Decisão prolatada pela Ministra Nancy Andrighi do STJ com relação a valores pagos indevidamente, nos mesmos parâmetros cobrados pelas instituições financeiras.
Decisão prolatada pela Ministra Nancy Andrighi do STJ com relação a valores pagos indevidamente, nos mesmos parâmetros cobrados pelas instituições financeiras.
Decisão prolatada pela Ministra Nancy Andrighi do STJ com relação a valores pagos indevidamente, nos mesmos parâmetros cobrados pelas instituições financeiras.
Cuida-se de recurso especial interposto por Banco Bandeirantes
S/A, com fundamento nas alneas "a" e "c" do permissivo constitucional. A ora recorrida JZ Outdoor Ltda. ajuizou ao, sob o rito ordinrio, em face do recorrente. Alegava que, durante quatro anos (de 1994 a 1998), manteve contratos bancrios com o ru, sendo que as cobranas das taxas por prestaes de servios, bem como dos juros e encargos contratuais, eram lanadas diretamente em sua conta corrente. Aps realizar um aprofundado exame sobre a regularidade dos lanamentos, a autora constatou a existncia de vrias cobranas indevidas, sob diferentes rubricas, alm de juros acima do ndice pactuado. Requereu a repetio dos valores pagos indevidamente, corrigidos segundo as mesmas taxas cobradas pela instituio financeira. Pleiteou, tambm, o ressarcimento dos danos emergentes e lucros cessantes. O pedido foi julgado parcialmente procedente, entendendo o juzo de primeiro grau que no ficaram provados os danos materiais. O ora recorrente foi condenado "no ressarcimento das quantias apuradas pela percia sob rubrica de JUROS, nos valores nominais constantes da planilha de f. 673/674, trs primeiras colunas identificadas por 'efeito s/ juros', 'valor juros' e 'total', e ainda as quantias referentes a lanamentos sob rubrica de DIVERSOS - OUT DEBIT - DEB AUTOR, nos valores nominais da planilha de 675/677, coluna 'valor'" corrigidos "pelos ndices da tabela adotada pela contadoria judicial, aprovada pela Egrgia Corregedoria de Justia, e com juros de mora de 1% ao ms, tudo a partir de cada um dos lanamentos ilcitos, como ficar apurado em liquidao por mero clculo aritmtico" (fl. 958). Ambas as partes apelaram. O Tribunal a quo julgou totalmente procedente o apelo da ora recorrida e parcialmente procedente o apelo do recorrente, somente para redistribuio das custas e honorrios advocatcios. Colhem-se os seguintes fundamentos do acrdo recorrido: "Embora ainda no se trate de matria imune a controvrsias, vai-se sedimentando nesta Corte o entendimento de que, em hipteses como a dos autos, o reembolso ao correntista deve ser corrigido pelas mesmas taxas e encargos praticados pela Documento: 612702 - VOTO VISTA - Site certificado Pgina 1 de 5 Superior Tribunal de Justia instituio financeira . que, de outra forma, haveria tratamento desigual dos contratantes. Enquanto o muturio sempre esteve sujeito a encargos onzenrios, superiores a 10% a/m, o mutuante estaria premiado com juros mdicos e correo monetria oficial." (fls. 1.087/1.088) (negritou-se)
Interpostos embargos de declarao, estes foram rejeitados.
Da o presente recurso especial, no qual se alega: I- violao ao art. 535, I e II, do CPC, porque no sanadas as omisses e contradies apontadas em sede de embargos declaratrios. II- negativa de vigncia aos arts. 4, IX, da Lei 4.595/64, 1, 3, do Dec. 22.626/33, 1.062 do CC, Lei 6.895/81, e Smula 596/STF, uma vez que no se pode permitir correntista, que no instituio financeira, cobrar juros e encargos que somente so lcitos quando exigidos por tal entidade. III- ofensa aos arts. 159, 161 e 1.096 do CC, pois o acrdo recorrido possibilita um enriquecimento sem causa da correntista. IV- contrariedade aos arts. 999, I, 1.000, 1.003 e 1.030 do CC, uma vez que no poderia ser determinada a repetio de indbito relativo a contratos j extintos por novao. V- dissdio jurisprudencial a respeito do direito de cobrar taxas de juros acima de 12% ao ano. O em. Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito proferiu voto no sentido de dar provimento ao recurso especial, sob o entendimento de que a recorrida no tem direito devoluo do pagamento indevido, acrescido dos encargos praticados pelo banco, pois somente este pode realizar tais cobranas, autorizado que est, por legislao especfica. Para melhor exame, pedi vista. Brevemente relatado o processo, passo ao exame das questes federais.
Com relao ofensa ao art. 535, I e II, do CPC, tem-se que, em
sede de embargos de declarao, o ora recorrente alegou contradio entre o acrdo recorrido e dispositivos legais, alm de omisso por no ter sido analisada a apontada impossibilidade da recorrida em cobrar os mesmos encargos financeiros que o banco. Contudo, a questo da aplicao das taxas e juros cobradas pela instituio financeira, na devoluo do indbito, restou fundamentadamente decidida no aresto vergastado, inexistindo omisso a esse respeito. Documento: 612702 - VOTO VISTA - Site certificado Pgina 2 de 5 Superior Tribunal de Justia Alm disso, a ofensa a dispositivos legais no se traduz em contradio ensejadora de embargos declaratrios. Portanto, de se afastar, realmente, a violao ao art. 535 do CPC. No tocante alegada extino dos contratos anteriores, por novao, (afronta aos arts. 999, 1.000, 1.003 e 1.030 do CC), a Smula 7 do STJ obsta a pretenso, pois o Tribunal a quo entendeu inexistirem provas nos autos relativamente ao animus novandi (fls. 1.088/1.089). O apontado dissdio jurisprudencial, a seu turno, no restou demonstrado, pois os paradigmas versam sobre a inaplicabilidade da limitao da taxa de juros instituio financeira, tema sobre o qual no se ateve o acrdo recorrido. Resta, assim, apenas analisar a questo relativa ofensa aos arts. 4, IX, da Lei 4.595/64, 1, 3, do Dec. 22.626/33, Lei 6.895/81, 1.062, 159, 161 e 1.096 do CC, que se resume em saber se o correntista tem direito devoluo das quantias cobradas indevidamente pelo banco, acrescidas das mesmas taxas e juros aplicadas pela instituio financeira. Cuida-se, como j exposto, de ao de repetio de indbito, tambm chamada, em doutrina, de ao de repetio por enriquecimento injustificado, cuja pretenso est amparada pelo art. 964 do CC. Restou comprovado o enriquecimento injustificado do banco-recorrente pela retirada indevida de quantias da conta-corrente da ora recorrida, seja por total ausncia de autorizao contratual, seja por cobrana de taxas a maior. O juzo de primeiro grau condenou o ora recorrente na devoluo de todos os valores cobrados indevidamente, inclusive aqueles provenientes da incidncia de encargos moratrios sobre as dvidas inexistentes, monetariamente corrigidos e acrescidos de juros de mora. Assim, a rigor, entende-se que tal deciso permite uma perfeita recomposio da perda patrimonial sofrida pela correntista, ora recorrida.
No restou provada a alegao dedudiza pela ora recorrida, de que
a cobrana de encargos excessivos pela ora recorrente levou aquela a contrair novos emprstimos, perante outras instituies financeiras. de se observar, ademais, que tal alegao, ainda que verdadeira fosse, no se insere no pedido formulado na petio inicial, o qual est fundado na repetio do indbito, e no em indenizao por danos materiais advindos de ato ilcito. Todavia, no pedido de repetio de indbito deve se entender por Documento: 612702 - VOTO VISTA - Site certificado Pgina 3 de 5 Superior Tribunal de Justia includo todos os valores injustificadamente auferidos pelo ru com a cobrana de encargos indevidos. Nesses termos, direito do titular de contrato de abertura de crdito em conta-corrente (cheque especial) obter a restituio de valores indevidamente cobrados pela instituio financeira. O montante do indbito a ser restitudo dever ser composto no apenas pelo valor cobrado indevidamente (principal), mas tambm por encargos que venham a remunerar o indbito mesma taxa praticada pela instituio financeira no emprstimo pactuado (acessrio). Assim, o autor no tem direito somente devoluo do que pagou indevidamente ao ru, mas, tambm, dos rendimentos advindos a este com a livre disposio do patrimnio usurpado. Ensina Pontes de Miranda, que "o que se presta, em caso de repetio por enriquecimento injustificado, no o valor do bem ao tempo em que se deu o enriquecimento, o valor tal qual enriquece o demandado no momento em que se exerce a pretenso. Se o bem, ficando com o demandante, valeria a, mas com o demandado passou a valer a + x, a + x que se h de prestar, (...)" ("Tratado de Direito Privado", Parte Especial, Tomo XXVI, 3 ed., 1971, p. 167). Alm disso, dar a algum a oportunidade de obter lucro, como o caso, por meio da prtica de ilcito, afronta prpria noo de eqidade, pelo que deve ser afastada, ao mximo, qualquer soluo jurdica que venha a acolher o enriquecimento ilcito. Deve-se, ao contrrio, obrigar a instituio financeira a devolver no s as quantias que indevidamente reteve do correntista, mas tambm a efetiva remunerao que auferiu com tal procedimento. Para isso, razovel presumir que o banco obteve rendimentos, no mnimo, iguais s taxas e juros que pactuou com a correntista, ora recorrida, pois o destino usual da remunerao obtida pela instituio financeira a concesso de novos crditos a clientes, mediante contratos que prevem encargos semelhantes. Se, em contrato de cheque especial pactuado taxa de 11% ao ms, a instituio financeira cobrou valor de seu correntista indevidamente, dever restitu-lo acrescido da mesma taxa, isto , 11% ao ms. Documento: 612702 - VOTO VISTA - Site certificado Pgina 4 de 5 Superior Tribunal de Justia Do contrrio, caso se exigisse da autora da ao de repetio de indbito, a prova sobre quais os lucros advindos ao banco com a utilizao do dinheiro usurpado, restaria ineficaz a norma contida no art. 964 do CC, pois manifesta a impossibilidade de produo desta prova. Em concluso, a remunerao do indbito mesma taxa praticada para o cheque especial se justifica, por sua vez, como a nica forma de se impedir o enriquecimento sem causa pela instituio financeira. No se vislumbra, tampouco, violao s normas que regulam o sistema financeiro, pois no se est concedendo - a quem no tem - o direito de cobrar juros acima da taxa legal ou outros encargos somente permitidos s entidades participantes do sistema. Trata-se, repita-se, de pedido vinculado to-somente reparao do dano causado e coibio do enriquecimento ilcito. Nesses termos, a soluo adotada no fere a Lei de Usura, porquanto o correntista no concedeu crdito instituio financeira, mas apenas busca restituir o que lhe foi cobrado indevidamente. Apenas se est aplicando o mencionado art. 964 do CC, que d ao autor da ao de repetio de indbito o direito de cobrar tudo que represente enriquecimento injustificado do ru, por imperativo legal, e tal direito somente pode ser satisfeito, na hiptese, com a devoluo da remunerao obtida pelo banco ao utilizar o dinheiro usurpado da correntista.
Forte em tais razes, NO CONHEO do recurso especial.
o voto.
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