mínimo, ferramenta capaz de subsidiar novos estudos e possibilidades
para uma expansão penal compatível com as normas constitucionais e infraconstitucionais,
sem as quais o Direito Penal perderia sua própria função.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DE JESUS, Damásio. Direito Penal: Parte Geral. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1985.
GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal.
Niterói: Impetus. 2016.
PRADO, Luiz Regis. Bem Jurídico-Penal e Constituição. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2019.
ROXIN, Claus. Problemas fundamentais de Direito Penal. Trad. Ana Paula dos Santos;
Luis Natscheradctz. Lisboa: Veja, 1986.
SOUZA, Luciano Anderson de. Expansão do Direito Penal e Globalização. São Paulo:
Quartier Latin, 2007.
WELZEL, Hans. Direito Penal. Trad. Afonso Celso Rezende. Campinas: Romana, 2003.