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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE

DIREITO DA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE


IVAIPORÖ PARANÁ

Autos nº 0003347-59.2019.8.16.0097

ALICIA DOMINGOS JACINTO, já devidamente


qualificada nos autos da Ação Penal em epígrafe, por meio de sua
advogada, nomeada por este Douto Juízo (seq.194), ao final assinado,
vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência apresentar:

ALEGAÇÕES FINAIS POR MEMORIAIS

Trata-se de ação penal pública movida pelo


MINISTÉRIO PÚBLICO em face de ALICIA DOMINGOS
JACINTO, dando-a como incursa nas sanções dos arts. 35, caput, e
33, caput, da Lei n. 11.343/06, na forma do art. 69 do Código Penal,
pelos supostos crimes abaixo descritos:

-FATO 01

Durante o ano de 2019 até a data de 22 de julho de 2019,


em uma residência situada na Rua Salvador Moreno de Souza, nº 236,
no Bairro Glorinha Rech, no Município de Jardim Alegre/PR, os
denunciados EDUARDO PEREIRA RODRIGUES e ALICIA
DOMINGOS JACINTO, dolosamente e ciente da ilicitude de suas
condutas, associaram-se a fim de praticar venda de entorpecentes, bem
como outros delitos previstos no artigo 33 da Lei n.11.343/2006,
tendo como ponto central da traficância o endereço supracitado,
residência dos denunciados.

-FATO 02

No dia 22 de julho de 2019, por volta das 11h40min, nas


imediações de uma residência na Rua Salvador Moreno de Souza, nº
236, no Bairro Glorinha Rech, no Município de Jardim Alegre/PR, os
denunciados EDUARDO PEREIRA RODRIGUES e ALICIA
DOMINGOS JACINTO, dolosamente e ciente da ilicitude de suas
condutas, um aderindo a vontade do outro, tinham em depósito para
fins de traficância aproximadamente 916 gramas da substância
entorpecente Cannabis Sativa L., popularmente conhecida como
Maconha, conforme Auto de Exibição e Apreensão de mov. 1.10 e
Laudo Definitivo de Substância Entorpecente de mov. 76.1. Segundo
restou apurado, a equipe policial recebeu inúmeras denúncias da
atividade de traficância na residência e que devido à presença das
viaturas no bairro os denunciados haviam dispensado uma sacola de
drogas em um terreno baldio ao lado da casa. Nesse foco, os policiais
retornaram ao local e encontraram o denunciado EDUARDO
deixando o terreno supracitado. Realizada a abordagem este
demonstrou excesso de nervosismo e, porém, franqueou a entrada nos
policiais em sua residência, onde foi encontrada parte da droga. No
terreno baldio a equipe também localizou uma sacola contendo 01
(um) tijolo e mais alguns pedaços de Maconha e 01 (uma) balança de
precisão. Segundo consta, foi apreendido na residência além das
substâncias entorpecentes, 02 (dois) aparelhos telefones, a quantidade
de R$ 190,50 (cento e noventa reais e cinquenta centavos) em cédulas
e moedas diversas sendo que em sua maioria eram notas de dez reais,
videogames e outros eletrônicos, bem como outra balança de precisão
e ainda 02 (duas) identidades RG em nome de Nivaldo Bento de
Oliveira e Valdinei de Lara, possivelmente deixadas em garantia de
pagamento por dívidas de drogas (Auto de Exibição e Apreensão de
mov. 1.10).

DA INCERTEZA NAS PROVAS DA ACUSAÇÃO

Tendo em vista que o testemunho do policial militar


Cristiano Gomes da Fonte (mov. 244.2), um dos policiais presente na
operação policial realizada no local, por si só não tem a força de
ensejar uma condenação, uma vez que em respeito ao contraditório e a
ampla defesa, a prova testemunhal e até mesmo uma eventual
confissão devem ser aferidas em consonância com outros elementos
presentes aos autos, como assim se encontra disposto no artigo 155 do
Código de processo Penal:

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre


apreciação da prova produzida em contraditório
judicial, não podendo fundamentar sua decisão
exclusivamente nos elementos informativos colhidos
na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não
repetíveis e antecipadas.

A acusada nega com eloquência que se preste ao tráfico


de drogas através de suas declarações contidas em audiência (mov.
249.3), ao categoricamente afirmar "Que nem nesses quatro meses
não ajudou EDUARDO. Que era EDUARDO quem mexia com as
drogas. Nesses quatro meses EDUARDO guardava a droga pro lado
de fora de casa, não sabia onde, um dia ele guardava em um lugar e
outro dia outro.”

Com relação as declarações da segunda testemunha


Valdinei de Lara (mov. 244.3), nota-se que ao tempo dos fatos,
encontrava-se totalmente dependente de drogas, o que lhe causava
confusões e reiterou que não se recorda com certeza do que ocorreu na
residência dos acusados, vindo seu depoimento ser totalmente
contraditório e sem forças probatórias.
Conforme informações dos autos percebe-se a ausência
de qualquer prova que a denunciada tinha a intenção de vender a
droga apreendida no local do crime.
Em seu interrogatório, a denunciada é contundente ao
afirmar que é apenas usuária frequente e que nesse caso não se
envolveu na traficância de qualquer entorpecente.
DA NÃO CONFIGURAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO PARA O
TRÁFICO
O tipo penal imputado a acusada encontra respaldo nos
termos do artigo 35 da lei 11.343/2006 "Associarem-se duas ou mais
pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos
crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei"
No entanto, apesar da acusada não ter praticado dita
conduta criminosa, cabe explanar sobre a impossibilidade de se
configurar a associação para o tráfico no presente julgado, por não se
encontrarem presentes os requisitos típicos subjetivos do artigo 35 da
lei 11.343/2006.
Segundo lição de Guilherme Nucci:

Elemento subjetivo: é o dolo. Exige-se elemento


subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de
associação, de caráter duradouro e estável. Do
contrário, seria um mero concurso de agentes para a
prática do crime de tráfico. Para a configuração do
delito do art. 35 (antigo 14 da Lei 6.368/76) é
fundamental que os sujeitos se reúnam com o
propósito de manter uma meta comum. (NUCCI,
Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais
Comentadas. São Paulo: Editora RT, 2006, p. 785).

Dessa maneira, não resta provada a associação dos réus


para a pratica do delito de tráfico de drogas, pois não se tem provas
suficientes que demonstrem a pratica de tal ato.

DA AUSÊNCIA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO. ENTEDIMENTO


DA JURISPRUDÊNCIA

Emérito Julgador, a bem da verdade, a prova


judicializada, é completamente estéril e infecunda, no sentido de
corroborar com a exordial acusatória, haja vista, que o Titular da
Ação, não conseguiu arregimentar uma única voz, isenta e confiável,
que depusesse contra a acusada, no intuito de incriminá-la do delito
que lhe é graciosamente capitulado.
Assim, ante a manifesta anemia probatória hospedada na
presente demanda, impossível é sazonar-se reprimenda penal contra a
acusada.
Assinale, que para referendar-se uma condenação na
esfera penal, mister que a autoria e a culpabilidade resultem
incontroversas. Contrário senso, a absolvição se impõe por critério de
justiça, visto que, o ônus da acusação recai sobre o artífice da peça
acusatória.
Ademais, o Direito Penal não opera com conjecturas ou
probabilidades. Sem a certeza total e plena da autoria, e da
culpabilidade, não podendo o Juízo criminal proferir condenação”.
Nesse norte, é de se afirmar que o ônus de acusar recai
ao Ministério Público, o qual foi infeliz ao apresentar denúncia com
base em argumentos falhos, baseados única e exclusivamente em
“ouviu dizer”.
Em verdade, não consta dos autos nenhuma testemunha
que solidifica a afirmação de que ouve a participação da acusada no
referido crime, devendo à ora denunciada, prevalecer o princípio do in
dubio pro reo.
Portanto Excelência, não existe prova, que de alguma
forma a Denunciada tenha participado do delito, devendo a mesma ser
absolvida nos termos do art. 386, do CPP.
A prova judiciária, sabe-se, tem um claro objetivo, qual
seja “a reconstrução dos fatos investigados no processo, buscando a
maior coincidência possível com a realidade histórica, isto é, com a
verdade dos fatos”. Essa tarefa de reconstruir a verdade dos fatos, não
é fácil de ser cumprida, resultando, não raro, que, pese as várias
provas produzidas, não se consegue a reconstrução histórica dos fatos,
assomando dos autos, muitas vezes, apenas a verdade processual. O
processo, não raro, produz apenas uma certeza do tipo jurídica, mas
que pode, sim, não corresponder à verdade da realidade histórica.
É truísmo afirmar, mas devo fazê-lo, que “para que o juiz
declare a existência da responsabilidade criminal e imponha sanção
penal a uma determinada pessoa, é necessário que adquira a certeza de
que foi cometido um ilícito penal e que seja ela a autoria”.
O magistrado só estará convicto de que o fato ocorreu e
de que seja determinada pessoa a autora do ilícito, “quando a ideia que
forma em sua mente se ajusta perfeitamente com a realidade dos fatos.
Se o Ministério Público denunciou uma determinada pessoa,
acusando-a de ter infringido um comando normativo, mas não
consegue demonstrar, quantum sufficti, ser verdadeira a imputação,
não pode o julgador, validamente, editar um decreto de preceito
condenatório baseado em supostas provas.
O decreto condenatório precisa estar solidificado sobre
os elementos carreados ao processo, e que ofereçam ao magistrado
sentenciante a pacífica certeza da ocorrência dos fatos censurados e
apontem sua autoria.
Existindo fragilidade nas escoras probatórias, todo o
juízo edificado padece de segurança, dando margem à arbitrariedade,
pondo em risco o ideal de justiça preconizado pelas sociedades
democráticas.
Se a prova produzida no inquérito policial e na sede
judicial, não for suficiente para expedição de uma condenação
criminal, deve-se, por isso, absolver a acusada, nos termos art. 386,
inciso VI, do Código de Processo Penal. Os Tribunais têm decidido,
por óbvias razões que ante a insuficiência de conjunto probatório
capaz de sustentar um decreto condenatório e não restando
demonstrada a autoria do delito é de se conceder provimento ao
recurso para, nos termos do art. 386, inciso VI, do Código de Processo
Penal, absolver o acusado, pois existe serias dúvidas quanto à
participação da denunciada.
Assim, não se pode perder de vista que a condenação
deve sempre resultar de provas tranquilas, convincentes e certas.
Na dúvida é preferível a absolvição da acusada, visto
que tal posicionamento é manifestação de um imperativo da justiça. 
Ao princípio do in dubio pro reo, cumpre analisar quem
é o detentor do ônus probatório, nos termos do CPP. Paulo Rangel
(2013, p.27) afirma que, em virtude do artigo 5º, LVII,
da CRFB/88 (que preconiza que ninguém será considerado culpado
até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória), do princípio
da ampla defesa e do sistema acusatório, o ônus da prova é do
Ministério Público. Deste modo, não é o réu que tem que provar sua
defesa, mas sim o Ministério Público a sua acusação.
Aury Lopes Jr. (2014, p.190), por sua vez,
estatui: Gravíssimo erro é cometido por numerosa doutrina (e
rançosa jurisprudência), ao afirmar que à defesa incumbe a prova
de uma alegada excludente. Nada mais equivocado. A carga do
acusador é de provar o alegado; logo, demonstrar que alguém
(autoria) praticou um crime (fato típico, ilícito e culpável). Isso
significa que incumbe ao acusador provar a presença de todos os
elementos que integram a tipicidade, a ilicitude e culpabilidade e,
logicamente, a inexistência das causas da jurisdição.
Pois bem, quanto ao princípio do in dubio pro
reo, Américo Bedê Júnior e Gustavo Senna (2012. p.96) afirmam
que: […] a lógica do in dubio pro reo é que se o magistrado, ao
analisar o conjunto probatório, permanecer em dúvida sobre a
condenação ou absolvição do réu, deve optar pela absolvição, até
porque entre duas hipóteses não ideais é menos traumático para o
direito absolver um réu culpado do que admitir a condenação de um
inocente.
Ora, se o Magistrado ficou em dúvida quanto à
autoria e materialidade do fato é por que o Ministério Público não
logrou êxito em sua tese acusatória, de modo que o réu não pode
ser prejudicado por não conseguir provar sua inocência. Ademais,
provar algo que não se praticou é muito mais complexo do que provar
algo que se praticou

Sendo assim, impõe-se a absolvição da acusada, em


respeito ao artigo 386, inciso V do Código de Processo Penal.

DOS PEDIDOS

Diante de todo o exposto, pede e requer:

a) Que a pretensão punitiva veiculada por meio da


denúncia seja julgada improcedente, consequentemente a absolvição
da acusada, tendo como fundamento o artigo 386, inciso V do Código
de Processo Penal;

b) Que seja a defesa acolhida, reconhecendo as


circunstancias favoráveis a denunciada na aplicação da pena;
c) Caso Vossa Excelência não entenda pela absolvição,
a desclassificação do crime de tráfico imputado a acusada, para a
condição de usuária, nos termos do artigo 28 da Lei 11.343/06, se
comprometendo a comparecer a todos os atos em que for intimado;

d) Seja diminuído, no caso de condenação pelo crime


previsto no artigo 33 da Lei 11.343/06, o quantum da pena privativa
de liberdade imposta, seguindo-se os rigorosos critérios estabelecidos
no artigo 59 e 68 do Código Penal, bem como a do parágrafo 4º do
artigo 33 da Lei 11.343/06, aplicando-se a pena mínima legal,
substituindo-se a pena privativa de liberdade aplicada por penas
restritivas de direito;

e) o arbitramento de honorários advocatícios para


advocacia dativa, considerando a nomeação da presente defensora
conforme (seq.194).

Nestes Termos,

Pede Deferimento.

Manoel Ribas, 14 de setembro de 2020

Patricia A. Haveroth Zaiaç


OAB/PR 94033

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