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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Faculdade Mineira De direito Unidade São Gabriel

PRÁTICA SIMULADA ADVOCACIA CRIMINAL


ALEGAÇÕES FINAIS

Belo Horizonte
Outubro 2023
Fabrizia Emanuelle Luz Rodrigues
Tamara Fernanda Gomes Nunes

ADVOCACIA CRIMINAL ALEGAÇÕES FINAIS

Belo Horizonte
Outubro 2023
CASO:

PUCMINAS - PRÁTICA SIMULADA – ADVOCACIA CRIMINAL – ALEGAÇÕES


FINAIS – 2.2023.

Carmem Guedes, 23 anos, bacharel em Biomedicina, no dia 11 de julho


de 2023, no município de Tabasco – MG, Triângulo Mineiro, subtraiu
voluntariamente o veículo automotor, Toyota Hilux 2020 – 2.8, SRV, 4x4, CD,
diesel, 4P, automático, de propriedade de Gigy Terra, que o estacionou em
frente à sua casa, na Avenida Principal, nº 2.895.
Na ocasião, às 17h:56min, Carmem, ao ver o carro estacionado,
aproximou-se, rapidamente arrebentou o vidro da porta do motorista, entrou no
veículo, empregou chave falsa na ignição, deu partida, e subtraiu a coisa alheia
móvel, dirigindo o carro para o vender no Paraguai.
Alertada pelos vizinhos, imediatamente, a vítima chamou a polícia. Os
agentes de segurança pública empreenderam perseguição ininterrupta, tendo
prendido Carmem em flagrante delito somente no dia seguinte, exatamente na
fronteira estadual, entre Minas Gerais e o Estado de Goiás, conduzindo o carro.
O veículo automotor foi apreendido e, logo em seguida, devolvido à
vítima, devido à imprudência burocrática. Sendo assim, o exame pericial do
automóvel não foi realizado. Até porque, logo após, a vítima conseguiu vender
o carro para amiga que morava no Uruguai.
Na Audiência de Custódia, foi concedida a liberdade provisória,
mediante fiança.
Em 11 de setembro de 2023, a denúncia foi recebida, imputando a
Carmem Guedes a prática dos crimes do art. 155, §4º, incisos I (rompimento de
obstáculo) e III (emprego de chave falsa) e § 5º (transporte para outro Estado),
c/c o §1º (período noturno) e o art. 69 (concurso material), ambos do CP.
Após, o pedido de absolvição sumária da resposta à acusação foi indeferido
pelo Juiz Criminal, que recebeu definitivamente a denúncia, fixando data de
realização da AIJ.
Na AIJ, 3/10/2023, as testemunhas comuns, arroladas pela acusação e
pela defesa, Inspetor Argony Silva, Detetive Carlos Airby e Detetive Estevão
Feitusco, todos da PCMG, afirmaram que a ré foi presa na fronteira
interestadual na posse do veículo automotor (res furtiva). Ainda narraram que a
ré era Top Model, com participação em minissérie da Rede Globo. Também
contaram que a acusada é notória consumidora de drogas proibidas. E tinha
envolvimento com a prostituição do book rosa em hotel de luxo da cidade.
Em seu interrogatório, a ré confessou voluntariamente o fato,
sustentando que devia a meses R$15.000,00 a traficantes de drogas, os quais
lhe ameaçavam permanentemente de morte por eletrocussão, caso não
pagasse imediatamente a dívida, razão pela qual em ato de desespero, sem
outro caminho de solução, foi forçada a praticar a subtração.
Diligências supletivas requiridas pelo Ministério Público foram deferidas,
mas não foi possível juntada de laudo pericial do local do fato e do veículo.
Ao cabo da AIJ, 19/10/2023, o Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal fixou o
prazo legal para apresentação das alegações finais defensivas na forma de
memoriais. Com base somente nas informações de que dispõe e nas que
podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija a peça defensiva,
sustentando, para tanto, as teses jurídicas pertinentes.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 4ª VARA
CRIMINAL DA COMARCA DE TABASCO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Autos nº xxxxxxxx-xx.8.13.xxxx

CARMEM GUEDES, brasileira, solteira, bacharel em Biomedicina, portadora da


cédula de identidade nº XXXXXXXX, inscrita no CPF sob o nº
XXX.XXX.XXX-XX, residente e domiciliada na Avenida Principal, nº 2.895,
Tabasco – MG, por intermédio de seu Advogado (doc. 1), com endereço
profissional situado na Rua XXXXXXX, nº XX, bairro XXXXXXXX, CEP:
XXXXX-XXX, nesta cidade, onde recebe intimações e notificações, vem,
respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, nos autos do processo
crime em epígrafe, apresentar suas ALEGAÇÕES FINAIS nos termos do artigo
403, § 3º, do Código de Processo Penal pelos fatos e fundamentos a seguir
expostos:

I - DOS FATOS

No dia 11 de julho de 2023, a ré Carmem Guedes foi acusada de subtrair


voluntariamente o veículo automotor, Toyota Hilux 2020, de propriedade de
Gigy Terra, na cidade de Tabasco Minas Gerais. A ré foi presa na fronteira
interestadual entre Minas Gerais e Goiás, conduzindo o veículo automotor,
veículo esse que foi apreendido pela autoridade policial, e logo em seguida
devolvido à vítima que o vendeu posteriormente.
Cumpre destacar que a ré Carmem Guedes, estava em um momento de
extrema vulnerabilidade. A ação praticada, embora pareça um simples furto de
veículo, na verdade, foi uma medida desesperada tomada em um contexto de
coação moral insuportável e de risco iminente à sua vida.
A ré, notoriamente uma jovem bacharel em Biomedicina e Top Model,
encontrava-se endividada com traficantes de drogas, sendo coagida sob
ameaça permanente de morte por eletrocussão. Essa situação a levou a
praticar o ato que está sendo julgado, não com o intuito de obter lucro com o
furto, mas sim como uma tentativa de se salvar de um perigo que a
acompanhava diariamente.
A ré não agiu com o intuito de obter lucro com o furto do veículo Toyota
Hilux 2020. A sua conduta não se coaduna com a típica finalidade de
enriquecimento ilícito. Ao contrário, Carmem Guedes agiu sob ameaça e
coação, sendo compelida a tomar medidas extremas para assegurar sua
própria sobrevivência.
Além disso, o veículo foi prontamente recuperado e devolvido à vítima, o
que demonstra que não houve qualquer prejuízo material a ser reparado. A
ausência de danos materiais evidencia a ausência de intenção de obtenção de
lucro, e sim uma reação de desespero diante da ameaça que pairava sobre a
ré.
A ré confessou voluntariamente o fato e explicou, de forma contundente,
que agiu sob coação moral insuportável. Os traficantes a ameaçavam
permanentemente de morte por eletrocussão, caso ela não pagasse
imediatamente a dívida de R$15.000,00. Tal situação é corroborada pelos
depoimentos das testemunhas, que atestam o envolvimento da ré com o tráfico
de drogas e sua notória condição de consumidora.

II - PRELIMINAR DE NULIDADE DA INEXISTÊNCIA DE PROVA


PERICIAL

A Constituição Federal e o Código de Processo Penal garantem o direito do


acusado a um devido processo legal e, por conseguinte, o direito à produção de
provas necessárias à sua defesa. No caso em tela, o exame pericial do veículo
automotor, objeto da suposta infração, não foi realizado, o que configura uma violação
fundamental desse direito.

O artigo 158 do Código de Processo Penal é claro ao estabelecer que "quando


a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou
indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado". No entanto, o veículo foi
apreendido e devolvido à vítima sem que se realizasse qualquer exame pericial que
pudesse atestar a ocorrência do delito e produzir evidências científicas que
sustentassem as acusações.

A jurisprudência também é unânime ao reconhecer a necessidade de


realização de perícia quando se trata de crimes que deixam vestígios, como é o caso.

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO


ESPECIAL. LESÃO CORPORAL. ART. 129,
"CAPUT", DO CP. MATERIALIDADE DELITIVA.
AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO
VÁLIDO. 1. Considera a lei indispensável a prova
técnica nas infrações que deixam vestígios,
admitindo, apenas em caráter excepcional, que a
ausência do exame pericial seja suprido pela
prova testemunhal, nas hipóteses em que não for
possível a realização de perícia ou os traços
indicativos do fato a ser constatado pelo exame
tiverem desaparecido (arts. 158 e 167 - CPP). 2.
Ausente prova pericial válida, bem como não
apresentada motivação acerca de situação
excepcional que dispensasse a confecção do laudo
pericial, cabível a absolvição do delito de lesão
corporal, em razão da falta de demonstração da
materialidade delitiva. 3. Agravo regimental
improvido.

(STJ - AgRg no REsp: 1994384 SC


2022/0093302-2, Data de Julgamento:
09/08/2022, T6 - SEXTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 15/08/2022)

A ausência de perícia do veículo torna impossível estabelecer com


precisão a autoria do crime e a efetiva prática dos atos descritos na denúncia.
Além disso, impede a análise de elementos que poderiam corroborar a versão
da ré, no sentido de que agiu sob ameaças e coação.

Inicialmente, cumpre ressaltar que a conduta atribuída à ré não se


amolda ao tipo penal descrito no art. 155, §4º, incisos I e III, c/c o §5º, c/c o §1º,
e do art. 69, ambos do Código Penal, uma vez que as circunstâncias fáticas
revelam a ausência de tipicidade.

No que tange ao rompimento de obstáculo, previsto no inciso I do §4º do


art. 155, inexiste prova de que a ré tenha efetivamente rompido qualquer
obstáculo para subtrair o veículo. Não há relatos de danos a qualquer meio de
segurança do veículo, como alarmes, trancas ou dispositivos eletrônicos de
proteção, que justifiquem a aplicação desse dispositivo legal. Portanto, não se
configura o rompimento de obstáculo no caso em questão.
No tocante ao emprego de chave falsa, descrito no inciso III do §4º do
art. 155, o próprio interrogatório da ré esclarece que ela utilizou uma chave
falsa para dar partida no veículo, mas não há provas que atestam o próprio
depoimento da ré uma vez que não houve a perícia. A ré não nega sua
participação no evento, mas alega que agiu sob coação, circunstância que será
detalhada posteriormente.

Quanto ao transporte para outro Estado, conforme o §5º do mesmo


artigo, a ré efetivamente foi presa na fronteira interestadual, mas a mera prisão
em posse da res furtiva não é suficiente para configurar o delito. É necessário
comprovar que a ré tenha realizado o transporte do veículo para outro Estado
com a intenção de apropriar-se definitivamente do mesmo. Não há indícios
concretos de que essa intenção existisse.

Nesse contexto, a fragilização da justa causa da denúncia é patente,


uma vez que a acusação se baseia em alegações que não foram devidamente
comprovadas por meio de perícia, cerceando o direito de ampla defesa da ré.

Diante da falta de laudos periciais e da fragilização da justa causa,


requeremos a nulidade absoluta do processo, uma vez que o prejuízo causado
à defesa é evidente, violando o direito constitucional à ampla defesa e
contraditório.

III - DA COAÇÃO MORAL

A ré, em seu interrogatório, confessou a subtração do veículo, alegando


ter sido coagida por traficantes de drogas que a ameaçavam permanentemente
de morte por eletrocussão, caso não pagasse imediatamente a dívida de
R$15.000,00. Diante de tal declaração retro mencionada, podemos com a mais
absoluta clareza concluirmos que a ré fora coagida a praticar o delito, objeto da
acusação. Diante dessa coação, o Código Penal em seu art. 22, dispõe o
seguinte:
“Se o fato é cometido sob coação
irresistível ou em estrita obediência de
ordem, não manifestamente ilegal, de
superior hierárquico, só é punível o autor
da coação ou da ordem.”
A interpretação jurisprudencial deste art. encontra-se na obra de Alberto
Silva Franco, na qual relata o seguinte:
“A coação moral irresistível é uma das
hipóteses da exclusão da culpabilidade, na
qual o coacto, em razão de
constrangimento moral que sobre ele é
exercido, atua em condições anormais, de
forma que não se lhe pode exigir um
comportamento, de acordo com a ordem
jurídica. O constrangimento moral deve ser
irresistível e por irresistível, segundo o Des.
Cunha Camargo (JUTACRIM 44/412), se
entende o constrangimento “inevitável,
insuperável ou inelutável”, “uma força de
que o coacto não se pode subtrair tudo
sugerindo situação à qual ele não pode se
opor, recusar-se ou fazer face, mas tão
somente sucumbir, ante o decreto do
inexorável”. Se a coação moral for, no
entanto, resistível, limitará em favor do
agente uma atenuante (art. 65, III, “c”, do
Cód. Penal.”

A coação moral irresistível é um estado psíquico no qual o agente se vê


compelido a agir de determinada maneira sob a ameaça de um mal
insuportável. No caso em tela, a ré estava sob constante ameaça de morte, o
que a colocava em uma situação de extremo desespero. Diante dessa
situação, a ré agiu sob o império de uma força irresistível que a impediu de agir
de outra forma.
Os impulsos ocorrem, quando o ser humano, diante de um fato
inesperado, ou que suas questões morais não permitem agir, fica perturbado,
sem equilíbrio, situação em que o superego não funciona, para tomar as
atitudes coerentes e condizentes com sua conduta em estado normal. Ficando
em conflito diante do que é moral ou imoral.
A jurisprudência tem entendido que a coação moral irresistível é uma
causa de exclusão da culpabilidade, pois o agente não age com liberdade de
vontade. Nesse sentido, colaciono jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça:

EMENTA: APELAÇÃO - TRÁFICO DE DROGAS -


COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL -
EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE -
RECONHECIMENTO - ABSOLVIÇÃO - MEDIDA
QUE SE IMPÕE. Coação irresistível é tudo o que
pressiona a vontade impondo determinado
comportamento, eliminando ou reduzindo o poder
de escolha.
(TJ-MG - APR: 10054200008586001 Barão de
Cocais, Relator: Alexandre Victor de Carvalho,
Data de Julgamento: 05/10/2021, Câmaras
Criminais / 5ª CÂMARA CRIMINAL, Data de
Publicação: 15/10/2021)

A ilicitude do fato imputado à ré está sob suspeita, dado que o contexto


de sua ação é permeado por circunstâncias atenuantes que merecem uma
análise aprofundada. A ré, em seu interrogatório, admitiu que praticou a
subtração do veículo, mas alegou que agiu sob ameaça de traficantes de
drogas. Tal ameaça justifica, ao menos em parte, a conduta da ré, a qual agiu
em estado de necessidade, buscando uma solução para evitar uma ameaça
iminente de morte por eletrocussão.

O art. 24 do Código Penal estabelece que age em estado de


necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual que não provocou
por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo
sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.

A ré estava sob constante ameaça de morte, o que pode ser


comprovado pela sua alegação e pelo contexto de seu envolvimento com
traficantes de drogas, como mencionado por testemunhas. Portanto, o seu agir
foi justificado pela necessidade de evitar um perigo atual e iminente, não
podendo ser responsabilizada penalmente por agir sob coação.

IV - DA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO E A


NULIDADE DA PRODUÇÃO DE PROVAS

Além da ausência de prova pericial, as únicas provas apresentadas


foram os depoimentos das testemunhas, que afirmaram que a ré foi presa na
posse do veículo. No entanto, tais depoimentos não são suficientes para
comprovar a autoria do crime, uma vez que não há elementos que demonstrem
que a ré foi a responsável pela subtração do veículo. Ademais, as testemunhas
também fizeram referência a aspectos da vida pessoal da ré, como sua
participação em minissérie da Rede Globo e envolvimento com a prostituição
do "book rosa," o que não guarda relação com os fatos em questão e pode
influenciar negativamente no julgamento.

Quanto à materialidade do rompimento de barreira e emprego de chave


falsa, é importante ressaltar que a ausência de prova pericial torna as
alegações da acusação frágeis. A defesa alega a nulidade da produção de
provas nesse sentido, pois não se pode sustentar uma acusação de forma
sólida sem a devida comprovação pericial da existência do rompimento de
barreira ou do emprego de chave falsa. Dessa forma, a condenação da ré com
base nessas alegações carece de fundamento probatório.

Portanto, considerando a insuficiência de provas para a condenação e a


nulidade na produção de provas quanto à materialidade do rompimento de
barreira e emprego de chave falsa, a defesa requer a absolvição de CARMEM
GUEDES, visto que a acusação não conseguiu comprovar de forma
convincente a autoria e a materialidade dos crimes imputados à ré.

V- DE O EXECESSO DE PUNIR

A ré foi acusada de diversos crimes que supostamente se enquadram em


concurso material. No entanto, é imperativo analisar se tais qualificadoras e
circunstâncias podem ser descaracterizadas a fim de evitar um excesso de punição. O
ordenamento jurídico brasileiro baseia-se no princípio da proporcionalidade,
garantindo que a sanção aplicada ao acusado seja equilibrada e justa em relação à
gravidade do delito. A defesa sustenta que a pena proposta pelo Ministério Público
ultrapassa os limites da razoabilidade, uma vez que a acusação parece ignorar a
ausência de agravantes específicas e a situação peculiar do presente caso.

No tocante ao rompimento de obstáculo, previsto no inciso I do §4º do art. 155,


não existem provas concretas de que a ré tenha efetivamente rompido qualquer
obstáculo para subtrair o veículo. Não há relatos de danos a qualquer meio de
segurança do veículo, como alarmes, trancas ou dispositivos eletrônicos de proteção,
que justifiquem a aplicação desse dispositivo legal. Portanto, não se configura o
rompimento de obstáculo no caso em questão.

Quanto ao emprego de chave falsa, descrito no inciso III do §4º do art. 155, a
ré admitiu ter utilizado uma chave falsa para dar partida no veículo. No entanto, vale
ressaltar que ela agiu sob coação, como será detalhado posteriormente, o que justifica
ao menos em parte a sua conduta. A ação sob coação impede a plena caracterização
da qualificadora.

No que se refere ao transporte para outro Estado, conforme o §5º do mesmo


artigo, a ré efetivamente foi presa na fronteira interestadual, mas a mera prisão em
posse da res furtiva não é suficiente para configurar o delito. É necessário comprovar
que a ré tenha realizado o transporte do veículo para outro Estado com a intenção de
apropriar-se definitivamente do mesmo. Não há indícios concretos de que essa
intenção existisse.

Ressaltamos mais uma vez que a ré agiu sob ameaça de traficantes de drogas,
conforme sua confissão e o contexto de seu envolvimento com tais criminosos.
Portanto, não se justifica o acúmulo de qualificadoras que resultam em um excesso de
punição, uma vez que a ação da ré foi motivada por uma situação de coação.

VI - DA INEXISTÊNCIA DE PERÍODO NOTURNO

A acusação imputa à ré o crime previsto no art. 155, § 1º, do Código


Penal, que prevê o agravamento da pena para o furto praticado durante o
período noturno. Entretanto, não há nos autos elementos probatórios
suficientes que atestem que o furto ocorreu durante a noite. A prisão de
Carmem Guedes aconteceu apenas no dia seguinte ao furto, na fronteira
estadual entre Minas Gerais e Goiás, mas não há provas concretas do horário
em que o delito foi praticado.
PENAL. ROUBO SIMPLES. SIMULAÇÃO DE PORTE
DE REVÓLVER. PROVA SATISFATÓRIA DA
MATERIALIDADE E AUTORIA. PENA AUMENTADA
POR TER SIDO O CRIME PRATICADO À NOITE.
IRRELEVÂNCIA. DECOTE DA MODULADORA DE
CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. SENTENÇA
REFORMADA EM PARTE. 1 Réu condenado por
infringir o artigo 157 do Código Penal , depois
adentrar uma farmácia de plantão e subtrair os
pertences de três vítimas distintas, intimidando-as
com simulação do porte de revólver. 2 A
materialidade e a autoria foram comprovadas pela
confissão do réu, corroborada pela apreensão de
parte da res furtiva na sua posse e os depoimentos
dos policiais responsáveis pela investigação. 3 O
simples fato de o roubo ter sido praticado de noite
não basta, por si só, para justificar o aumento de
pena, especialmente no caso em que as vítimas
estavam acordadas e duas delas não
tergiversaram em reconhecer o assaltante,
quando este lhes foi apresentado na Delegacia.
Impõe-se o decote da moduladoras de circunstâncias
do crime. 4 Apelação provida em parte.

VII - DAS SANÇÕES


Diante das circunstâncias apresentadas no caso de Carmem Guedes, a
aplicação das sanções penais deve ser orientada pelo Código Penal,
notadamente pelo artigo 77, que trata da atenuação da pena em virtude da
confissão voluntária e da coação moral irresistível.

Carmem, de 23 anos, bacharel em Biomedicina, admitiu voluntariamente


sua participação no crime de furto qualificado, nos termos do artigo 155, §4º,
incisos I (rompimento de obstáculo) e III (emprego de chave falsa), do Código
Penal, além do § 5º (transporte para outro Estado), c/c o §1º (período noturno),
e do artigo 69 (concurso material). Essa confissão voluntária deve ser
considerada como uma atenuante na dosimetria da pena, conforme previsto no
artigo 65, III, "d" do Código Penal, que preconiza a redução da pena em razão
da confissão espontânea do acusado.

Adicionalmente, Carmem alegou ter praticado o delito sob grave ameaça


de traficantes de drogas, que a coagiram, ameaçando-a de morte por
eletrocussão devido a uma dívida. Caso essas alegações sejam devidamente
comprovadas, o Código Penal, em seu artigo 22, prevê a excludente de
culpabilidade da coação moral irresistível. Portanto, é essencial que as
diligências suplementares requeridas pelo Ministério Público sejam concluídas
e que um laudo pericial do local do fato e do veículo seja produzido para
verificar a veracidade das alegações da ré.

Considerando que Carmem é primária e não possui antecedentes


criminais, juntamente com a confissão voluntária e a possível coação moral, a
pena mínima deve ser aplicada, de acordo com a regra do artigo 59 do Código
Penal, levando em consideração as circunstâncias atenuantes.

No que diz respeito ao regime prisional, dada a natureza do delito e o


perfil da ré, sugere-se a utilização do regime prisional mais benéfico, que é o
regime aberto, conforme previsto no artigo 33, § 2º, "c" do Código Penal.

Ademais, é relevante considerar a substituição da pena privativa de


liberdade por penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44 do Código
Penal. Essa substituição pode incluir prestações de serviços à comunidade,
prestação pecuniária ou limitação de fim de semana, de acordo com a análise
do juiz, visando a ressocialização da ré e a reparação dos danos causados.

Em resumo, Carmem Guedes apresenta elementos que justificam a


aplicação da pena mínima, o regime prisional mais benéfico, a substituição da
pena e a consideração da confissão voluntária como atenuante, desde que as
alegações de coação moral irresistível sejam devidamente comprovadas. A
aplicação das sanções penais deve ser guiada pelo princípio da
proporcionalidade e da justiça, buscando uma solução equitativa para o caso.
VIII - DO PEDIDO DE MANUTENÇÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA

Cabe ressaltar que, na audiência de custódia, a ré foi liberada mediante


fiança, o que demonstra uma avaliação inicial do risco à ordem pública e a
garantia de sua apresentação ao processo. É importante considerar os
argumentos que sustentam a manutenção de sua liberdade provisória, apesar
das acusações graves que pesam contra ela.

Carmem confessou voluntariamente o crime e alegou que estava sendo


coagida por traficantes de drogas, os quais a ameaçavam de morte. Este é um
elemento crucial a ser considerado, uma vez que indica que ela agiu sob
pressão e desespero, com sua vida em perigo. A confissão e a situação de
ameaça precisam ser tratadas com a devida seriedade.

Em vista desses argumentos e das circunstâncias especiais do caso, é


imperativo que se mantenha a liberdade provisória de Carmem Guedes
enquanto aguarda o desenrolar do processo. É evidente que a ré enfrenta
dificuldades pessoais e situações de risco que devem ser abordadas de
maneira adequada. Além disso, a fragilidade das provas apresentadas até o
momento levanta dúvidas razoáveis sobre sua culpa.

IX - CONCLUSÃO

Com base nos fatos e argumentos apresentados na defesa de Carmem


Guedes, é possível concluir que a ré tem uma série de elementos que
justificam uma análise aprofundada e cuidadosa deste caso. A defesa
sustentou que a ré agiu sob coação moral irresistível, o que é uma causa de
exclusão da culpabilidade de acordo com o Código Penal brasileiro.
A defesa também levantou a questão da insuficiência de provas para a
condenação, particularmente em relação à ausência de prova pericial e a
fragilidade dos depoimentos das testemunhas. Além disso, a aplicação de
múltiplas qualificadoras e a alegação de excesso de punir foram abordadas,
destacando que a situação peculiar de Carmem Guedes exige um tratamento
equitativo na aplicação das sanções penais.
A defesa solicitou a manutenção da liberdade provisória da ré,
argumentando que sua confissão voluntária e a alegação de coação moral
devem ser consideradas. Também foi destacado que a situação da ré requer
um tratamento que leve em consideração suas circunstâncias pessoais e as
dificuldades que ela enfrenta.
Em vista dessas considerações, a conclusão da defesa é que Carmem
Guedes merece uma análise cuidadosa de seu caso, com a devida
investigação das alegações de coação moral e uma avaliação das provas
disponíveis. A manutenção de sua liberdade provisória é justificada enquanto
aguarda o desfecho do processo, dada a complexidade do caso e a fragilidade
das provas apresentadas até o momento.

X - DOS PEDIDOS

a) Requer-se a declaração de nulidade do processo em virtude da ausência de


laudos periciais, o que resultou em cerceamento de defesa, prejudicando a
análise adequada dos fatos.

b) Caso o pedido de nulidade processual não seja aceito, requer a absolvição


de Carmem Guedes, em razão da insuficiência de provas para a condenação.
A ré agiu sob alegações de coação moral irresistível e com a ausência de
provas conclusivas, a absolvição é a medida justa.

c) Alternativamente, caso não seja concedida a absolvição, requer-se a


desclassificação do crime imputado à ré para furto simples, uma vez que as
provas disponíveis não sustentam a configuração do furto qualificado.

d) Caso a ré seja condenada, pleiteamos a aplicação da pena mínima, levando


em consideração a confissão voluntária de Carmem Guedes, nos termos do
artigo 65, III, "d" do Código Penal.

e) Requer a aplicação do regime prisional mais benéfico, que é o regime


aberto, de acordo com o artigo 33, § 2º, "c" do Código Penal, considerando a
natureza do delito e o perfil da ré.

f) Requer substituição de Pena nos termos do Art. 77 da Lei 9.099 e Art. 89 da


Lei de Execução Penal, da pena privativa de liberdade por penas restritivas de
direitos, como prestações de serviços à comunidade, prestação pecuniária ou
limitação de fim de semana, de acordo com o artigo 44 do Código Penal e os
dispositivos legais mencionados.

g) Requeremos a aplicação do instituto da suspensão condicional do processo,


previsto no artigo 89 da Lei dos Juizados Especiais Criminais, considerando as
circunstâncias do caso. Este pedido visa possibilitar à ré uma oportunidade de
ressocialização, evitando a imposição de pena privativa de liberdade e
permitindo que ela cumpra condições estabelecidas pelo juízo para a
suspensão do processo.

h) Em caso de condenação, a concessão de regime inicial aberto, dada a


inexistência de circunstâncias que justifiquem regime mais gravoso.

i) A manutenção da liberdade provisória da ré até o trânsito em julgado da


sentença condenatória, conforme garantido na Audiência de Custódia.

Nestes termos, pede e espera deferimento.

Tabasco 03 de novembro de 2023

________________________________
xxxxxxxxxxxxxx
OAB/MG XXX.XXX

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