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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2023.0001065224

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1004695-53.2023.8.26.0008, da Comarca de São Paulo, em que é apelante/apelado
BANCO MASTER S/A, é apelado/apelante MARIA ELZA GOLBERTO DIAS
(JUSTIÇA GRATUITA).

ACORDAM, em 37ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de


São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso do réu e
julgaram prejudicado o do autor. V. U.", de conformidade com o voto do Relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEDRO


KODAMA (Presidente) E ANA CATARINA STRAUCH.

São Paulo, 5 de dezembro de 2023.

JOSÉ TARCISO BERALDO


RELATOR
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO Nº: 55437


APEL.Nº: 1004695-53.2023.8.26.0008
COMARCA: São Paulo 3ª VC F REG TATUAPÉ
APTES. : BANCO MASTER S/A E MARIA ELZA GOLBERTO DIAS
(JUST GRAT)
APDOS. : OS MESMOS

CONTRATO Cobrança indevida sobre benefício


previdenciário em razão de cartão de crédito com uso da
Reserva de Margem Consignável (RMC)
Inadmissibilidade Afirmação de falsidade
Verossimilhança, tanto mais que a prova em contrário
cabia ao banco, do que não cuidou Inteligência do
disposto no art. 6º do CDC e no inciso II do art. 373 do
Cód. de Proc. Civil Ação anulatória e restitutória
procedente.
DANO MORAL Inocorrência Ausência de
comprovação dos alegados danos Caso de mero dissabor,
do qual não resulta dever de indenizar Situação, ademais,
em que a autora permaneceu de posse do valor creditado -
Devolução simples das quantias debitadas, uma vez que
não foi demonstrada má-fé ou dolo da instituição financeira
- Sentença reformada em parte Apelação do réu
parcialmente provida, com improvimento do recurso
adesivo.

Apelação e recurso adesivo interpostos contra r.


sentença proferida pelo MM Juiz de Direito Dr. Guilherme Salvatto
Whitaker que julgou procedente ação desconstitutiva e indenizatória
ajuizada em razão de contrato de cartão de crédito com utilização de
reserva de margem consignável (RMC) alegadamente não avençado
para declarar a inexigibilidade do débito indicado na inicial e condenar
a ré a restituir em favor da autora os valores descontados do respectivo
benefício, de forma simples, com indenização por danos morais no
valor de cinco mil reais; honorários advocatícios arbitrados em dois mil
reais, por equidade.
Sustentam as partes, na ordem de interposição dos
recursos:

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a) o Banco Master S/A, que a contratação foi


regular, conforme documentação acostada à contestação, em especial
comprovante de transferência dos valores mutuados para a conta
corrente de titularidade da autora, de modo que não há falar em falha na
prestação dos serviços e tampouco dever de restituição de valores;
b) a autora, que o “quantum” indenizatório foi
apoucado, comportando majoração, bem como que a restituição deve
ser dobrada, ante a evidencia de má-fé do banco na cobrança.
Batem-se as partes, em resposta, pela manutenção do
quanto decidido no que lhes beneficia.
Recursos, no mais adequadamente processados.
Houve oposição ao Julgamento Virtual.
É o relatório.
O inconformismo do réu vinga em parte.

Com efeito, a ocorrência da fraude na obtenção do


empréstimo que deu origem à cobrança de parcelas dos proventos de
aposentadoria da autora foi bem reconhecida.
Afirmou ela, veementemente, desde a petição inicial,
que não contraiu o empréstimo consignado, isto é, que nenhum
instrumento assinou, com o que aquele implementado pelo apelante,
creditando valor em sua conta corrente, foi fruto de fraude.
A instituição financeira, de outra sorte, alegou o
contrário, isto é, a idoneidade da contratação, sendo seu o ônus de
demonstrar a alegação de fato extintivo ou impeditivo, conforme o
disposto no inciso II do art. 373 do Cód. de Proc. Civil, bem como do
inciso VIII do art. 6º do Código de Defesa do Consumidor, do que,
todavia, não cuidou, a tanto não bastando a documentação juntada com
a contestação que não confere lastro à tese de defesa, tanto mais em face
das providencias imediatas tomadas pela apelada autora para
cancelamento do contrato, inclusive por meio de lavratura de boletim de
ocorrência, anotando-se que da autora seria inexeqüível exigir-se prova
negativa
Daí se concluir que a pretensão anulatória era
mesmo de ser acolhida, tanto mais em se considerando o teor da Súmula
nº 479 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual "As
instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos
gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados

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por terceiros no âmbito de operações bancárias ".


Não é caso, todavia, de indenização pelos alegados
danos morais.
Isso porque, em que pese as alegações autorais, a
apelada autora não faz jus à indenização pretendida, uma vez que não se
se vê presente nenhuma ofensa aos direitos de sua personalidade de
consumidor, ou que as cobranças, reconhecidas na sentença como
indevidas, tenham extrapolado os limites do mero dissabor cotidiano.
Apenas isso, todavia, não é suficiente para
caracterizar a existência de dano moral, para qual se exige que a
violação ao direito da vítima exceda “a naturalidade dos fatos da
vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem
ela se dirige” (REsp 599.538/MA, Rel. Ministro CESAR ASFOR
ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 04.03.2004, DJ 06.09.2004
p. 268).
Os fatos ocorridos certamente incomodaram a
autora; todavia, forçoso reconhecer, e respeitados os sentimentos dela,
que, em verdade, não passaram de mero aborrecimento.
Nesta C. Câmara se tem deliberado nesse sentido
(AP's 1000711-42.2018.8.26.0168; Rel. Des. João Pazine Neto;
1000403-62.2018.8.26.0311; Rel. Des. Sergio Gomes).
Por outro lado, e terminando-se o exame desse ponto
do inconformismo, tem-se que a apelada autora não comprovou a
existência de alguma outra circunstância mesmo as alegadas na
petição inicial das quais pudessem derivar a pretendida indenização,
tanto mais que, realmente, ficou em poder do valor mutuado -
indevidamente creditado conforme demonstrado pelo apelante réu por
meio de comprovante de transferência para a conta de titularidade da
autora - tendo dele se beneficiado, o que o compensa moralmente dos
débitos das parcelas que foram efetivados, além de terem sido de baixo
valor.
Anote-se, ainda, que não há falar em repetição em
dobro.
Isso porque, não se pode dizer que a ré tenha agido
temerariamente ou com o intuito de prejudicar a autora.
A aplicação do disposto nos arts. 42 do CDC e 940
do Código Civil somente teria lugar em caso de demonstração
inequívoca de dolo da outra parte, do que, como dito, não há evidência

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de que tenha ocorrido.


Assim já era também quanto ao correspondente art.
1.531 do diploma civil revogado, o que motivou, aliás, a edição da
Súmula nº 159 do C. Supremo Tribunal Federal, “verbis”: “Cobrança
excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do art. 1.531 do
Código Civil”.
Outro não é o sentido da lição de WASHINGTON
DE BARROS MONTEIRO, para quem “sem prova de má-fé da parte
do credor que faz a cobrança excessiva, não se comina referida
penalidade” (“Curso de Direito Civil”, Saraiva, 8ª ed., Obrigações 2ª
parte, pág. 432).
Feitas essas considerações, reforma-se em parte a r.
sentença de modo a afastar a condenação ao pagamento de indenização
por danos morais; em razão do quanto decidido, ficam redistribuídos os
ônus da sucumbência, cabendo à autora o pagamento de metade da taxa
judiciária e ao réu o restante, devendo o autor pagar ao réu dez por
cento sobre o valor da pretensão indenizatória a título de honorários
advocatícios, cabendo ao banco o pagamento de mil reais à autora, por
equidade.
Diante do exposto, dá-se parcial provimento à
apelação do réu e nega-se provimento ao recurso adesivo.

JOSÉ TARCISO BERALDO


Relator

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