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Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário

Tribunal de Justiça
Comarca da Capital
Cartório da 6ª Vara Cível
Av. Presidente Vargas, 2555 2º Pav. 202/210/219CEP: 20210-030 - Cidade Nova - Rio de Janeiro - RJ Tel.: 2588-2246
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Fls.

Processo: 0119840-45.2013.8.19.0001

Classe/Assunto: Procedimento Ordinário - Revisão Contratual / Obrigações / D. Civil C/C Depósito


/ Espécies de Contratos
Autor: SILVANIR RODRIGUES FARINCHON
Réu: BV FINANCEIRA S A CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

___________________________________________________________

Nesta data, faço os autos conclusos ao MM. Dr. Juiz


Renata Gomes Casanova de Oliveira e Castro

Em 13/01/2015

Sentença

Trata-se de demanda ajuizada por SILVANIR RODRIGUES FARINCHON em face de BV


FINANCEIRA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, em que postula: 1) a
declaração de nulidade das cláusulas contratuais que estipulam juros abusivos e sua
capitalização; 2) a consignação em pagamento das parcelas no valor que o autor entende devido;
3) a gratuidade de justiça; 4) a exibição do contrato de financiamento; 5) o deferimento da
antecipação de tutela para que a ré se abstenha de incluir o nome do autor nos cadastros
restritivos ao crédito e para autorizar a manutenção do veículo em posse do autor.

Na petição inicial de fls. 02/28, acompanhada dos documentos de fls. 29/37, o autor
sustenta, em termos bastante genéricos: 1) a limitação dos juros cobrados ao patamar de 1% ao
mês; 2) a proibição de capitalização mensal de juros.

A decisão de fl. 58 deferiu a gratuidade de justiça e autorizou a consignação dos valores


mensais.

Contestação às fls. 68/107, com documentos às fls. 108/114.

Decretação da revelia à fl. 120.

Manifestação do autor em provas requerendo a realização de perícia contábil às fls.


123/126. O réu dispensou provas (fl. 127).

Deferimento da prova pericial à fl. 131, com nomeação de perito.

Quesitos do autor às fls. 135/137, e do réu, às fls. 138/139.

Honorários periciais homologados à fl. 155, determinando ao réu a juntada de documentos,


o que foi atendido às fls. 156/162.

Laudo pericial às fls. 167/188. Manifestação do réu às fls. 191/204. O autor não se

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pronunciou.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

O exame dos autos demonstra ter a parte autora firmado com o réu, em 20/11/2010,
contrato de financiamento no valor de R$ 62.389,39, ajustando custo efetivo total anual de 25,43%
(fl. 157).

Vê-se que o contrato foi claro ao mencionar o custo efetivo total da operação (CET). Esta
informação visa a permitir que o consumidor possa comparar as diferentes ofertas de crédito feitas
pelas instituições do mercado, gerando maior concorrência entre estas na medida em que o
referido percentual engloba todos os encargos e despesas das operações, isto é, taxa de juros,
tarifas, tributos, seguros e qualquer outra despesa cobrada.

Quanto aos juros remuneratórios, cabem dois esclarecimentos.

Em primeiro lugar, a Lei nº 4.595/64 revogou a Lei de Usura na parte em que limitava a taxa de
juros aos contratos celebrados pelas instituições financeiras, e com a revogação da norma do § 3º
do art. 192 da CF/88 pela Emenda Constitucional 40/2003 assentou-se o entendimento de que a
sua fixação em contrato deve respeitar apenas a média praticada no mercado.

Em segundo lugar, consultando as páginas do Banco Central na internet


(http://www.bcb.gov.br/fis/taxas/htms/20101012/tx012040.asp), é possível verificar os custos
efetivos médios mensais que eram cobrados pelas instituições financeiras na data da contratação -
vide documento anexo à sentença.

Consta, ainda, do referido sítio eletrônico a seguinte informação :

"As taxas de juros apresentadas nesse conjunto de tabelas correspondem a médias aritméticas
ponderadas pelos valores das operações contratadas nos cinco dias úteis referidos em cada
tabela. Essas taxas representam o custo efetivo médio das operações de crédito para os clientes,
composto pelas taxas de juros efetivamente praticadas pelas instituições financeiras em suas
operações de crédito, acrescida dos encargos fiscais e operacionais incidentes sobre as
operações.

As taxas de juros apresentadas correspondem à média das taxas praticadas nas diversas
operações realizadas pelas instituições financeiras, em cada modalidade. Em uma mesma
modalidade, as taxas de juros podem diferir entre clientes de uma mesma instituição financeira.
Taxas de juros variam de acordo com fatores diversos, tais como o valor e a qualidade das
garantias apresentadas na operação, a proporção do pagamento de entrada da operação, o
histórico e a situação cadastral de cada cliente, o prazo da operação, entre outros.

As instituições não relacionadas nas tabelas não operaram nas respectivas modalidades nos
períodos referidos ou não prestaram informações ao Banco Central do Brasil."

Como se vê da tabela anexa, os juros praticados pelas instituições financeiras na data do


contrato celebrado pelo autor variaram entre 1,14% ao mês e 6,33% ao mês, de modo que a taxa
de juros imposta ao autor (1,44% - fl. 157) apresenta-se como uma das mais baixas do mercado.
Deste modo, não há como se reconhecer a abusividade mencionada.

A questão atinente à prática do anatocismo foi definitivamente resolvida em sede de recurso


repetitivo, tomando-se em conta os recursos especiais representativos da controvérsia de nº

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RENATACASANOVA
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1.112.879/PR e 973827/RS.

Assim dispõem as ementas dos acórdãos paradigmas proferidos pelo STJ:

"BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO


BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS.
CONTRATO QUE NÃO PREVÊ O PERCENTUAL DE JUROS REMUNERATÓRIOS A SER
OBSERVADO.
I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.
ORIENTAÇÃO - JUROS REMUNERATÓRIOS. 1 - Nos contratos de mútuo em que a
disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser
consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os
juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa
cobrada for mais vantajosa para o cliente. 2 - Em qualquer hipótese é possível a correção para a
taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios praticados.
II - JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO - Consignada, no acórdão recorrido, a
abusividade na cobrança da taxa de juros, impõe-se a adoção da taxa média de mercado, nos
termos do entendimento consolidado neste julgamento. - Nos contratos de mútuo bancário,
celebrados após a edição da MP nº 1.963-17/00 (reeditada sob o nº 2.170-36/01), admite-se a
capitalização mensal de juros, desde que expressamente pactuada. Recurso especial
parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. Ônus sucumbenciais redistribuídos."
(REsp 1112879/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2010,
DJe 19/05/2010).

"CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE


BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM
GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS.
DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
MORA. CARACTERIZAÇÃO.
1 - A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a
um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada,
tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos, serem, periodicamente,
incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles
passam a incidir novos juros.
2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e
"taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao
início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa
nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de
juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933.
3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com
periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da
Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que
expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir
pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual
superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual
contratada".
4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser
cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios.
5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que
decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido."
(REsp 973827/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA

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ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 24/09/2012)

Como se vê, assentou o STJ a possibilidade da capitalização mensal dos juros nos contratos
bancários celebrados após a MP nº. 1.963-17/00, desde que expressamente pactuada, bastando,
para tanto, que a previsão dos juros anuais seja superior ao duodécuplo dos juros mensais.

Na hipótese em tela, a contrato foi firmado no ano de 2010, após a edição de referida Medida
Provisória. Logo, cabível a cobrança de juros mensalmente capitalizados no contrato objeto da
presente.

Note-se que o contrato acostado demonstra que o autor sabia o valor exato das parcelas
assumidas, tendo aderido espontaneamente a ele. Além disso, o fato de serem fixas e
previamente conhecidas as parcelas a serem pagas pelo autor impede o reconhecimento de
onerosidade excessiva, que é sempre posterior à formação do contrato.

Sobre taxa mensal de juros, anatocismo e tabela price o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro vem
se pronunciando no seguinte sentido:

Apelação Cível. Ação de revisão de cláusulas contratuais. Rito ordinário. Autora que celebrou com
o réu contrato de financiamento de veículo. Alegação de cobrança de juros abusivos, anatocismo,
com utilização da "tabela price", a cumulação de comissão de permanência com outros encargos
financeiros, estipulação indevida de taxas e de IOF. Sentença pela improcedência do pedido.
Apelo no qual a autora alega que houve cerceamento do seu direito de produzir prova pericial, a
fim de comprovar o anatocismo. Novo entendimento sobre a matéria por parte deste Relator, ante
o posicionamento do STJ que, em recurso repetitivo, estabeleceu que a cobrança de juros sobre
juros, em periodicidade inferior a um ano, é permitida em contratos celebrados após 31/3/2000,
data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor com MP nº 2.170-01, desde
que expressamente pactuada e, ainda, que "a capitalização dos juros em periodicidade inferior à
anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de
juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva
anual contratada." Desnecessidade de perícia no caso em apreço, eis que consta dos autos o
contrato celebrado entre as partes, devidamente assinado pela autora, onde está previsto o
anatocismo, nos termos expressos no paradigma do STJ mencionado. Desprovimento do apelo.
(Ap. 0023286-82.2012.8.19.0001, Rel. Des. Carlos José Martins Gomes - Julgamento: 10/12/2013
- 16ª Câmara Cível)

APELAÇÃO - AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS CUMULADA COM


REPETIÇÃO DE INDÉBITO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. Contrato de alienação fiduciária.
Alegação de abusividade na cobrança de juros remuneratórios e capitalizados mensalmente, com
aplicação da tabela price. Sentença de improcedência que deve ser mantida. No que tange os
juros remuneratórios a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de
Justiça, já se consolidou no sentido de que às instituições financeiras, regidas pela Lei nº
4.595/64, não se aplica a limitação da taxa de 12% ao ano, estabelecida na Lei de Usura, Decreto
n° 22.626/33 e no art. 192 da Constituição da República. Aplicação do verbete nº 596, da Súmula
do STF: "As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros
encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o
sistema financeiro nacional". Ademais, o art. 192, § 3º, da Constituição da República que
determinava que as taxas de juros não poderiam ser superiores a 12% ao ano, foi revogado pela
EC 40/2003. Assim, consolidou-se no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento de que as
instituições financeiras podem cobrar juros acima do patamar de 12% ao ano, que somente
poderão ser considerados abusivos quando forem excessivos em relação à taxa média de
mercado, o que não é o caso dos autos. Quanto ao anatocismo, o entendimento mais recente

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adotado pelo STJ é de que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um
ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n.
1.963-17/2000, desde que expressamente pactuado. Orientação traçada no julgamento do REsp
nº 973.827/RS, processado na forma do art. 543-C do CPC. RECURSO A QUE SE NEGA
SEGUIMENTO, NA FORMA DO ART. 557, CAPUT, DO CPC. (Ap. 0004760-49.2013.8.19.0028,
Rel. Des. Claudio Dell Orto - Julgamento: 08/01/2014 - 25ª Câmara Cível Consumidor)

Assim, inexiste qualquer abusividade no negócio jurídico firmado entre as partes que justifique a
sua revisão, a exclusão/abstenção de apontamento do autor nos cadastros restritivos ao crédito,
sua manutenção na posse do veículo ou a consignação de valores.

Deixo de considerar as demais questões atinentes a encargos e multas abordados no laudo


pericial por não terem integrado os pedidos nem a causa de pedir da inicial, cujos termos
genéricos beiram a inépcia. Preservado, assim, o princípio da adstrição da sentença ao pedido.

Os depósitos efetuados nos autos devem ser levantados em favor do réu, a fim de permitir a
quitação parcial do débito do autor.

Isto posto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO na forma do art. 269, I do CPC. Condeno o
autor ao pagamento de custas e honorários advocatícios que arbitro em R$ 500,00 (quinhentos
reais), na forma do art. 20 §3º do CPC, observada a gratuidade de justiça deferida. Expeça-se
mandado de levantamento dos valores depositados em favor do réu.

Com o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se.

P.R.I.

Rio de Janeiro, 23/01/2015.

Renata Gomes Casanova de Oliveira e Castro - Juiz em Exercício

___________________________________________________________

Autos recebidos do MM. Dr. Juiz

Renata Gomes Casanova de Oliveira e Castro

Em ____/____/_____

Øþ

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RENATACASANOVA

RENATA GOMES CASANOVA DE OLIVEIRA E CASTRO:000032081 Assinado em 23/01/2015 15:39:01


Local: TJ-RJ

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