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Poder Judiciário

JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
2ª Vara Cível de Araguaína
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PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL Nº 0010239-37.2021.8.27.2706/TO


AUTOR: ANTÔNIO DOS SANTOS MARTINS
RÉU: CENTRO DE INTEGRACAO E ASSISTENCIA AOS SERVIDORES PUBLICOS

SENTENÇA

Trata-se de AÇÃO REVISIONAL C/C EXIBIÇÃO DE


DOCUMENTOS ajuizada por ANTONIO DOS SANTOS MARTINS, em desfavor
de CIASPREV – CENTRO DE INTEGRAÇÃO E ASSISTÊNCIA, ambos
qualificados nos autos.

Dita a parte autora ter realizado a contratação de três empréstimos


consignados, datados de novembro/2020, a ser quitado em 96 parcelas de R$ 104,77;
dezembro/2019, a ser quitado em 96 parcelas de R$ 580,33, e novembro/2019, a ser
quitado em 96 parcelas de R$ 580,33.

Sustenta que na data da contratação dos empréstimos não ficou com


nenhuma via do contrato, razão pela qual, solicitou administrativamente cópias dos
mesmos, não tendo o requerido encaminhado ao autor, jamais tendo acesso ao Custo
Efetivo Total, Taxa de Juros, Valor Cobrado de IOF.

Pleiteou pela exibição dos Contratos objeto da lide, constando os


valores cobrados, valores liberados, taxa de juros, custo efetivo total além de
eventuais taxas administrativas e cobranças de tarifas. No mérito, requer, com a
negativa da apresentação dos Contratos, ou apresentado Contratos divergentes ao
solicitado, a aplicação da Súmula 530 do STJ, com a aplicação da taxa média de
juros e o ressarcimento dos valores cobrados a mais nas parcelas pagas.

Com a inicial, juntou documentos.

Decisão – evento 4, indeferiu a concessão da gratuidade da justiça ao


autor, e intimou a referida parte para promover a emenda à inicial, adequando o rito a
ser seguido.

Em Manifestação – evento 7, a parte autora emendou à inicial,


informando que o rito a ser seguido é o procedimento comum.

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Citado, o requerido apresentou Contestação – evento 13, alegando, em
apertada síntese, que há apenas 02 (dois) contratos ativos junto a requerida, os de nº
320979 e nº 320941, sendo que em todas as negociações foram expostas as taxas
aplicadas, forma, valor e prazo de pagamento, de modo que este, por sua vez,
concordou e ratificou todos os termos.

Sustenta ainda ser apenas uma entidade privada que oferece aos
associados assistência financeira, indicando empréstimos bancários junto às
Instituições Financeiras, realizando apenas a rubrica do empréstimo no contracheque
do associado, sendo que todas as taxas e prazos é fixada e obtida diretamente pelo
Banco investidor. Juntou documentos.

Em Impugnação – evento 18, a parte autora refutou as alegações


contidas na Contestação e reiterou os termos da inicial.

Intimados para indicarem as provas a serem produzidas, ambas as


partes pugnaram pelo julgamento antecipado do mérito – eventos 27 e 27.

Os autos vieram-me conclusos.

É o relatório. Fundamento e Decido.

O processo comporta julgamento antecipado do mérito, nos termos do


que dispõe o art. 355, I, do Código de Processo Civil, dispensando-se a dilação
probatória.

Cinge-se a controvérsia em verificar se houve falha na prestação de


serviços da parte requerida quanto à cobrança dos juros nos Contratos nº 320979 e nº
320941, e se a alegação de abusividade é suficiente à determinação de readequação
dos valores das parcelas e devolução de possível montante pago a mais.

De se pontuar que a relação jurídica havida entre as partes caracteriza-


se como de consumo, submetendo-se às normas do Código de Defesa do
Consumidor (Lei 8.078/90, art. 2º e 3º, §2º).

Os juros remuneratórios, também chamados de compensatórios, são


aqueles devidos ao credor com o objetivo de remunerar o empréstimo do capital. A
regra geral estabelece que não há limitação para a pactuação e a cobrança dos juros
compensatórios nos contratos bancários, ou seja, a taxa de juros pode ser livremente
estabelecida pelas partes contratantes.

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Podem convencionar o percentual incidente pelo empréstimo do capital
livremente, pois não incide o artigo 192, parágrafo 3º da Constituição Federal
(revogado) e as taxas previstas na Lei da Usura (Decreto nº. 22.626/33) às
instituições financeiras, in verbis:

Súmula Vinculante 7: A norma do parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição,


revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a
12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar.

Vale dizer, portanto, que as instituições financeiras podem fixar


livremente a taxa de juros compensatórios, vez que são inaplicáveis as limitações
constitucionais (de 12% ao ano) do Código Civil e/ou da Lei de Usura (6% ou 12%,
conforme o caso) "aos contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema
Financeiro Nacional, salvo nas hipóteses previstas em legislação especifica" (STJ.
AgRg no REsp 920.437/RS. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino. T3. Julg. 18.11.2010).

Todavia, em que pese não estar adstrita à cobrança de juros


remuneratórios de 12% ao ano, a taxa deve ser expressamente pactuada e não pode
representar abusividade, onerosidade excessiva ou enriquecimento desmedido do
agente financeiro.

No presente caso, pretende a parte autora revisar três Contratos,


datados de novembro/2020, a ser quitado em 96 parcelas de R$ 104,77;
dezembro/2019, a ser quitado em 96 parcelas de R$ 580,33, e novembro/2019, a ser
quitado em 96 parcelas de R$ 580,33. No entanto, o requerido informou que a parte
autora possui apenas dois Contratos ativos, sendo os de nº 320979, cuja parcela
remonta ao montante de R$ 104,77, e o de nº 320941, cuja parcela remonta ao
montante de R$ 580,33 (evento 13 – CONTR5; CONTR7).

Em detida análise ao feito, em que pese o requerido ter informado que


o autor possui apenas dois Contratos ativos, observo que em seu
Contracheque, consta a incidência de três descontos referente a CIASPREV
(Empréstimo), sendo o valor de R$ 104,77 – Parc 1/96; R$ 580,33 – Parc 11/48, e
R$ 580,33 – Parc 1/96, inferindo-se que existem três cobranças distintas, referente a
três Contratos distintos (evento 1 – FINANC7).

Feitos esses esclarecimentos, em relação aos Contratos juntados nos


autos, sendo os de nº 320979 e nº 320941, verifico que os mesmos não discriminam,
expressamente, a taxa de juros anual ou CET, apenas fazendo referência a taxa de
juros mensal, fixadas nos percentuais de 3,64% e 2,72%, respectivamente.

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Em relação aos Contratos que pretende a parte autora revisar, prevê a
Súmula 530 do STJ que “Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar
a taxa de juros efetivamente contratada – por ausência de pactuação ou pela falta de
juntada do instrumento nos autos -, aplica-se a taxa médica de mercado, divulgada
pelo BACEN, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for
mais vantajosa para o devedor.”

No caso concreto, a parte autora impugnou a taxa de juros cobrada nos


referidos Contratos, sendo cabível a revisão, nos termos da Súmula 530 do STJ,
tanto em relação aos Contratos efetivamente juntados pela requerida, quando ao
Contrato não juntado no processo, para que se verifique abusividade, onerosidade
excessiva ou enriquecimento desmedido do agente financeiro.

Dessa forma, nos termos da citada Súmula, deve-se aplicar a taxa


média de juros das operações de crédito no mercado financeiro, divulgada pelo
Banco Central, se não há pactuação expressa da taxa de juros anual ou apresentação
do Contrato, sendo mantido o mesmo parâmetro para a análise da taxa de juros
mensal, a fim de se verificar abusividade ou onerosidade excessiva. Assim também
se posiciona a jurisprudência pátria:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO - ALEGAÇÃO DE


INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL - NÃO OCORRÊNCIA - REVISÃO DO
CONTRATO - POSSIBILIDADE - CONTRATO DE CHEQUE ESPECIAL -
INTIMAÇÃO PARA JUNTADA AOS AUTOS - INÉRCIA - LIMITAÇÃO À TAXA
MÉDIA DE MERCADO - SÚMULA 530 DO STJ - APLICAÇÃO - Se a simples
leitura da inicial, seguida da respectiva emenda, proporciona ao julgador aferir as
supostas ilegalidades contratuais impugnadas, revela-se excesso de formalismo o
acolhimento da preliminar de inépcia da inicial - A proteção ao consumidor é
norma constitucional e o CDC tem "status" de lei complementar, sendo que, por
força dele, há muito a jurisprudência tem mitigado o princípio pacta sunt
servanda, permitindo-se a revisão de cláusulas contratuais - A ausência de fixação
da taxa de juros pactuada no contrato bancário ou a ausência de prova dessa
pactuação impõe ao Julgador o dever de limitar a referida taxa em conformidade
com a média de mercado praticada quando a taxa cobrada for superior a ela
(Súmula 530, STJ) (TJ-MG - AC: 10000210774311001 MG, Relator: Evandro
Lopes da Costa Teixeira, Data de Julgamento: 10/06/2021, Câmaras Cíveis / 17ª
CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 11/06/2021).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C AÇÃO CONSIGNATÓRIA COM


PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. QUADRO RESUMO DO
CONTRATO DE FINANCIAMENTO. DOCUMENTO SUFICIENTE PARA A
REVISÃO CONTRATUAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA 530 DO STJ. SENTENÇA
CASSADA. 1. O autor questiona, em sua inicial, o limite dos juros remuneratórios e
a capitalização mensal de juros, o que é possível analisar da leitura do quadro
resumo colacionado aos autos, o qual indica a taxa de juros mensal e anual. 2. A

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súmula 530 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que nos contratos
bancários, na impossibilidade de comprovar-se a taxa de juros efetivamente
contratada, in casu pela falta de juntada do instrumento aos autos, aplica-se a
taxa média de mercado, divulgada pelo BACEN, praticada nas operações da
mesma espécie. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PROVIDA. SENTENÇA
CASSADA (TJ-GO - 03361897220168090051, Relator: FERNANDO DE CASTRO
MESQUITA, Data de Julgamento: 22/11/2017, 5ª Câmara Cível, Data de
Publicação: DJ de 22/11/2017).

Para os efeitos de revisão e aplicação das taxas médias de juros


estipuladas pelo Banco Central, mantém-se a modalidade contratada, qual seja,
empréstimo pessoal consignado público, conforme Contratos apresentados, o qual
foi devidamente assinado pela parte autora, não havendo qualquer indício de que,
diferentemente do que alega, tenha sido induzida a erro em relação à contratação de
empréstimo.

Por tanto, tendo como norte as taxas médias estipuladas pelo Banco
Central, à modalidade da contratação e a data da celebração do contrato, apresento o
quadro com a taxa de juros praticada pelo mercado nas operações de crédito pessoal
consignado para trabalhadores do setor público, cuja natureza é a mesma dos
Contratos juntados pela requerida, vejamos:

Parâmetros informados
Séries selecionadas
20745 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal
consignado para trabalhadores do setor público.
25467 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito
pessoal consignado para trabalhadores do setor público.
Período Função
12/11/2020 – Contrato nº 320979 Linear
12/11/2020 – Contrato nº 320941
11/2019 – Contrato 48x R$ 580,33
Registros encontrados por série:1
Lista de valores (Formato numérico: Europeu - 123.456.789,00)
Data 20745 25467
mês/AAAA % a.a % a.m.
Nov/2020 15,87 1,24

Nov/2019 18,47 1,42


Fonte BCB-DSTAT BCB-DSTAT

Da análise de tais índices, verifica-se que existe abusividade no


percentual aplicado no contrato em questão, uma vez que fixados em índices
superiores aos da média de mercado do Banco Central, devendo serem revistas as
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taxas originalmente pactuadas.

Os juros, considerados como retribuição ou contraprestação pelo


capital mutuado, devem ser limitados à taxa média de mercado em operações da
espécie indicadas pelo Banco Central do Brasil à época da contratação, como forma
de restabelecer o equilíbrio contratual, ficando a apuração do saldo devedor relegada
para a fase de regular procedimento de liquidação de sentença quando necessário. A
respeito do exposto, trago orientação do TJTO:

APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO C/C DANOS


MORAIS. CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS.
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PLEITO IMPROCEDENTE. MERO
DISSABOR. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1 – O caso em debate trata
de demanda revisional e reparatória em razão da cobrança de juros exorbitantes
em contratos de empréstimo pessoal. 2 - Constatada a cobrança abusiva pela
instituição financeira, os valores cobrados a maior devem ser necessariamente
extirpados do montante da dívida e restituídos ao consumidor. 3 – Todavia, para o
dever de indenizar por danos extrapatrimoniais é necessário o abalo, angústia ou
aflição desproporcionais, que extrapolem o mero dissabor. O que não se verificou no
caso em comento. 4 – Ademais o dano de cunho moral não se caracteriza pelo
advento de frustrações, chateações, aborrecimentos, inconvenientes, enfim, os
direitos da personalidade não são vilipendiados por atos inerentes ao piso
elementar de situações ordinárias afetas a dinâmica social e comercial, a qual todos
estão obrigados a suportar. 5 – Recurso conhecido e improvido. (APELAÇÃO
CÍVEL Nº. 0024402-60.2019.827.0000. 1ª CÂMARA CÍVEL. RELATORA:
DESEMBARGADORA JACQUELINE ADORNO. JULGADO EM 11.10.2019).

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais, para


REVISAR os Contratos nº 320979, nº 320941, e o Contrato não apresentado (48
parcelas de R$ 580,33), nos termos da Súmula 530 do STJ, LIMITANDO os juros
remuneratórios a Taxa Média de Mercado apurada, correspondendo à:

a) Contrato nº 320979 e nº 320941- 1,24% ao mês e 15, 87% ao ano,

b) Contrato não apresentado (48 parcelas de R$ 580,33 – datado de


Nov/2019) – 1,42% ao mês e 18,47% ao ano.

CONDENAR o requerido a restituir à parte autora eventuais valores


pagos a maior, corrigido monetariamente pelo INPC a partir do efetivo prejuízo
(Súmula 43 do STJ) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação
(art. 405 do CC), a ser apurador em Liquidação de Sentença (se houver).

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CONDENO a parte requerida ao pagamento das custas, despesas
processuais e honorários advocatícios, que ARBITRO R$ 1.500,00 (mil e quinhetos
reais), por equidade (CPC, art. 85, § 8º).

Por fim, DECLARO RESOLVIDO O MÉRITO DO PROCESSO,


com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Na eventualidade de não serem interpostos recursos voluntários no


prazo legal, CERTIFIQUE-SE a data do trânsito em julgado e arquive-se os
autos.

Publique-se. Registre-se. Intime(m)-se. Cumpra-se.

Documento eletrônico assinado por WANESSA LORENA MARTINS DE SOUSA MOTTA, Juíza de
Direito, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº
5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço
eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 5885243v4 e do código
CRC 455223af.

Informações adicionais da assinatura:


Signatário (a): WANESSA LORENA MARTINS DE SOUSA MOTTA
Data e Hora: 13/7/2022, às 13:43:13

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