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TEORIA DA CONSTITUIÇÃO

A TEORIA DA Constituição pertence indagar sobre as possibilidades e os limites da força


normativa da Constituição. Cumpre-lhe discutir os problemas constitucionais sob um prisma
teorético. A ela incube descrever, explicar e seriar os fundamentos ideais e materiais da
Constituição, assim como compreender as suas condições histórico-culturais de
desenvolvimento e de otimização, pondo especialmente em relevo as complexas relações
entre as constituições (escrita) e a realidade constitucional. Esta última tarefa é considerada
como um dos elementos caracterizadores da Teoria Constitucional.

Sendo hoje indiscutível o significado central da pré- compreensão na obtenção e “seleção” dos
resultados colhidos mediante a interpretação-concretização das normas constitucionais, à
Teoria da Constituição incube identificar e ordenar sistematicamente as teorias, as tendências
e os (pre-)juízos que tendem a determinar, consciente ou inconscientemente, os resultados de
aplicação do Direito Constitucional. Pág: 15

O Direito Constitucional Comparado estuda e descreve, numa perspectiva de confronto, os


fenômenos constitucionais. Nos nossos dias, a comparação jurídica deverá ser de longo
alcance, ou seja, deverá incluir não apenas a características gerais de um sistema
constitucional, como também a análise de elementos concretos, tais como a doutrina e a
jurisprudência constitucionais. Pág: 16

A Constituição Portuguesa de 1976, na melhor tradição do constitucionalismo liberal, não só


recolhe os conteúdos materiais próprios dos primeiros textos constitucionais (organização do
Estado e enunciação de direitos), adaptados naturalmente a uma democracia realizada e
social, como reflete em várias das suas normas uma especial posição e força normativas de
valorações próprias do hodierno “Estado Constitucional”. Pág: 21

Ao definirmos o Estado como comunidade política, estamos já a adotar uma conceção de


Estado que, acentuando o seu substrato sociológico, o define como comunidade de pessoas,
de homens concretos. Pág: 28

Era comum ao pensamento medieval a construção contratualista do poder pela


admissibilidade de dois contratos: pelo pactum unionis societatis os homens isolados em
estado de natureza, constituem-se em sociedade; pelo pactum subjectionis, a sociedade, antes
constituída, transferida os seus poderes para o soberano. Pág: 29/30

A Revolução Francesa de 1789 marca o triunfo, no espaço continental europeu, de uma nova
racionalidade, e abre caminho à possibilidade de concretização de uma nova ordenação social
e à teorização de um novo modelo de Estado- o modelo liberal.

A racionalidade e a perfeição do sistema repousam agora no individuo livre, isolado e igual. O


equilíbrio da sociedade passa agora pela expressão e livre desenvolvimento das
potencialidades do indivíduo em perfeita igualdade natural. O espaço de realização ética do
indivíduo depende da afirmação da sua racionalidade autossuficiente. Pág: 32

A Constituição liberal estrutura-se no sentimento da liberdade burguesa, para quem a


liberdade pessoal, a propriedade privada, a liberdade contratual e a liberdade de comércio e
indústria eram áreas de sociedade, ou seja, dos particulares. Aí, o Estado aparece estritamente
controlado, como mero servidor da sociedade, submetendo-se a um sistema acabado de
normas jurídicas, ou simplesmente identificado com esse sistema de normas, não sendo então
mais que norma e processo. Isto, de resto, estava de acordo com a contenção de finalidades
que corresponde ao ideário liberal.

Para garantir esse posicionamento do Estado, bastava exigir a intervenção da Representação


Popular nas matérias “externas” ao Estado, matérias que cláusula da “liberdade- propriedade”
veio a significar. Antes da época constitucional, todo o poder soberano estava no Monarca. As
exigências constitucionais não significaram, porém, dissolver totalmente o Monarca e seu
Governo. O objetivo era simplesmente uma limitação do poder do Monarca. Essa era a função
o Parlamento, cabendo à Constituição determinar as matérias a este reservadas. Pág: 36

A Teoria do Estado de Direito é, assim, produtora e normativa, mas vinculada ao material


cultural, o que não encontra eco num tratamento logicista do Direito. “Contra toda a espécie
de racionalismo, cujo propósito é explicar a realidade pela razão, deve sustentar-se de que a
realidade social é uma unidade dialética de natureza e cultura”. “A Teoria do Estado e da
Sociedade hão de ocupar-se do homem, enquanto este efetiva a realidade social e estatal. Há,
pois, que recordar que o homem que interessa à sociedade e ao Estado é o que se manifesta
em sua vida como objetivamente efetivo no social e não como aparece a si mesmo ou outros
homens”.

A unidade estatal passa, para HELLER, pela conexão total das condições naturais e culturais da
vida social, sendo que a função da Teoria do Estado consiste em analisar o Estado como um
fenômeno substantivo dentro do conjunto dessas condições. Pág: 38/39

A volta de século, a que atrás nos referimos, significou essencialmente a miscigenação dos
problemas do Estado e da Sociedade. O Estado passou ser visualizado em conexão com as
vicissitudes da sua matriz social, ou seja, com o devir das estruturas sociais e dos valores e dos
fins a ela imanentes. Superado, com efeito, o divórcio entre a Sociedade e o Estado, a partir da
refração do poder numa sociedade plural politicamente ativa, não mais o Estado pode ser
encarado como vontade lógica superpartes, encarnação do ideal histórico ou entidade de
legitimação pressuposta. Pelo contrário, o Estado passa a ser entendido como resultante de
precipitado da vontade dos grupos, mediadores da vontade dos indivíduos que existem na
sociedade. Pág: 40

Como bem acentua VIEIRA DE ANDRADE (Sumários, cit.), o Estado é, enquanto comunidade de
pessoas, uma comunidade organizada segundo um princípio de unidade. Essa unidade não
corresponde, porém, a lago de hipostasiado, a um todo homogêneo baseado numa
uniformidade de interesses e numa unanimidade de opiniões. Pressupõe, poruq se refere a
uma comunidade de homens concretos, a multiplicidade dos interesses e a diferença na
maneira de ver as coisas, o dissenso, o conflito e a oposição. E pressupõe que essa
multiplicidade e diferença se manifestem no campo da atuação política, ou seja, num sistema
aberto capaz de integrar politicamente tal pluralismo. Pág: 41

O Estado é apenas uma dimensão da sociedade, a sua dimensão política. Utilizando aqui uma
linguagem sistémica, o Estado é o sistema político da sociedade a que pertence assumir a alta
complexidade das sociedades de hoje e traduzi-la e regras que, legítima e vinculativamente,
hão de construir a ordem política e jurídica da sociedade. Pág: 42

Esse sentido moderno de Constituição exprime-se na ideia da consagração, por lei, de uma
ordenação sistemática e racional de toda a vida política e manifesta-se historicamente na
conjugação das conceções individualísticas e voluntaristas protestantes com as crenças
racionalistas do humanismo. O ideal moderno de constituição- liga-se, na verdade, a
documentos escritos provenientes de assembleias representativas que se estruturam de forma
segura e duradoura o exercício do poder político, de modo a preservar a liberdade do
indivíduo. Pág: 46

O movimento constitucional trouxe especificamente de novo a exigência da certeza jurídica,


com intuitos garantísticos da individualidade, que pretensamente só um texto escrito poderia
assegurar. Pág: 47

A destruição das bases da sociedade liberal e o nascimento de uma nova sociedade, a


sociedade técnica de massas, heterogênea e conflitual, vem, porém, alterar o entendimento
do Estado e da Constituição. Pág: 48

A Constituição já não se reduz agora um estatuto de organização e limitação do poder e,


apesar de não perder essa intenção, pretende ser uma ordenação fundamental congregadora
da vida da comunidade, acompanhando o sentido integrador que se liga agora ao ser do
Estado.

Assim, ao lado das declarações de direitos e das normas organizatórias, surgem os direitos à
ação estadual e os princípios retores da vida social. Este conjunto de normas constitucionais
afasta decisivamente aquele entendimento ideal de Constituição que se revia num mecanismo
racional de organização e limitação do poder, para a tornar, mais do que isso, num sistema de
valores político- jurídicos aceites na comunidade. Daí que esse sistema de valores não seja
nem um dado fixo, nem uma ordem imposta, antes seja algo construído a partir de forças
políticas diversas ou opostas que exprimem a pluralidade social e pontos de vista sobre o bem
comum. Pág: 49

Mas, a ordem política também não pode ser agora a simples resultante das relações de força
estabelecidas entre os grupos sociais. A ordenação da comunidade política não pode ser o
resultado de uma afirmação de força. Daí que os valores a que fizemos referência a propósito
do processo de Constituição do Estado não possam deixar de ser valores jurídicos.

Valores jurídicos porque e na medida em que o Direito é a forma instrumental pela qual se
regula a organização das relações sociais e o processo da integração política- são os princípios
e os preceitos que se reclamam da positividade jurídica que garantem a ordenação dos
comportamentos humanos e a realização das tarefas estaduais numa perspectiva de unidade
(Estado de Direito formal); valores jurídicos, ainda, porque a vinculação da comunidade
política ao Direito se justifica pela necessidade de fundamentar o carácter obrigatório das
decisões políticas em considerações de retitude e justiça (Estado de Direito material).

O princípio da constitucionalidade, expressando, precisamente, a supremacia material e formal


das normas constitucionais em face de outras normas jurídicas, garante a unidade, ao nível do
fundamental, da comunidade política. Pág: 51

A ideia hoje comum de Constituição está associada a um texto escrito que, em virtude de um
especial processo de elaboração, contém as disposições que gozam de uma especial
superioridade normativa. Pág: 54

Todavia, esta associação não representa algo de necessário. O constitucionalismo britânico


continua ainda hoje como a viva ilustração de que os quadros fundamentais da vida política de
um país podem ser regulados por outras formas: por usos, costumes e convicções forjados na
prática e observados ao longo dos tempos. Trata-se, reconheça-se, de uma visão alternativa do
ser do Direito, porquanto, em grande medida, o Direito deve aí a sua normatividade
constitutiva à vivencia consuetudinária (jus commune- common law) e explicita-se na doutrina
e na jurisprudência. Pág: 55

No entanto, não são apenas as diferenças entre o continente europeu e as ilhas britânicas que
relevam teoricamente na distinção entre Constituição escrita e não escrita. Mesmo nos países
em que a Constituição é uma lei constitucional, haverá sempre regras e princípios de cariz
constitucional que não estão expressamente consagrados nas leis constitucionais e toda uma
série de princípios político- jurídicos, não redutíveis a palavras, que formam o ambiente
cultural e suportam a renovação permanente da comunidade política. Por conseguinte, a
existência de uma Constituição escrita não significa a irrelevância do direito constitucional não
escrito, mas unicamente atesta a existência de um documento em que está escrita a
generalidade dos princípios e regras a que se quis, em determinado momento, dar uma
especial forma. Podemos então concluir que a distinção entre Constituição escrita e não
escrita é assim apenas uma distinção formal.

A rigidez constitucional é, porém, uma consequência da opção (decisão) do poder constituinte


de formalizar um conjunto de normas a que atribui uma especial superioridade normativa. Ou
seja, ela pressupõe um poder constituinte formal. Daqui decorre também que a rigidez
constitucional está ligada à forma escrita da Constituição, já que não é possível distinguir
formalmente o Direito Constitucional do Direito Ordinário a não ser em referência a textos
escritos. Assim se compreende que as constituições de base consuetudinária sejam
constituições flexíveis. Pág: 56

É que o carácter de Constituição rígida não assegura a permanência do texto para além dos
entraves (limites) formais que coloca à revisão. Também não assegura, por outro lado, a
durabilidade (material) da constituição. Na verdade, se a rigidez (formal) de um texto não
obsta a que ele possa ser alterado frequentemente, também será possível que uma
Constituição flexível possa pendurar no tempo sem alterações significativas de conteúdo, se
ele exprimir e estiver em consonância real com os valores culturais e políticos que
fundamentam a vida comunitária (veja-se o caso da Constituição britânica). Este é, porém, um
problema de “rigidez material" diferente do conceito(formal) de Constituição rígida. Pág:
57/58

A opção por um texto rígido, no sentido assinalado, é hoje justificada pela necessidade de se
garantir a identidade da Constituição sem impedir o desenvolvimento constitucional. Rigidez é
sinônimo de garantia contra mudanças constantes, frequentes e imprevistas ao sabor das
maiorias legislativas transitórias. A rigidez não pode ser um entrave ao desenvolvimento
constitucional, pois a Constituição deve poder ser revista sempre que a sua capacidade
reflexiva para captar a realidade constitucional se mostre insuficiente. Pág: 58

Numa primeira aproximação conceitual, podemos definir a Constituição em sentido material,


ou substancial, como o conjunto de princípios e preceitos jurídicos que são por si os
fundamentos da comunidade política. Pág: 58

Poe Constituição em sentido formal, entende-se o conjunto de disposições jurídicas a que é a


atribuída uma superioridade formal em relação às leis comuns. Daí que tenda hoje a
identificar-se o conceito da Constituição formal com o de Constituição escrita. Convertida em
texto, a Constituição ganha um sentido instrumental de garantia da ideia moderna de
Constituição: ordenação sistemática e racional da comunidade através de um documento
escrito dirigido à salvaguarda dos valores da liberdade, da estabilidade, da segurança, da
publicidade e da previsibilidade.
Por aqui passará uma primeira distinção, de cariz lógico entre Constituição material e
Constituição formal e que radicará, em último termo, no problema da extensão ou âmbito da
matéria constitucional. Pressupõe-se, na verdade, a possibilidade de identificar um conjunto
de matérias com dignidade constitucional intrínseca, que pode não coincidir com o âmbito
volitivo de positivação do poder constituinte, o qual pode pecar por defeito ou por acesso.

Pecaria por excesso quando no documento constitucional viessem a ser formalizadas


disposições sem dignidade constitucional, que melhor seriam qualificadas como direito
comum, ou seja, deveriam ser deixadas a opções legislativas ordinárias. Daqui surgiria o
conceito de normas só formalmente constitucionais ou seja, normas formalmente
constitucionais, mas materialmente não constitucionais.

Pecaria por defeito quando ficassem fora do documento constitucional normas e princípios
relativos a aspetos essenciais da comunidade política, que, por exemplo, estão contidos em
leis ordinárias. Estaríamos perante o conceito de normas materialmente constitucionais, mas
formalmente não constitucionais. Pág: 59

Já em termos de Teoria da Constituição, esta distinção assume relevância, uma vez que, apesar
do âmbito constitucional ser uma variável em princípio indeterminada, não deve admitir-se
que o legislador constituinte possa incluir legitimamente todas e quaisquer matérias no texto
constitucional. Levada ao extremo, essa liberdade do legislador constituinte poderia
transformar os diplomas constitucionais em programas de governo, ou mesmo em
configurações totalitárias do Estado, destruindo por aí, o deixando sem sentido, o pluralismo e
alternância políticas. Impor-se à assim um princípio de essencialidade ou autocontenção do
poder constituinte, até para que a Constituição consiga ser verdadeiramente uma constituição
normativa, Esta última exigência melhor se compreenderá se o sentido de Constituição
material se desligar de um critério de mera extensão do texto, para se fixar num critério de
conteúdo das normas constitucionais. Pág: 60

As constituições oitocentistas são, por definição constituições estatutárias porque recusam a


intervenção e direção da sociedade pelo Estado. Já as constituições socialistas devem
configurar-se como constituições programáticas, pois, para além de estabelecerem as
conquistas sociais já alcançadas (constituição- balanço), enunciam regras ou princípios de
intervenção estatal (constituição- programa). Pág: 61

Com efeito, as constituições atuais, no âmbito político- cultural em que nos inserimos, são um
composto de normas estatutárias e de normas- programas. Pág: 61

Há constituições neutras e que uma constituição de índole liberal pode ser intrinsecamente
tão ideológica, ou mais, que uma constituição socialista. O que, de facto, separa uma da outra
são fundamentos valorativos em que se assentam.

A constituição simples não consagra princípios que conflituam entre si, havendo unidade
valorativa ( ou se acolhe à liberdade, ou se acolhe à igualdade). Este modelo de constituição
opta por uma escolha valorativa unilateral, não precisando de conciliar valores diferentes, na
medida em que opta por apenas um deles. A constituição liberal pretende, como bem
absoluto, defender a liberdade dos cidadãos, apostando num modelo social baseado na
liberdade. De igual modo, as constituições totalitárias não procuram conciliar igualdade com
liberdade, optando pela igualdade. Ambas são exemplos de constituições simples.
Por seu turno, as constituições compromissórias necessitam de fazer uma harmonização de
princípios, em virtude da pluralidade e complexidade dos princípios que consagram. Torna-se,
assim necessário proceder a compromisso valorativos (v. g., conciliar a medida da liberdade e
da igualdade e, também, da solidariedade). Verifica-se, portanto, uma ordem valorativa plural
e complexa, porque pretende harmonizar diferentes valores e resolver questões ou problemas
na sua real complexidade.

Terá sido KARL LOWENSTEIN, em momento particularmente crítico do constitucionalismo


europeu, olhado à distância de um oceano, que cuidou de saber da efetividade da
Constituição, ou seja, da relação que se estabelece de facto entre o texto constitucional e a
realidade constitucional. Nesta resposta acerco do ser da Constituição (conceção ontológica),
encontrava LOWENSTEIN Constituições (ou melhor, existências constitucionais) que designou
de nominais, semânticas e normativas. Pág: 62

Na Constituição normativa, a Constituição está em vigor, é operante, regulando juridicamente


a comunidade política.

Por seu turno, a Constituição nominal consiste numa Constituição formal que não está a ser
respeitada, já não se adaptando, ou nunca se tendo adaptado, à realidade constitucional à
qual se dirige, havendo um desfasamento entre a realidade constitucional e o texto
constitucional.

Finalmente, na categoria de Constituição semântica têm-se aquelas constituições que são o


retrato do momento histórico- cultural e político em que são elaboradas, tendo o intuito de
eternizar esse momento. Apenas servem para estabilizar a intervenção dos dominadores de
facto na comunidade; e as forças no poder tentam perpetuar esse texto constitucional. De
facto, estas constituições possuem um texto demasiadamente preso a um contexto histórico e
cultural muito especifico, sem que se verifique capacidade para se adaptar à evolução da
realidade constitucional, e no qual os direitos são funcionalizados e subordinados às
conjunturas políticas e ideológicas. Pág: 63

A Constituição oitocentista foi, na verdade, uma Constituição material e ideal. A absolutização


do valor da liberdade individual implicou a criação de um Estado abstencionista, porquanto ao
Direito apenas competia garantir o livre jogo das forças sociais. Pág: 65

E assim, a Constituição, que formalizava a relação de domínio conseguida pelo modelo liberal,
vai pretender eternizar-se na força supralegal. Só que o texto põe e a realidade dispõe.
Começa, na verdade, a desenhar-se uma separação entre a Constituição (texto) e a realidade
constitucional, na medida em que o texto constitucional é estático e nõ acompanha a evolução
da sociedade.

Vai, assim, abrir-se progressivamente um fosso entre a ideia de Constituição oitocentista


(material- formal) e a realidade e valores fundamentais da comunidade política a que esta se
dirige (Constituição material). Pág: 66

Por contraposição a um texto neutro e formal, surge a ideia de Constituição material. O


preenchimento deste conceito vai expressar-se, todavia, em teorias e conceções diferenciadas
que marcaram a história da Teoria Constitucional.

FERDINAND LASSALE parte, com efeito, em reação ao formalismo em que convertera o ideal
de Constituição, de uma conceção sociológica, distinguindo entre a Constituição escrita e a
constituição real.
A Constituição material é, desta feita, a Constituição real.

MORTATI, por seu turno, parte de uma perspetiva institucionalista. Para este Autor, o Estado
não equivale à soma de relações espontaneamente determinadas entre os que pertencem à
sociedade, antes consiste numa consciente vontade de ordem. Assim, a sociedade ordena-se
em torno de forças coletivas (designadamente, os partidos políticos) com os seus fins de
conquista do poder para impor a sua ordem. Estes fins políticos, também designados como
“princípios diretores de ação”, consubstanciam a visão do bem comum assumida e imposta
efetivamente, com relativa estabilidade, por um conjunto de forças coletivas (os partidos
políticos) dominantes. No seu conjunto, formam a Constituição (material) do Estado.

A teorias integracionistas de R. SMEND e H. HELLER, atrás referidas como contraponto ao


logicismo de P. LABAND e G. JELLINK, acentuaram os dados sociológicos e culturais ao nível das
fontes do Direito, É de lembrar aqui a célebe frase de SMEND: “a constituição é um plebiscito
quotidianamente renovado”.

Refira-se ainda as teorias espiritualistas, ou da ordem de valores, que evidenciam a especial


reflexão sobre a base cultural do Estado, ocorrida no após Segunda Guerra Mundial, e
aparecem estreitamente ligadas à defesa dos direitos fundamentais, tais como a dignidade da
pessoa humana e o postulado democrático. Em consonância, a Constituição material consiste
num conjunto de valores transcendentes, pré- constitucionais e suprapositivos, que conferem
validade de sentido às normas constitucionais (RADBRUCH). Estes valores são determinantes
da cultura da comunidade e são hierarquizados numa ordem de valores subtraída à história,
ou seja, num sistema cristalizado de valores que são anteriores e superiores à Constituição e
que esta não pode senão positivar, dando-lhes uma formalização técnico- jurídica. Pág: 68

As conceções realistas e espiritualistas, levam, com efeito, ao esvaziamento e à


imprestabilidade prática do conceito de Constituição, porque esta é agora reduzida, ora a uma
mera folha de papel, ora a um tratado de moral (um conjunto de valores espirituais), que, de
igual modo, acabam por entregar o futuro da comunidade política ao jogo das forças
dominantes, culminando na perda de normatividade do texto constitucional.

É neste contexto, e após a Europa ter bebido o fel de vários idealismos, que surge uma nova
Teoria da Constituição e a generalidade da doutrina adere à tese da força normativa da
Constituição de acordo com a qual cabe a esta uma tarefa histórica de conformação (material)
da comunidade política concreta. Ponto será o texto constitucional conheça os seus limites.
Pág: 69.

O texto constitucional, consagrando opções-valores fundamentais de uma comunidade


política, deve pois ter suficiente abertura, porquanto só assim encontrará forma de refletir a
realidade constitucional e, ao mesmo tempo, influenciá-la, acompanhando a evolução da
própria sociedade.

A solução, saída dos escombros das teorias e dos muros da cidade, impôs-se: se não te sentido
hoje negar-se a normatividade do texto, também não tem sentido reduzir a Constituição ao
texto constitucional. Texto que contém agora normas de ação política, social, econômica, e ao
qual se pede os limites dentro dos quais é permitida a intervenção do Estado e assegurada a
liberdade dos cidadãos. A contraposição entre Constituição formal e Constituição material é
por fim ultrapassada, porquanto os valores fundamentais e os factos decisivos na vida da
comunidade têm de caber no texto constitucional e, com base neles, conformar essa mesma
comunidade política.
VIEIRA DE ANDRADE diz-nos que a Constituição é sempre material, dado que mais não é que
uma unidade de sentido cultural. Não é sempre um mero texto, nem se limita simplesmente a
traduzir a realidade ou a cultura, antes é o conjunto ativo desses três elementos. Esta
conceção de tridimensionalidade constitucional engloba os valores (elementos axiológicos) e a
realidade (elementos políticos e sociológicos) que caracterizam o ambiente em que o texto vai
ser interpretado e aplicado.

O que o texto constitucional tem de consagrar é limites a essa intervenção, quando se coloque
em causa valores fundamentais dessa comunidade. Isto fez-se, por exemplo, na subida de
alçada dos direitos fundamentais (da legalidade para a constitucionalidade). Pág: 71

Há uma ordem de valores, mas esta é desde logo, pluralista, devendo recusar-se o apelo
redutor a um certo e determinado valor, em detrimento de outros. As sociedades atuais são
complexas também ao nível dos princípios e preceitos que consagram.

Criticam-se, assim, as teorias espiritualistas (G. RADBRUCH) e as teorias meramente


garantísticas (E. FORSTHOFF), as quais, ao fixar-se numa única tarefa de Constituição, acabam
por fornecer-lhe um valor e tarefa unilateral e reducionista.

As primeiras não fazem a ligação com a realidade constitucional, pois não atentam no
relacionamento entre as opções fundamentais e a própria comunidade. Com efeito, as
comunidades políticas são muito heterogêneas, as opções fundamentais são diferentes
(podem mesmo não estar no mesmo plano axiológico) e muitas vezes contraditórias. Não
podem, todavia, estar hierarquizadas, precisamente por serem fundamentais. Quanto às teses
positivistas, ou excessivamente revalorizadoras do texto, esquecem que este é o produto da
laboração humana, logo é imperfeito. Na verdade, nem sempre sabemos, ou podemos,
traduzir o nosso pensamento em preceitos. Para além disso, o texto constitucional é, muitas
vezes e conscientemente, ambíguo, pouco claro ou insuficiente, não podendo por conseguinte,
ser a Constituição. Por exemplo, se devem estar aí espelhadas as opções fundamentais, não
pode dizer-se o mesmo quanto às opções políticas (ideológicas), porque os valores de natureza
político- partidária não recolhem a adesão de toda ou da generalidade da comunidade. Assim,
o texto não deve conter opções ideológico- políticas fechadas. O texto deve ser visto como o
ponto de partida e fornecer o limite das soluções constitucionais, mas pode haver Constituição
para além dele, pois a vivencia comunitária pode demonstrar que a comunidade política evolui
mais depressa do que o texto, impondo “mutuações de sentido” ao texto. Por outro lado os
princípios fundamentais acabam por ter validade autônoma, pois podemos encontrar neles
dimensões da Constituição que vão para além do texto. É aqui que entra a “comunidade dos
juristas” e a ação dos tribunais. Não é por acaso que os Tribunais Constitucionais se
generalizam na Europa no após guerra, ou no após guerras. Pág: 72/73

Uma maior ou menor carga ideológica torna a Constituição menos ou mais aberta à evolução
das ideias, das forças políticas e dos interesses sociais. Com efeito, a afirmação da força
normativa da Constituição não é melhor garantida se esta ignorar a realidade. Pelo contrário, a
Constituição só será eficaz se conseguir integrar a vida política concreta, não podendo por isso
enclausurar-se numa linguagem ideológica fechada. Pág: 74

JOHN LOCKE, a que se deve a distinção fundadora do constitucionalismo moderno entre poder
constituinte e poder ordinário.

Segundo EMMANUEL SIEYÉS, é também um poder autônomo, ou seja, livre, pois não depende
de nenhum outro poder.
Por último, a característica mais subtil: o poder constituinte é inesgotável, pois não desaparece
pela nação de uma Constituição, antes continua permanentemente “operacional”,
potencialmente ativo, acima da Constituição.

JOHN LOCKE, por seu turno, já um século antes, na sua obra mais importante (Os dois tratados
de governo, 1680- 1683), em oposição a HOBBES, havia sugerido a distinção entre o poder
constituinte do povo (o poder do povo em alcançar uma nova forma de governo) e o poder
ordinário do parlamento e do governo, encarregues da feitura e aplicação das leis. São
característicos deste modus operandi do poder constituinte o carácter institucional e
consuetudinário da revelação do Direito em que o poder inicial detido pela common- wealth
aparecia já limitado pelos direitos individuais, a property; ou seja, os indivíduos têm um
conjunto de direitos naturais (property) que antecede ou preexiste à formação de qualquer
governo. Pág: 84/85.

Plasmou-se, assim, uma filosofia garantista da Constituição, por oposição à ideia de nela
projetar o futuro, encarando-a como uma forma de garantir direitos e limitar poderes. O poder
constituinte revelou-se como soberania funcional para redefinir a higher law, the fundamental
and Paramount law of the Nation e para estabelecer as regras do jogo entre poderes
constituídos e sociedade. Pág: 85

Na história do constitucionalismo, emergiram três candidatos (GOMES CANOTILHO): Nação,


Estado, Povo (respetivamente, soberania nacional, soberania do Estado e soberania popular).

Quando surgiu, o poder constituinte ligou-se à nação, tal como era visível nas nossas
Constituições de 1822, 1826, 1838, 1911 e, por arrasto, também na Constituição de 1933”. A
fórmula que estas Constituições consagravam não deixava margem para dúvidas: “a soberania
reside em a Nação”. Foi este conceito que acolheu todo o ideário do liberalismo, de tal modo
que a nação se veio a converter num conceito normativo, restringindo o poder a uma grandeza
ideal capaz de converter a vontade nacional em “volonté généralé”.

A Nação somente se deixaria representar por homens livres e instruídos, possidentes (sufrágio
censitário) e esclarecidos (sufrágio capacitário). Pág: 87

As decisões constitucionais serão democráticas, caso a generalidade dos cidadãos exerça o


poder constituinte. O poder do povo vai expressar-se, direta ou indiretamente, na forma de
exercício ou de revelação do poder constituinte. O modo como o povo vai intervir na feitura e
aprovação da Constituição vai qualificar o procedimento constituinte. Pág: 90

JORGE MIRANDA (Manual de Direito Constitucional, Tomo, II) fala a este propósito de limites
imanentes e limites heterônomos, sendo que os primeiros expressam a realidade política,
social e cultural da comunidade que o poder regula e os segundos revelam os
condicionamentos externos dessa mesma comunidade. Pág: 92

Dependendo do processo consagrado pelo poder constituinte como forma de alterar o texto
constitucional, assim se manifestará o grau de rigidez constitucional. O carácter de
Constituição rígida depende, como vimos, da existência de uma diferença formal entre normas
ordinárias e normas constitucionais; ou seja, existem processos autônomos e diferenciados de
criação ou alteração das normas constitucionais e das normas ordinárias que estabelecem
entre elas uma diferenciação formal. Pág: 94

Representantes da posição que reconhece toda a força jurídica aos limites materiais expressos,
GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA acentuam a natureza diferente do poder constituinte
originário e do poder constituinte derivado: ao primeiro compete criar a Constituição; ao
segundo cabe alterá-la nos limites impostos pelo primeiro. Ou seja, a função do poder de
revisão não é a de elaborar uma nova Constituição, mas antes fazer o inverso, isto é, guardá-la
e defendê-la.

Por seu turno, para ISABEL MAGALHÃES, entre outros, não existe qualquer diferença entre o
poder constituinte e o poder de revisão, na medida em que ambos configuram expressão da
soberania do Estado e são ambos exercidos por representantes eleitos do povo. O poder
constituinte, de certo modo, não será superior ao poder constituinte que se manifesta na
revisão, em momento posterior. Deverá, pois, aplicar-se a regra geral da revogabilidade das
normas anteriores pelas normas subsequentes.

De acordo com uma terceira tese, os limites materiais expressos terão valor declarativo, ou
seja, valerão se se revelarem essenciais à identidade da Constituição e não pelo facto de
estarem expressos num determinado artigo da Constituição. BARBOS ADE MELO, CARDOSO DA
COSTA, VIEIRA DE ANDRADE, em plena “querela constitucional”, defenderão esta posição,
abrindo caminho à evolução interpretativa do então artigo 290 º da CRP. A tese da dupla
revisão, defendida desde muito cedo por JORGE MIRANDA, também relativiza os
limites na medida em que permitiria a alteração das matérias formalizadas como
limites, se anteriormente se removessem os limites. Ou seja, os limites são suscetíveis
de remoção através de dupla revisão ou, em rigor, através de um duplo processo de
revisão. Pág: 98
Existe, assim, uma primeira distinção a fazer. Há limites materiais implícitos e limites
materiais expressos: os primeiros retiram-se da importância que as matérias têm no
texto constitucional (e na realidade e cultura constitucionais, dado que, para nós, o
texto não é tudo); os segundos estão formalizados, catalogados, no próprio texto.
Todas as constituições têm as suas “cláusulas pétreas”, sem as quais deixam de ser
(elas); a generalidade das constituições escritas articula-as expressamente no texto
constitucional. Pág: 99
JORGE MIRNADA, distingue três categoria de princípios. Princípios axiológicos
transcendentes, que funcionam como limites transcendentes ao poder constituinte:
dignidade de pessoa humana; igualdade; Estado de Direito Democrático. Princípios
político- constitucionais, que funcionam como limites imanentes o poder constituinte e
ainda como limites à revisão constitucional. São “princípios diretamente constitutivos
da particular forma de Estado instituída”, refletindo as grandes opções e princípios de
cada regime. Por exemplo, no âmbito da nossa Constituição, o princípio republicano, o
princípio democrático. Princípios instrumentais (como, por exemplo, in dubio pro reo,
nulla pena sine lege).
GOMES CANOTILHO, por seu turno, identifica também três categorias de princípios.
Princípios jurídicos fundamentais, que aceita na seguinte enunciação: são “princípios
historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica
que encontram uma receção expressa ou implícita no texto constitucional”; pertencem
à ordem jurídica positiva e são um importante fundamento para a interpretação,
integração, conhecimento e aplicação do Direito positivo. Princípios políticos
constitucionalmente conformadores: princípios constitucionais que explicitam as
valorações políticas fundamentais do legislador constituinte. Consistem em opções
políticas nucleares, contendo o ideário inspirador da Constituição (são “o cerne político
de uma constituição política”). Princípios constitucionais impositivas, também
designados como princípios- diretivas fundamentais, ou princípios definadores dos fins
do Estado: consistem em todos os princípios que impõem aos órgãos do Estado,
sobretudo ao legislador, a realização de fins e execução de tarefas. Estamos, desta
feita, perante princípios dinâmicos, prospectivamente orientados e que traçam para o
legislador as linhas diretrizes da sua atividade política e legislativa. A título
exemplificativo, podemos indicar o princípio da correção das desigualdades na
distribuição da riqueza e do desenvolvimento. Princípios –garanti: são princípios que
visam instituir diretamente uma garantia dos cidadãos. Possuem a densidade de um
autêntico preceito e força determinante positiva ou negativa, vinculando
estreitamente o legislador na sua aplicação, v.g., os princípios nullum crimen sine lege,
nulla poena sina lege, e ne bis in idem. Pág:113

A relevância constitucional do costume


Quanto ao costume, este não se afigura como uma fonte direta e imediata do Direito
Constitucional, mas não se elimina a possibilidade de o costume, em certas
circunstâncias, ser fonte de Direito. Por nós, admitimos a existência de um costume
secundum legem (constitutionem) e de um costume praeter legem (constitutionem),
mas, neste caso, a relevância do costume reduz-se a elementos a ter em conta na
interpretação e integração do texto constitucional. Mesmo aqui poderia colocar-se a
questão de o costume valer auto-nomamente e desligado da norma. O problema é
conceptualmente aliciante, mas ocioso em termos jurídicos.
O verdadeiro problema estaria no costume contra constitutionem. Uanto a nós, não
será admissível esse costume contra legem scriptam. É este o entendimento de
GOMES CANOTILHO, tendo aqui JORGE MIRANDA uma posição mais cautelosa. Mais
uma vez, numa lógica de tridimensionalidade constitucional, entendemos que o
costume só ultrapassará o texto constitucional- como de facto já ultrapassou no
passado- se o texto não tiver flexibilidade (abertura) e previsão de momentos de
revisão, que quebrem o estaticismo próprio de uma Constituição rígida. Pág: 120
É de resto, nessa sinonia que GOMES CANOTILHO afirma: “O problema das normas
constitucionais inconstitucionais é levantado por quem conhece um direito vinculativo
do próprio legislador constituinte. É perfeitamente admissível, sob o ponto de vista
teórico, a existência de contradições transcendentes, ou seja, contradições entre o
direito constitucional positivo e os ´valores`, ´directrizes` ou ´critérios` que servem para
a modelação do direito positivo (direito natural, direito justo, ideia de direito,
etc.)”Com base porém, na rejeição da ideia de “unidade valorativa” ou de “plenitude
lógica do ordenamento constitucional” e na adesão a uma “unidade normativa”.
GOMES CANOTILHO rejeita, no plano interno da Constituição, quer a tese das
antinomias normativas quer a tese das normas constitucionais inconstitucionais. Pág:
146
“Quanto a nós- diz JORGE MIRANDA- perfilhamos a existência de uma ´axiologia´
transpositiva que não está na disponibilidade do positivo constitucional ou de que não
é titular sem limites o poder constituinte´. Como dissemos, há limites transcendentes
que correspondem a imperativos do Direito natural, tal como, em cada época e em
cada lugar, este se refrage na vida social”. A partir daqui poderia supor-se a adesão à
possibilidade de normas constitucionais escritas serem inconstitucionais e, portanto,
inválidas, se violassem grosseiramente aqueles “imperativos de Direito natural”, ou
seja, o reconhecimento teórico da possibilidade de “normas constitucionais
inconstitucionais”, no confronto Constituição escrita/ Direito supralegal. Pág: 147
Do que fomos dizendo ao analisar a doutrina e a jurisprudência alemãs e a doutrina
portuguesa, decorre já a nossa posição quanto à possibilidade de “normas
constitucionais inconstitucionais”. Partindo de uma compreensão jurídica que
reconhece um nomos de reserva do Direito, autônomo do Direito positivo, é
irrecusável a aceitação da possibilidade teórica de normas formalmente
constitucionais, mas materialmente inconstitucionais, se violadoras de princípios
jurídicos fundamentais que dão expressão à heteronomia do Direito. Pág: 157
Também nós entendemos que o texto da Constituição portuguesa atual, ao nível dos
princípios fundamentais, é um “quadro normativo aberto” que confia à “vontade
atual” dos participantes da vida política o dar efetividade aos preceitos materiais da
Constituição, os quais assumem as dimensões essenciais de um Estado Democrático de
Direito. Pág: 160
A realidade fáctica e axiológica evolui e com ela evolui o entendimento, o sentido, o
conteúdo das normas.
O tempo não é para nós um elemento ou uma dimensão autônoma na composição da
normatividade constitucional. Este intervém através do evoluir dos factos e dos
valores, ou seja, através das dimensões da realidade constitucional e da cultura
constitucional.
O tempo, na aceção que acima referimos e adotamos, é um componente integrante da
normatividade constitucional, passando por aí a sua relevância na efetivação dos
direitos fundamentais. Pág: 167
Por último, mas não menos importante, existe o princípio da proteção da confiança,
que pode ser visto, simultaneamente, como uma decorrência do tempo e como uma
proteção contra o tempo. Pág: 171

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