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INTRODUÇÃO
A legislação castrense possui fundamento jurídico constitucional que atribui a
polícia militar dos estados a responsabilidade de preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e patrimônio. Também nossa carta magna em seu artigo 125 §
4º delega a justiça militar estadual processar a julgar os militares dos estados.
Este artigo terá como objetivo estabelecer fundamentos constitucionais dos atos
da polícia judiciária militar estadual. Para tanto, é necessária uma aplicação de meios
interpretativos, com desígnio de garantir de forma satisfatória o exercício exegético
literal, para que, dentro das questões práticas e teóricas da legislação castrense
fundamentar-se-á aos auspícios da Constituição Federal. Dessa forma, uma abordagem
interpretativa de conceitos e princípios constitucionais, por onde, ao final, se apresentará
a vinculação de garantias constitucionais com os procedimentos de polícia judiciária
militar estadual dentro de uma realidade atual, no que se referre a conceitos
constitucionais.
A problematização do tema proposto fica evidenciado com a seguinte pergunta:
São aplicadas as garantias constitucionais nos procedimentos de polícia Judiciária
Militar Estadual em Santa Catarina?
Neste estudo será formulado o seguinte objetivo “Analisar a atual legislação
constitucional, conceitos e princípios aplicados nos procedimentos de Polícia Judiciária
Militar Estadual”.
Como objetivo específico deste estudo: Apresentar Garantias Constitucionais e
Tratados Internacionais aplicáveis nos procedimentos de Polícia Judiciária Militar
Estadual.
Desta maneira, torna-se fundamental este estudo, para auxiliar, fundamentar e
compreender o garantismo constitucional, adotados nas atividades dos setores jurídicos
dos Batalhões de Polícia Militar em Santa Catarina.
Ao final deste trabalho, será possível entender e relacionar as principais
Garantias Constitucionais aplicadas nos procedimentos de Polícia Militar Judiciária
Estadual.
1. PROCEDIMENTOS DA POLÍCIA JUDICIÁRIA MILITAR
A Polícia Judiciária Militar está diretamente relacionada a Justiça Militar 2, que
por sua vez encontra guarida nos artigos da atual Constituição Federal, mais
especificamente nos arts. 122 a 1243 e §§, o art. 125 § 3º, 4º, e 5º.
E para exercer a atividade investigatória a Polícia Judiciária Militar possui
fundamentação legal no Código de Processo Penal Militar em seu artigo 8º4:
Art. 8º Compete à Polícia judiciária militar:
a) apurar os crimes militares, bem como os que, por lei
especial, estão sujeitos à jurisdição militar, e sua autoria;
b) prestar aos órgãos e juízes da Justiça Militar e aos membros
do Ministério Público as informações necessárias à instrução e
julgamento dos processos, bem como realizar as diligências
que por êles lhe forem requisitadas;
c) cumprir os mandados de prisão expedidos pela Justiça
Militar;
d) representar a autoridades judiciárias militares acêrca da
prisão preventiva e da insanidade mental do indiciado;
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Justiça Militar é considerada uma Justiça Especial. Marques (2000) conceitua Justiça Especial como “As
jurisdições especiais, embora não se identifiquem com as justiças de exceção, constituem sempre uma
derrogação às atribuições da justiça comum, e, por isso, não devem ser em grande número,
principalmente em relação à aplicação do direito penal. No direito brasileiro, felizmente, a justiça comum
permanece com poder de julgar bem amplo e extenso, justamente porque as jurisdições especiais são em
pequeno número e compreendem atribuições que na realidade devem ser separadas das que pertencem à
jurisdição comum”.
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Art. 122. São órgãos da Justiça Militar:
I - o Superior Tribunal Militar;
II - os Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei.
Art. 123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios, nomeados pelo
Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais
generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais da
Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.
Parágrafo único. Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros
maiores de trinta e cinco anos, sendo:
I - três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva
atividade profissional;
II - dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do Ministério Público da Justiça Militar.
Art. 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.
Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência da Justiça Militar.
Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.
§ 3º A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual,
constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau,
pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar
seja superior a vinte mil integrantes.
§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares
definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri
quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos
oficiais e da graduação das praças.
§ 5º Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares
cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de
Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares.
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BRASIL. Decreto-lei nº 1.002, de 21 out.1969. Institui o Código de Processo Penal Militar. Diário
Oficial da União, Brasília, 21 out.1969. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del1002.htm. Acesso em: 16 de abril de 2020.
e) cumprir as determinações da Justiça Militar relativas aos
presos sob sua guarda e responsabilidade, bem como as demais
prescrições dêste Código, nesse sentido;
f) solicitar das autoridades civis as informações e medidas que
julgar úteis à elucidação das infrações penais, que esteja a seu
cargo;
g) requisitar da polícia civil e das repartições técnicas civis as
pesquisas e exames necessários ao complemento e subsídio de
inquérito policial militar;
h) atender, com observância dos regulamentos militares, a
pedido de apresentação de militar ou funcionário de repartição
militar à autoridade civil competente, desde que legal e
fundamentado o pedido.
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LEI Nº 6.218, DE 10 DE FEVEREIRO DE 1983 - Estatuto dos Policiais-Militares do Estado de Santa
Catarina
§ 2º Disciplina é a rigorosa observância e o acatamento integral
das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam
o organismo policial-militar e coordenam seu funcionamento
regular e harmônico traduzindo-se pelo perfeito cumprimento
do dever por parte de todos e de cada um dos componentes
desse organismo.
§ 3º A disciplina e o respeito á hierarquia devem ser mantidos
em todas as circunstâncias, entre policiais-militares da ativa, da
reserva e reformados.
Para abertura do IPM deve ser observado a hierarquia, pois deve existir a
superioridade do posto ou graduação do infrator pela autoridade encarregada 7. A
formação do referido procedimento, deve ser observada com atenção no artigo 13 do
CPPM:
Art. 13. O encarregado do inquérito deverá, para a formação
deste:
Atribuição do seu encarregado
a) tomar as medidas previstas no art. 12, se ainda não o tiverem
sido;
b) ouvir o ofendido;
c) ouvir o indiciado;
d) ouvir testemunhas;
e) proceder a reconhecimento de pessoas e coisas, e
acareações;
f) determinar, se for o caso, que se proceda a exame de corpo
de delito e a quaisquer outros exames e perícias;
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Art. 9º O inquérito policial militar é a apuração sumária de fato, que, nos têrmos legais, configure crime
militar, e de sua autoria. Tem o caráter de instrução provisória, cuja finalidade precípua é a de ministrar
elementos necessários à propositura da ação penal.
Parágrafo único. São, porém, efetivamente instrutórios da ação penal os exames, perícias e avaliações
realizados regularmente no curso do inquérito, por peritos idôneos e com obediência às formalidades
previstas neste Código.
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Art. 10 §1º CPPM - Tendo o infrator posto superior ou igual ao do comandante, diretor ou chefe de
órgão ou serviço, em cujo âmbito de jurisdição militar haja ocorrido a infração penal, será feita a
comunicação do fato à autoridade superior competente, para que esta torne efetiva a delegação, nos
termos do § 2° do art. 7º.
g) determinar a avaliação e identificação da coisa subtraída,
desviada, destruída ou danificada, ou da qual houve indébita
apropriação;
h) proceder a buscas e apreensões, nos termos dos arts. 172 a
184 e 185 a 189;
i) tomar as medidas necessárias destinadas à proteção de
testemunhas, peritos ou do ofendido, quando coactos ou
ameaçados de coação que lhes tolha a liberdade de depor, ou a
independência para a realização de perícias ou exames.
O prazo do inquérito penal militar deve ter seu término dentro do período de 20
dias, caso o indiciado esteja preso, devendo iniciar sua contagem no dia que ocorreu a
prisão. Caso o indiciado esteja solto o prazo é de 40 dias a partir da data em que o
procedimento for instaurado, conforme art. 20 do CPPM.
Nos casos em que o réu esteja preso e decorrido o prazo estabelecido por lei e
não ser encaminhado os autos ao Parquet, restará configurado o crime de
constrangimento ilegal8, cuja solução deverá ser dada pelo remédio constitucional
Habeas Corpus. Caso o indiciado estar em liberdade, o prazo de 40 (quarenta) dias
poderá ser prorrogado por 20 (vinte) dias, conforme o § 1º, do art. 20, do CPPM.
O Inquérito Policial Militar é finalizado com um minucioso Relatório da
Autoridade Encarregada, seguido de uma Conclusão da autoridade Delegante, onde se
proferirá sobre o cometimento ou não de infração penal.
Devem acompanhar os autos do Inquérito Policial Militar todos os instrumentos
utilizados na prática da infração penal e outros meios de provas utilizado no decurso dos
autos, que serão entregues mediante protocolo do sistema E-proc do Tribunal de Justiça
Estadual direcionado para na vara da Justiça Militar.
Mister de dizer, que o Inquérito Policial Militar não poderá, ser arquivado pela
Autoridade da Polícia Judiciária Militar, mesmo concluindo pela inexistência de crime
militar.
1.2 Sindicância
Sindicância é um procedimento administrativo que tem por finalidade a
apuração de fato onde servidor militar pode ter inferido em crime militar ou
transgressão disciplinar.
Seguindo as lições de Hely Lopes Meirelles que nos ensina que “sindicância
administrativa é o meio sumário de apuração ou elucidação de irregularidades no
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Art. 146 do CP - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver
reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer
o que ela não manda: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
serviço para subsequente instauração de processo e punição ao infrator. Pode ser
iniciada com ou sem sindicado, bastando que haja indicação da falta a apurar9”.
Ainda sobre o assunto a mesma autora afirma que este procedimento
administrativo dispensa defesa do sindicado e a publicidade no seu procedimento, em
razão de tratar de simples expediente de apuração ou verificação de irregularidade, e
não de base para punição equiparável ao inquérito policial em relação à ação penal
(MEIRELLES, 2016).
Para melhor compreender o referido procedimento e sua conceituação, nos
baseamos na ORDEM DE SERVIÇO Nº 26/76 do Comando da PMSC que possui como
assunto a elaboração de Sindicância, que define que “Sindicância é a apuração sumária
de fato irregular, sem prévia configuração de crime, militar ou comum, sobre cuja
natureza e circunstâncias necessite a autoridade de esclarecimentos, a fim de orientar e
fundamentar sua decisão”.
Segundo o conceito de José Cretella Júnior10:
Sindicância Administrativa ou, abreviadamente, sindicância é o
meio sumário de que se utiliza a Administração do Brasil para,
sigilosamente ou publicamente, com indiciados ou não,
proceder à apuração de ocorrências anômalas no Serviço
Público, as quais, confirmadas, fornecerão elementos concretos
para a abertura do processo administrativo contra o funcionário
Público responsável; não confirmadas as irregularidades, o
processo sumário é arquivado.
Para a apuração de fatos por uma Sindicância e a consequente nomeação de
autoridade Sindicante, deve ser iniciada através de Portaria. Este procedimento também
se ancora na portaria nº 009/PMSC/200111 que visa regulamentar o Processo
Administrativo Disciplinar na Polícia Militar de Santa Catarina, em seus artigos 8º e 9º
que assim seguem:
Art. 8° A autoridade competente para aplicar sanção
disciplinar, nos termos do Regulamento Disciplinar da Polícia
Militar, não havendo elementos suficientes para instauração de
processo administrativo disciplinar, por falta de indícios da
autoria ou não estar demonstrado o fato, poderá determinar,
preliminarmente, a instauração de sindicância, designando
autoridade sindicante.
Art. 9° Da sindicância poderá resultar:
I - arquivamento dos autos;
II - adoção de medidas administrativas, de caráter não
disciplinar, devidamente fundamentadas;
III - instauração de processo administrativo disciplinar (PAD).
9
Meirelles. Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 42ª edição São Paulo: Malheiros, 2016.
10
JÚNIOR. J. Cretella. Prática do processo Administrativo. 5ª edição São Paulo; editora Revista dos
Tribunais, 2006, p. 64.
11
Portaria nº 009/PMSC/2001 - Aprova o Regulamento de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) na
Polícia Militar de Santa Catarina e dá outras providências.
§ 1º Se no relatório a autoridade sindicante entender cabível
penalidade disciplinar, encaminhará os autos à autoridade
delegante, opinando pela abertura de processo administrativo
disciplinar, ou se ela própria for autoridade delegante
determinará tal procedimento, em obediência ao princípio do
inciso LIV, do art. 5°, da Constituição Federal.
(CF: “Art. 5º...LIV - ninguém será privado da liberdade ou de
seus bens sem o devido processo legal;”)
§ 2º No caso do parágrafo anterior, cópia da sindicância será
anexada à portaria, ofício, ou outro documento de delegação de
competência.
§ 3º Sendo a própria autoridade delegante a processante, cópia
da sindicância irá integrar o libelo acusatório administrativo.
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DECRETO N.º 12.112, de 16 de setembro de 1980, Regulamento Disciplinar da Polícia Militar de
Santa Catarina (RDPMSC).
dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte”.
O CADH aplica-se a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no país e
não possui nenhuma vedação ao fato dos brasileiros serem civis ou militares. Assim,
cabe a autoridade julgadora dos procedimentos de Polícia Justiça Militar reconhecer o
princípio da inocência quando, na ausência de provas seguras que possam demonstrar a
culpabilidade do acusado, a materialidade ou autoria. Esse princípio encontra-se
consagrado na Constituição Federal e na Convenção Americana de Direitos Humanos.
As normas e regulamentos militares devem estar submetidos à Constituição
Federal, que está no topo da hierarquia das leis. O Policial Militar transgressor deve ser
punido de acordo com a lei, sendo-lhe assegurado todas as garantias previstas na
Constituição Federal. E o julgamento da autoridade delegante deve ser pautada pelo
respeito ao princípio da imparcialidade, com a efetiva aplicação da justiça e
devidamente motivada. Caso contrário poderá ser revista pelo Poder Judiciário, em
atendimento ao art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.
Além das garantias constitucionais, os policiais militares encontram-se
protegidos pelos instrumentos internacionais assinados pelo Brasil, como a Convenção
Americana de Direitos Humanos e a Declaração de Direitos Humanos da Organização
das Nações Unidas – ONU.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Levando-se em consideração os aspectos abordados durante o desenvolvimento
deste estudo, se percebe a necessidade de uma adequação dos conceitos garantistas da
nossa Constituição Federal com os atos da Polícia Judiciária Militar Estadual. O Direito
Militar é peculiar e possui em suas raízes propostas lastreadas na disciplina e na
hierarquia, que constituem a essência desse Direito. Todavia, Judiciária Militar Estadual
submete seus atos aos princípios gerais do Direito. Pode e deve ser submetida ao
controle do Poder Judicial, do qual a ninguém é dado furtar-se do Estado Democrático
de Direito.
De maneira bastante singela são aplicadas as garantias constitucionais nos
procedimentos de Polícia Judiciária Militar Estadual em Santa Catarina, ainda que em
passos pequenos. Temos muito que evoluir na área em estudo, todavia, como
observamos quando relacionado alguns procedimentos de Polícia Judiciária Militar com
as Garantias Constitucionais e Tratados Internacionais, evidencia certa proteção
normativa ao militar investigado ou indiciado, sob pena de ser o ato revisto pelo Poder
Judiciário.
O Militar envolvido nestes procedimentos, possuem direitos e garantias
inerentes a qualquer Ser Humano deste Estado Democrático. Direito regido por
convenções internacionais que nosso País faz parte, como o Pacto de São José da Costa
Rica. Assim, evoluímos com a recepção dos atos de Polícia Judiciária Militar na
Constituição Federal de 1988, com entendimento de que os atos devem possui
fundamentos e observância de princípios e garantias constitucionais e atualizar os
Regulamentos Disciplinares deixando mais próximo a realidade normativa que vivemos,
sem quebra da Hierarquia e Disciplina.