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1. NOTAS INTRODUTÓRIAS
Conforme doutrina desenvolvida por Pontes de Miranda e aceita por todo bom
doutrinador pátrio, a plena produção de efeitos do negócio jurídico está subordinada a
três planos (escada ponteana): a) existência; b) validade; c) eficácia. Para que o negócio
jurídico produza os efeitos pretendidos pelos agentes, é preciso que ele suba cada um
desses degraus.
O próprio Pontes de Miranda lecionou que “existir, valer e ser eficaz são conceitos
tão inconfundíveis que o fato jurídico pode ser, valer e não ser eficaz, ou ser, não valer e
ser eficaz (...) o que se não pode dar é valer e ser eficaz, ou valer, ou ser eficaz, sem ser;
porque não há validade, ou eficácia do que não é”1.
Plano da
Eficácia
Plano da
Validade
Plano da
Existência
1
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 4 ed. São Paulo: RT, 1974.
t. III, p. 15.
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2. PLANO DA EXISTÊNCIA
Reconhecidos apenas pela doutrina, os pressupostos de existência são elementos
fundamentais do negócio jurídico. Tratam-se dos requisitos mínimos para que o negócio
pelo menos exista (plano do “ser”), sem pensar ainda na qualidade deles ou na
existência de eventual vício ou defeito. Assim sendo, os elementos de existência são
identificados como substantivos não adjetivados: VOAF - “vontade”, “objeto”,
“agente” e “forma”.
Para que o negócio jurídico exista, é precisa que um agente (ou agentes) manifeste
sua vontade, de alguma forma (expressa ou tácita), em busca de determinado objeto
(material ou imaterial).
É curioso destacar que o Código Civil de 2002, assim como o seu antecessor, não
dispõe expressamente sobre o plano da existência, mas inicia a regulamentação dos
negócios jurídicos (art. 104) já tratando acerca da validade. Não obstante, a doutrina
reconhece a relevância deste plano, notadamente como causa de prejudicialidade dos
demais. Se não existe, não pode ser válido ou eficaz. A ausência de apenas um desses
elementos torna o negócio jurídico inexistente.
CC, Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja
feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o
destinatário tinha conhecimento.
2
Op. Cit., p. 433
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Fala-se em reserva mental quando um indivíduo manifesta a sua vontade através
de um negócio jurídico, mas sobre algo que não pretende cumprir, ou seja, um dos
declarantes oculta a sua verdadeira intenção, ele não quer o efeito que diz querer. De
acordo com Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery3, emite-se uma declaração de
vontade não querida em seu conteúdo (tampouco em seu resultado), tendo por único
objetivo enganar o declaratário.
3
NERY, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. São Paulo, RT, 2007, p.
297.
4
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CC, Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os
usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.
CC, Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita
ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça,
dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for
sujeita a encargo.
CC, Art. 1.807. O interessado em que o herdeiro declare se aceita, ou não, a
herança, poderá, vinte dias após aberta a sucessão, requerer ao juiz prazo
razoável, não maior de trinta dias, para, nele, se pronunciar o herdeiro, sob
pena de se haver a herança por aceita.
CC, Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o
pagamento do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em
trinta dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.
3. PLANO DA VALIDADE
Alcançado o degrau da existência, o próximo passo é cumprir os requisitos de
validade, estes apontados expressamente pela própria lei. Validade corresponde à
adequação do negócio jurídico ao ordenamento jurídico, razão pela qual, didaticamente
afirma-se que esse plano qualifica os elementos de existência. No degrau da existência
tínhamos apenas substantivos, agora, no degrau da validade tais substantivos são
adjetivados.
O ato existente deve passar por uma triagem quanto à sua regularidade, para
ingressar no plano da validade, quando então se verificará se está perfeito
ou se encontra eivado de algum vício ou defeito inviabilizante. O
preenchimento de certos requisitos fáticos, como a capacidade do agente, a
licitude do objeto e a forma prescrita em lei, é indispensável para o
reconhecimento da validade do ato. Mesmo a invalidade pressupõe como
essencial a existência do fato jurídico. Este pode, portanto, existir e não ser
válido.
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O artigo 4º do Código Civil, que também sofreu sensível alteração em razão do
Estatuto da Pessoa com Deficiência, atualmente enuncia que são relativamente
incapazes para certos atos da vida civil: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito
anos; II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III - aqueles que, por causa
transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV - os pródigos. Observe
que NÃO EXISTE QUALQUER MENÇÃO À DEFICIÊNCIA mental ou de qualquer outra
natureza como critério definidor da incapacidade. Para todos os efeitos, a pessoa com
deficiência passou a ser considerada, em regra, como plenamente capaz.
Por derradeiro, insta fazer menção aos artigos 105 e 180 do Código Civil. O
primeiro artigo determina que a incapacidade relativa de uma das partes não pode ser
invocada pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos co-interessados capazes,
salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum.
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Dessa forma, se imaginarmos a situação em que de um lado do negócio jurídico o
sujeito é capaz, mas do outro lado temos dois sujeitos, um deles capaz e o outro
relativamente incapaz, o negócio será anulado parcialmente. A anulação por
incapacidade não beneficia os cointeressados capazes.
Com relação ao artigo 180, uma importante regra que privilegia o princípio da boa-
fé objetiva. Dispõe o legislador que o menor, relativamente incapaz (maior de 16 e
menor de 18 anos), não pode arguir a incapacidade para eximir-se de cumprir uma
obrigação, quando dolosamente a ocultou da outra parte ou declarou-se maior. Nesse
caso, ainda que relativamente e sem assistente, o menor será responsabilizado
civilmente.
CC, Art. 105. A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser
invocada pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos co-
interessados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito
ou da obrigação comum.
CC, Art. 180. O menor, entre dezesseis e dezoito anos, não pode, para eximir-
se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando
inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.
Art. 4º CC
I - Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
RELATIVAMENTE II - Os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
INCAPAZES III - Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não
puderem exprimir sua vontade;
IV - Os pródigos.
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Incapacidade
Representação
Absoluta (Art. 3º)
Suprimento da
Incapacidade
Incapacidade Relativa
Assistência
(Art. 4º)
Incapacidade Nulidade
Absoluta (Art. 3º) (Art. 166, I)
Efeitos do ato
realizado sem
suprimento
Incapacidade Relativa Anulabilidade (Art.
(Art. 4º) 171, I)
Considera-se objeto lícito aquele que não atenta contra a lei, a moral e os bons
costumes. Nesse sentido são inválidos em razão da ilicitude do objeto, por exemplo, o
contrato de compra e venda de drogas; o ajuste de pagamento pelo assassinato de
alguém e etc.
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lícito. Neste caso, temos que é vedado a alienação da herança de pessoa viva (CC, art.
426); a alienação do bem de família convencional (CC, art. 1.717); e também a alienação
de bens fora do comércio ou gravados de inalienabilidade.
Perceba que não é tão fácil identificar a diferença entre objeto juridicamente
impossível e objeto ilícito. Por isso, nos valemos da dica do saudoso doutrinador,
Orlando Gomes, que assim leciona: o objeto juridicamente impossível é aquele que
simplesmente não é admitido por lei, e que se figurar no negócio jurídico causará apenas
a sua nulidade; diferentemente, o objeto ilícito é aquele proibido pela lei, de modo que
não causará apenas a nulidade do negócio jurídico, mas ensejará uma punição aos
agentes, vez que configurará uma contravenção penal ou crime.
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Reconhecendo a relevância do tema para o direito obrigacional, Luciano
Figueiredo e Roberto Figueiredo5 fazem um interessante paralelo entre parte geral e
parte especial do Código Civil. Senão, vejamos:
A forma deve ser prescrita ou não defesa em lei. Quanto a esse requisito, o nosso
ordenamento adotou o princípio da liberdade das formas, previsto no artigo 107 do
Código Civil, segundo o qual: “a validade da declaração de vontade não depende de
forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”.
Em regra, portanto, o negócio jurídico pode ser verbal ou escrito, por escritura
pública ou particular, com a presença de testemunhas ou não. A priori, nada disso
influencia a validade do negócio jurídico, embora possa dificultar a prova da sua
existência.
5
Op. Cit., p. 435
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nulidade absoluta. Conforme inteligência do artigo 166 do Código Civil, nos incisos IV e
V, é nulo o negócio jurídico quando “não revestir a forma prescrita em lei” ou “for
preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade”.
Além da lei, é possível que as próprias partes determinem, por manifestação livre
da vontade, que o negócio jurídico dependerá de forma, que se for inobservada também
implicará em nulidade absoluta. Assim dispõe o artigo 109 do Código Civil: “no negócio
jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, este é da
substância do ato”.
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vícios de consentimento (erro, dolo, coação, estado de perigo e lesão) e vícios sociais
(fraude contra credores e simulação).
4. PLANO DA EFICÁCIA
O terceiro plano do negócio jurídico é o da eficácia, onde os efeitos pretendidos
pelos agentes serão produzidos, ou seja, onde efetivamente o direito será criado,
modificado ou extinto em razão da relação jurídica. Dessa forma, por exemplo, o
contrato de compra e venda produz efeitos quando a propriedade do bem é transmitida
do vendedor para o comprador.
São três os elementos acidentais que podem impedir a produção imediata dos
efeitos do negócio jurídico, todos de natureza acessória e não essenciais: a) Condição;
b) Termo; c) Encargo.
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