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CURSO MEGE

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Celular / Whatsapp: (99) 982622200 (Tim)
Turma: PCSP (Delegado de Polícia)
Material: Direito Constitucional (Ponto 1)

RODADA 1
Direito Constitucional
1
(Ponto 01)
Constitucionalismo e Teoria da Constituição1

1
Temáticas que resumem elementos diversos da parte inicial do último edital da PCSP para Delegado de
Polícia.
2
MENSAGEM DO MEGE

Para prova de Delegado de Polícia de São Paulo é necessário fazer uma


revisão básica da parte geral de direito constitucional. No último concurso não tivemos
uma prova simples, inclusive a doutrina esteve presente (de forma decisiva) em 11 de
14 questões aplicadas. O que nos fez reunir alguns assuntos relevantes iniciais de base
teórica para melhor domínio em questões mais complexas. Fiquem cientes: não
estamos diante de uma prova meramente de lei seca.

Há um maior preciosismo na polícia civil de São Paulo para temas doutrinários


na primeira fase. O que significa que você precisa atuar em dois pontos nessa revisão
inicial. O primeiro é sem dúvidas a lei seca. O segundo são pontos específicos de
direito constitucional que merecem mais atenção conceitual, e isso o curso vai te
oferecer no decorrer das próximas semanas.

Vamos aos estudos!


Equipe Mege. 3
SUMÁRIO

1. DOUTRINA (RESUMO) ................................................................................................ 5

1.1. DIREITO CONSTITUCIONAL: NOÇÕES GERAIS........................................................... 5

1.2. CONCEITO DE CONSTITUCIONALISMO ..................................................................... 6

1.3. NEOCONSTITUCIONALISMO................................................................................... 16

1.4. CONSTITUCIONALISMO E SOBERANIA POPULAR ................................................... 20

1.5. CONCEITO, CLASSIFICAÇÃO E ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO.............................. 24

1.6. ESTRUTURA DAS CONSTITUIÇÕES .......................................................................... 34

1.6.1. PREÂMBULO ....................................................................................................... 34

1.6.2. PARTE DOGMÁTICA ............................................................................................ 35

1.6.3. PARTE TRANSITÓRIA ........................................................................................... 35 4


1.7. NORMAS CONSTITUCIONAIS PROGRAMÁTICAS .................................................... 35

1.8. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS .............................................................................. 36

1.9. DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS ................................................... 42

2. QUESTÕES ................................................................................................................ 44

3. GABARITO COMENTADO ......................................................................................... 49


1. DOUTRINA (RESUMO)

1.1. DIREITO CONSTITUCIONAL: NOÇÕES GERAIS

De acordo com a teoria clássica, o Direito se divide em dois grandes ramos:


Direito Público e Direito Privado. Modernamente, porém, a divisão do direito em
público e privado vem sendo remodelada, entendendo-se que o direito é uno e
indivisível. Assim, o direito deve ser definido e estudado como um grande sistema, em
que tudo se harmoniza. Dessa forma, a divisão tem efeitos apenas acadêmicos, de
forma a facilitar o estudo de cada ramo do direito.
O Direito Constitucional está incluído no ramo do Direito Público (conforme a
teoria clássica).
Trata-se de um direito público fundamental, tanto se observado na concepção
kelseniana – como fundamento de validade para a estrutura hierarquizada do
ordenamento jurídico – como se tomado na concepção material, consagrador da ideia
de direito que se expande na interpretação e aplicação das normas jurídicas (processo
de constitucionalização do direito).
A noção resumida de direito constitucional indica o estudo da Teoria Geral das
Constituições e os ordenamentos jurídicos de cada Estado.
A noção detalhada de Direito Constitucional compreende a ordenação 5
sistemática e organizada das normas supremas que estruturam o Estado e as relações
de poder, que como disciplina-síntese, exerce influência sobre todos os ramos do
direito.
O objeto do Direito Constitucional é o estudo sistematizado das Constituições:
organização do Estado, forma de governo, estruturação do poder, liberdades
públicas e princípios.
Ressalte-se que a doutrina afirma a existência de um direito privado
constitucional. Dessa forma, mais adequado seria falar, então, em um Direito Civil-
Constitucional, estudando-se o Direito Civil à luz das regras constitucionais e, em
muitos casos, reconhecendo-se a aplicação dos direitos fundamentais nas relações
privadas (eficácia horizontal dos direitos fundamentais).
Fica evidente que, para além da discussão dogmática e doutrinária, a
constitucionalização do direito privado revela efeitos práticos, com reflexos
jurisprudenciais como o citado acima.
Dentro desta perspectiva, autores trazem o Princípio da dignidade da pessoa
humana como núcleo axiológico da Constituição, e por consequência de todo o
ordenamento jurídico, promovendo uma revolução em diversos institutos e conceitos
do direito, tornando-os mais maleáveis ao diálogo com o direito constitucional.
Aspecto salutar e que tende a ser cobrado (sobretudo nas fases mais agudas)
não só em Direito Constitucional, como também em Direito Civil, refere-se justamente
ao movimento de despatrimonialização do Direito Civil, promovido pela força
normativa dos princípios constitucionais, com enfoque na dignidade da pessoa
humana.
É que tal princípio funciona como verdadeira matriz de todos os direitos
fundamentais, os quais são responsáveis por alçar a pessoa a um patamar distinto do
que se vislumbrava no Estado Liberal, de modo que o Direito Civil, ao receber esta
influência, passa a se preocupar com o indivíduo não só sob a ótica patrimonial,
passando a tutelar com primazia interesses existenciais. Trata-se, em resumo, de um
movimento de releitura dos institutos tipicamente de direito privado sob a ótica dos
princípios constitucionais.

1.2. CONCEITO DE CONSTITUCIONALISMO

O Constitucionalismo comporta duas acepções:


a) em sentido amplo, relacionado à existência de Constituição
como garantia dos governados (Platão) e estruturação do
sistema de poder. Refere-se à existência de uma Constituição
básica que confere poderes ao soberano, mesmo que
tacitamente.
b) em sentido estrito, técnica jurídica, social, política e
ideológica de tutela das liberdades públicas surgida no final do
século XVIII. 6
O Constitucionalismo em sentido estrito confunde-se com a própria evolução
do Direito Constitucional, surgindo como técnica jurídica de combate ao absolutismo e
busca pela limitação do poder. Foi a “arma do liberalismo contra o absolutismo”.
Nessa busca, três ideias principais sempre se encontram presentes, que são
conhecidas como “axiomas” do Constitucionalismo: garantia de direitos, separação
dos poderes e princípio do governo limitado (art. 16, Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão).
Vejamos alguns conceitos doutrinários de Constitucionalismo em sentido
estrito:
Canotilho – É a teoria que ergue o princípio do governo
limitado, indispensável à garantia dos direitos em dimensão
estruturante da organização político-social de uma comunidade.
Neste sentido, o Constitucionalismo moderno representará
uma técnica de limitação do poder com fins garantísticos.
Kildare Gonçalves – Perspectiva Jurídica/Sociológica – O
Constitucionalismo se trata de um sistema normativo,
enfeixado na Constituição, e que se encontra acima dos
detentores do poder; sociologicamente, representa um
movimento social que dá sustentação à limitação do poder,
inviabilizando que os governantes possam fazer prevalecer seus
interesses e regras na condução do Estado.
André Ramos Tavares – Determina quatro sentidos para o
Constitucionalismo: 1) Limitar o poder arbitrário; 2) Imposição
de que existam cartas constitucionais escritas; 3) Evolução
histórica-constitucional de um determinado Estado; e 4)
Prevalência dos direitos fundamentais como proteção ao
regime autoritário.
Pedro Lenza – O Constitucionalismo é um meio de limitação do
poder autoritário e de prevalência dos direitos fundamentais,
afastando-se da visão autoritária do antigo regime (aproxima-
se da posição de Ramos Tavares).

Podemos resumir Constitucionalismo como “a busca do homem político pela


limitação do poder arbitrário” (Karl Loewenstein).

1.2.1. MARCOS NA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONSTITUCIONALISMO


A. Constitucionalismo primitivo

O Constitucionalismo primitivo identifica-se com a acepção ampla do termo e


remonta à organização consuetudinária dos povos sem escrita na Antiguidade
Clássica.
O principal exemplo é do povohebreu: os profetas dotados de legitimidade
7
popular, no Estado Teocrático, fiscalizavam e puniam os atos dos governantes que
ultrapassavam os limites bíblicos. Alguns autores entendem que com o povo hebreu
houve a primeira experiência, ainda que embrionária, de Constitucionalismo, pois os
detentores do poder eram limitados pela lei do “Senhor”.
De maneira geral, as principais características do Constitucionalismo primitivo
são: normas consuetudinárias, influência direta da religião - especialmente pelo
influxo dos valores cristãos - e meios de constrangimento (ordálias).

B. Constitucionalismo antigo

No Constitucionalismo antigo, há duas experiências importantes: Grécia e


República Romana. Autores destacam, no ponto, a organização das cidades-Estado
gregas e o surgimento da democracia direta.
Grécia: O regime político da Grécia se preocupava com a limitação do poder
das autoridades e a contenção do arbítrio, porém essa limitação estava ligada à busca
do bem comum da polis, e não exatamente à garantia de liberdades individuais.
Roma: Também não havia o sentido de Constitucionalismo nas bases
modernas como limitação ao poder do governante e defesa dos direitos individuais.
Contudo, alguns institutos romanos demonstravam certa preocupação com a
separação de poderes, repartindo-o em instituições como o Consulado, o Senado e a
Assembleia.
São características do Constitucionalismo antigo:
i) inexistência de uma Constituição escrita;
ii) forte influência da religião; e
iii) supremacia do monarca ou do Parlamento.

No Constitucionalismo antigo não havia controle de constitucionalidade.


Sequer se falava na existência de um Poder Judiciário. As Constituições eram
consuetudinárias e os doutrinadores apontam pela “eficácia social zero do
Constitucionalismo”. As normas eram destituídas de obrigatoriedade, formando-se
uma cultura do ceticismo quanto ao valor da Constituição do ponto de vista de sua
concretização.

C. Constitucionalismo medieval

A era medieval, caracterizada pelo feudalismo, pela fragmentação do poder


político e pela separação de classes, foi marcada pelas concepções jusnaturalistas de
limitação do poder, lastreadas no pensamento de que as leis precediam ao homem.
A título de contextualização histórica, vale lembrar que nenhuma instituição
existente à época possuía uma espécie de soberania semelhante ao que se vê nos
Estados Modernos, razão pela qual é difícil falar em Constitucionalismo na Idade 8
Média, tal qual entendido atualmente.
No entanto, no final da Idade Média, sobretudo na Inglaterra, foram
realizados pactos entre os reis e seus súditos de estamentos mais privilegiados,
reconhecendo certas prerrogativas. Tal concessão de direitos e a respectiva limitação
que isto trazia ao poder do Monarca são traços iniciais do que se passou a entender
como constitucionalismo (em sentido estrito).
Existiram, portanto, alguns documentos garantidores das liberdades públicas:
Magna Carta, Petition of Right; Habeas Corpus Act; Bill of Rights (Inglaterra).
Vejamos um quadro-resumo:

A Magna Carta de 1215 representou uma


Magna Charta (1215):
limitação do poder real.

Reconhecimento de direitos e liberdades para os


Petition of Rights (1628): súditos do Rei. – firmada entre o Parlamento e o
Rei Carlos.

Habeas Corpus Act (1679): Anulava as prisões arbitrárias.

Submetia a monarquia à soberania popular,


Bill of Rights (1689):
transformando-a numa monarquia constitucional.
Desses documentos, interessante destacar a Magna Carta inglesa de 1215,
que, em suma, limitou o poder do rei, o que é ínsito ao próprio conceito de
Constituição, razão pela qual até hoje verificamos a Constituição de 1988 ser
“apelidada” em textos jurídicos de Carta Magna ou Texto Magno.
São características do Constitucionalismo medieval:
i) Constituições consuetudinárias;
ii) Concepções jusnaturalistas da limitação do poder;
iii) Forte influência da religião;
iv) Existência de alguns direitos oponíveis ao Monarca;
v) Supremacia do Parlamento (especialmente na Inglaterra).

D. Constitucionalismo moderno

O Constitucionalismo moderno é o movimento jurídico, político e cultural do


fim do século XVIII que pregava uma Constituição escrita para frear o arbítrio dos
poderes públicos.
Segundo J.J Gomes Canotilho, o Constitucionalismo moderno é o movimento
político social e cultural que, sobretudo a partir de meados do século XVIII, questiona
nos planos político, filosófico e jurídico os esquemas tradicionais de domínio político,
sugerindo, ao mesmo tempo, a invenção de uma nova forma de ordenação e 9
fundamentação do poder político (definição cobrada na prova do TJMT-2009).
Conforme ensina Pedro Lenza, “Dois são os marcos históricos e formais do
constitucionalismo moderno: a Constituição norte-americana de 1787 e a
Constituição francesa de 1791 (que teve como preâmbulo a Declaração Universal dos
Direitos do Homem e do Cidadão de 1789), movimento este deflagrado durante o
Iluminismo e concretizado como uma contraposição ao absolutismo reinante, por meio
do qual se elegeu o povo como titular legítimo do poder”.
O principal diferencial do Constitucionalismo moderno, em relação à fase
anterior, é o aparecimento das primeiras Constituições escritas, rígidas e formais. A
partir delas, surgem as noções de rigidez constitucional (o que define a rigidez das
Constituições é o processo diferenciado de modificação, e não a presença de cláusulas
pétreas) e supremacia da Constituição.
Também estavam presentes, simultaneamente, as ideias de limitação do
poder do soberano, com a repartição de poderes, a preocupação com direitos
individuais e a necessidade de legitimação do governo pelo consentimento dos
governados.
Assim, alguns autores entendem que somente a partir do Constitucionalismo
moderno, podemos falar em Constitucionalismo propriamente dito (em sentido
estrito).
Frisa-se que o Constitucionalismo moderno foi fundamental para o
desenvolvimento da ideia de Estado de Direito, tal qual conhecida hoje: Estado em
que o poder exercido é limitado pela ordem jurídica vigente.
Características do Constitucionalismo moderno:
i) Superação do absolutismo;
ii) Surgimento das primeiras Constituições escritas (constituição
no sentido formal);
iii) Primeiras ideias de rigidez constitucional e supremacia
constitucional;
iv) Influências do Iluminismo, a partir das ideias de John Locke
(ideias de liberalismo), Jean Jacques Rousseau (valorização da
lei como expressão da vontade geral do povo) e Montesquieu
(divisão de poderes);

ATENÇÃO! John Locke, Rousseau e Montesquieu são influenciadores do


Constitucionalismo MODERNO. Já foi considerado errado em provas assertiva no
sentido que os pensadores seriam precursores do Constitucionalismo
contemporâneo.

v) Garantia de direitos individuais;


vi) Separação dos poderes;
vii) Limitação do poder estatal. 10
Importante destacar que os marcos do Constitucionalismo moderno são o
absenteísmo estatal (viés liberal do período) e a proteção das liberdades públicas
clássicas (direitos civis e políticos), relacionando-se, portanto, aos direitos
fundamentais de primeira geração/dimensão.
Esse movimento pode ser didaticamente subdividido em duas fases:
Constitucionalismo moderno liberal e Constitucionalismo moderno social.

D.1. Constitucionalismo moderno CLÁSSICO ou LIBERAL

O Constitucionalismo clássico ou liberal começa no fim do século XVIII, com as


revoluções liberais, e estende-se até o fim da Primeira Guerra Mundial (1918).
No Constitucionalismo clássico, duas experiências constitucionais merecem
destaque, com características peculiares: a norte-americana e a francesa.

a) Constitucionalismo norte-americano
A carta americana de 1787 nasceu em substituição aos Articles Of
Confederation, a partir da reunião de onze das trezes colônias norte-americanas que
adquiriram independência. Suas marcas principais estão na instituição do federalismo,
da rígida separação de poderes e do presidencialismo. Seguem alguns pontos
principais:
i) Criação da primeira Constituição escrita, elaborada em 1787:
trata-se de uma Constituição sintética e concisa, que contém
apenas os elementos estruturantes do Estado e do poder.
Desde seu nascimento, tratou de um conjunto de NORMAS,
que impunham obrigatoriedade aos poderes instituídos.
Constatou-se, portanto, a existência de uma Constituição
dogmática, escrita e sistematizada por um órgão constituinte
soberano.
ii) Surgimento do controle de constitucionalidade difuso: O
controle de constitucionalidade está ligado às ideias de
supremacia e rigidez constitucionais, tendo como parâmetro
uma Constituição escrita, com a diferenciação entre
supremacia formal e material das constituições. O controle de
constitucionalidade DIFUSO, como conhecido hoje, surgiu do
famoso caso Marbury vs. Madison (1803), fruto, portanto, da
experiência do Constitucionalismo norte-americano.
iii) Fortalecimento do Poder Judiciário: Na obra “Os
Federalistas”, Hamilton ensina que o Poder Judiciário é o mais
fraco dos poderes, por não possuir nem a espada nem o cofre.
Os norte-americanos tinham bastante medo dos abusos
perpetrados pelo Parlamento inglês, razão pela qual optaram
11
pelo fortalecimento do Judiciário.
iv) Importante contribuição para as noções de separação dos
poderes, forma federativa de Estado, sistema republicano e
presidencialista e regime democrático.
v) Existência de declarações de direitos: a Declaração de
Direitos da Virgínia é anterior à própria constituição (1776).

b) Constitucionalismo francês
O marco inicial do Constitucionalismo francês é a Revolução Francesa, de
1789. A primeira Constituição francesa escrita é de 1791. Duas ideias que constam da
Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 são fundamentais
para a compreensão do Constitucionalismo francês: garantia de direitos e separação
dos poderes.
São características fundamentais do Constitucionalismo francês:
i) Consagração do princípio da separação dos poderes:
Montesquieu foi estudar no direito britânico a separação dos
poderes. Os franceses, que não entendiam esse sistema,
originário de um país de common law, foram buscar inspiração
nos EUA, onde a separação dos poderes foi bem recebida. Na
verdade, os sistemas francês e norte-americano se
interpenetraram reciprocamente em seu surgimento.
ii) Distinção entre poder constituinte originário e derivado: O
francês Abade Emmanuel Joseph Sieyès foi o teórico do poder
constituinte (“Qu’est-ce que le tiers état?” – O que é o terceiro
Estado? A Constituinte Burguesa). Nesta obra, Sieyès, com base
na doutrina do contrato social (John Locke, Jean-Jacques
Rousseau), vislumbrava a existência de um poder imanente à
nação, superior aos poderes ordinariamente constituídos e por
eles imodificáveis: o poder constituinte. Além de legitimar a
ascensão do Terceiro Estado (o povo) ao poder político, a obra
traçou as linhas mestras da Teoria do Poder Constituinte, ainda
hoje relevante para o estudo do Direito Constitucional.
iii) Supremacia do Parlamento: No modelo francês de
Constitucionalismo clássico, o Parlamento era considerado o
poder supremo. Há, portanto, a característica de valorização do
Legislativo, acarretando o enfraquecimento do controle de
constitucionalidade das leis (curiosidade: a primeira vez que um
tribunal francês exerceu o controle repressivo de
constitucionalidade foi em 2010). Isso ocorre, pois, os
revolucionários franceses viam o Poder Judiciário com
desconfiança, associando-o ao antigo regime monarquista.
Além disso, o Legislativo era valorizado como a expressão da
vontade geral do povo.
iv) Surgimento da escola da exegese, a partir do Código de 12
Napoleão de 1804: Para a escola da exegese, a interpretação
era uma atividade mecânica, e ao Judiciário cabia somente
dizer o que já estava na lei. O juiz deveria somente expressar o
que a lei continha, e não interpretar. Os adeptos dessa teoria
entediam que o Código de Napoleão já era algo perfeito e
acabado e não tinha de ser interpretado, muito menos
complementado.
v) Constituição analítica, extensa ou expansiva: Enquanto a
Constituição dos EUA é concisa ou sintética, a experiência
constitucional francesa demonstrou ser extensa, e regulou
situações que poderiam ser tratadas por normas
infraconstitucionais (não se limitou às matérias
substancialmente constitucionais, que são os direitos
individuais, a separação dos Poderes e a organização do Estado).

D.2. Constitucionalismo moderno SOCIAL

Fase do Constitucionalismo moderno que surge com o fim da 1ª Guerra


Mundial (1918). A crise econômica instaurada e o aumento das desigualdades sociais
levaram à derrocada do liberalismo clássico. Dessa forma, as Constituições passaram a
prever não só limitações ao poder do Estado e garantias individuais, mas também a se
preocupar com o desenvolvimento social das nações.
O movimento do Constitucionalismo social coincide com o surgimento da
segunda dimensão de direitos fundamentais e liga-se essencialmente a direitos sociais,
econômicos e culturais. Tratam-se de direitos coletivos vinculados à IGUALDADE e que
em geral possuem um caráter positivo, demandando uma atuação estatal (e não
somente o absenteísmo típico dos direitos fundamentais de primeira dimensão e do
constitucionalismo liberal).
Destaca-se, portanto, a ideia de Estado-Social, ou seja, Estado intervencionista,
atuando na produção e distribuição de bens e riqueza, de modo a garantir um mínimo
de bem-estar social.
IMPORTANTE: A doutrina aponta a Constituição Mexicana de 1917 e a
Constituição Alemã de 1919 (Constituição de Weimar) como experiências marcantes
do período, especialmente por imporem ao Estado a obrigação de ofertar prestações
positivas aos indivíduos.

E. Constitucionalismo contemporâneo

No Constitucionalismo contemporâneo, o valor constitucional supremo e


fundamental passa a ser a dignidade da pessoa humana. Essa é a grande mudança de
paradigma: a preocupação com o ser humano e sua dignidade, independentemente de
qualquer condição pessoal. Em outras palavras, todos os homens possuem o mesmo
grau de dignidade, pelo simples fato de sua humanidade (valor apriorístico). 13
As principais características dessa nova fase são:
a) Reconhecimento definitivo da força normativa da
constituição (Konrad Hesse): ideia de que a Constituição tem o
poder de conformar a realidade social.
b) Rematerialização das constituições: no Constitucionalismo
contemporâneo, as Constituições são mais semelhantes às
Constituições francesas do que à americana (que é concisa,
como visto acima), em termos de assuntos tratados. Os fatores
de origem do fenômeno de rematerialização foram as
experiências autoritárias ocorridas na América e na Europa
(ditaduras militares da América Latina e Regimes totalitários da
Europa). A ideia, então, foi constitucionalizar inúmeros
assuntos com o objetivo de mais proteger – proteção
qualificada – certos assuntos. As Constituições do segundo pós-
guerra (Constitucionalismo contemporâneo) são, em geral,
prolixas, tratando de vários temas e os especificando de
maneira mais pormenorizada.

ATENÇÃO! O Constitucionalismo contemporâneo é visto por alguns autores como


uma amálgama das experiências francesa e americana. A ideia de rematerialização
é inspirada na experiência francesa. A força normativa da Constituição é uma clara
influência da Constituição americana.
c) Centralidade da Constituição e dos Direitos Fundamentais,
o que acarreta:
i) consagração de normas de outros ramos do direito no texto
das constituições;
ii) filtragem constitucional, ou seja, interpretação das normas
de outros ramos do direito à luz da Constituição;
iii) eficácia horizontal dos direitos fundamentais (eficácia dos
direitos fundamentais não somente nas relações particular-
Estado, mas também nas relações entre particulares);
iv) fortalecimento do Poder Judiciário e da jurisdição
constitucional, o que tem causado o fenômeno chamado
“judicialização da política e das relações sociais”.
d) Maior abertura da interpretação e aplicação da
Constituição.

APROFUNDANDO: Além dessas características principais, identifica-se no


Constitucionalismo contemporâneo a presença de normas programáticas de
conteúdo social (normas que estabelecem um programa de Estado de conteúdo
social), o que, segundo a doutrina majoritária, acarreta os seguintes fenômenos
constitucionais:
- Totalitarismo Constitucional - Refere-se à existência de textos 14
constitucionais amplos, extensos e analíticos, que encarceram
temas próprios da legislação ordinária.
- Dirigismo Comunitário - Refere-se à capacidade do texto
constitucional de fixar regras para dirigir as ações
governamentais.
- Constitucionalismo Globalizado - Refere-se à busca da
expansão e da proteção dos direitos humanos mundialmente.
- Direitos de segunda e terceira dimensão.

Destaca-se que o movimento do Constitucionalismo contemporâneo está


relacionado ao surgimento dos direitos fundamentais de terceira dimensão, ligados à
fraternidade ou solidariedade.
Tratam-se de direitos transindividuais, de titularidade difusa ou coletiva, por
exemplo: direito ao desenvolvimento ou progresso, autodeterminação dos povos,
meio ambiente, comunicação, propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade.

F. Constitucionalismo do Futuro (José Roberto Dromi)

Para o autor, o Constitucionalismo deve buscar consolidar os direitos de


fraternidade e solidariedade. Baseia-se na esperança de dias melhores da evolução
humana e no encontro do ponto de equilíbrio entre as concepções do
constitucionalismo moderno e os excessos do constitucionalismo contemporâneo.
Características da Teoria do Constitucionalismo do Futuro - São
características que as Constituições devem observar:
- Verdade (crítica às normas programáticas) - Determina que a
Constituição somente poderá prever aquilo que é possível ser
atingido.
- Solidariedade - Refere-se à igualdade sedimentada na
solidariedade entre os povos, na dignidade e na justiça social.
- Consenso (democrático) - A Constituição do futuro deve ser
fruto de consenso democrático.
- Continuidade - Ao se reformar uma Constituição, não pode
haver um abandono dos direitos já conquistados.
- Participação - Refere-se à efetiva participação dos corpos
intermediários da sociedade, consagrando-se a noção de
democracia participativa e de Estado Democrático de Direito.
- Integração (órgãos supranacionais) - Trata-se da previsão de
órgãos supranacionais para a implementação de uma
integração espiritual, moral, ética e institucional entre os povos
(“transnacionalização dos povos”).
- Universalidade (dignidade da pessoa humana) - Consagra os 15
direitos fundamentais internacionais nas Constituições futuras,
fazendo prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana
de maneira universal e afastando, assim, qualquer forma de
desumanização.

G. Constitucionalismo abusivo

O conceito de Constitucionalismo abusivo não se relaciona com o movimento


de limitação do poder do Estado, ora estudado, mas é uma classificação doutrinária
que merece nossa atenção, especialmente por já ter sido citada pelo STF.
Constitucionalismo abusivo é uma expressão cunhada por David Landau e que
pode ser conceituada como o uso de institutos de origem constitucional para ceifar a
democracia.
Trata-se de um fenômeno caracterizado pela edição de atos normativos com
aparência de legalidade, mas que provocam retrocessos democráticos, a exemplo de
atos que concentram poderes no chefe do Executivo, retiram a transparência,
impedem mecanismos de controle social e diminuem a esfera de atuação da sociedade
civil organizada.
Modernamente, a maioria dos regimes autoritários ou semiautoritários foram
instalados a partir de medidas pontuais, aparentemente válidas do ponto de vista
formal, mas que, em conjunto e progressivamente, corroem a tutela de direitos e
neutralizam outras instâncias de controle e deliberação política.
Em outras palavras, ao contrário dos golpes autoritários experimentados no
século passado (ex.: ditaduras latino-americanas), fala-se, atualmente, em engenhosos
“golpes institucionais”, efetivados por meio do uso abusivo de mecanismos
constitucionais.
A expressão “Constitucionalismo abusivo” foi utilizada pelo Ministro Roberto
Barroso na concessão da medida liminar na ADPF 622, que suspendeu dispositivos do
decreto do Executivo que, na prática, esvaziavam a participação da sociedade civil
junto ao Conselho Nacional da Criança e do adolescente - CONANDA.

1.3. NEOCONSTITUCIONALISMO

De início, vale destacar que o termo “Neoconstitucionalismo” não tem sentido


único (alguns doutrinadores identificam, inclusive, como sinônimo de
Constitucionalismo contemporâneo).
Tratam-se, em verdade, de “Neoconstitucionalismos”, no plural, em alusão à
obra do jurista Miguel Carbonell. Nesse material, contudo, traçamos algumas diretrizes
gerais do fenômeno, com enfoque especial no que é mais cobrado em provas.
A ideia geral é a Constituição como centro do sistema. A CF passa a ser uma
norma jurídica dotada de imperatividade e superioridade (deixa de ser apenas uma
16
carta política). Busca-se, dentro dessa nova realidade, não mais apenas atrelar o
Constitucionalismo à ideia de limitação do poder político, mas, acima de tudo, busca-
se a eficácia da Constituição, deixando o texto de ter um caráter meramente retórico e
passando a ser mais efetivo, especialmente diante da expectativa de concretização dos
direitos fundamentais.
O Neoconstitucionalismo possui como principais características, as seguintes:
1) Positivação e concretização de um catálogo de direitos
fundamentais;
2) Onipresença dos princípios e das regras;
3) Inovações hermenêuticas. O formalismo jurídico e a
aplicação automática da lei são substituídos por novos cânones
interpretativos, pela argumentação jurídica e pela ponderação;
4) Densificação da força normativa do Estado; e
5) Desenvolvimento da Justiça Distributiva.
Para o Neoconstitucionalismo, a CF possui uma carga valorativa (axiológica)
fundamentada na dignidade da pessoa humana e nos direitos fundamentais. Assim,
não se fala apenas em uma simples hierarquia entre a CF, mas sim em uma
ponderação de valores entre suas próprias regras e princípios.
Dessa forma, a CF possui efeito irradiante em relação aos poderes e mesmo
aos particulares. Assim, seus efeitos se aplicam a todos os poderes e às relações entre
particulares (eficácia horizontal).
De acordo com Luís Roberto Barroso, o Neoconstitucionalismo possui os
seguintes marcos fundamentais:

- Marco Histórico – Teve seu início depois do pós-guerra, com o


destaque das Constituições escritas. Dessa forma, foi um
momento de redemocratização e de efetivação do Estado
Constitucional de Direito.
- Marco Filosófico - Teve como marco o Pós-positivismo. Assim,
não era suficiente a simples implementação da norma. Esta
deveria ser aplicada e efetivamente cumprida. Com isso, houve
o desenvolvimento das ideias de direitos fundamentais e uma
busca pelo direito mais próximo da ética. Dessa forma,
buscou-se uma concretização dos direitos previstos nas
Constituições. A doutrina aponta que o pós-positivismo foi o
fundamento filosófico de reaproximação entre o Direito e a
Moral.
- Marco Teórico - Teve como fundamento as ideias de:
i) Força Normativa da CF, especialmente a partir dos estudos de
Konrad Hesse (buscou-se o seu cumprimento forçado, sua
imperatividade);
ii) Expansão da jurisdição constitucional (supremacia da CF); e 17
iii) Nova Dogmática de interpretação da CF (voltada para a
implementação de valores e de uma interpretação das normas
conforme a Constituição).

ATENÇÃO! Neoconstitucionalismo NÃO é sinônimo de pós-positivismo. O pós-


positivismo é apenas o marco filosófico do Neoconstitucionalismo (conforme Luis
Roberto Barroso).

O Neoconstitucionalismo pode ser resumido, então, como uma nova


perspectiva de olhar e discutir o direito (em suas dimensões ontológica,
fenomenológica e epistemológica), fundada na força invasiva geral da Constituição e
na centralidade jurídica da tutela dos direitos fundamentais.
Destacam-se, assim, dois conceitos:
- Constitucionalização-inclusão: inclusão na Constituição de
temas anteriormente não tratados, com a incorporação de
valores e opções políticas nos textos constitucionais, como a
tutela do meio ambiente e do consumidor;
- Constitucionalização-releitura: impregnação de todo o
ordenamento jurídico pelos valores constitucionais. Técnica da
interpretação conforme a Constituição e da filtragem
constitucional do direito.
Verifica-se uma tendência à chamada judicialização da política e das relações
sociais, de forma que o Poder Judiciário é chamado a intervir, ainda que de maneira
excepcional, para sanar a omissão dos outros poderes, atuando na concretização de
direitos e princípios constitucionais.
Em outras palavras, é como se ao clássico princípio da separação dos poderes
fosse agregada uma interpretação mais flexível, capaz de transpor os rígidos limites da
tradição francesa e admitir o controle jurisdicional de políticas públicas de caráter
fundamental.

• Críticas ao Neoconstitucionalismo

Para fins de provas, especialmente de primeira fase, o mais importante é


compreender o conceito de Neoconstitucionalismo e sua influência na jurisdição
constitucional.
Sabe-se, contudo, que alguns excessos interpretativos geraram críticas
doutrinárias, notadamente por fundamentarem um “ativismo” judicial exacerbado.
Daniel Sarmento aponta as principais críticas ao Neoconstitucionalismo como
sendo:
(a) a de que seu pendor judicialista é antidemocrático. Com
efeito, como o Poder Judiciário não é submetido diretamente à
18
soberania popular, por meio do voto, haveria uma espécie de
“déficit” democrático no que tange à concretização de direitos
fundamentais pela via judicial.
(b) a de que sua preferência por princípios e ponderação, em
detrimento de regras de subsunção, é perigosa, sobretudo no
Brasil, em função de singularidades de nossa cultura.

No ponto, destaco que a Lei 13.655/2018 acrescentou o art. 20 à Lei de


Introdução às Normas do Direito Brasileiro, in verbis:
Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não
se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que
sejam consideradas as consequências práticas da decisão.

A lei consagrou o chamado princípio da responsabilidade decisória, que


obriga o julgador a avaliar, na motivação, as consequências práticas de sua decisão,
notadamente de natureza econômica, em aproximação à teoria da análise econômica
do direito, de tradição norte-americana.
A ideia é evitar decisões meramente retóricas, que aplicam valores jurídicos
abstratos sem analisar os fatos e seus impactos. Devem ser ponderados, assim, os
efeitos sistemáticos de determinado entendimento judicial, com vocação expansiva
diante de inúmeros casos semelhantes.
A novidade legislativa foi interpretada como uma tentativa de mitigação da
força normativa dos princípios e de frear o ativismo judicial.

(c) a de que ele pode gerar uma panconstitucionalização do


Direito, em detrimento da autonomia pública do cidadão e da
autonomia privada do indivíduo. Com efeito, uma atuação
desenfreada na “microjustiça” (justiça do caso concreto) pode
comprometer a fruição de direitos e a correta alocação de
recursos públicos.

ATENÇÃO! A perspectiva crítica ao Neoconstitucionalismo deve ser abordada em


provas apenas se expressamente perguntada ou direcionada.

• Transconstitucionalismo (Marcelo Neves)

Em aprofundamento doutrinário, especialmente para as provas mais


avançadas do concurso, traço a seguir linhas gerais sobre o conceito de
“Transconstitucionalismo”.
Neoconstitucionalismo não se confunde com Transconstitucionalismo. 19
Transconstitucionalismo é o fenômeno pelo qual diversas ordens jurídicas de
um mesmo Estado ou de Estados diferentes se entrelaçam para resolver problemas
constitucionais. O componente novo não é o entrelaçamento entre a pluralidade de
ordenamentos, mas o modo como são travadas as conversações.
É inevitável o fenômeno da “globalização do Direito constitucional”, que não
propugna uma Constituição global ou internacional, mas propõe uma “globalização do
direito constitucional doméstico”.
Não se confunde com Constitucionalismo transnacional, que propugna a
criação de uma Constituição internacional, como forma de solução dos problemas
decorrentes da globalização, ou seja, o Direito Constitucional doméstico estaria
hierarquicamente vinculado a uma Constituição global, nas questões comuns aos
Estados envolvidos.
No Brasil, o principal autor que trata sobre Constitucionalismo é o professor
Marcelo Neves. Ele explica que o conceito de Transconstitucionalismo não tem nada a
ver com o conceito de Constitucionalismo internacional, transnacional, supranacional,
estatal ou local. O conceito está relacionado à existência de problemas jurídico-
constitucionais que perpassam às distintas ordens jurídicas, sendo comuns a todas
elas, como, por exemplo, os problemas associados aos direitos humanos (“questões
transconstitucionais”).
O Transconstitucionalismo propõe, assim, a existência de Constituições que
dialogam entre si, não como precedente, mas como autoridade persuasiva (o que o
autor denomina de “fertilização constitucional cruzada” ou “relação transversal
permanente”).
Um exemplo prático, na jurisprudência brasileira, do diálogo entre
Constituições foi o reconhecimento do “Estado de Coisas Inconstitucional”
relativamente às prisões brasileiras, instituto originário da Corte Constitucional
Colombiana (STF. Plenário. ADPF 347 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em
9/9/2015). Outro exemplo foi a utilização do precedente argentino (caso “Verbitsy”)
como um dos argumentos para legitimar o cabimento de habeas corpus coletivo,
mesmo sem previsão legal expressa (HC 143641).

• Multiculturalismo (Boaventura de Souza Santos)

Os conceitos acima tratados (Neoconstitucionalismo, transconstitucionalismo)


também não podem ser confundidos com o fenômeno do multiculturalismo trazido
por Boaventura de Souza Santos.
Em síntese, o autor propõe uma verdadeira “fuga para o Sul” no âmbito da
teoria constitucional, objetivando a construção de um novo Constitucionalismo latino-
americano, por meio do que denomina “hermenêutica diatópica”.
A tônica do autor é a “descolonização do Direito Constitucional”,
especialmente nos países sul-americanos, por intermédio do diálogo intercultural, do
enfoque nos valores dos povos tradicionais, da concepção mestiça de direitos e da 20
valorização da participação democrática.

1.4. CONSTITUCIONALISMO E SOBERANIA POPULAR

A Constituição Federal de 1988 dispõe que todo poder emana do povo, que o
exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição. Dessa forma, a titularidade do poder é do povo, podendo seu exercício se
dar de forma direta ou indireta.
A CF prevê como regra a Democracia Indireta (representativa), que é
exercida pelos representantes eleitos pelo voto popular.
Contudo, há mecanismos de exercício da Democracia Direta previstos
constitucionalmente, que possibilitam o exercício do poder diretamente pelo povo.
São estes: o referendo, o plebiscito, a iniciativa popular e a ação popular.
Confiram a previsão contida no art. 14 do texto constitucional:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio
universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para
todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular.”
1.4.1. PLEBISCITO

Regulado pela Lei 9.709/98, o plebiscito é uma consulta prévia à população,


convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo,
pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido.
O plebiscito deve ser convocado por Decreto-Legislativo editado pelo
Congresso Nacional por proposta de no mínimo 1/3 de qualquer das casas.
A votação se dá por maioria simples e não passa por sanção do Presidente
(matéria exclusiva do Congresso, conforme art. 49, XV, da CF).
A doutrina diverge sobre a vinculação do Congresso à decisão do plebiscito.
Segundo Ayres Britto:
“O resultado do plebiscito não vincula o poder legislativo. E, de
fato, não vincula porque o Poder Legislativo não pode ser
obrigado a legislar. É diferente do Poder Judiciário, que é
obrigado a julgar. Enquanto no referendo quem dá a última
palavra é a população, a eficácia fica dependendo da aprovação,
no plebiscito, é diferente. O povo dá a primeira palavra, mas a
última é do parlamento”.
São exemplos de PLEBISCITO realizados no Brasil, sob a égide da Constituição
de 88: o plebiscito para escolha entre a forma de governo (República/Monarquia) e o
sistema de governo (Presidencialismo/Parlamentarismo) (1993) - Art. 2º do ADCT; o 21
plebiscito no Estado do Pará para decidir sobre a formação dos Estados de Carajás e do
Tapajós (2011).

1.4.2. REFERENDO

Também regulado pela Lei 9.709/98, o referendo é uma consulta posterior


que confirma uma decisão já tomada, devendo ser autorizado por Decreto-Legislativo
editado pelo Congresso (art. 49, XV, da CF) por proposta de no mínimo 1/3 de
qualquer das casas.
A votação se dá por maioria simples e não passa por sanção do Presidente
(matéria exclusiva do Congresso).
São exemplos de REFERENDO realizados no Brasil, sob a égide da Constituição
de 88: o referendo para a manifestação do eleitorado sobre a manutenção ou rejeição
da proibição da comercialização de armas de fogo e munição (2005) - Lei 10.826/2003
- Estatuto do Desarmamento; o referendo no Estado do Acre para decidir sobre o fuso
horário (2010).
1.4.3. INICIATIVA POPULAR

A iniciativa popular se dá por meio de projeto de lei encaminhado


diretamente pelo povo para seus representantes, também regulada pela Lei 9.709/98.
Fundamento:
- Lei Federal - art. 61, § 2º, da CF;
- Lei Estadual e Distrital - art. 27, § 4º, da CF; e
- Lei Municipal - art. 29, XIII, da CF.

Procedimento para Lei Federal - O projeto deve ser encaminhado para a


Câmera dos Deputados, por 1% do eleitorado nacional, distribuído em 5 Estados e em
cada um desses estados por 0,3% dos seus eleitores.

ATENÇÃO! DICA para memorização: número 1503.


1% do eleitorado, distribuído em 5 Estados, com 0,3% do eleitorado em cada um deles.

- Limitação de Assunto - art. 13, § 1º, da Lei nº 9.079/98 - O


projeto de iniciativa popular deve circunscrever-se a somente
um assunto.
22
- Impossibilidade de Vício de Forma - art. 13, § 2º, da Lei nº
9.079/98 - O projeto não poderá ser rejeitado por vício de
forma. A Câmara dos Deputados irá corrigi-lo formalmente.
Ressalta-se que em matéria de iniciativa reservada não cabe
iniciativa popular.
- Início do Processo de Votação e Vinculação - A casa iniciadora
é sempre a Câmara e o Senado é a casa revisora. A Câmara ou o
Senado não são obrigados a aprovar o projeto e o Presidente
pode vetá-lo. Dessa forma, o projeto não vincula o legislativo
nem o executivo.

Procedimento Estadual - A iniciativa estadual e distrital será definida pela


Lei. Normalmente, elas vêm utilizando simetria e aplicando o percentual 1% da mesma
forma que a Lei Federal. Entretanto, seria razoável flexibilizar esse valor.
Procedimento Municipal - No âmbito municipal o projeto deve ser subscrito
por no mínimo 5% do eleitorado municipal (art. 29, XIII, da CF).
OBSERVAÇÕES FINAIS:
PEC de Iniciativa Popular - O §2º do art. 60 da Constituição Federal não prevê
a possibilidade de PEC de iniciativa popular.
Pedro Lenza entende que, embora a Carta Política não tenha admitido de
forma expressa a iniciativa popular para PEC, tal situação é perfeitamente cabível. O
doutrinador em questão valeu-se da interpretação sistemática, fundamentando que o
art. 1º, parágrafo único, da CF, permite o exercício do poder de forma direta pelo
próprio povo, além de que o art. 14, III, da CF, estabelece que a soberania popular será
exercida mediante a iniciativa popular. Tal opinião também é comungada por José
Afonso da Silva, embora se trate de tema que divide a doutrina, sendo opinião
doutrinária minoritária.
Nesse sentido, muitas Constituições Estaduais permitem a propositura de
emenda à Constituição por iniciativa popular, o que foi considerado compatível com a
Constituição Federal, conforme recente julgado do Supremo Tribunal Federal:
“A iniciativa popular de emenda à Constituição Estadual é
compatível com a Constituição Federal, encontrando
fundamento no art. 1º, parágrafo único, no art. 14, II e III e no
art. 49, XV, da CF/88. Embora a Constituição Federal não
autorize proposta de iniciativa popular para emendas ao
próprio texto, mas apenas para normas infraconstitucionais,
não há impedimento para que as Constituições Estaduais
prevejam a possibilidade, ampliando a competência constante
da Carta Federal”.
STF. Plenário. ADI 825/AP, Rel. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 25/10/2018. 23
O julgado, frisa-se, refere-se à compatibilidade de dispositivo de Constituição
Estadual, que prevê PEC de iniciativa popular, com a Constituição Federal. Ainda não
houve o enfrentamento do tema quanto à possibilidade de emenda à própria
Constituição Federal por meio de iniciativa popular. Assim, atenção para o objeto de
eventual questionamento: se a questão se refere à literalidade da Constituição
Federal ou ao entendimento jurisprudencial/doutrinário específico.
Objeto da Iniciativa Popular - A iniciativa popular pode ser aplicada nas
seguintes espécies normativas do art. 59 da CF:
- PEC - Há controvérsia doutrinária, havendo precedente
admitindo para Constituição Estadual, como visto acima;
- LC e LO - Previsão expressa no art. 61, caput, da CF;
- Leis Delegadas - Não cabe, pois a competência é do Presidente;
- Medidas Provisórias - Não cabe, pois a competência é do
Presidente;
- Decretos Legislativos - Não cabe, pois a competência é do
Congresso Nacional;
- Resoluções - Não cabe, pois a competência é privativa do
Senado ou da Câmara.
Exemplos de leis decorrentes de iniciativa popular:
- Projeto do Fundo Nacional para a Moradia Popular - Lei
11.124/2005 - Foi de iniciativa popular;
- Lei da Ficha Limpa - LC 135/2010 - Foi de iniciativa popular

1.5. CONCEITO, CLASSIFICAÇÃO E ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO

1.5.1. CONCEITOS DE CONSTITUIÇÃO


A. Concepções de constituição (doutrina clássica)

São inúmeras as classificações das Constituições. Neste material, vou me ater


às mais cobradas em provas, especialmente considerando o perfil do concurso da
Magistratura.
Sentido Sociológico - Ferdinand Lassale - A Constituição deve refletir as forças
sociais, sob pena de ser apenas uma “simples folha de papel” (sem valor). Dessa forma,
a Constituição é a somatória dos fatores reais do poder (forças econômicas, sociais,
políticas, religiosas), dentro de uma sociedade.
Sentido Político - Carl Schmitt - A Constituição é o documento que determina
as normas fundamentais e estruturais do Estado. A Constituição é decisão política
fundamental do titular do poder constituinte (teoria decisionista ou voluntarista). A
24
validade da Constituição, nesse sentido, basear-se-ia na decisão política que lhe dá
existência.
Dessa forma, as normas presentes na Constituição que não tratam da
estruturação e dos fundamentos do Estado são apenas uma lei constitucional, mas não
uma Constituição propriamente dita.
Este sentido se aproxima do conceito material de Constituição, que determina
que Constituição é aquilo que tem matéria de Constituição. Entretanto, o Brasil adota
o sentido formal, ou seja, aquilo que está na CF é Constituição, independentemente de
seu conteúdo.
APROFUNDANDO:
Atualmente, conforme parte da doutrina, o Brasil caminha para
um critério misto, assim, depende da forma e da matéria.
Isto ocorreu com a equiparação dos tratados internacionais
sobre direitos humanos aprovados com o quórum de emenda
(art. 5º, § 3º, da CF). Ex.: Decreto Legislativo 186/2008 e
Decreto 6.949/2009 - Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência e o seu protocolo facultativo (NY em 30 de
março de 2007).
Os tratados de direitos humanos aprovados antes da emenda
45 e aqueles não aprovados pelo quórum de emenda
constitucional têm caráter supralegal (Pacto de São José da
Costa Rica). Quaisquer outros tratados que tratem de matéria
diferente de direitos humanos têm natureza de lei ordinária.

Sentido Jurídico - Hans Kelsen - Esse autor aloca a Constituição no mundo do


“dever ser”, e não no mundo do “ser”, caracterizando-a como fruto da vontade
racional do homem. Para ele, o sistema normativo está organizado em uma pirâmide,
assim, cada norma busca sua validade na norma imediatamente superior. Dessa forma,
a concepção de Kelsen toma a Constituição em dois sentidos:
- Plano Lógico-jurídico (plano suposto) - Existência de uma
norma fundamental hipotética (plano da norma suposta). Essa
norma é o fundamento lógico transcendental da validade da
norma posta ou positivada.
- Plano Jurídico-positivo - Existência de norma posta,
positivada. A Constituição é a norma positivada suprema, que
serve para regular a criação de todas as outras.

Em resumo, para Kelsen, criador da Teoria Pura do Direito, a validade da


Constituição não se apoia na realidade social do Estado. O fundamento de validade da
Constituição está na norma hipotética fundamental, que é norma posta, pressuposta,
imaginada.
É como se Kelsen fizesse um “corte epistemológico” em sua teoria: cada 25
norma inferior retira seu fundamento de validade da norma imediatamente superior,
em um sistema escalonado de normas, até a Constituição. Ex.: o decreto regulamentar
retira seu fundamento de validade da lei que retira seu fundamento de validade da
Constituição, topo da pirâmide. E a Constituição, retira seu fundamento de onde? Da
norma hipotética fundamental, que estaria no campo da política e, portanto, não
interessaria ao Direito (Teoria Pura do Direito).
APROFUNDANDO:
A professora Flávia Piovesan sustenta o abandono do sistema
piramidal de Kelsen para a adoção de um sistema em formato
de trapézio. Nesse sistema, a Constituição divide o “topo” com
os tratados internacionais de direitos humanos (Human Rights
Approach).

Sentido Culturalístico - J. H. Meirelles Teixeira - Nessa acepção, a


Constituição é produto de um fato cultural produzido pela sociedade e que sobre ela
pode influir. A Constituição decorre de uma formação objetiva de cultura, incluindo
aspectos econômicos, sociológicos, jurídicos e filosóficos. Segundo o autor, esse
conceito conduz a uma Constituição total, a fim de abranger o seu conceito em uma
perspectiva unitária. Em resumo, para lembrar dessa classificação: “Constituição
condicionada e condicionante da cultura”.
Contraposta à Constituição unitária está a ideia de Constituição aberta. Esta é
a Constituição que permite uma constante atualização por meio de um processo de
interpretação (hermenêutica). Dessa forma, a Constituição evolui para evitar o
desmoronamento da sua força normativa (mutação constitucional - processo informal
de mudança interpretativa).

ATENÇÃO! MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL.


Deriva do chamado “Poder Constituinte Derivado Difuso”. É possibilidade de
alteração informal do texto constitucional (mutação constitucional) de acordo
com a evolução histórica, política e social da comunidade. Em outras palavras, o
texto da Constituição permanece o mesmo, não houve emenda ou revisão
constitucional, mas a norma resultante de sua interpretação se alterou ao longo
do tempo.
Segundo o STF, três situações legitimam a mutação constitucional:
i) mudança na percepção do direito;
ii) modificação da realidade fática;
iii) consequência prática negativa de determinada linha de entendimento.
Exemplo de mutação constitucional, fruto do poder constituinte derivado difuso,
foi o novo entendimento dado ao art. 52, X, da Constituição Federal. Atualmente,
entende-se que quando o STF declara uma lei inconstitucional, ainda que em
controle difuso, a decisão tem efeito erga omnes e vinculante, cabendo ao Senado
Federal apenas dar publicidade à decisão (ADI 3406/RJ e ADI 3470/RJ). 26
Segundo Barroso, para que seja legítima, a mutação precisa ter lastro democrático, isto é,
deve corresponder a uma demanda social efetiva por parte da coletividade, estando
respaldada, portanto, pela soberania popular.

Constitucionalização Simbólica - Marcelo Neves – O Professor Marcelo Neves


alerta para o fato de que, na atividade legiferante, muitas vezes, há o predomínio da
função simbólica (ideológica, moral e cultural) sobre a função jurídico-instrumental
(força normativa), gerando um déficit de concretização das normas constitucionais. A
legislação simbólica se tipifica de acordo com um modelo tricotômico (Harald
Kindermann):
1) Confirmação dos Valores Sociais - Refere-se à vitória de um
determinado grupo social em relação a outro segmento social
conflitante (ex.: protestantes e católicos quanto à Lei Seca nos
EUA). Dessa forma, o grupo prestigiado procura influenciar a
atividade legiferante, fazendo prevalecer os seus valores contra
os do grupo adversário. É uma espécie de “superioridade social”
a partir das vitórias legislativas.
2) Demonstrar a Capacidade de Ação do Estado - Tem o
objetivo de assegurar confiança nos sistemas jurídico e político.
Configura-se por meio da chamada “legislação álibi” (são
respostas rápidas do governo diante de uma insatisfação da
sociedade, com pouca possibilidade de serem efetivas).
- Esta prática pode levar a sociedade a uma descrença no
sistema jurídico.
- Na CF, as normas programáticas podem ser consideradas
como “legislação álibi”, sendo o MI e a ADO um meio de
implementar essas normas.
3) Adiar a solução de conflitos sociais por meio de
compromissos dilatórios - A legislação busca conformar partes
conflitantes (lei aparentemente progressista), mas não acaba
com o conflito, apenas o envia para o futuro (compromissos
dilatórios).

Como base nessas premissas, Marcelo Neves define Constituição como uma
via de prestações recíprocas, um mecanismo de interpenetração entre política e
direito.
Atenção para mais uma classificação:
1) Constituição simbólica em sentido negativo: o texto
constitucional, de forma geral, não seria suficientemente
concretizado normativo-juridicamente de forma generalizada.
2) Constituição simbólica em sentido positivo: a atividade
constituinte e a linguagem constitucional desempenhariam
relevante papel político-ideológico, servindo para encobrir 27
conflitos e problemas sociais.

B. Outras concepções de constituição (UADI LAMMEGO BULOS)

As concepções de Constituição vistas no item anterior são as mais cobradas


em provas.
Contudo, importante atentar também para os seguintes conceitos que podem
ser cobrados em provas com maior aprofundamento doutrinário, e também em fases
mais avançadas do concurso.
Concepção jusnaturalista: A Constituição é concebida à luz dos princípios do
direito natural, principalmente no que concerne aos direitos humanos fundamentais.
Concepção positivista (Jellinek): A Constituição é o conjunto de normas
emanadas do poder do Estado, positivadas pela ação do homem, independentemente
de qualquer outro critério metajurídico.
Concepção marxista: A Constituição é o produto da superestrutura ideológica
condicionada pela infraestrutura econômica. É o exemplo de Constituição balanço, que
registra os estágios da relação de poder, ou seja, a cada passo da evolução, haverá
uma nova Constituição. É um conceito inverso da Constituição-garantia ou
Constituição-moldura.
Concepção compromissória: É aquela que reflete a pluralidade de forças
políticas e sociais, típica de uma sociedade plural e complexa e de conflitos profundos.
O procedimento constituinte envolve um tumultuado jogo de correntes divergentes,
mas que ao fim encontram o “compromisso constitucional”.
IMPORTANTE! Concepção suave ou dúctil (Zagrebelsky): É aquela que não
contém exageros, não fazendo promessas baseadas na demagogia política, porque
tem ambição de ser efetivamente realizada. As palavras chaves são equilíbrio e
moderação. Constituição-garantia é o principal modelo. Reflete o pluralismo social,
político e econômico.
As Constituições dúcteis veiculam conteúdos tendencialmente contraditórios
entre si, sem que se lhes possa traçar uma hierarquia rigorosa. Pelo contrário, eles
devem ser assim preservados, de modo a conceder ampla margem à configuração
legislativa, além de abertos a possíveis ponderações judiciais. Assim, estabelecem-se
mútuas relações entre legislador e juiz, política e justiça.
Constituição em branco: É aquela que não consagra limitações explícitas ao
poder de reforma constitucional. O processo de sua mudança subordina-se à
discricionariedade dos órgãos revisores. Um exemplo são as Constituições fixas.
Constituição plástica (Raul Machado Horta): É aquela que apresenta uma
mobilidade, projetando sua força normativa na realidade social, política, econômica e
cultural do Estado. Revela uma maleabilidade que permite a adequação de suas
normas. Tanto as cartas rígidas como as flexíveis podem ser plásticas, já que a
possibilidade de adequação nada tem a ver com o procedimento de reforma. O seu
quid caracterizador é sempre a adaptação das normas constitucionais às oscilações
da vida real. Interligam-se profundamente com o fenômeno da mutação 28
constitucional.
Constituição como ordem material e aberta da comunidade (Hesse): As
Constituições devem criar fundamentos e normatizar os princípios diretores da
unidade política do Estado, regulando o processo de solução de conflitos da
comunidade historicamente construídos. Possui, nesse viés, um conteúdo vago,
impreciso, aberto e material, que deve se adaptar às necessidades do tempo,
garantindo o exercício das liberdades. O texto aberto, atuando diretamente na
realidade social, atribui à Constituição efetividade e força normativa.
Liga-se ao conceito de “sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”,
que pressupõe que todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que
vive com este contexto é, indireta ou até mesmo diretamente, intérprete dessa norma.
Em outras palavras, o destinatário da norma também é participante ativo do processo
hermenêutico, não sendo monopólio dos intérpretes jurídicos.
Constituição dirigente (Canotilho): A Constituição dirigente considera que os
problemas econômicos, sociais e científicos são, simultaneamente, problemas
constitucionais suscetíveis de conformação e resolução por meio de decisões político-
constitucionais vinculativas das decisões tomadas pelo poder político, reconhecendo o
caráter de impulso e incentivo ao bloco normativo-programático contemplado em seu
texto. Contempla definição programático-constitucional dos fins e tarefas do Estado
que não elimina o poder de conformação da maioria simples em que eventualmente
se apoia um governo, nem impede a renovação da direção política e a confrontação
pluripartidária. Por essa razão, enseja a dedução de pretensões à legislação e o
correspondente direito de ação perante os tribunais, que, todavia, não resultam na
substituição do juiz ao legislador com a consequente emanação judicial de uma norma
nem pela correção incidental da omissão legislativa. O objetivo, portanto, é dirigir a
ação governamental do Estado a partir de um programa de ação. A Constituição é o
“estatuto jurídico político”, que adota uma filosofia de ação normativa para o Estado e
sociedade. Por traçar diretrizes para a atuação estatal, a constituição-dirigente está
relacionada às chamadas normas programáticas e aos direitos fundamentais de
segunda geração/dimensão, que exigem atuação positiva do Estado.
Constituições subconstitucionais ou subconstituições (Kruger): As
Constituições são programas de integração e representação nacionais, que devem
entrar na consciência dos cidadãos. E por isso, somente devem trazer aquilo que
interessa à sociedade como um todo. O totalitarismo constitucional incha a
constituição e foge do sentido exato da palavra. O autor explica que o excesso de
normas constitucionais forma as subconstituições, que podem ser definidas como
conjunto de normas que, mesmo elevadas formalmente ao patamar constitucional,
são limitadas nos seus objetivos e na sua efetividade. Revelam uma espécie de
“constituição necessidade” preocupada com problemas momentâneos.
Constituição como documento regulador do sistema político (Luhmann): A
Constituição é instrumento que serve para reduzir a complexidade do sistema político,
buscando uma reflexão de funcionalidade do direito. Não basta analisar o vínculo de
conformidade das leis com a constituição – juízos de constitucionalidade – sendo
necessário que a constituição funcione como campo de contingência de autofixação do
sistema político.
Constituição como processo público (Haberle): A Constituição é o documento
29
fundamental de uma sociedade pluralista e aberta, obra de vários partícipes. A
Constituição é uma ordem fragmentária, passível de interpretação e descontínua. É o
reflexo de um processo interpretativo aberto e conduzido à luz da força normativa da
publicidade.
Constituição.com (crowdsourcing): É o projeto que conta com a opinião
maciça dos usuários da internet, permitindo maior participação popular, consciência
dos temas constitucionais e o princípio da transparência. A primeira foi a Carta
Islandesa.

1.5.2. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES

O tema foi abordado na última prova objetiva da PCSP!

Quanto à Origem:
a) Promulgadas - São as Constituições que têm origem
democrática. Alguns chamam de votada ou popular (ex.: CF
1891; 1934; 1946; e 1988). Elaboradas por uma assembleia
nacional constituinte em nome do povo, pelo povo e para o
povo.
b) Outorgadas - São aquelas que foram impostas de maneira
unilateral por um agente revolucionário, assim não recebem
legitimidade popular (ex.: CF 1824, 1937, 1967 e emenda 1/69).
c) Cesaristas - Existe uma autorização popular por meio de
plebiscito ou referendo, mas o texto da Constituição é forçado
por um poder ditatorial (ex.: plebiscito napoleônicos e de
Pinochet no Chile). Também chamadas de napoleônicas ou
bonapartistas.
d) Pactuadas - Estas decorrem de um pacto entre os vários
titulares de poder (ex.: Magna Carta de 1215 na Inglaterra -
Decorreu de um pacto entre Realeza e Burguesia).

Quanto à Forma:
a) Escritas (instrumentalizada) - São aquelas sedimentadas em
documentos solenes, formais (ex.: CF 1988). Em algumas
Constituições escritas existe uma grande influência dos
costumes, como nos EUA. Podem ser codificadas ou legais.
b) Não escritas - Estas não trazem regras em um único texto
solene e codificado. É formada por textos esparsos,
reconhecidos pela sociedade como fundamentais. Além disso,
baseiam-se nos usos, costumes, jurisprudência e convenções
(ex.: Constituição Inglesa).
30

Quanto à Extensão:
a) Sintéticas (concisas, breves, sumárias, sucintas, básicas) - O
texto da Constituição é principiológico e não se funda em
detalhes. Esta espécie de Constituição tem maior manutenção
do texto no ordenamento (ex.: EUA).
b) Analíticas (amplas, extensas, largas) - O texto da
Constituição é minucioso. Esta espécie de Constituição está
sujeita a uma maior modificação dada a evolução social (ex.: CF
1988).

Quanto ao Modo de Elaboração:


a) Dogmáticas - Estas se fundam nos grandes dogmas que são
sedimentados no texto escrito (ex.: CF 1988). São escritas,
elaboradas por um órgão constituído para esta finalidade,
segundo os dogmas e valores então em voga.
b) Históricas - São formadas por um processo lento e contínuo
ao longo do tempo, reunindo a história e as tradições de um
povo. Obs.: as Constituições históricas são juridicamente
flexíveis, mas normalmente são política e socialmente rígidas.
Quanto à Alterabilidade (mutabilidade ou estabilidade):
a) Rígidas - Estas são alteradas por um processo mais solene e
mais dificultoso que o processo de alteração das demais
espécies normativas infraconstitucionais (ex.: CF de 1988 - art.
60). Segundo o STF, a Constituição de 1988 é considerada rígida.
Obs.: A Constituição rígida é sempre escrita, mas a recíproca
não é verdadeira.
b) Flexíveis - Estas são alteradas por um processo igual ao das
espécies normativas infraconstitucionais. Dessa forma, a
Constituição tem a mesma hierarquia da lei. Nesse caso, não
existe controle de constitucionalidade, pois um dos
pressupostos do controle de constitucionalidade é justamente
a rigidez constitucional.
c) Superrígidas - Estas são alteradas por um processo mais
solene e mais dificultoso que o processo de alteração das
demais espécies normativas infraconstitucionais. Além disso,
possuem um núcleo duro imutável (alguns autores afirmam
que a CF de 1988 é superrígida).
d) Semirrígidas ou semiflexíveis - Estas Constituições possuem
processo diferenciado para algumas normas e processo comum
para outras (CF de 1824 - art. 178).
e) Fixas (silenciosas) - Kildare - Estas somente podem ser 31
alteradas por um procedimento igual ao que as criou (ex.:
Estatuto do Reino da Sardenha de 1948 e Carta Espanhola). São
consideradas silenciosas, pois não mencionam sua forma de
alteração.
f) Transitoriamente Flexíveis - São aquelas que durante um
período são flexíveis e depois se tornam rígidas (ex.: Carta
Irlandesa de 1937).
g) Imutáveis (permanentes, graníticas) - Aquelas que
pretendem ser inalteráveis e eternas (são apenas históricas).

Quanto à Sistemática (Pinto Ferreira):


a) Reduzidas (unitárias) - São aquelas que se materializam por
meio de um só código básico (ex.: CF de 1988).
- Paulo Bonavides as chama de “Codificadas”.
b) Variadas - São aquelas que se materializam por meio de
textos esparsos (ex.: Inglesa).
- Paulo Bonavides as chama de “Legais” ou “Escritas não
formais”.
Quanto à Dogmática (Paulino Jacques):
a) Ortodoxas - São aquelas formadas por uma só ideologia (ex.:
URSS de 1977).
b) Ecléticas/heterodoxas - São aquelas formadas pela
conciliação de várias ideologias (ex.: CF de 1988).
- Segundo Canotilho, é aqui que reside o caráter
compromissório da CF. Este se evidencia na busca pela
conciliação entre ideologias diferentes (ex.: Liberalismo vs.
Estado Social).
IMPORTANTE! Quanto à Essência (Loewenstein) ou correspondência com a
realidade política e social (classificação ontológica):
a) Normativas - O processo de poder está de tal forma
disciplinado que as relações políticas e os agentes do poder
subordinam-se às determinações do seu conteúdo e do seu
controle procedimental (espera-se do texto 1988).
b) Nominalistas (ou nominais) - Contêm disposições de
limitações e controle de dominação política, sem ressonância
na sistemática de processo real de poder, e com insuficiente
concretização constitucional.
c) Semânticas - São simples reflexos da realidade política,
servindo como mero instrumento dos donos do poder e das 32
elites políticas, sem limitação do seu conteúdo (texto de 1937 e
1967).
- Marcelo Neves prefere a expressão instrumentalista.

Quanto ao Sistema (Diogo de Figueiredo Moreira Neto):


a) Principiológicas - Prevalecem os princípios, identificados
como normas constitucionais providas de alto grau de
abstração, consagradores de valores, pelo que é necessária a
mediação concretizadora (ex.: CF de 1988).
b) Preceituais - Prevalecem as regras individualizadoras de
princípios, pelo que é possível a aplicação coercitiva (ex.:
Constituição mexicana).

Classificação de Manoel Gonçalves F. Filho:


a) Garantia - Estas buscam garantir a liberdade limitando o
poder (ex.: CF de 1988). O objetivo da Constituição-garantia é
proteger as liberdades públicas contra a arbitrariedade do
Estado (correspondem ao primeiro período de surgimento dos
direitos humanos).
b) Balanço - Estas fazem um balanço de tempos em tempos da
evolução socialista (ex.: URSS). A Constituição-balanço visa
reger o ordenamento durante um certo tempo. Transcorrido
esse prazo, é elaborada uma nova Constituição e seu texto é
adaptado. Também chamada de Constituição-registro.
c) Dirigente - Estas são compostas por normas programáticas
(planos e programas a serem cumpridos) - (ex.: CF de 1988).
- Possui inspiração Marxista, ou seja, preza por um “ideal a ser
concretizado”.

Classificação de Ramos Tavares - Quanto ao Conteúdo Ideológico:


a) Liberais (negativas) - Surgem com o triunfo das ideologias
burguesas (ideias liberais). Dessa forma, privilegiam direitos de
primeira dimensão. São, assim, Constituições negativas
(absenteísmo estatal).
b) Sociais (dirigentes) - São ligadas ao Estado Social de Direito
(ex.: CF 1988). Consagram atuações sociais do Estado.
Privilegiam direitos de segunda dimensão.

Teoria de Raul Machado Horta - Expansividade da Constituição - A


expansividade da CF de 1988, em função dos temas novos e da ampliação conferida a
temas permanentes, como no caso dos direitos e garantias fundamentais, pode ser
aferida em três planos distintos: 33
a) Conteúdo anatômico e estrutural da CF (anatomia) -
Expansiva é aquela que está bem dividida em capítulos, títulos
etc.
b) Comparação constitucional interna - Considera as
Constituições brasileiras precedentes, considerando a extensão
de cada uma e as suas alterações. A CF de 1988 comparada
com as outras brasileiras é expansiva.
c) Comparação constitucional externa - Considera as
Constituições internacionais. A CF de 1988 comparada com
outras internacionais também é expansiva.

Outras classificações:
a) Constituição-lei: tem status de lei ordinária.
b) Constituição-fundamento: liberdade do legislador é apenas
dar efetividade às normas constitucionais.
c) Constituição-quadro/constituição-moldura: legislador só
pode atuar dentro de determinado espaço estabelecido pelo
poder constituinte. Cabe à jurisdição constitucional verificar se
esses limites foram obedecidos.
1.5.3. ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO

Definição - São critérios de classificação das normas de José Afonso da Silva.


Buscam agrupar as normas que tenham a mesma origem e a mesma finalidade.
Segundo o autor, a CF tem uma natureza polifacética, pois possui normas que
apresentam valores distintos.
Elementos Orgânicos - São normas que regulam a estrutura do Estado e do
Poder. Ex.: Título III - Organização do Estado; Título IV - Organização dos poderes.
Elementos Limitativos - São normas que estabelecem direitos e garantias
fundamentais limitadores dos poderes estatais. Ex.: Título II - Dos Direitos e Garantias
Fundamentais (excetuando-se os direitos sociais).
Elementos Socioideológicos - Revelam o compromisso da Constituição entre
o Estado Individualista e o Estado Social Intervencionista. Ex.: Capítulo II do Título II -
Dos Direitos Sociais; Título VII - Da Ordem Econômica e Financeira.
Elementos de Estabilização - Normas que definem mecanismos de
estabilização diante de crises. São destinadas a solucionar conflitos e buscam a defesa
da CF, do Estado e das Instituições Democráticas. Ex.: Art. 102, I, “a”, da CF - ADIN; Art.
34 a 36 da CF - Da Intervenção nos Estados e Municípios.
Elementos Formais de Aplicabilidade - Referem-se às normas de aplicação da
Constituição. Ex.: Preâmbulo, ADCT, Art. 5º, § 1º, da CF.
34
1.6. ESTRUTURA DAS CONSTITUIÇÕES

1.6.1. PREÂMBULO

O preâmbulo é a parte que antecede o texto constitucional e define as


intenções do legislador constituinte, sintetizando a ideologia do poder constituinte.
Serve de integração e orienta a interpretação.
O preâmbulo, embora parte integrante da Constituição, com a mesma origem
dos demais dispositivos constitucionais, costuma ser diferenciado por sua eficácia e
papel desempenhado.
De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), por ser
destituído de valor normativo e força cogente, o preâmbulo não pode ser invocado
como parâmetro para o controle de constitucionalidade de leis e atos normativos.
Vejamos:
“Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central.
Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de
reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo
força normativa.” (grifo nosso)
[ADI 2.076, rel. min. Carlos Velloso, j. 15-8-2002, P, DJ de 8-8-
2003.]
Segundo o STF, o preâmbulo não tem caráter vinculante, situando-se no
âmbito da política. Adota-se, portanto, a teoria da irrelevância jurídica do preâmbulo.

1.6.2. PARTE DOGMÁTICA

É o texto constitucional propriamente dito, o corpo permanente da Constituição.

1.6.3. PARTE TRANSITÓRIA

A parte transitória visa a integrar a ordem jurídica antiga à nova. É


formalmente constitucional, embora no texto da Constituição apresente numeração
apartada. Assim como a parte dogmática, pode servir de paradigma para o controle de
constitucionalidade.

1.7. NORMAS CONSTITUCIONAIS PROGRAMÁTICAS

Luis Roberto Barroso destaca que, com o surgimento do Estado


intervencionista e a consequente introdução de normas de cunho social na
Constituição, foram estabelecidos direitos a serem concretizados no presente, que são 35
os denominados direitos sociais. Contemplaram-se, também, certos interesses, de
caráter prospectivo, orientadores de posições, desde logo observáveis, e foram
implantadas projeções de comportamentos, a serem efetivadas de forma progressiva,
dentro das possibilidades do Estado e da sociedade. Surgiram, assim, as denominadas
normas programáticas. As normas programáticas destinam-se aos órgãos estatais com
a finalidade de fixar os programas que guiarão os poderes públicos, e relacionam-se à
concepção de Constituição Dirigente.
A norma constitucional programática possui eficácia limitada, necessitando de
um ato normativo para sua concretização (lei integrativa infraconstitucional) e para
produzir plenos efeitos. Contudo, mesmo tendo eficácia mediata, as normas
programáticas são dotadas de eficácia jurídica, uma vez que revogam as leis anteriores
com ela incompatíveis, condicionam a atuação da administração pública e a edição de
legislação futura, servem de vetores de interpretação e aplicação das demais leis pelo
Poder Judiciário etc.
Assim, apesar de não gerarem imediatamente um direito público subjetivo
para o indivíduo, as normas programáticas consagram um “direito subjetivo negativo”,
resultando na possibilidade de se exigir que o poder público se abstenha de praticar
atos que com elas colidam.
1.8. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

O tema foi abordado na última prova objetiva da PCSP!

A CF/88 consagra, no Título I, os Princípios Fundamentais da República


Federativa do Brasil, os quais estabelecem a forma, a estrutura e os fundamentos do
Estado brasileiro (CF, art. 1.º), a divisão dos poderes (CF, art. 2.º), os objetivos
primordiais a serem perseguidos (CF, art. 3.º) e as diretrizes a serem adotadas nas
relações internacionais (CF, art. 4.º).
A) Princípios Estruturantes:
CF, art. 1.º A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito (...).
Os princípios estruturantes constituem e indicam as diretrizes fundamentais
informadoras de toda a ordem constitucional. Assim, passaremos a analisar os
princípios estruturantes consagrados no caput do artigo 1º da Constituição da
República, os quais expressam as decisões políticas fundamentais do legislador
constituinte em relação à forma e à organização do Estado brasileiro.
i. Princípio republicano 36
No Brasil, a proclamação da República ocorreu em 15 de novembro de 1889,
resultando no fim do regime imperial. Como já visto, no âmbito constitucional, essa
forma de governo é inaugurada com o advento da Constituição de 1891, tendo todas
as posteriores cartas políticas brasileiras seguido o mesmo caminho.
A República (do latim res publica: “coisa do povo”) surgiu como uma forma de
governo em oposição à Monarquia, com a finalidade de retirar a concentração de
poder das mãos do Rei.
A República se caracteriza pelo caráter representativo dos governantes,
inclusive do Chefe de Estado (representatividade), pela necessidade de alternância no
poder (temporariedade ou alternância) e pela responsabilização política, civil e penal
de seus detentores (responsabilidade). A forma republicana de governo possibilita a
participação dos cidadãos, direta ou indiretamente, no governo e na administração
pública.
ii. Princípio federativo
A forma federativa de Estado tem sua origem a partir de um pacto celebrado
entre Estados que cedem sua soberania para o ente central e passam a ter autonomia
nos termos estabelecidos pela Constituição. Há, portanto, a incidência de mais de uma
esfera de poder sobre a população e dentro de um mesmo território.
O princípio federativo, que tem como núcleo essencial o respeito à autonomia
constitucionalmente conferida a cada ente integrante da federação, deve ser
observado tanto no âmbito de elaboração quanto no de aplicação das normas.
iii. Princípio da indissolubilidade do pacto federativo
O princípio da indissolubilidade do pacto federativo tem por finalidade
conciliar a descentralização do poder político com a preservação da unidade nacional.
Ao estabelecer que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel
dos Estados, Distrito Federal e Municípios, a Constituição veda, aos entes que
compõem a federação brasileira, o direito de secessão.
Caso ocorra tentativa de rompimento da unidade da federação brasileira, é
permitida a intervenção federal com o objetivo de manter a integridade nacional (CF,
art. 34, I).

OBSERVAÇÃO: a forma federativa de Estado é uma cláusula pétrea explícita,


prevista no inciso I do § 4º do artigo 60 da CF/88.

iv. Princípio do Estado democrático de direito


De acordo com a doutrina, a primeira institucionalização, com certo caráter
geral, do Estado de Direito ocorre com a Revolução Francesa. A limitação do Estado
pelo direito com distribuição das funções em órgãos distintos (separação dos poderes)
é um dos aspectos distintivos em relação ao modelo anterior.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, surge um novo modelo de Estado que
tem como notas distintivas a introdução de novos mecanismos de soberania popular, a 37
garantia jurisdicional da supremacia da Constituição, a busca pela efetividade dos
direitos fundamentais e ampliação do conceito de democracia. A tensão entre a nova
configuração do Constitucionalismo e o conceito meramente formal de democracia,
tradicionalmente associado às forças majoritárias, promove o desenvolvimento de
uma dimensão substancial da democracia, a fim de assegurar que os direitos
fundamentais sejam efetivamente usufruídos por todos, inclusive pelas minorias
perante a vontade majoritária.
A fim de destacar a mudança do paradigma de Estado, anteriormente,
associado à ideia de “império da lei” (Estado de direito), passa-se a ter na supremacia
da Constituição sua característica nuclear (Estado constitucional). No Estado
constitucional de direito, a Constituição é a norma mais elevada, não apenas sob o
ponto de vista formal, mas também substancial.
B) Fundamentos da República Federativa do Brasil:
CF, art. 1.º A República Federativa do Brasil (…) tem como
fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa;
V - o pluralismo político.
ATENÇÃO! DICA para memorização dos fundamentos: So-Ci-Di-Va-Plu.

Os fundamentos de um Estado devem ser compreendidos como os valores


essenciais que compõem sua estrutura. A consagração expressa da soberania, da
cidadania, da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa e do pluralismo político como fundamentos da República Federativa do Brasil
atribui a esses valores especial significado dentro de nossa ordem constitucional.
Os princípios nos quais esses fundamentos se materializam desempenham um
importante papel, seja de forma indireta, atuando como diretriz para a elaboração,
interpretação e aplicação de outras normas do ordenamento jurídico, seja de forma
direta, quando utilizados como razões para a decisão de um caso concreto.
i. Soberania
Atualmente, a soberania estatal passou a ser definida como um poder político
supremo e independente. Supremo, por não estar limitado por nenhum outro poder
na ordem interna (soberania interna); independente, por não estar submetido, na
ordem internacional, a regras que não sejam voluntariamente aceitas e por estar em
igualdade com os poderes supremos dos outros povos (soberania externa).
Vale ressaltar que o desenvolvimento dos meios de comunicação e de
informação, bem como a globalização política e econômica, fizeram com que o 38
conceito de soberania fosse flexibilizado, causando uma crise na delimitação deste
conceito e impondo sua reavaliação.
ii. Cidadania
A cidadania decorre do princípio do Estado Democrático de Direito e consiste
na participação política do indivíduo nos negócios do Estado e, até mesmo, em outras
áreas de interesse público.
iii. Dignidade da pessoa humana
Núcleo axiológico do Constitucionalismo contemporâneo, a dignidade da
pessoa humana é considerada o valor constitucional supremo e, enquanto tal, deve
servir, não apenas como razão para a decisão de casos concretos, mas principalmente
como diretriz para a elaboração, interpretação e aplicação das normas que compõem a
ordem jurídica.
O reconhecimento e a proteção da dignidade da pessoa humana pelas
Constituições em diversos países ocidentais tiveram aumento após a Segunda Guerra
Mundial, como forma de reação às práticas ocorridas durante o nazismo e o fascismo,
bem como durante as ditaduras ao redor do mundo.
O fato de a dignidade ter um caráter absoluto - isto é, não comportar
gradações no sentido de existirem pessoas com maior ou menor dignidade - não
significa que a dignidade humana seja um princípio absoluto. Apesar de ter um peso
elevado na ponderação, o seu cumprimento, assim como o de todos os demais
princípios, ocorre em diferentes graus, de acordo com as possibilidades fáticas e
jurídicas existentes.
É possível afirmar que a dignidade da pessoa humana, enquanto fundamento
da República Federativa do Brasil, possui tripla dimensão normativa:
i. atua como diretriz a ser observada na criação e interpretação
de outras normas;
ii. é um princípio que impõe aos poderes públicos o dever de
proteção da dignidade e de promoção dos valores, bens e
utilidades indispensáveis a uma vida digna; e
iii. é uma regra, a qual determina o dever de respeito à
dignidade, seja pelo Estado, seja por terceiros.

Existe uma relação de mútua dependência entre a dignidade da pessoa


humana e os direitos fundamentais. A dignidade é o fundamento, a origem e o ponto
comum entre os direitos fundamentais, os quais são imprescindíveis para uma vida
digna.
Vale ressaltar que existe corrente doutrinária segundo a qual a dignidade da
pessoa humana não seria classificada como princípio, mas sim como postulado
normativo (metanorma), que serve para aplicação e interpretação geral de todo o
Direito. Em alguns julgados do STF, inclusive, verifica-se a adoção da expressão
“postulado da dignidade da pessoa humana”.
iv. Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa
Além do reconhecimento dos valores sociais do trabalho como um dos 39
fundamentos do Estado brasileiro, a Constituição também reconhece o trabalho como
um direito social fundamental (CF, art. 6º), conferindo uma extensa proteção aos
direitos dos trabalhadores (CF, arts. 7º ao 11). A consagração dos valores sociais do
trabalho impõe, ainda, ao Estado o dever de proteção das relações de trabalho contra
qualquer tipo de aviltamento ou exploração.
A livre iniciativa é um princípio básico do liberalismo econômico. Além de
fundamento da República Federativa do Brasil, a livre iniciativa está consagrada como
princípio informativo e fundante da ordem econômica (CF, art. 170), sendo
constitucionalmente “assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade
econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos
previstos em lei” (CF, art. 170, parágrafo único). A ordem econômica tem por
finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social
(CF, art. 170).
v. Pluralismo político
Consagrado na Constituição de 1988 como um dos fundamentos da República
Federativa do Brasil (CF, art. 1º , V), o pluralismo político, em sentido amplo,
compreende: o pluralismo econômico (economia de mercado; concorrência de
empresas entre si; setor público distinto do privado); o pluralismo político-partidário
(existência de vários partidos ou movimentos políticos que disputam entre si o poder
na sociedade) e o pluralismo ideológico (diversas orientações de pensamento; diversos
programas políticos e opinião pública não homogênea).
C) Objetivos Fundamentais (art. 3º)
CF, art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem,
raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação.

Diversamente dos fundamentos (art. 1º), que são valores estruturantes do


Estado brasileiro, os objetivos fundamentais consistem em algo a ser perseguido pelo
Estado na maior medida possível.
De acordo com o professor Novelino, “a construção de uma
sociedade justa e solidária (princípio da solidariedade) e a
busca pela redução das desigualdades sociais e regionais estão
associadas à concretização do princípio da igualdade, em seu
aspecto substancial (igualdade material). Nesse sentido,
legitimam a adoção de políticas afirmativas (ações afirmativas
ou discriminações positivas) por parte do Estado. A promoção 40
do bem de todos, sem quaisquer formas de preconceito e
discriminação, está diretamente relacionada à proteção e
promoção da dignidade da pessoa humana e ao respeito às
diferenças, como exigência do pluralismo. A erradicação da
pobreza é uma das muitas concretizações do princípio da
dignidade da pessoa humana, por estar indissociavelmente
relacionada à promoção de condições dignas de vida”.

Ainda, vale ressaltar que o rol de objetivos fundamentais constante do artigo


3º da Constituição é apenas exemplificativo.

ATENÇÃO! Dica para provas objetivas: observe que os objetivos fundamentais da


República iniciam-se com verbos, como “construir, garantir, etc.”.

D) Princípio da Separação dos Poderes:


CF, art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos
entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
No sistema de freios e contrapesos (checks and balances), a repartição
equilibrada dos poderes entre os diferentes órgãos é feita de modo que nenhum deles
possa ultrapassar os limites estabelecidos pela Constituição sem ser contido pelos
demais.
A Constituição de 1988, além de consagrar expressamente o princípio da
separação dos poderes (CF, art. 2º) e protegê-lo como cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4º,
III), estabeleceu atribuições de controle recíproco, de forma a garantir a independência
entre os Poderes, bem como evitar o abuso e o arbítrio por qualquer um deles.
Em regra, a aplicação do princípio em questão é casuística, sendo necessário
extrair da própria Constituição a marca essencial para fins de controle de
constitucionalidade.

E) Princípios a serem observados nas relações internacionais (art. 4º)


CF, art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas
relações internacionais pelos seguintes princípios:
I - independência nacional;
II - prevalência dos direitos humanos;
III - autodeterminação dos povos;
IV - não intervenção;
V - igualdade entre os Estados; 41
VI - defesa da paz;
VII - solução pacífica dos conflitos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX - cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade;
X - concessão de asilo político.
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a
integração econômica, política, social e cultural dos povos da
América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-
americana de nações.
José Afonso da Silva identifica quatro inspirações para este rol de princípios
que devem reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais: a de caráter
nacionalista, expressa nas ideias de independência nacional, de autodeterminação dos
povos, de não intervenção e de igualdade entre os Estados; a de caráter
internacionalista, revelada na determinação de prevalência dos direitos humanos e de
repúdio ao terrorismo e ao racismo; a de caráter pacifista, exteriorizada nos
dispositivos que determinam a defesa da paz, de solução pacífica dos conflitos e a
concessão de asilo político; e a de caráter comunitarista, observada nas ideias de
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e no estímulo à formação
de uma comunidade latino-americana de nações.
1.9. DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS

Conforme visto acima, a finalidade do ADCT é estabelecer regras de transição


entre o antigo ordenamento jurídico e o novo, instituído pela manifestação do poder
constituinte originário.
Por natureza, portanto, diante de sua eficácia temporária, após produzirem os
seus efeitos, ou diante do advento da condição ou termo estabelecidos, esgotam-se,
tornando-se normas de eficácia exaurida.
De acordo com o doutrinador Raul Machado Horta, "norma permanente nas
Disposições Transitórias é norma anômala”.

1.9.1. CLASSIFICAÇÃO DAS DISPOSIÇÕES DO ADCT

Raul Machado Horta identificou as seguintes categorias:


a) normas exauridas: aquelas que já desapareceram, em virtude
da realização da condição ou do ato nela previstos;
b) normas dependentes de legislação e de execução;
c) normas dotadas de duração temporária expressa. Ex.: art. 40
do ADCT, que manteve, por 25 anos, a partir da promulgação
da Constituição, a Zona Franca de Manaus (prazo esse
42
acrescido de 10 anos pela EC n. 42/2003);
d) normas de recepção. Ex.: art. 34, § 5º; art. 66 etc.;
e) normas sobre benefícios e direitos. Ex.: arts. 53 e 54.

Por sua vez, Luís Roberto Barroso, identificando espécies distintas de


disposições transitórias, estabeleceu três categorias:
a) disposições transitórias propriamente ditas: são as
disposições típicas que regulam de modo transitório
determinadas relações, estando sujeitas à condição resolutiva
ou termo.
b) disposições de efeitos instantâneos e definitivos: essas
disposições não aguardam uma condição ou um termo,
operando imediatamente ou no prazo estabelecido. Como
exemplo, temos o art. 13, caput, do ADCT, que criou o Estado
do Tocantins, ou o art. 15, que extinguiu o Território Federal de
Fernando de Noronha, reincorporando a sua área ao Estado de
Pernambuco;
c) disposições de efeitos diferidos: são aquelas que “sustam a
operatividade da norma constitucional por prazo determinado
ou até a ocorrência de um determinado evento”. Como
exemplo, temos o art. 5º, caput, do ADCT.
O ADCT tem natureza jurídica de norma constitucional e poderá, portanto,
trazer exceções às regras colocadas no corpo da Constituição.
As normas constantes do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
possuem a mesma hierarquia daquelas consagradas na parte permanente e podem ser
paradigma de controle de constitucionalidade concentrado.
Neste sentido:
“Como cediço, o preâmbulo da CF não pode servir de
parâmetro para o controle de constitucionalidade, ao passo
que as normas que compõem o Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, salvo as que tenham sua eficácia
exaurida, podem ser usadas como paradigma de controle em
razão de sua natureza de norma constitucional.” (STF, RE
215.107/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, j.
21/11/2006, p. DJ 02/02/2007)
Assim, em virtude de sua natureza constitucional, a alteração das normas do
ADCT ou o acréscimo de novas regras dependerão da manifestação do poder
constituinte derivado reformador, ou seja, necessariamente por meio de emendas
constitucionais que, por sua vez, deverão observar os limites ao poder de reforma.

43
2. QUESTÕES

1. A ressignificação das Constituições provocou deslocamentos importantes na


compreensão da ordem jurídica dos Estados democráticos de direito. Acerca do
impacto dessas transformações sobre o conceito de Constituição, assinale a opção
correta.
a) Segundo a doutrina pertinente, a Constituição normativa, ou jurídica, é aquela na
qual o processo político é regido pelas normas constitucionais, independentemente
das contingências históricas.
b) O neoconstitucionalismo importa a ampliação da eficácia irradiante dos direitos
fundamentais aos poderes públicos constituídos, porém, não aos particulares, cuja
autonomia se sobrepõe àqueles direitos.
c) Em sentido sociológico, a Constituição deve ser entendida como a norma que se
refere à decisão política estruturante da organização do Estado.
d) De acordo com o conceito de Constituição-moldura, o texto constitucional deve
apenas apresentar limites para a atividade legislativa, cabendo ao Poder Judiciário
avaliar se o legislador agiu conforme o modelo configurado pela Constituição.

2. O “constitucionalismo moderno”, com o modelo de Constituições normativas, tem


sua base histórica: 44
a) a partir das revoluções Americana e Francesa.
b) a partir da Magna Carta inglesa e no Bill of Rights da Inglaterra.
c) com o advento do “Estado Constitucional de Direito”, com uma Constituição rígida,
estabelecendo limites e deveres aos legisladores e administradores.
d) a partir das Constituições do México e de Weimar, ao estabelecer o denominado
“constitucionalismo social”.

3. A expressão “constitucionalização do Direito” tem, de modo geral, sua origem


identificada pela doutrina:
a) na Constituição Federal brasileira de 1988, com seu conteúdo analítico e casuístico.
b) nos julgamentos dos MI 712/PA, 670/ES e 708/DF, pelo Supremo Tribunal Federal,
alterando entendimento anterior para reconhecer sua competência para editar texto
normativo diante da omissão legislativa, a fim de concretizar previsão constitucional.
c) nos EUA, com o precedente firmado no julgamento do caso Marbury v. Madison, em
1803.
d) na Alemanha, especialmente sob a égide da Lei Fundamental de 1949.

4. Considerando os diferentes conceitos de Constituição, abordados sob a ótica


peculiar de diversos doutrinadores, analise as seguintes manifestações sobre o tema:
I. Constituição é a soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação.
II. Constituição é a decisão política fundamental sem a qual não se organiza ou funda
um Estado.
Assim, é correto afirmar que os conceitos I e II podem ser atribuídos,
respectivamente, a:
a) Ferdinand Lassale e Hans Kelsen.
b) Hans Kelsen e Konrad Hesse.
c) Konrad Hesse e Carl Schimitt.
d) J.J. Canotilho e Hans Kelsen
e) Ferdinand Lassale e Carl Schimitt.

5. Sobre o conceito de Constituição, assinale a alternativa CORRETA.


a) É o estatuto que regula as relações entre Estados soberanos.
b) É o conjunto de normas que regula os direitos e deveres de um povo.
c) É a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à
estruturação, à formação dos poderes públicos, direitos, garantias e deveres dos
cidadãos.
d) É a norma maior de um Estado, que regula os direitos e deveres de um povo nas
suas relações.
45
6. A respeito das constituições classificadas como semânticas, assinale a opção
correta.
a) São aquelas que se estruturam a partir da generalização congruente de expectativas
de comportamento.
b) São aquelas cujas normas dominam o processo político; e nelas ocorrem adaptação
e submissão do poder político à constituição escrita.
c) Funcionam como pressupostos da autonomia do direito; e nelas a normatividade
serve essencialmente à formação da constituição como instância reflexiva do sistema
jurídico.
d) São aquelas cujas normas são instrumentos para a estabilização e perpetuação do
controle do poder político pelos detentores do poder fático.
e) São aquelas cujo sentido das normas se reflete na realidade constitucional.

7. Assinale a alternativa correta a respeito da Constituição e do Constitucionalismo.


a) Nos Estados Unidos, diferentemente da França, a constituição americana deu pouca
relevância ao papel do juiz, dada a aversão à sua figura pelos revolucionários,
reduzindo a função do Judiciário a mero emissor da voz da lei.
b) A Constituição francesa de 1791 construiu um sistema fundado na supremacia do
legislativo, restando ao executivo a função de dispor dos meios aptos à aplicação da
lei.
c) O modelo de constitucionalismo praticado no mundo contemporâneo segue, nas
suas linhas gerais, o padrão que foi estabelecido pela Constituição francesa de 1791,
especialmente no que diz respeito à função do Judiciário.
d) A Constituição norte-americana de 1787 e a Constituição francesa de 1791 são os
dois marcos mais importantes do Neoconstitucionalismo.
e) Influenciada pela revolução francesa e pelas revoluções americanas, a Constituição
brasileira de 1824 continha importante rol de direitos civis e políticos, tendo adotado a
separação tripartite de Montesquieu na divisão e no exercício do poder político.

8. A concepção que compreende o texto da Constituição como não acabado nem


findo, mas como um conjunto de materiais de construção a partir dos quais a política
constitucional viabiliza a realização de princípios e valores da vida comunitária de
uma sociedade plural, caracteriza o conceito de Constituição:
a) em branco.
b) semântica.
c) simbólica.
d) dúctil.
e) dirigente.

9. Assinale a alternativa correta a respeito do constitucionalismo. 46


a) O constitucionalismo antigo teve início com a Magna Carta de 1215, não havendo
antes desse período indícios de experiências democráticas que contrastassem com os
poderes teocráticos ou monárquicos dominantes.
b) No constitucionalismo moderno, as Constituições de sintéticas passam a analíticas,
consagrando nos seus textos os chamados direitos econômicos e sociais, e a
democracia liberal-econômica dá lugar à democracia social, mediante a intervenção do
Estado na ordem econômica e social.
c) A transição da Monarquia Absolutista para o Estado Liberal, em especial na Europa,
no final do século XVIII, que traçou limitações formais ao poder político vigente à
época, é um marco do constitucionalismo moderno.
d) John Locke, Montesquieu e Rousseau são reconhecidos como os principais
precursores do constitucionalismo contemporâneo, em virtude de concepções
revolucionárias que defendiam a unificação e consagração dos ideais e valores
humanos universais.

10. O constitucionalismo representa uma série de movimentos históricos, culturais,


sociais e políticos cujo objetivo central é a limitação do poder estatal mediante o
estabelecimento de uma Constituição. Sobre a sua evolução histórica e caraterísticas,
é correto afirmar:
a) o constitucionalismo espartano foi marcado por uma organização política de base
civil e democrática, assim como Atenas, permitindo-se a ampla participação dos
cidadãos nos assuntos públicos da polis.
b) no Brasil, o denominado Constitucionalismo social teve início com a Constituição de
1946, a qual passou a consagrar não apenas os direitos sociais ao trabalho, educação e
previdenciário mas também defendeu a impossibilidade de exercício do direito de
propriedade contra o interesse coletivo ou social.
c) as Revoluções liberais do Século XVIII e início do Século XIX, promovidas na Europa
Ocidental, são fruto do denominado constitucionalismo moderno, e foram
caracterizadas, dentre outros elementos, pela consagração das liberdades individuais e
defesa da igualdade em sentido formal.
d) o constitucionalismo hebreu, identificado na fase medieval, era representado pela
conduta dos profetas, responsáveis pela verificação da compatibilidade dos atos do
poder público com o texto sagrado.
e) a Revolução Gloriosa instaurada na Inglaterra, no âmbito do desenvolvimento do
constitucionalismo moderno, contribuiu de maneira exponencial para o
desenvolvimento de variados aspectos do constitucionalismo contemporâneo,
destacando-se, dentre eles, a ideia de federalismo e também a visão da constituição
como um documento sagrado político.

11. Sobre as principais concepções a respeito da Teoria das Constituições, assinale a


alternativa correta.
47
a) Hans Kelsen defende a Constituição como uma decisão política fundamental, o que
traz como consequência a obrigação do Estado em respeitar o texto constitucional,
mas permitindo-lhe que, em situações excepcionais, deixe de atender a Lei
Constitucional.
b) José Joaquim Gomes Canotilho adota uma concepção jurídica sobre o sentido de
Constituição, aduzindo que o fundamento de validade de uma norma apenas pode ser
a validade de outra norma.
c) Konrad Hesse adota o denominado sentido sociológico da Constituição e aduz que,
para que possa obter eficácia normativa, é preciso que constituição escrita e
constituição real estejam alinhadas como única substância.
d) Peter Häberle adota uma visão da Constituição como um processo político, o que
conduz à afirmação de que a verdadeira constituição resulta de um processo
interpretativo conduzido à luz da publicidade.
e) Niklas Luhmann, sociólogo alemão, define a Constituição como importante
mecanismo de determinação Estatal direcionando-o num plano de transformação
social e implementação de política públicas na ordem socioeconômica, o que passou a
denominar de Constituição dirigente.
12. Sobre os enunciados contidos no preâmbulo da Constituição Federal de 1988,
assinale a afirmativa correta.
a) Não têm valor normativo, não podendo ser considerados na interpretação dos
dispositivos constitucionais, porque não é obrigatório.
b) Não têm valor normativo e somente podem ser considerados na interpretação dos
dispositivos constitucionais, se estes admitirem expressamente a interpretação.
c) Devem ser observados na interpretação das normas constitucionais, por se tratarem
de vetores adotados pela Constituição.
d) São promessas do legislador originário para o futuro, e não podem orientar a
interpretação, pois dependem da mudança gradativa do pensamento da sociedade.

13. No tocante ao neoconstitucionalismo, ao conceito de Constituição e às normas


constitucionais, assinale a opção correta.
a) O neoconstitucionalismo está associado a diversos fenômenos reciprocamente
implicados, seja no campo empírico, seja no plano da dogmática jurídica, como
reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e da separação entre o
direito e a moral.
b) A Constituição Federal de 1988 é considerada exemplo típico de constituição
compromissória, uma vez que, na constituinte, houve a atuação das mais diversas
forças políticas, inspiradas em diferentes ideologias.
c) Nas constituições flexíveis, o conflito entre a norma constitucional anterior e a lei
48
superveniente resolve-se não pelo critério hierárquico, mas pelo critério de
especialidade.
d) Prevalece a adoção da teoria da dupla revisão no sistema constitucional brasileiro.
e) No sentido sociológico, a constituição é entendida como a decisão política
fundamental do titular do poder constituinte.
3. GABARITO COMENTADO

1. D
(A) INCORRETA. Embora jurídica, a Constituição normativa não desconsidera as
contingências histórias, sendo um erro tal afirmação.
(B) INCORRETA. As relações entre particulares também sofreram alterações
decorrentes do neoconstitucionalismo e da centralidade atribuída aos direitos
fundamentais, no que a doutrina designa “eficácia horizontal dos direitos
fundamentais”, razão pela qual a assertiva é incorreta.
(C) INCORRETA. A afirmativa diz respeito ao sentido político da Constituição, conforme
teoria de Carl Schimitt.
(D) CORRETA. A alternativa D está correta, não havendo qualquer reparo a ser feito.

2. A
(A) CORRETA. O Constitucionalismo Moderno tem como marcos as Constituições
americanas (1787) e francesa (1791), sendo esta a afirmativa correta.
(B) INCORRETA. A Carta Magna (1215) inaugura o Constitucionalismo Medieval, razão
pela qual a alternativa está incorreta.
(C) INCORRETA. A assertiva trata de característica do neoconstitucionalismo, razão 49
pela qual a assertiva está incorreta.
(D) INCORRETA. O constitucionalismo social difere do constitucionalismo moderno
clássico, com marcos históricos distintos, razão pela qual a assertiva está incorreta.

3. D
A doutrina entende de forma majoritária que o marco inicial do processo de
constitucionalização do Direito foi estabelecido na Alemanha, com a Lei Fundamental
de 1949, que endossou desenvolvimentos doutrinários expressos na jurisprudência do
Tribunal Constitucional Federal, notadamente de proteção aos direitos fundamentais.

4. E
A questão, embora de baixa complexidade, exigiu sólidos conhecimentos a respeito de
teorias e seus autores, não desafiando aquele/a que estuda a parte doutrinária, pois
tomou como afirmação duas teorias bastante conhecidas de Ferdinand Lassale e Carl
Schimitt, que são cobradas de forma recorrente. Assim, a parte doutrinária não deve
ser negligenciada, já que a cobrança de questão muitas vezes exige conhecimentos
básicos, mas desconhecidas de quem não estuda de forma sistemática toda a matéria.
5. C
A alternativa C é a que melhor esboça a finalidade de uma Constituição de acordo com
o entendimento da doutrina majoritária, sendo certo que a Constituição de 1988
atende às finalidades precípuas descritas na assertiva, que não merece qualquer
reparo.

6. D
Inicialmente, o conceito mais conhecido de constituição semântica foi desenvolvido
por Karl Loewenstein, seguindo o critério ontológico, segundo o qual, nas palavras de
Bernardo Gonçalves Fernandes (Curso de direito constitucional, 7ª ed, Juspodivm,
2015, p. 51), As constituições semânticas são aquelas que traem o significado de
Constituição (do termo Constituição). Sem dúvida, Constituição, em sua essência, é e
deve ser entendida como limitação de poder. A Constituição semântica trai o conceito
de Constituição, pois ao invés de limitar o poder, legitima (naturaliza) práticas
autoritárias de poder. A Constituição semântica vem para legitimar o poder autoritário
(sendo, portanto, Constituições tipicamente autoritárias).
Portanto, se adotado tal critério de classificação, a resposta “D” é a que mais se
enquadra dentro do conceito trazido.
No entanto, outros conceitos foram desenvolvidos para o termo “constituições
semânticas”. Para alguns autores, são as constituições nas quais o texto não é dotado
de uma clareza e especificidade e que, portanto, não vão trabalhar apenas o método
gramatical, exigindo outros métodos de interpretação (ou outras posturas
50
interpretativas) (Bernardo Gonçalves Fernandes, Curso de direito constitucional, 7ª ed,
Juspodivm, 2015, p. 47).
Por fim, Canotilho conceitua tal espécie de Constituição, como sendo aquelas que
podem ser entendidas como Constituições fechadas de cunho meramente formal que
não consagram um conteúdo mínimo de justiça em termos materiais. Estas, para o
autor de Coimbra, diferenciam-se das Constituições normativas, que são aquelas
Constituições que trazem um conjunto de normas dotadas de bondade material que
garantem direitos e liberdades, bem como impõem limites aos poderes. (Bernardo
Gonçalves Fernandes, Curso de direito constitucional, 7ª ed, Juspodivm, 2015, p. 47).

7. B
(A) INCORRETA. Ao contrário! A aversão ao juiz está na França.
(B) CORRETA. Exato! A Constituição francesa de 1791 construiu um sistema fundado
na supremacia do Parlamento, restando ao executivo a função de dispor dos meios
aptos à aplicação da lei.
(C) INCORRETA. De jeito nenhum. No modelo francês, o Judiciário só diz o que a lei diz
(boca da lei) – impensável um controle judiciário das leis.
(D) INCORRETA. Aqui vigia o Constitucionalismo CLÁSSICO ou liberal! O
Neoconstitucionalismo vem após a 2ª Guerra Mundial.
(E) INCORRETA. A Constituição de 1824 adota a teoria dos 4 Poderes, incluindo o Real
ou Moderador (Benjamin Constant).
8. D
(A) INCORRETA. Em branco é a Constituição que NÃO veicula limitações explícitas ao
poder de reforma.
(B) INCORRETA. Semântica, dentro da classificação ontológica de Karl Loewenstein, é
aquela Constituição que está a serviço das classes dominantes, legitimando práticas
autoritárias de poder (trai seu escopo).
(C) INCORRETA. Simbólica (conceituação de Marcelo Neves) é aquela Constituição que
pretende não criar uma norma cogente, mas sim alcançar outros objetivos
(simbólicos).
(D) CORRETA. Conceito de Constituição dúctil, também conhecida como Constituição-
suave. Nas atuais sociedades, marcadas pela diversidade, a Constituição não pode ser
o ponto de partida, mas sim o de chegada; não deve ser um projeto predeterminado
de vida comunitária, cabendo-lhe apenas assegurar condições possíveis à vida comum
– tem de acompanhar a descentralização do Estado e refletir o pluralismo reinante.
(E) INCORRETA. Dirigente é a programática, isto é, estabelece um projeto para o
futuro. J. J. Gomes Canotilho assevera que a Constituição deve ser um plano que
direcionará a atuação do Estado, notadamente por meio das normas programáticas – a
Constituição passa a comandar a ação estatal e impor a realização de metas (não
substitui a política, mas se torna premissa material dela).

9. C 51
(A) INCORRETA. O constitucionalismo antigo possui raízes antes da Magna Carta de
1215, sendo citado por Pedro Lenza, em sua obra (Direito constitucional
esquematizado, 18ª ed., Saraiva, 2014, p.67), como exemplos o constitucionalismo
hebreu, estabelecendo-se no Estado teocrático limitações ao poder político ao
assegurar aos profetas a legitimidade para fiscalizar os atos governamentais que
extrapolassem os limites bíblicos (...), e das Cidades-Estados gregas como importante
exemplo de democracia constitucional.
(B) INCORRETA. Trata-se, em verdade, do Constitucionalismo contemporâneo do pós-
guerra.
(C) CORRETA.
(D) INCORRETA. Locke, Montesquieu e Rousseau são considerados principais
precursores do Constitucionalismo moderno, e não do contemporâneo.

10. C
(A) INCORRETA. O sentido de Constitucionalismo na Antiguidade era um sentido
eminentemente descritivo, não era um sentido normativo. Embora a pólis grega seja
de fato um embrião da democracia, com o julgamento de questões importantes pelo
povo, em praça pública (democracia direta), registre-se que nem todos eram
considerados cidadãos, sendo excluídos diversos estratos sociais da participação na
vida política. Outrossim, a aludida experiência se deu essencialmente em Atenas, e não
em Esparta. (Cláudio P. S. Neto e Daniel Sarmento - Direito constitucional - teoria,
história e métodos de trabalho).
(B) INCORRETA. De fato, a Constituição de 1946 estabeleceu a condicionante de
atendimento ao bem estar da sociedade em relação ao direito de propriedade, com
possibilidade de desapropriação por interesse social, contudo, a primeira Constituição
a registrar um compromisso social mais firme foi a de 1934, a qual rompeu com o
conceito essencialmente liberal que prevalecia nas Constituições anteriores e
introduziu elementos socioideológicos. Ex.: implementou a Justiça do Trabalho, a
Justiça Eleitoral, o voto secreto, o mandado de segurança, a ação popular, dentre
outros direitos individuais e sociais.
(C) CORRETA. A defesa das liberdades clássicas (direitos civis e políticos) e da igualdade
em sentido formal e a limitação do poder estatal compõem a tônica do
Constitucionalismo moderno. As Revoluções liberais da Europa, nesse contexto
histórico, buscavam a garantia da proteção do homem contra as arbitrariedades
estatais (abstenção estatal). Trata-se da construção de uma espécie de “círculo” em
volta do homem, composto pelas liberdades públicas e intransponível pelo Estado.
(D) INCORRETA. De fato, uma das características do Constitucionalismo hebreu reside
na circunstância de os profetas dotados de legitimidade popular no Estado Teocrático
fiscalizarem e punirem os atos dos governantes que ultrapassavam os limites bíblicos.
Ocorre que a assertiva o situa de forma cronologicamente equivocada, uma vez que
não se situa na época medieval, e sim na perspectiva do Constitucionalismo primitivo.
(E) INCORRETA. A Revolução Gloriosa promoveu a derrubada do absolutismo inglês,
que foi substituído pela monarquia parlamentar constitucional, sendo de fato uma
base importante para a afirmação do Constitucionalismo, porém não se previa um
modelo de estado federado.
52

11. D
(A) INCORRETA. A visão de Constituição como decisão política fundamental remete ao
autor Carl Schmmit. Na perspectiva jurídica (positivista) de Kelsen, a Constituição seria
a norma posicionada no topo do ordenamento jurídico e se apresentaria como
fundamento de validade de todas as outras normas ou outros atos normativos, daí
porque não se admite, na teoria de Kelsen, que se deixe de atender à Lei
Constitucional (na teoria Kelseana sequer é admitida a diferenciação entre
Constituição e Lei Constitucional).
(B) INCORRETA. Kelsen é quem trabalha o conceito jurídico de Constituição. Para
Canotilho, a Constituição deve ser vista em perspectiva dirigente, revelando um viés
social.
(C) INCORRETA. O conceito Sociológico de Constituição é fornecido por LASSALE. Para
HESSE, a Constituição por si só tem um sentido mais concreto, devido à sua força
normativa. Logo, na visão desse autor a Constituição não é só fato, norma e valor, e
sim resulta de uma síntese dialética desses 3 fatores, pois cada um deles interage com
os outros. Norma, fato e valor interagem, comunicam-se. Uma das funções da norma é
modificar a situação fática vigente em determinado contexto. O fato repercute sobre a
norma assim como a norma repercute sobre o fato. As normas visam a condicionar a
realidade social, mudar a situação fática.
(D) CORRETA. Na concepção de Haberle, a Constituição é o documento fundamental
de uma sociedade pluralista e aberta, obra de vários partícipes. A Constituição é uma
ordem fragmentária, passível de interpretação e descontínua. É o reflexo de um
processo interpretativo aberto e conduzido à luz da força normativa da publicidade.
(E) INCORRETA. A noção de Constitucionalismo dirigente remete à Canotilho. Para
Luhmann, a Constituição é documento regulador do sistema político, instrumento que
serve para reduzir a complexidade do sistema político, buscando uma reflexão de
funcionalidade do direito. Não basta analisar o vínculo de conformidade das leis com a
Constituição – juízos de constitucionalidade – sendo necessário que a Constituição
funcione como campo de contingência de autofixação do sistema político.

12. C
A banca considerou correta a seguinte assertiva: “Devem ser observados na
interpretação das normas constitucionais, por se tratarem de vetores adotados pela
Constituição”.
Entretanto, o STF adotou a tese da irrelevância jurídica do preâmbulo. Possuindo,
inclusive entendimento consolidado sobre a matéria:
O preâmbulo não se situa no âmbito do Direito, mas sim no domínio da política. Ele
apenas reflete a posição ideológica do constituinte. Desse modo, o preâmbulo não
possui relevância jurídica. Vale ressaltar, ainda, que o preâmbulo não constitui norma
central da Constituição, não sendo de reprodução obrigatória nas Constituições dos
Estados-membros. A invocação a Deus, presente no preâmbulo da CF/88, reflete um
53
sentimento religioso. Isso não faz, contudo, que o Brasil deixe de ser um Estado laico.
O Brasil é um Estado laico, ou seja, um Estado em que há liberdade de consciência e de
crença, onde ninguém é privado de direitos por motivo de crença religiosa ou
convicção filosófica. A invocação da proteção de Deus contida no preâmbulo da CF/88
não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo
força normativa. Se a Constituição estadual não tiver esta expressão, não há qualquer
inconstitucionalidade nisso. STF. Plenário. ADI 2076, Rel. Min. Carlos Velloso, julgado
em 15/08/2002.
Dessa forma, a equipe do MEGE indicou que a questão era passível de anulação. De
toda forma, trouxe a questão para fins de estudo e análise da forma como o conteúdo
é cobrado.

13. E
(A) INCORRETA. A assertiva se equivoca ao dizer que existe separação entre o direito
e a moral. O Neoconstitucionalismo é uma nova forma de se interpretar o Direito, que
aproximado da Moral, passa a contemplar juízos de valor com a finalidade de
preservar, garantir e promover os direitos fundamentais, que por estarem prescritos
em regras ou princípios constitucionais faz com que o Direito Constitucional se aloque
no centro do sistema jurídico irradiando sua forma normativa.
(B) CORRETA. Constituições pluralistas ou compromissórias são aquelas que possuem
normas inspiradas em ideologias diversas. Geralmente resultam de um compromisso
entre os diversos grupos participantes do momento constituinte.
(C) INCORRETA. A assertiva se equivoca ao dizer que nas Constituições flexíveis o
conflito entre a norma constitucional anterior e a lei superveniente resolve-se não
pelo critério hierárquico. Flexíveis são aquelas Constituições que não possuem um
processo legislativo de alteração mais dificultoso do que o processo legislativo de
alteração das normas infraconstitucionais. A dificuldade em alterar a Constituição é a
mesma encontrada para alterar uma lei que não é constitucional.
(D) INCORRETA. O Brasil não adotou a teoria da dupla revisão, sendo inclusive
entendido como uma limitação implícita ao poder de reforma constitucional.
(E) INCORRETA. No sentido sociológico, a Constituição, segundo a conceituação de
Lassalle, seria a somatória dos fatores reais do poder dentro de uma sociedade.

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