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Constitucionalismo Cabo-verdiano

JAIME BRITO / JOANA DA GRAÇA / RICARDO LOPES


CIÊNCIAS DE COMUNICAÇÃO - 2º ANO

Sistemas Políticos e Teoria Constitucional

Docente ALCIDES RAMOS

23 de Janeiro de 2023
Índice

Enquadramento .................................................................................................................................... 3
Referencial teórico ............................................................................................................................... 4
Constitucionalismo.......................................................................................................................... 4
Constituição..................................................................................................................................... 7
História da Constituição de Cabo Verde ............................................................................................ 11
Primeira Constituição ............................................................................................................... 12
Revisões Constitucionais.......................................................................................................... 12
Nova Constituição .................................................................................................................... 13
Revisões da Nova Constituição ................................................................................................ 14
Conclusão........................................................................................................................................... 15
Bibliografia ........................................................................................................................................ 16
Enquadramento

A seguinte pesquisa foi desenvolvida tendo em conta plano curricular da unidade curricular de Sis-
temas políticos e Teoria Constitucional. Trata-se de desenvolver um documento teórico sobre o te-
ma “Constitucionalismo Cabo-verdiano”.

Pretendemos primeiramente, fazer uma revisão bibliográfica do conceito de Constitucionalismo,


procurando sua origem, definição e alguns outros aspetos básicos relacionados ao tema e introduzi-
remos um pouco sobre Constituição. Após termos uma contextualização do que é Constitucionalis-
mo e Constituição, faremos um estudo sobre o tal tema, mas no caso de Cabo Verde.

Para o estudo do tema em Cabo Verde, procuraremos dados históricos de como tem-se funcionado o
poder do Estado em relação aos direitos fundamentais do ser humano. Em outras palavras, de acor-
do com o conceito encontrado na contextualização, enquadraremos o dado conceito no caso de Ca-
bo Verde, e estudaremos as divergências e convergências da estrutura de Cabo Verde em relação ao
dado tema - o Constitucionalismo. Faremos uma breve revisão ao historial da Constituição de Cabo
Verde, a primeira e a segunda Constituição de Cabo Verde e suas revisões.

Ao fim de toda análise teórica faremos uma breve conclusão, apresentando os dados, os conheci-
mentos retidos e a perceção que tivemos ao tema em estudo.

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Noção de Constitucionalismo

Referencial teórico

Ao receber o tema Constitucionalismo ao estudo, procurámos uma definição, baseada apenas no


nosso conhecimento. A primeira perceção, a palavra remete-nos ao conceito de constituição, por ou-
tras palavras, o conjunto de leis legislações de uma ideologia política, que regem o Estado. Entre-
tanto ao procurarmos por uma definição mais teórica e estudada, encontramos uma grande diversi-
dade de conceitos.

Constitucionalismo

O conceito moderno de Constituição refere-se a um documento que contempla, ao menos, a organi-


zação fundamental do Estado e direitos humanos. Já constitucionalismo, segundo José Joaquim Go-
mes Canotilho define como:

"...teoria que ergue o princípio do governo limitado indispen-


sável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da orga-
nização política-social de uma comunidade. Neste sentido, o
constitucionalismo moderno representará uma técnica específi-
ca de limitação do poder com fins garantísticos. O conceito de
constitucionalismo transporta, assim, um claro juízo de valor.
É, no fundo, uma teoria normativa da política, tal como a teoria
da democracia ou a teoria do liberalismo"

Já outros autores, em seus estudos e teses, acabam por definir constitucionalismo de forma diferen-
te, como é o caso de Kildare Gonçalves Carvalho que informa o constitucionalismo de forma jurídi-
ca, como sociológica. Dessa forma:

"...em termos jurídicos, reporta-se a um sistema normativo, en-


feixado na Constituição e que se encontra acima dos detentores
do poder, já sociologicamente, representa um movimento social
que dá sustentação à limitação do poder, inviabilizando que os
governantes possam fazer prevalecer seus interesses e regras na
condução do Estado"

Por sua vez, Pietro de Jesús Alarcón ( ALARCÓN, Pietro de Jesús, 2017) vê o constitucionalismo
como mais que uma categoria filosófica ou um conceito estritamente jurídico. Para ele, o Constitu-
cionalismo é um movimento que traduz uma luta ideológica e politica. Trata-se da teorização e prá-

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Noção de Constitucionalismo

tica em torno à limitação da arbitrariedade estatal como instrumento para a proteção e salvaguarda
dos direitos do ser humano.

Ainda de acordo com a doutrina de André Ramos Tavares sobre o constitucionalismo:

"...embora de grande alcance jurídico, apresente feições socio-


lógicas inegáveis. O aspeto jurídico revela-se pela pregação de
um sistema dotado de um corpo normativo máximo, que se en-
contra acima dos próprios governantes - a Constituição. O as-
peto sociológico está na movimentação social que confere a ba-
se de sustentação dessa limitação de poder, impedindo que os
governantes passem a fazer valer seus próprios interesses e re-
gras na condução do Estado".

Em poucas palavras, o constitucionalismo seria uma técnica de limitação do poder político em cada
sociedade política. Essa técnica precave os cidadãos contra práticas ditatoriais e salvaguarda, inde-
pendentemente da vontade dos governantes, o respeito pela dignidade humana.

O constitucionalismo é uma espécie de articulado jurídico que define as competências de cada ór-
gão de soberania e que estatua os direitos e garantias dos cidadãos. Tal articulado, todavia, nem
sempre tem existido com a mesma forma e força legais e, por vezes, nem sequer existiu.

O surgimento da palavra constitucionalismo decorre das primeiras investigações sobre constituição.


O desenvolvimento dos estudos do constitucionalismo, pelos estudos de suas manifestações doutri-
nárias e experiências institucionais implementadas, mostram o lugar que a constituição ocupa.

O constitucionalismo pode ser demarcado em períodos históricos diferentes, identificando os ele-


mentos institucionais históricos que vieram compor a noção de constitucionalismo em cada desses
períodos.

A palavra constitucionalismo remete aos movimentos de limitação do poder – que tiveram por obje-
tivo superar e prevenir o absolutismo – decorrentes das três grandes Revoluções Liberais: (i) a Re-
volução Gloriosa inglesa, de 1688-1689, quando: (i.a) o Rei Jayme II foge para a França; (i.b) o
Parlamento inglês escolhe novos Rei e Rainha, Guilherme de Orange e Maria; e (i.c) afirma, o Par-
lamento, a sua soberania; (ii) a Revolução Americana, referenciada pela Independência das até en-
tão Treze Colônias inglesas na América, em 4 de julho de 1776; e (iii) a Revolução Francesa, decor-
rente de um conjunto de fatos, como a queda da Bastilha, em 14 de julho de 1789.

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Noção de Constitucionalismo

Mas o marco principal do constitucionalismo, considerado por muitos, é a Declaração Universal dos
Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789. É inestimável a importância da Declara-
ção, sobretudo para o constitucionalismo, é corroborada pelo teor de cada um dos seus dispositivos,
valendo destacar o art. 16: “Toda sociedade em que a garantia dos Direitos não esteja assegurada,
nem a separação dos Poderes determinada, não tem Constituição”.

Seguem alguns exemplos de acontecimentos, para melhor compreensão do movimento constitucio-


nalista em algumas épocas e seus reflexos no mundo jurídico de hoje:

a) O renomado jurista Karl Loewenstein reconheceu demonstrações de constitucionalismo em


tempos antigos, como na organização do povo Hebreu, pautado na conduta dos profetas anciãos,
que tinham como prerrogativa a fiscalização dos atos do poder público;

b) Há que se levar em consideração demonstrações de constitucionalismo na Grécia antiga, na


ação chamada de Graphe Paranomon, que servia para fiscalização dos atos normativos, traduzindo-
se na visão de alguns professores como o antecedente mais remoto do Controle de Constitucionali-
dade;

c) Continuando cronologicamente nosso histórico, na Idade Média, mais especificamente no ano


de 1215, com a outorga da Magna Carta do Rei João I da Inglaterra (conhecido como João sem ter-
ra), surgiu uma série de garantias de direitos ao povo inglês, incluíndo o de rebelião e a defesa de
que um homem livre não podia ser aprisionado, exilado ou morto, a não ser por meio dos processos
legais.

d) Em meados do século XVIII, surgiu a Constituição Norte-americana em 1787 e a Constituição


francesa de 1791, que proporcionaram o nascimento do Constitucionalismo Moderno.

Devido a toda sua história e evolução, o constitucionalismo recebeu nomenclaturas diferentes que o
definem, e cada nomenclatura é dotada de características próprias. As nomenclaturas que o constitu-
cionalismo recebeu são as seguintes:

I. Constitucionalismo Social - o Constitucionalismo Social está previsto na Constituição da Repú-


blica atual, como por exemplo: proteção aos direitos à saúde e à alimentação. A origem desse ti-
po de constitucionalismo é, em primeiro plano, a constituição do México de 1917. Posterior-
mente, podemos ter como modelo também a constituição de Weimar de 1919.

II. Constitucionalismo do futuro/por vir - Essa nomenclatura foi idealizada pelo professor e jurista
argentino José Roberto Dromi, no sentido de que, para ele, as futuras constituições devem ser

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Noção de Constitucionalismo

pautadas por alguns valores, como veracidade e solidariedade. Nesse ínterim, a constituição não
deve/pode fazer promessas irrealizáveis, utópicas, e, ainda, no campo da solidariedade, deve ser
voltada ao auxílio recíproco nacional e internacional.

III. Transconstitucionalismo - O jurista brasileiro Marcelo Neves idealizou esse estilo, tendo defini-
do como uma relação entre o direito interno e o direito internacional, buscando uma melhor tute-
la dos direitos fundamentais. Por exemplo: direito de não produzir provas contra si mesmo (Pac-
to de São José da costa rica, artigo 8°).

IV. Constitucionalismo transnacional - Esse modelo prevê a possibilidade de criação de uma Cons-
tituição para vários países.

V. Constitucionalismo Termidoriano - Nesse caso é defendido que as mudanças constitucionais de-


vem ser mais lentas ou graduais, paulatinas.

O constitucionalismo trouxe inúmeros valores, presentes até a contemporaniedade, objetivando es-


pecialmente a formulação de uma constituição, seja ela escrita (maior parte) ou não escrita (não
compilada em um único documento, como a constituição inglesa), além de uma racionalização do
poder político e a representatividade política. Estes valores, são até hoje, determinantes para a for-
mação de um estado de direito.

Logo entende-se que o constitucionalismo de um determinado país encontra-se traduzido na sua


constituição, que abrange, a forma de governo e de estado, o sistema de governo, distribuição de
competências dos órgãos estatais, direitos e garantias, deveres dos cidadãos, deveres do estado para
com o organismo social, entre outras.

Constituição

A constituição teve a sua origem nas manifestações arbitrárias e limitadoras do constitucionalismo,


manifestações estas impostas, recorrendo ou não, ao uso da força. Vale também mencionar, que qua-
se todas as constituições originaram-se de revoluções, ou então “golpes de estado”.

Uma constituição é um conjunto base de leis, normas e regras de um país ou, até mesmo, de uma
instituição. É a constituição federal que regula e organiza todas as possíveis atuações do Estado pe-
rante sua população, interna e externamente. Enquanto legislação, a constituição é a lei máxima que
apresenta os limites do poder do governo e descreve os deveres e direitos de cada cidadão.

Segundo a Enciclopédia de Moral e Civismo, a constituição se define da seguinte forma:

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Noção de Constitucionalismo

“É a lei fundamental do Estado, na qual se acham expressos, or-


ganicamente e sistematicamente, as bases de sua estrutura, tais
como regime do governo, orgãos administracionais do Estado e
limites de sua competência, direitos e deveres fundamentais do
cidadão e outros aspetos e determinações relativas à manuten-
ção e defesa do Estado.”

Segundo assegura BLACK, professor norte-americano, no termo de Constituição estão contidas du-
as ideias: a) regulamentação da forma de governo; e b) garantia das liberdades do povo.

Cada Estado têm suas peculariedades, por isso não é possível exigir um modelo constitucional úni-
co e uniforme, pois, sendo soberanos, os Estados escolhem a forma que melhor lhes interessa. Devi-
do a todos os instantes que originiram a Constituição, ela pode ser caracterizada de diversas formas
e identificada facetas diferentes que ela assume.

Quanto a origem elas podem ser caracterizadas como outorgadas, promulgadas, cesaristas (bonapar-
tistas) ou pactuadas (dualistas).

1. Constituição outorgada: é aquela imposta pelo governante ilegítimo, são as chamadas Cartas
Constitucionais, como a Constituição Brasileira de 1824, no período do Império.

2. Constituição promulgada: é resultante da atividade da Assembleia Nacional Constituinte, esta


eleita de modo direto pelo povo.

3. Constituição cesarista/ bonapartista: é definida por José Afonso da Silva como não exatamen-
te outorgada, muito menos democrática. Ocorre um plebiscito ou referendo sobre o projeto apre-
sentado pelo governante, sendo que a participação popular nesse caso não é propriamente demo-
crática, mas apenas uma maneira de aprovar a vontade do governante, como o plebiscito de Pi-
nochet, no Chile em 1980.

4. Constituição pactuada: de acordo com Uadi Lammêgo Bulos, surge como consequência de um
pacto firmado entre os detentores do poder constituinte, em que este é centralizado em mais de
um indivíduo ou grupo social. Em conformidade com Bonavides, a Constituição pactuada é re-
sultado do acordo instável de forças políticas opostas, como por exemplo a Constituição France-
sa de 1791.

As Constituições também podem ser classificadas quanto a forma. Quanto a forma, as Constituições
podem ser escritas (instrumental) ou costumeiras (não escritas ou consuetudinárias). A Consti-

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Noção de Constitucionalismo

tuição escrita é sistematizada e codificada em um documento, como por exemplo a Constituição


Americana. A costumeira é composta por documentos desagregados entre si, sendo reconhecidos e
praticados pela sociedade, complementados por costumes, jurisprudência e convenções, como a
Constituição da Inglaterra.

A classificação das Constituições de acordo com a extensão pode ser sintética ou analítica. A sinté-
tica é precisa, é transmissora dos elementos fundamentais do Estado. Por ser concisa, a Constitui-
ção sintética é duradoura; os princípios nela instituídos são interpretados e adaptados ao longo de
sua vigência, trazendo flexibilidade a estrutura constitucional, como exemplo a Constituição Ameri-
cana. A Constituição analítica em contraposição, é mais abrangente, abordando todos os temas en-
tendidos como fundamentais com um elevado grau de detalhamento sobre o tema. Essa Constitui-
ção busca a estabilidade direito legislado e assente a rigidez constitucional como cautela para a de-
cisão da autoridade, como a Constituição Brasileira de 1988.

Ela també pode ser classificada segundo a Flexibilidade. Também admitida pelas terminologias:
mutabilidade, estabilidade ou consistência; a Flexibilidade classifica as Constituições em rígidas,
flexíveis, semirrígidas (semiflexíveis), fixas (silenciosas) e imutáveis (permanentes, graníticas ou
intocáveis).

1. Rígida: é a Constituição que para ser alterada exige um procedimento mais formal e cerimonio-
so que o procedimento adotado para a alteração de normas não constitucionais, como a Consti-
tuição Brasileira de 1988.

2. Flexível: é aquela em que a pouca dificuldade do processo de alteração acaba se equiparando a


pouca dificuldade de alteração de normas não constitucionais, admitindo a não existência da hi-
erarquia entre Constituição e lei infraconstitucional.

3. Semirrígida: é rígida e flexível ao mesmo tempo, em que determinados assuntos exigem maior
formalidade para serem alterados e outros que tem pouca dificuldade para serem alterados, co-
mo por exemplo a Constituição Imperial.

4. Fixa, de acordo com Kildare Gonçalves Carvalho, é a Constituição que só admite alteração pelo
mesmo poder que a criou. Não esclarece efetivamente o processo para a alteração e por isso
também é conhecida como silenciosa, tendo como exemplo a Carta Espanhola de 1876.

5. Imutável é incapaz de sofrer alteração.

6. Super-rígida: Parte da doutrina entende ainda que existe uma classificação de constituições su-
per-rígidas, que seriam, no geral, rígidas, mas possuiriam um núcleo imutável, como é o caso da
Constituição Federal de 1988, em razão da existência de cláusulas pétreas.

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Assim terminámos a breve contextualização das noções fundamentais acerca do constitucionalismo.


No capítulo que se segue, tentaremos falar um pouco sobre o constitucionalismo de Cabo Verde, ba-
seando em alguns aspetos de sua constituição.

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História da Constituição de Cabo Verde

O arquipélago de Cabo Verde terá sido descoberto no ano de 1460 por navegadores italianos e por-
tugueses. Santiago foi a ilha mais favorável para a ocupação e assim o povoamento começa ali em
1462.

Dada a sua posição estratégica, nas rotas que ligavam entre si a Europa, a África e o Brasil, as ilhas
serviram de entreposto comercial e de aprovisionamento, com particular destaque no tráfego de es-
cravos. Cedo, o arquipélago tornou-se num centro de concentração e dispersão de homens (pessoas
escravizadas), plantas e animais.

Cabo Verde terá vivido boa parte da sua história sob o domínio da coroa portuguesa. Logo, pensa-
se, que em maior parte da sua história houve a ausência do constitucionalismo ou qualquer ideia de
separação e limitação de poder ou valorização dos direitos fundamentais do homem. O próprio Ca-
bo-verdiano, terá nascido nesse ambiente de opressão, onde uma única pessoa detinha todos os po-
deres e governava segundo ao seu próprio veredito. O colonialismo terá influenciado grandemente a
forma de ser e de viver do cabo-verdiano.

O próprio cabo-verdiano terá se originado da misigenação entre o branco português capataz e o ne-
gro africano e escravo. Europeus livres e escravos da costa africana fundiram-se num só povo, o ca-
bo-verdiano, com uma forma de estar e viver muito própria e o crioulo emergiu como idioma da co-
munidade maioritariamente mestiça.

A Constituição de Cabo Verde terá tido sua origem em decorrêcia da luta pela libertação de Guiné
Bissau e Cabo Verde. No século XX, a partir da década de 50, começam a surgir os movimentos in-
dependentistas no continente africano. Cabo Verde vinculou-se à luta pela libertação da Guiné Bis-
sau, lutando contra o colonialismo português e promovendo marchas pela independência em todo o
país. A 19 de Dezembro de 1974 foi assinado um acordo entre o PAIGC e Portugal, instaurando-se
um governo de transição em Cabo Verde. Este mesmo Governo preparou as eleições para uma As-
sembleia Nacional Popular que em 5 de julho de 1975 proclamou a independência. Ainda no decor-
rer da independência, houve a Aprovação da Lei Sobre a Organização Política do Estado.

É relevante dizer-se que a primeira denominação do parlamento cabo-verdiano – Assembleia Nacio-


nal Popular, resulta do artigo 3º da Lei Sobre a Organização Política do Estado (LOPE), atribuindo-
lhe o exercício do poder soberano do Estado de Cabo Verde até à instituição da Constituição da Re-
pública.

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No pôs 5 de Julho, a assembleia Nacional deveria em três meses elaborar a Constituição, da recém
proclamada República de Cabo Verde. Tal acontecimento só veio se suceder em 1980. Durante esse
período, o país se guiou com base na lei da Organização Política de Estado (LOPE). Este documen-
to continha 23 artigos, mas não contemplava a parte relativa dos direitos fundamentais, entretanto
funcionou como uma Constituição provisória.

Primeira Constituição

Constituida por 96 artigos, veio a ser aprovada só em Setembro de 1980 pela Assembleia Nacional
Popular (ANP). A lei constitucional do país foi elaborada por uma comissão de juristas e entrou em
vigor em Dezembro do mesmo ano. A constituição de 80 definiu Cabo Verde como uma República
soberana, democrática, laica, unitária, anticolonialista e anti-imperialista e instituiu um regime de
partido único e de democracia nacional revolucionária, em que, o Partido Africano da Independên-
cia da Guiné e Cabo Verde era considerado força política dirigente da sociedade e do Estado (Artº
4º). Essa Constituição, em contraste com a LOPE, inovou em matéria os direitos fundamentais, con-
sagrando, direitos, liberdades, garantias e deveres fundamentais dos cidadãos. Estabeleceu ainda co-
mo orgãos do Poder do Estado, a Assembleia Nacional Popular, o Presidente da República, o Go-
verno, os Tribunais e os orgãos de Poder local. No seu artigo 60º previa que a Assembleia Nacional
Popular reunia-se em duas sessões ordinárias por ano, sendo uma delas consagrada nomeadamente à
apreciação do relatório de actividades do Governo e à discussão e votação do Orçamento Geral do
Estado para o ano financeiro seguinte.

Revisões Constitucionais

Em 1980, houve um golpe de Estado em Guiné-Bissau, que pôs em causa a unidade entre Guiné e
Cabo Verde. Com isto, os dirigentes políticos Cabo-verdianos anunciaram publicamente a criação
do PAICV ( Partido Africano da Independência de Cabo Verde) em Dezembro de 1981. Estas mu-
danças levaram a uma Revisão Constitucional, e, abrangeu o relatório da Constituição e todas as re-
ferências feitas no articulado da Constituição da República de Cabo Verde e ao Partido Africano da
Independência da Guiné e Cabo Verde, consideravam-se feitas no Partido Africano da Independên-
cia de Cabo Verde e ao PAICV, em tudo o que não for incompatível com a realidade política de en-
tão (art.1º da lei n.º 2/81).

Houve uma segunda Revisão da Constituição, em 1988, por outros motivos. A marca desta revisão
foi a adopção da política de integração da economia de Cabo Verde na economia mundial e o mo-
mento crucial foi quando o Governo apresentou um projecto de lei relativo à constituição e o funci-
onamento das instituições financeiras internacionais, mas a Assembleia considerou que era inconsti-

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tucional e a Mesa de então sugeriu uma revisão, para que se viabilizasse e consequentemente se
aprovasse a proposta.

A terceira Revisão da Constituição teria acontecido no dia 13 de Fevereiro de 1990. Teve início nu-
ma reunião extraordinária do Conselho Nacional do PAICV, em cuja ordem do dia figurava uma re-
flexão sobre o regime político. A reunião terminou no dia 19, tendo este órgão aprovado uma reso-
lução conhecida por «decisão sobre a abertura política», que implicaria necessariamente uma revi-
são da Constituição, que aconteceu em Setembro de 1990 e consagrou a transição constitucional ao
determinar o fim do regime de partido único com a queda do artigo 4º e instituir o princípio de sepa-
ração e interdependência dos poderes. Ao prever a eleição do Presidente da República por sufrágio
universal e conferir-lhe determinados poderes, designadamente o poder de dissolver a Assembleia,
demitir o Governo sendo este politicamente responsável perante a Assembleia Nacional Popular e o
Presidente da Republica, e exercer o direito de veto político (arts.64.ºe 68.ºal.a) e 78º) desenha-se
um novo sistema de governo, denominado por alguns autores por semipresidencial e por outros é
denominado como Parlamentar mitigado.

Com isso abrem-se as portas para o pluripartidarismo e com isso surge o partido Movimento Para
Democracia (MPD), que seria o primeiro partido da oposição e a que venceu as primeiras eleições
em 13 de Janeiro de 1991. Com essa vitória, o MPD projetou uma nova constituição. Tratou-se de
um texto que veio revogar o texto constitucional de 1980. Essa revogação trouxe diversas mudan-
ças, tendo em conta as alterações politicas que sucederam no país. Alterações profundas foram in-
troduzidas como a mudança de símbolos nacionais e a redução dos poderes do Presidente da Repú-
blica; e ainda o princípio de separação e interdependência dos poderes legislativo, executivo e judi-
cial.

Nova Constituição

A 5 de Agosto de 1992, foi aprovado a Nova Constituição pela Assembleia Nacional. A lei consti-
tucional foi promulgada pelo presidente Mascarenhas Monteiro a 4 de Setembro e entrou em vigor
em 25 de Setembro.

Em 13 de Novembro de 1995 houve uma Revisão extraordinária da Nova Constituição. A revisão


limitou-se a aditar, nas disposições transitórias, uma norma sobre a aplicabilidade do artigo 102º,
que referia que “a partir do ano anterior, as eleições para qualquer orgão politíco e até o apuramento
dos resultados, essa lei não poderia ser revogada”.

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Revisões da Nova Constituição

A 31 de Julho de 1999 aconteceu uma nova Revisão da Constituição. Foi feita uma revisão extensa
e profunda que abrangeu vários preceitos constitucionais, como a institucionalização da língua ca-
bo-verdiana como língua oficial em construção; a consagração do Tribunal Constitucional e a figura
do Provedor de Justiça. Reforço das competências absolutamente reservadas da Assembleia Nacio-
nal.

Em 05 de Fevereiro de 2010 sucedeu a 2.ª Revisão ordinária da Constituição. Nesta revisão foram
contemplados o sector da Justiça e os Direitos, Liberdades e Garantias. No sistema Judicial, a revi-
são de 2010 criou os tribunais judiciais de segunda instância e estatuiu que a escolha dos juízes do
Supremo Tribunal de Justiça deve ser feita por concurso público. Enquanto isso, no sistema de Go-
verno, surgem novos elementos de equilíbrio, pois com essa revisão o Presidente da República pas-
sa a ter o poder de dissolução da Assembleia. Até os dias de hoje, essa constitui-se como a Consti-
tuição da República de Cabo Verde. Ela é composta por 295 artigos, dividida em sete partes:

- Parte I ( Princípios fundamentais )

- Parte II ( Direitos e Deveres Fundamentais )

- Parte III ( Organização económica e financeira)

- Parte IV ( Exercício do Poder Político)

- Parte V (Organização do Poder Político)

- Parte VI ( Das Garantias de Defesa e da Revisão da Constituição)

- Parte VII ( Disposições Finais e Transitórias.

Cada uma dessas partes, por sua vez, se dividem em títulos e originão capítulos onde se encontram
as suas determinadas leis.

Foi um longo percurso até a Constituição da República de Cabo Verde chegar em o que ela é hoje.
Entretanto essas alterações e revisões não foram aleatórias, aconteceram à luz a problemas que exi-
giam mudanças e ajustes.

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Conclusão

O Constitucionalismo constitui-se como uma técnica, ou ainda mais uma ideia de liberdade. Seria
uma forma de de atribuir devido valor e direito ao povo. O objetivo fundamental do constituciona-
lismo é limitar e dividir os poderes do Estado e ainda, não menos importante, garantir a satisfação
dos direitos e das necessidades básicas do homem. Os próprios direitos do homem e do cidadão
constituem-se como a maior manifestação do Constitucionalismo, além das revoluções liberais.

Conclui-se que a Constiuição revela-se como a realização prática e teórica das ideias e normativas
do Constitucionalismo. Portanto, seria impossível falarmos de Constitucionalismo sem referirmos
ao conceito de Constituição.

Ao fim dessa pesquisa, compreendemos que o Constitucionalismo de um país é classificado confor-


me o funcionamento de sua Constituição. Portanto, para termos uma noção sobre o Constitucionalis-
mo em Cabo Verde, falámos sobre a sua Constituição e sua história.

A Constituição de Cabo Verde passa por muitas alterações e revisões, mas essas acontecem a luz de
situações que exigem essas tais revisões. A Constituição de Cabo Verde quanto a flexibilidade ela
pode ser caracterizada como semi-rígida, já que na sua história ela sofre muitas alterações, mas es-
sas alterações são de situações de grande importância.

Quanto a origem podemos classificar a Constituição como promulgada, como notámos nessa breve
revisão pela história da Constituição de Cabo Verde, ela é resultante da atividade da Assembleia Na-
cional Popular, que foi eleita pelo povo.

Quanto a extensão, optámos por classificar a Constituição de Cabo Verde como sintética, pois ela é
transmissora dos elementos fundamentais do Estado. Ela também é duradoura, e como pudemos ver,
os princípios nela instituídos são interpretados e adaptados ao longo de sua vigência, trazendo um
pouco de flexibilidade a estrutura constitucional.

Concluímos, que ainda que a Constituição de Cabo Verde seja recente, ela apresenta uma rica histó-
ria de Constitucionalismo. Segundo Jorge Miranda, a Constituição de Cabo Verde é avançada em di-
reitos sociais, mas ainda na sua opinião, esses direitos sociais em termos práticos não funcionam.

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Bibliografia

Canotilho, José Joaquim Gomes , Direito constitucional e teoria da Constituição, 7ª ed., p. 51 e


218.
Carvalho, Kildare Gonçalves , Direito constitucional: Teoria do Estado e da Constituição. Di-
reito constitucional positivo, 12ª ed., p. 211.
Alarcón, Pietro de Jesús Lora. Constitucionalismo. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso
Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Di-
reito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zan-
caner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, 2017.
Tavares,André Ramos , Curso de direito constitucional, 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 2.
Junior, José Levi MA , Constitucionalismo e conceito de Constituição, Universidade de São
Paulo (USP), 2021.

Junior, Evandro MB , O constitucionalismo e sua história - Como surgiu nomenclaturas e defi-


nições
Pequena enciclopédia de moral e civismo, Ministério de Educação e Cultura, Fundação Nacio-
nal do Material Escolar, 2º ed., 1972 Acessado 13 de Janeiro de 2023
História da Constituição, Fonte: https://constituicaodecaboverde.blogs.sapo.cv/1697.html Aces-
sado 13 de Janeiro de 2023

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