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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

JBMT
Nº 70085744688 (Nº CNJ: 0001568-41.2023.8.21.7000)
2023/CRIME

EMBARGOS INFRINGENTES. FURTO MEDIANTE


ARROMBAMENTO. AUSÊNCIA DE QUALQUER
REGISTRO OFICIAL, FOTOGRAFIA OU AUTO
INSPECIONAL, DOS DANOS, ASSIM COMO DE
AUTO DE EXAME DE CORPO DE DELITO DIRETO.
O AUTO DE EXAME INDIRETO, NO CASO, NÃO
PASSA DE UM ARREMEDO DE EXAME, QUE NÃO
SE PRESTA A ATENDER À EXIGÊNCIA DE PROVA
DA MATERIALIDADE TARIFADA POR LEI.
Embargos infringentes acolhidos. POR MAIORIA.

EMBARGOS INFRINGENTES E DE TERCEIRO GRUPO CRIMINAL


NULIDADE

Nº 70085744688 (Nº CNJ: 0001568- COMARCA DE SÃO LEOPOLDO


41.2023.8.21.7000)

BRUNO GABRIEL CAMPOS EMBARGANTE

MINISTERIO PUBLICO EMBARGADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes do Terceiro Grupo Criminal do


Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em acolher os embargos infringentes, fazendo
prevalecer o voto vencido.
Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores


DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (PRESIDENTE) E DES.ª VANDERLEI
TERESINHA TREMEIA KUBIAK, DES. SÉRGIO MIGUEL ACHUTTI BLATTES,
DES.ª BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH.

Porto Alegre, 26 de abril de 2023.

DES. JOÃO BATISTA MARQUES TOVO,

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PODER JUDICIÁRIO
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JBMT
Nº 70085744688 (Nº CNJ: 0001568-41.2023.8.21.7000)
2023/CRIME

Relator.

RELATÓRIO
DES. JOÃO BATISTA MARQUES TOVO (RELATOR)

Adoto o relatório do parecer ministerial, transcrevendo-o:


(...)
BRUNO GABRIEL CAMPOS opôs embargos infringentes contra decisão
proferida pela egrégia Sexta Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, na Apelação
n.º 70085141729 que, por maioria, negou provimento ao recurso defensivo, vencida a
Des.ª Bernadete Coutinho Friedrich, cujo voto entendeu adequado o acolhimento
parcial do recurso para afastar a qualificadora do rompimento de obstáculo (fls. 171-
178).

O embargante pretende a prevalência do voto vencido para o efeito de ser


afastada a qualificadora e redimensionada a pena (fls. 182-185).

Vieram os autos para parecer.


(...)

O parecer, da lavra do Dr. Silvio Miranda Munhoz, ilustre Procurador de


Justiça, foi no sentido de rejeitar os embargos infringentes.
Autos conclusos.

É o relatório.

VOTOS

DES. JOÃO BATISTA MARQUES TOVO (RELATOR)


Esta a imputação fática:
(...)
FATO DELITUOSO:
No dia 28 de setembro de 2015, por volta das 03h40min, na Rua Presidente
Roosevelt, nº 176, Bairro Centro, nesta Cidade, o denunciado tentou subtrair, para si,
mediante rompimento de obstáculo, consistente em arrombar a porta do veículo,
quebrar o painel e cortar os fios do automóvel (auto de constatação de furto
qualificado anexo), coisa alheia móvel, qual seja, o veículo FIT/Tipo 1.6, cor preta,
modelo 1995, placas LBC-8043 (auto de apreensão da fl. 09 – IP), bem avaliado em R$
6.402,00 (seis mil quatrocentos e dois reais) – (auto de avaliação indireta anexo) e
pertencente à vítima Valmor roberto Machado, delito que somente não se consumou

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por circunstâncias alheias à sua vontade, qual seja, não ter conseguido realizar a
ligação direta no veículo.

Na ocasião, policiais militares foram despachados via sala de operações para


atender ocorrência de furto a veículo no endereço supracitado, onde o suspeito estaria
vasculhando dentro do automóvel. Quando da chegada, os policiais fizeram contato
com a testemunha Jean Pilla Mendonça, a qual relatou que um indivíduo arrombou o
veículo, tentou fazer ligação direta por diversas vezes e, como não obteve sucesso, saiu
em direção à estação de trem. Na posse das características do suspeito, os policiais
saíram em diligência nas redondezas, logrando êxito em localizar o denunciado, na
posse de uma faca, o qual possuía as características informadas e foi reconhecido pela
testemunha Jean.
Diante dos fatos, o denunciado foi preso em flagrante e conduzido até a
repartição policial.
A res furtiva foi apreendida e restituída à vítima (autos de apreensão e
restituição anexos).
(...)

A sentença, no ponto em que interessa ao julgamento do presente recurso,


assim foi fundamentada:
(...)
Passo a fundamentar e decidir.

Registro que a relação processual desenvolveu-se de forma regular, estando


presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, não havendo nulidades a
serem declaradas de ofício, tampouco implementou-se qualquer prazo prescricional.

A existência do delito descrito na denúncia está claramente consubstanciada


pelo boletim de ocorrência de fls. 19-22, auto de apreensão de fl. 23, auto de restituição
de fls. 24, auto de constatação de furto qualificado de fl. 66 e auto de avaliação indireta
de fl. 67, acrescendo-se, ainda, a prova testemunhal colhida, não havendo dúvidas
acerca do fato apurado.

O réu, tanto em sede policial, como em Juízo, optou por permanecer em silêncio.

A vítima Valmor Roberto Machado relatou que o seu vizinho flagrou o réu
tentando furtar o seu veículo e acionou a polícia, sendo que quando conseguiram lhe
chamar, o acusado já estava detido. Referiu que o veículo estava em via pública. Disse
que o acusado arrombou o veículo para ingressar, danificando a porta, o painel, o
módulo. Ressaltou que seu vizinho flagrou o acusado dentro do veículo, tentando fazê-
lo ligar. Questionado, informou que quando chegou ao local, o acusado estava dentro
da viatura da polícia, em frente ao seu veículo.

Ainda, a testemunha Jean Pila Mendonç, relatou que ouviu barulhos de


arrombamento e quando olhou pela janela, flagrou o acusado dentro do veículo do seu
vizinho. Disse que prontamente foi chamar o proprietário do veículo, mas não
conseguiu contato. Referiu que o acusado continuava dentro do automóvel, tentando
ligá-lo, tendo, então, acionado a Brigada Militar. Informou que o acusado não
conseguiu dar partida no veículo e saiu caminhando. Relatou que a Brigada Militar
chegou ao local e pediu as características do acusado, saindo a procura dele. Disse
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que, em seguida, os policiais retornaram com o acusado dentro da viatura, tendo o


depoente o reconhecido como o indivíduo que estava tentando furtar o veículo. Referiu
que uma faca foi apreendida com o acusado. Disse não saber o que foi danificado no
veículo. Informou que no local havia iluminação pública e seu apartamento fica há
cerca de dois metros de distância do local onde o veículo estava estacionado. Disse que
a luz interna do veículo não estava acesa, mas visualizou o momento em que o acusado
saiu. Afirmou que a Brigada demorou cerca de 15 minutos para chegar e, depois, cerca
de 5 minutos para localizar o acusado. Referiu que o acusado estava utilizando boné,
não recordando a cor.

Por derradeiro, a testemunha Rafael Pereira Saraçol não recordou do fato, em


razão do tempo transcorrido, mas confirmou seu depoimento em sede policial (fl. 54).

Aí cessa a prova coligida durante a instrução penal, sob o jugo do contraditório


e ampla defesa, estando, portanto, apta a julgamento.

Os elementos de prova produzidos sob o crivo do contraditório e ampla defesa,


são suficientes à comprovação do tipo penal descrito na denúncia, imputado ao
denunciado.

Com efeito, a vítima relatou ter sido avisada pelo seu vizinho acerca da tentativa
de furto do seu veículo e quando chegou no local, o acusado já se encontrava detido
dentro da viatura da Brigada Militar, ocasião em foi reconhecido pelo seu vizinho
como o autor do delito.

Cabe destacar que o relato da vítima merece especial valoração, primeiro,


porque uma pessoa, sem desvios de personalidade, jamais acusará desconhecidos da
prática de um crime, quando não aconteceu, segundo, porque geralmente os crimes
desta natureza são praticados na clandestinidade, sem a presença de testemunhas.
Desse modo, em se tratando de pessoa idônea, não se pode crer que falte com a
verdade, acusando indivíduo inocente, salvo prova em sentido contrário, a cargo da
Defesa, o que não ocorre no caso dos autos.

Não há, portanto, qualquer prova a desqualificar o testemunho do ofendido.

Nesse sentido, colaciono o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do


Estado do Rio Grande do Sul:

(...omissis...)

Somado à declaração da vítima tem-se o depoimento da testemunha presencial


do fato, a qual detalhou a empreitada criminosa, porquanto relatou ter escutado os
barulhos do arrombamento do veículo, flagrando o acusado no seu interior, tentando
ligá-lo e, após, sem obter êxito, deixando o local, tendo, então, imediatamente acionado
a Brigada Militar. Ainda, reconheceu o acusado, quando detido pelos policiais, como o
indivíduo que havia tentado furtar o veículo da vítima.

Cumpre destacar que o depoimento da testemunha presencial do fato possui


grande relevância probatória, conforme tem reconhecido o Tribunal de Justiça do
Estado:

(...omissis...)
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Assim, plenamente possível, pois, a valoração do depoimento para fins de um


decreto condenatório, sobretudo pelo fato de serem corroborado por todo o conjunto
probatório dos autos, valendo ainda destacar a apreensão de uma faca, na posse do
réu.

Gize-se que o silêncio do acusado em sede policial e em Juízo, ainda que não
possa ser considerado em seu prejuízo, por ser direito constitucionalmente previsto, por
óbvio, não pode recair em seu favor, tendo em vista a grave consequência que, se assim
fosse, poderia acarretar aos demais processos penais. Dessa maneira, inexiste razão
para entender que a ausência de confissão do acusado possa caracterizar, por si só,
ainda que contrária aos demais elementos probatórios, como bastante para uma
absolvição.

Assim, irrompe inafastável, por tudo, a autoria do delito de furto qualificado


tentado descrito na denúncia, não havendo sequer margem para cogitar de
insuficiência probatória para a condenação.

De igual forma, a qualificadora de rompimento de obstáculo está comprovada


nos autos por meio do auto de constatação indireto de furto qualificado juntado à fl. 66,
que apontou que a porta do veículo foi arrombada, o painel quebrado e os fios
cortados.

Ademais, a vítima e testemunha inquiridas corroboraram o que estava descrito


no auto, porquanto afirmaram que para acessar o veículo o réu arrombou a porta,
danificando-a.

Saliento que na falta do exame direto pode e deve o Juiz valer-se do exame
indireto, através da prova testemunhal, conforme dispõe o art. 167 do Código de
Processo Penal. E, no caso dos autos, como já referido, a vítima confirmou que a porta
do seu veículo foi arrombada, bem como o painel e módulo restaram danificados,
corroborando, reitero, o resultado do auto de constatação indireta de furto qualificado.

(...omissis...)

Logo, assente a configuração da qualificadora.

Todavia, muito embora certa a autoria do fato descrito, à evidência, o delito não
restou consumado por circunstâncias alheias à vontade do réu, tendo em vista que o
acusado foi flagrado ainda no interior do veículo da vítima, porém não conseguiu dar
partida e deixou o local, sendo, em seguida, detido pelos policiais próximo ao local do
ocorrido.

Neste sentido, destaco o entendimento do Tribunal de Justiça gaúcho, em caso


semelhante ao dos autos:

(...omissis...)

Portanto, diante dos argumentos esposados, resta comprovada a materialidade e


a autoria do delito descrito na exordial, porquanto demonstrados os elementos
constitutivos do tipo penal, devendo o denunciado responder pelos seus atos, ante o

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juízo de reprovabilidade de sua conduta, afastando-se as teses defensivas


remanescentes.

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE a ação penal e CONDENO o réu


BRUNO GABRIEL CAMPOS como incurso nas sanções do artigo 155, §4º, inciso I,
c/c o artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal.
(...)

E o voto vencido, lavrado pela relatora, Desª. Bernadete Coutinho Friedrich,


nos seguintes termos:
(...)
Conheço desse recurso de apelação porque satisfeitos seus requisitos de
admissibilidade.
O Ministério Público denunciou o acusado, imputando-lhe a prática do crime de
furto qualificado pelo rompimento de obstáculo na forma tentada, previsto no art. 155,
§4º, inciso I, c/c o art. 14, ambos do CP.
O julgador de origem, acolhendo a denúncia, julgou procedente a ação penal,
condenando o acusado ao cumprimento de pena de reclusão e multa, substituindo a
pena privativa de liberdade por pena restritiva de direito, prestação de serviços à
comunidade e prestação pecuniária.
A Defesa insurge-se contra essa decisão, postulando a absolvição, ou a
desclassificação da conduta para furto simples e a redução da pena aplicada.
Prospera em parte o recurso.
Explico.
A materialidade do delito vem comprovada pelos autos de apreensão, avaliação
indireta e restituição (fls. 23,67 e 24).
A autoria é incontroversa.
O acusado, tanto na fase policial quanto em juízo optou em exercer seu direito
ao silêncio. Todavia, resta induvidoso ter sido ele o autor do crime de furto descrito na
denúncia, porquanto preso em flagrante logo após ter ocorrido a tentativa de
subtração, fato que ocorreu por conta da descrição feita pela testemunha Jean Pilla
Mendonça aos policiais militares que foram por ele chamados ao local do fato.
Ao ser ouvido em juízo, ratificando o relato por ela feito perante a autoridade
policial, a testemunha presencial, Jean Pilla Mendonça, disse que, residia no mesmo
prédio do proprietário do veículo, que estava estacionado na via pública, quando viu
pela janela que o acusado estava tentando subtraí-lo. Em razão disso tentou avisar a
vítima sem êxito. Então, ligou para a polícia militar que foi ao local, ocasião em que
ela descreveu o acusado, tendo os policiais saído a sua procura, voltando, em seguida
com ele preso, momento em que o reconheceu como sendo a pessoa que estava no
interior do automóvel da vítima, tentando subtraí-lo (fl. 108).
A vítima Valmor, ao ser ouvido em juízo e que não presenciou a subtração, disse
que foi informado a respeito pelo vizinho Jean Pilla e que o acusado restou preso em
flagrante no interior do automóvel. (Fl.94)
O policial militar Rafael Pereira Saraçol, em juízo, nada lembrou sobre o
ocorrido, confirmando, todavia, o depoimento por ele prestado à autoridade policial,
ocasião em que disse que: que foram acionados pela sala de operações para atender
ocorrência de furto de veículo, onde um indivíduo estaria dentro do veículo. Que no
local entraram em contado com uma testemunha a qual disse ter ligado para brigada
militar para informar o acontecido. Que após a testemunha informar para onde o

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indivíduo foi, a guarnição conseguiu pega-lo, sendo que o indivíduo estava com uma
faca em seu poder. Que a testemunha reconheceu o indivíduo como sendo aquele que
ficou por algum tempo tentando ligar o veículo fiat tipo da vítima. Que então
conduziram todos para delegacia (fl.08).
Essa a prova oral encartada ao caderno processual durante a instrução da
causa.
E, ao contrário do afirmado pela Defesa em suas razões recursais, essa prova
oral somada ao auto de prisão e flagrante e aos autos de apreensão e restituição, são
prova bastante para sustentar um veredito condenatório, pois, demonstram, sem deixar
qualquer dúvida, que o acusado tentou subtrair o veículo da vítima, não conseguindo
êxito em seu intento por circunstâncias alheias a sua vontade, na medida em que não
conseguiu fazer ligação direta no automotor para empreender marcha e leva-lo de
onde estava.
Assim, comprovadas a materialidade e a autoria delitiva, inexistente no caderno
processual qualquer elemento de convicção capaz de excluir o crime e ou isentar o réu
de pena, importa a manutenção do decreto condenatório. Inaplicável, na espécie, o
princípio do in dubio pro reo, na medida em que não há dúvida que o acusado cometeu
crime contra o patrimônio, descrito na denúncia, ao tentar subtrair o veículo automotor
da vítima, estacionado na via pública.
Quanto à adequação típica da conduta, razão assiste à Defesa quando pretende
o afastamento da qualificadora do rompimento de obstáculo.
Isso porque o crime narrado na denúncia deixa vestígios, razão porque era
imprescindível a realização de exame de corpo de delito, não havendo como suprir a
sua ausência pela prova oral, nem mesmo pela confissão, nos termos do art. 158 do
CPP.
E, o exame do local foi realizado, mas de forma indireta, como dá conta o auto
de constatação, fl. 66, sem que os senhores peritos tenham informado porque agiram
assim, tampouco esclarecido sobre o desaparecimento de eventuais vestígios deixados
quando da prática do crime, o que, aí sim, autorizaria a realização do exame dessa
forma.
Então, resta o auto de constatação de rompimento de obstáculo eivado de vicio
de validade, pois, realizado em desacordo com a legislação de regência.
Assim, há que ser acolhida a pretensão defensiva de desclassificação do crime
de furto para a sua forma simples, afastada a qualificadora do rompimento de
obstáculo.
Por isso, desclassifico a conduta do réu para o crime de furto simples, previsto
no art. 155, caput, c/c art. 14, inciso II, todos do CP.
Passo a análise da pena aplicada, assim estabelecida pelo juízo de origem:
“....
Analisando as circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal,
verifico que o réu não registra antecedentes, aqui considerados os fatos pretéritos à
infração ora analisada, com trânsito em julgado há mais de cinco anos e que não
importam em reincidência, conforme certidão de antecedentes de fls. 128-130; a
conduta social não encontra elementos significativos demonstrados nos autos; quanto
à personalidade, ausentes elementos para aferição; os motivos que ensejaram a
conduta do réu dizem respeito à obtenção de lucro fácil em prejuízo de terceiro;
quanto às circunstâncias são comezinhas aos crimes desta espécie; não há
consequências de relevo; a vítima em nada contribuiu para a prática do crime.
Assim, a teor da análise realizada, tem-se que a culpabilidade, aqui considerada
como o grau de reprovabilidade da conduta, é ordinária, tendo o denunciado
potencial consciência da ilicitude de seu ato, sendo-lhe exigida conduta diversa.

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Dessa forma, atenta às operadoras do artigo 59 do Código Penal, acima


analisadas, bem como aos critérios de necessidade e suficiência para a prevenção e
reprovação do crime, fixo a pena-base em DOIS (02) ANOS de RECLUSÃO.

Ante a ausência circunstâncias agravantes ou atenuantes, resta a pena provisória


fixada no mesmo patamar da pena-base.

Incidente, na espécie, a minorante da tentativa, de modo que, considerando o iter


criminis percorrido, tendo o réu logrado êxito em arrombar e ingressar no
automóvel, somente não conseguindo dar partida, em conduta que se aproximou da
consumação, diminuo a pena em um terço (1/3) o que corresponde a OITO (08)
MESES de RECLUSÃO, restando a pena em UM (01) ANO e QUATRO (04)
MESES de RECLUSÃO, a qual torno definitiva ante a inexistência de outras causas
de aumento ou diminuição da pena.

Reaprecio.
Todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP foram consideradas
favoráveis ao réu.
Assim, tendo em vista a desclassificação do delito para a sua forma simples,
estabeleço a pena base privativa de liberdade no mínimo legal cominado, ou seja, um
(01) ano de reclusão, restando a pena provisória nesse quantum porque ausentes
agravantes e atenuantes.
Na última etapa do cálculo da pena, pretende a Defesa a redução da pena na
fração máxima em razão do reconhecimento de que o delito foi cometido na sua forma
tentada, no que não lhe assiste razão, na medida em que, restou demonstrado pelo
depoimento da testemunha presencial, que o réu entrou no interior do carro da vítima,
tentou fazer uma “ligação direta” para dar a partida, sem êxito, razão porque desistiu
e saiu do local, sendo detido momentos após.
Então, forçoso reconhecer que iter criminis percorrido, em muito se aproximou
da consumação do delito, razão pela qual, resta mantida a redução da pena na fração
de 1/3.
Assim, resta a pena definitiva em 08 meses de reclusão.
A pena de multa porque estabelecida na sentença no mínimo legal cominado
resta mantida.
Por outro lado, observado o quantum estabelecido para a pena de reclusão, na
forma do art. 44, §2ºc/c o art.46, ambos do CP, substituo a pena privativa de liberdade
por uma pena restritiva de direito, na forma de prestação de serviços à comunidade
pelo tempo da pena de reclusão aplicada, a ser organizada pelo Juízo das Execuções
Criminais.
Diante do exposto, voto no sentido de dar parcial provimento ao recurso de
apelação para, mantida a condenação do réu Bruno Gabriel Campos, desclassificar a
conduta descrita na denúncia para o crime de furto simples na forma do art. 155, caput
, c/c art. 14, inciso II, todos do CP, reduzindo a pena privativa de liberdade aplicada
para oito (08) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, substituída
por uma pena restritiva de direito, na forma de prestação de serviços comunidade pelo
tempo da pena de reclusão aplicada, a ser organizada pelo Juízo das Execuções
Criminais, mantidas as demais disposições contidas na sentença.
(...)

O Des. José Ricardo Coutinho Silva, condutor da decisão majoritária, assim


laçou seu voto:
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(...)
Com a devida vênia à eminente Relatora, divirjo no que diz respeito ao
afastamento da qualificadora do rompimento de obstáculo.
Com efeito, tenho que comprovada a qualificadora, nos termos do auto de
constatação indireta de furto qualificado (fl. 66), apontando a existência de danos na
porta, no painel e nos fios no interior do veículo, o que foi confirmado pela prova oral.
Ademais, reiterados os julgados deste Tribunal de Justiça, inclusive, do 3º
Grupo Criminal, no sentido de que o fato de o auto de constatação de furto qualificado
ter sido confeccionado de forma indireta não o invalida, eis que autorizado,
expressamente, pelo art. 158 do Código de Processo Penal:

Art. 158.  Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame


de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do
acusado. Grifei.

Nesse sentido, os precedentes deste Tribunal:

(...omissis...)

Ademais, tenho que, embora recomendável, nos delitos que deixam vestígios, a
realização da prova pericial não é essencial à comprovação do crime
e suas circunstâncias quando não necessária qualificação técnica para a sua
aferição, podendo sua demonstração ocorrer por outros meios de prova legalmente
admitidos.
Assim, deve ser mantido o reconhecimento da qualificadora do rompimento de
obstáculo.
No tocante ao apenamento, nada a alterar na pena-base, já fixada no mínimo
legal, 02 anos de reclusão.
Ausentes agravantes ou atenuantes, mantenho a redução da pena pela tentativa,
na fração de 1/3, diante do andar avançado iter criminis percorrido, restando essa
definitiva, na ausência de outras causas modificadoras, em 01 ano e 04 meses de
reclusão.
Nada a alterar no regime inicial já fixado no aberto e na substituição da pena
carcerária pelas restritivas de direitos de prestação de serviços à comunidade e
prestação pecuniária, em observância ao disposto, respectivamente, nos artigos 33, §
2º, alínea “c”, e 44, § 2º, ambos do Código Penal.
Vai mantida, também, a pena de multa, já fixada no mínimo legal de 10 dias-
multa, na razão mínima.
Em face do exposto, voto por negar provimento ao apelo.
(...)

O voto de desempate, do Des. Sérgio Miguel Achutti Blattes:


(...)
Com a vênia da eminente Relatora, no caso concreto acompanho a divergência
inaugurada pelo ilustre Desembargador José Ricardo Coutinho da Silva.
(...)

Busca o embargante a prevalência do voto vencido.

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Pois estou a fazer prevalecer o voto vencido. No caso dos autos, bastava
tirar uma fotografia dos danos ou a autoridade policial que presidiu o flagrante fazer uma
constatação in loco e fazer um auto de inspeção certificador do evento. Mas disso não se
cuidou. O que se fez foi apenas um arremedo de exame indireto algum tempo depois, o que,
a meu sentir, viola o disposto no artigo 158 do CPP.

POSTO ISSO, voto no sentido de acolher os embargos e fazer prevalecer o


voto vencido.

DES.ª VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK (REVISORA) - De acordo com


o(a) Relator(a).

DES. SÉRGIO MIGUEL ACHUTTI BLATTES


Rogo vênia ao eminente Relator e divirjo a fim de manter integralmente o
posicionamento exposto em meu voto quando do julgamento do recurso de apelação.
Renovada vênia, voto por desacolher os embargos infringentes.

DES.ª BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH - De acordo com o(a) Relator(a).


DES. IVAN LEOMAR BRUXEL (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - Presidente - Embargos Infringentes e de Nulidade nº


70085744688, Comarca de São Leopoldo: "POR MAIORIA, ACOLHERAM OS
EMBARGOS INFRINGENTES FAZENDO PREVALECER O VOTO VENCIDO,
VENCIDO O DESEMBARGADOR SÉRGIO MIGUEL ACHUTTI BLATTES."

Julgador(a) de 1º Grau: CELIA CRISTINA VERAS PEROTTO

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