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ESTADO DO CEARÁ

PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E CRIMINAL DA COMARCA DE MARACANAÚ
Rua Edson Queiroz, s/n – Piratininga – Maracanaú/CE. Telefone: (85) 3371.8753

Processo nº 3000562-81.2022.8.06.0118

AUTOR: CLAUDIO RODRIGUES DE SENA

REU: Banco Bradesco SA

SENTENÇA

Vistos etc.

Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO DE DANOS
ajuizada por CLAUDIO RODRIGUES DE SENA em face de BANCO BRADESCO S.A, na qual o autor requer a suspensão
das cobranças referentes ao serviço Cesta Fácil Super, a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente e
indenização por danos morais, em razão da ausência de contratação do serviço. Requereu ainda a concessão de tutela de
urgência, para que sejam cessados os descontos indevidos na sua conta.

Tutela antecipada indeferida e deferida a inversão do ônus da prova em favor do autor, para o banco demandado
comprovar nos autos a regularidade dos descontos impugnados, conforme Id n. 32558931.

O banco promovido contesta o feito, arguindo preliminar e, no mérito, alegando a regularidade das cobranças, vez que
exerceu regularmente o direito de cobrar as tarifas pelos serviços prestados à parte autora e pugnou pela improcedência
total dos pedidos. Anexou os extratos bancários.
Réplica apresentada.
Audiência de instrução realizada, na qual foi colhido o depoimento da parte autora.

É o breve o resumo dos fatos relevantes (art. 38, da Lei n.º 9.099/95). Decido.

Relativamente à gratuidade da justiça pleiteada pela parte autora, o deferimento pretendido fica condicionado à
comprovação da alegada insuficiência econômica por ocasião de um possível Recurso Inominado.
Afasto a preliminar arguida, uma vez que a petição inicial cumpre os requisitos do art. 14, da Lei 9.099/95, bem como
todas as provas, inclusive documentais, podem ser produzidas até audiência de instrução e julgamento (art. 33, da
citada lei). E, ao contrário do que o requerido alega, a inicial está acompanhada de documentos necessários ao
julgamento da lide, não apresentando qualquer dificuldade à apresentação da defesa, possibilitando-lhe, portanto, o
pleno contraditório.
Da análise dos autos, verifica-se que a parte autora ingressa com a presente ação, pleiteando o ressarcimento em
dobro da quantia supostamente cobrada de forma indevida em sua conta bancária, referente à tarifa denominada
“CESTA FÁCIL SUPER”, além de indenização por danos morais.
No que se refere ao fato específico, o banco promovido alega exercício regular de direito, vez que a conduta do Banco
foi dentro da rotina normal do comércio bancário, atento aos ditames que estabelece os critérios para a cobrança de
tarifas referente ao serviço decorrente de manutenção de conta, normatizados nacionalmente pelo Banco Central do
Brasil.
Do cotejo das provas constantes no processo, inexiste dúvida de que houve descontos referente ao pacote de tarifas
cobrados pelo banco promovido, conforme extratos bancários acostado junto à inicial.
Constata-se, no entanto, que o banco promovido não demonstrou a anuência da parte autora na celebração do negócio
jurídico em alusão, vez que não foram apresentas cópias do instrumento contratual ou qualquer outro tipo de documento

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que comprove que a parte autora optou por contratar o pacote de tarifas.
É necessário salientar que não basta ao banco demandado alegar, em sua defesa, o exercício regular do direito de
cobrar tarifas pelos serviços prestados à parte autora, sem apresentar cópia do contrato específico que comprove que a
correntista autorizou ou solicitou o pacote tarifário.
Ressalta-se inclusive a exigência de instrumento específico para contratação de tarifas bancárias pela prestação de
serviços por parte das instituições financeiras está prevista no art. 1º e 8º da Resolução n o . 3.919/2010, do BACEN,
que regulamenta o tema:
“Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais
instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução,
deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente
autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.”
“Art. 8º A contratação de pacotes de serviços deve ser realizada mediante contrato específico.”
Nesse sentido, cita-se ementa da súmula de julgamento do Recurso Inominado 0001314-65.2015.8.03.0011, da Turma
Recursal dos Juizados Especiais do Estado do Amapá, que corrobora o entendimento:
“CIVIL. CDC. BANCO. COBRANÇA DE “CESTA DE SERVIÇOS”. LEGALIDADE, DESDE QUE COBRADA.
RESOLUÇÃO N o . 3.919/2010 DO BACEN. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1). A cobrança de
remuneração pela prestação de serviços por das instituições financeiras deve estar prevista no contrato firmado entre
esta e o cliente, ou ter sido, o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado, conforme disposto pelo art. 1º da
Resolução n o . 3.919/2010, do BACEN. Referida norma também estabelece que a contratação de pacotes de serviços
deve ser realizada mediante contrato específico (art. 8º). Assim, não restando comprovada a anuência do autor para
efetivação da cobrança da tarifa denominada “Cesta Exclusive Plus”, impõe-se o seu cancelamento, bem como
restituição dos valores indevidamente cobrados, mantendo-se, porém, os serviços essenciais e gratuitos garantidos pela
resolução acima citada. 2). Recurso conhecido e não provido. 3) Sentença Mantida”.
Ainda no mesmo sentido, menciona-se que a Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Cíveis
e Criminais do Amazonas, em sede do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei nº 0000511-49.2018.8.04.9000,
também se manifestou sobre o tema a partir de três quesitos. Confira-se:
“INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, DANOS
MATERIAIS E OBRIGAÇÃO DE FAZER – DIREITO DO CONSUMIDOR – CONTRATO BANCÁRIO – TARIFA MENSAL
FIXA DE SERVIÇO BÁSICO – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. QUESTÃO 1. ILEGALIDADE DA COBRANÇA DA
TARIFA BANCÁRIA DENOMINADA "CESTA BÁSICA DE SERVIÇOS", "CESTA FÁCIL" OU SIMILARES, QUANDO
NÃO DEMONSTRADA A CONTRATAÇÃO DE TAIS SERVIÇOS, MEDIANTE CONTRATO COM CLÁUSULA
ESPECÍFICA. INEXISTÊNCIA DE CONTRATO/CONTRATAÇÃO. DESCONTO INDEVIDO. SERVIÇO INADEQUADO
NOS TERMOS DO CDC. VENIRE CONTRA FACTUM PROIPRUM EM FAVOR DO CONSUMIDOR. INEXISTENCIA DE
SUPRESSIO. QUESTÃO 2. ANÁLISE DO CASO CONCRETO ACERCA DA OCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS EM
RAZÃO DE TAIS DESCONTOS. ANALOGIA À SÚMULA 532 DO STJ. INDENIZAÇÃO EM RAZÃO DE SERVIÇO NÃO
SOLICITADO. PRÁTICA ABUSIVA. OFENSA À DIGNIDADE DO CONSUMIDOR. SOBREPOSIÇÃO DA
HIPERSUFICIÊNCIA FINANCEIRA DO BANCO FRENTE AO CONSUMIDOR. INOCORRE DANO MORAL IN RE IPSA.
QUESTÃO 3. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS INDEVIDAMENTE. INCIDÊNCIA DO ART.
42, PARÁGRAFO ÚNICO DO CDC. INEXISTÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL. CONFIGURADA MÁ-FÉ QUANDO
IMPOSTA AO CONSUMIDOR COBRANÇA POR SERVIÇO NÃO SOLICITADO.
Diante dos quesitos, concluiu a eminente Corte pela fixação de três teses, com as quais este juízo está de acordo:
1). É vedado às instituições financeiras realizar descontos a título de tarifa de pacote de serviços bancários sem prévia e
expressa autorização do consumidor, mediante contrato com cláusula específica e destacada, nos termos do art. 54,
§4º, do CDC.
2). O desconto indevido da cesta de serviços bancários não configura ocorrência de danos morais in re ipsa, devendo a
repercussão danosa ser verificada pelo julgador no caso concreto.
3). A reiteração de descontos de valores a título de tarifa de pacote de serviços bancários não é engano justificável.
Presentes tais requisitos (má-fé e inexistência de engano justificável) a indenização por danos materiais deve se dar na
forma do art. 42, parágrafo único, do CDC.
Desse modo, quando o consumidor nega a existência do negócio, cabe ao fornecedor do serviço demonstrar a realidade
do mesmo. Isso porque a prova negativa na espécie é impossível e, portanto, inexigível da parte que alega, aplicando-
se a regra segundo a qual é incumbência da parte ré a produção da prova dos fatos impeditivos, modificativos ou
extintivos do direito do autor (art. 373, II, do CPC), ônus do qual o requerido não se desincumbiu.

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Assim, impõe-se o reconhecimento da existência de falha nos serviços prestados pelo requerido, consubstanciada na
cobrança de valores não contratados, e, por via de consequência, a declaração de nulidade do débito.

Quanto à devolução dos valores descontados, comprovados os descontos indevidos na conta corrente da parte autora,
a título das tarifas bancárias ora impugnadas, determino a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados
da parte autora, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, observada a prescrição quinquenal.

No tocante ao dano moral, ainda que tenha havido falha do requerido na cobrança de valores indevidos, não houve
maiores transtornos à parte autora, pois houve a cobrança de valor ínfimo diante da movimentação bancária da conta do
autor, bem como o fato deste não ter comprovado outros descontos em sua conta nem que a suposta contratação do
pacote de tarifas lhe causou desconfortos que abalaram a sua moral, ou até mesmo que sofreu diminuição de seu
patrimônio ou abalo do seu orçamento doméstico, conduzem ao entendimento de inexistência de abalo moral a ser
compensado pecuniariamente.

Não houve repercussão externa dos fatos de forma a ensejar reparação, pois incapazes de romper com o equilíbrio
psicológico ou atingir a honra e imagem da parte autora a cobrança da tarifa impugnada, tratando-se de mero
aborrecimento ou dissabor, que não excede o limite do tolerável.
Diante do exposto JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487,
I, do Código de Processo Civil, para declarar nula a cobrança discutida nestes autos, em consequência, determino a
devolução em dobro dos valores indevidamente descontados, a título de cesta super fácil, observada a prescrição
quinquenal, devendo incidir juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC, ambos a partir de cada
desconto indevido.

Defiro o pedido de antecipação de tutela, para determinar que o requerido se abstenha de efetuar descontos na
conta bancário do autor, referente a tarifa cesta super fácil, caso ainda ativo, sob pena de multa, a qual desde já,
arbitro em R$ 100,00 (cem reais), por desconto realizado, limitado ao teto de R$3.000,00(três mil reais), podendo
ser revista caso se mostre infrutífera.

Indefiro o pedido de danos morais, conforme fundamentação acima.

Sem custas e sem honorários, por força de lei.


Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Considerando a Recomendação nº 01/2019, do NUMOPEDE/CGJCE, item 8, determino seja oficiado à Corregedoria


Geral de Justiça do TJCE para fins de conhecimento sobre a presente demanda.

Maracanaú-CE, data da inserção.

Nathália Arthuro Jansen

Juíza Leiga

Pela MM. Juíza de Direito foi proferida a seguinte Sentença:

Nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, HOMOLOGO o projeto de sentença elaborado pela Juíza Leiga, para que
surta seus jurídicos e legais efeitos.

Publique-se. Intimem-se.

Expedientes necessários.

Maracanaú-CE, data da inserção no sistema.

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Candice Arruda Vasconcelos
Juíza de Direito
assinado por certificação digital

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