CONSTITUCIONALISMO e
NEOCONSTITUCIONALISMO
Considerações Gerais e Peculiaridades
Versão Express
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 3
3. NEOCONSTITUCIONALISMO ................................................................................................... 5
3.1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................... 5
A doutrina de Karl Loewenstein2, aponta que entre os hebreus houve um tímido surgimento
de algo semelhante ao Constitucionalismo, estabelecido com base em um Estado teocrático, no
qual as limitações ao poder político advinham da legitimidade dos profetas para fiscalizar os
atos governamentais que extrapolassem os limites bíblicos.
Posteriormente, o mesmo autor cita como um segundo exemplo de Constitucionalismo
rudimentar a experiência das Cidades-Estados gregas, que adotaram uma “democracia
constitucional”, pois o modelo de democracia direta, particular a elas, consagrava o único
1 Lenza, Pedro, Dlreito constitucional esquematizado/ Pedro Lenza. – 21. ed. - São Paulo ; Saraiva, 2017.
(Coleção esquematizado), p. 64
2 Karl Loewenstein, Teoria de la Constitución, fl. 154/155.
exemplo conhecido de sistema político com plena identidade e entre governantes e governados,
no qual o poder político está igualmente distribuído entre todos os cidadãos ativos.
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2) A consecução (com o devido reconhecimento) de direitos e garantias
fundamentais (num primeiro momento, com a afirmação em termos pelo menos
formais da: igualdade, liberdade e propriedade de todos).
Nesse sentido, o constitucionalismo moderno (com seu intitulado conceito ocidental de
constituição) é também defensor de uma "dimensão histórico-constitucional" de viés inglês
(English Constitution) que se desenvolveu por meio de momentos constitucionais que incluem a
Petition of Rights, de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679 e o Bill of Rights de 1689, que
acabaram por sedimentar "dimensões estruturantes" de um Constitucionalismo ocidental.
3 Paulo, Vicente, 1968-Direito Constitucional descomplicado, Vicente Paulo, Marcelo Alexandrino. - 15. ed.
rev. e atual. - Rio de Janeiro: Forer.se; São Paulo: MÉTODO: 2016, fl. 2.
O conteúdo dessas primeiras Constituições escritas e rígidas, de orientação liberal, resumia-
se ao estabelecimento de regras acerca da organização do Estado, do exercício e transmissão do
poder e à limitação do poder do Estado, assegurada pela enumeração de direitos e garantias
fundamentais do indivíduo.
Nesse sentido, a concepção liberal (de valorização do indivíduo e afastamento do Estado)
gerará concentração de renda e exclusão social, fazendo com que o Estado passe a ser chamado
para evitar abusos e limitar o poder econômico. Surge daí o doutrina chamou de direitos de
segunda geração (ou dimensão) de direitos e que teve como documentos marcantes a
Constituição do México de 1917 e a de Weimar de 1919, influenciando, profundamente, a
Constituição brasileira de 1934 (Estado Social de Direito).
3. NEOCONSTITUCIONALISMO
3.1 INTRODUÇÃO
A tese da reserva do possível foi inicialmente abordada na década de 70, por ocasião do
julgamento do caso “numerus clausus” pela Corte Constitucional Alemã, que discutiu a limitação
do número de vagas nas universidades públicas daquele país.
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal tem erguido como óbice à aplicabilidade da
cláusula da reserva do possível o respeito ao mínimo existencial, entendido como o conjunto
de elementos fundamentais à dignidade da pessoa humana. É dizer que a tese fazendária não
tem sido acolhida, quando não demonstrada a satisfação do referido mínimo existencial.
Por essa razão, a tese da reserva do possível tem espaço quando o mínimo existencial foi
satisfeito, por meio de outras políticas públicas, menos gravosas ao Estado, mas
igualmente eficazes (ex.: caso da postulação de medicamentos que não constem na lista do
SUS, quando há no estoque outro avalizado pelo sistema).
Atendido o mínimo existencial, Ingo Sarlet anota que a tese da reserva do possível deve ser
acolhida, quando restarem comprovadas:
1) a impossibilidade fática de o Estado satisfazer materialmente o direito
prestacional exigido: inexistência de recursos financeiros para atender a
demanda;
2) a impossibilidade jurídica: inexistência de dotação orçamentária;
3) a desproporcionalidade da demanda: sendo possível ao Estado prestar o
direito por outros meios, não há motivos para que o faça pelo mais gravoso.
A cláusula da “reserva do possível” é endossada pela “teoria dos custos do direito” e pela
tese das “escolhas trágicas”, todas elas relacionadas a argumentos de ordem orçamentário-
financeira.
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3.5 TEORIA DOS CUSTOS DOS DIREITOS
A “teoria dos custos dos direitos”, pensada pelos autores Stephen Holmes e Cass
Sustein na obra “The cost of rigths” (“O custo dos direitos”), propõe uma análise econômica do
Direito. Segundo os autores, o direito nasce a partir de sua previsão orçamentária: antes
disso, não há direito a ser vindicado, pois o Estado não pode proteger direitos sem
recursos.
Assim, a jurisdição constitucional restaria limitada aos parâmetros orçamentários definidos
pelos poderes majoritários. Ou seja, fora das balizas referenciadas, não poderia o Poder Judiciário
agir, a pretexto de satisfazer direitos, pois, inexistindo recursos orçamentários para tanto, não
seria possível vincular a norma garantidora ao titular da faculdade reclamada.
A tese das “escolhas trágicas”, apresentada pelos autores Guido Calabresi e Philip Bobbit
na obra “Tragic Choices” (ou “Escolhas Trágicas”) exprime “o estado de tensão dialética entre a
necessidade estatal de tornar concretas e reais as ações e prestações de saúde em favor das
pessoas, de um lado; e as dificuldades governamentais de viabilizar a alocação de recursos
financeiros, sempre tão dramaticamente escassos, de outro” (Min. Celso de Mello, ARE 745.745
AgR/MG).
Em outras palavras, a tese mencionada revela ao intérprete o problema da escassez de
recursos, em face das múltiplas demandas sociais. Nesse sentido, cotidianamente o Judiciário
é chamado a decidir se, por exemplo, concede tratamento médico de R$ 100.000,00 (cem mil
reais) a um único paciente, ou preserva os referidos recursos para resguardar o tratamento de
outras cem pessoas. Eis o contexto das “escolhas trágicas”: alguém deverá sucumbir, bastando
ao poder público escolher quem.
Nesse ponto, retoma-se a ideia de ilegitimidade das decisões judiciais que não levam em
conta as suas consequências no mundo real. Demais disso, em um contexto de “escolhas
trágicas”, a atuação judicial não pode, a pretexto de realizar a justiça do caso concreto
(microjustiça), influir negativamente na distribuição de justiça social por meio de políticas públicas
coletivas (macrojustiça), definidas, ordinariamente, pelos Poderes majoritários.
Portanto, os princípios e regras que amparam o exercício da jurisdição constitucional em
tema de efetivação de políticas públicas, podem ser assim esquematizadas:
TESE AUTOR/ORIGEM CONTEÚDO
Caso “numerus clausus”, Respeitado o mínimo 10
julgado pela Corte existencial, a efetivação de
Reserva do possível Constitucional Alemã na direitos fundamentais positivos
década de 70, em que se depende da: 1) possibilidade
discutiu a limitação do número fática: existência de recursos
de vagas nas universidades financeiros; 2) possibilidade
públicas da Alemanha. jurídica: existência de previsão
orçamentária; 3) razoabilidade
da pretensão reclamada.
Stephen Holmes e Cass Análise econômica do Direito:
Sustein, na obra “The cost of os direitos condicionam-se à
Teoria dos custos dos Rights” ou “O custo dos previsão orçamentária de seus
direitos direitos”. custos. Em outras palavras,
apenas há direito, se houver
orçamento. Propõe a
adequação da atividade
jurisdicional aos parâmetros
TESE AUTOR/ORIGEM CONTEÚDO
orçamentários: fora deles, não
pode o Judiciário atuar na
implementação de políticas
públicas.
Guido Calabresi e Philip Apresenta o estado de
Bobbit, na obra “Tragic escassez de recursos, para
Escolhas trágicas Choices” ou “Escolhas satisfação de todas as
trágicas”. demandas sociais. Nesse
contexto, analisa quem deve
decidir sobre macrojustiça,
devendo-se apontar, para
tanto, os Poderes Executivo e
Legislativo, pois o Poder
Judiciário é vocacionado para
resolver casos concretos
(microjustiça).
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3.7 CRÍTICAS AO NEOCONSTITUCIONALISMO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
BRASILEIRO
Consignadas as limitações elencadas nos tópicos anteriores, vê-se, portanto, que o ativismo
judicial não pode descambar para o arbítrio judicial, que, a pretexto de imprimir juridicidade às
normas constitucionais, especialmente os princípios, finda por relegar a um segundo plano a
segurança jurídica e a democracia. Este o ponto de reverberação das críticas à recepção
distorcida do neoconstitucionalismo no Brasil. Os principais autores que cuidam do tema são
Daniel Sarmento, Humberto Ávila e Marcelo Neves.
Segundo Daniel Sarmento, “no Brasil, uma crítica que tem sido feita à recepção do
neoconstitucionalismo – eu mesmo a fiz em vários textos, bem como outros autores, como
Humberto Ávila e Marcelo Neves – é a de que ele tem dado ensejo ao excessivo arbítrio
judicial, através do que chamo de “carnavalização dos princípios constitucionais”. Os
princípios constitucionais, de teor mais vago, acabam servindo para tudo, no contexto de uma
cultura jurídica que vê como mais cult a sua invocação do que o recurso às regras legais. Com
frequência, tais princípios são empregados sem a devida fundamentação. Paga-se por isto um
preço caro em termos de SEGURANÇA JURÍDICA – já que as decisões judiciais se tornam
imprevisíveis – e de DEMOCRACIA – pois os cidadãos ficam sujeitos aos gostos e às
preferências de magistrados não eleitos. Além disso, no cenário de “cordialidade assimétrica” em
que vivemos, o recurso indiscriminado a princípios fluidos pode ser uma forma oblíqua de se
legitimar o uso do “jeitinho”, em favor dos amigos e dos mais poderosos. Estes, porém, são
problemas da recepção do neoconstitucionalismo em nossas práticas judiciais, e não da teoria
neoconstitucional, que não endossa este uso abusivo e pouco fundamentado de princípios
abertos”.
Luís Roberto Barroso, analisando o neoconstitucionalismo a partir do seu marco filosófico,
afirma que “o pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito
posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias
metafísicas. A interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma
teoria de justiça, mas não podem comportar voluntarismos ou personalismos, sobretudo os
judiciais”.
Em arremate, conquanto não se negue as transformações promovidas pelo
neoconstitucionalismo, sobretudo, em relação à força normativa da Constituição e ao
engrandecimento do Poder Judiciário como coparticipante do processo de criação do Direito
Constitucional, o candidato deve voltar os olhos, principalmente, para os limites de atuação deste
poder contramajoritário. Deve defender, por isso, que o ativismo judicial não pode desaguar em 12
arbítrio judicial, em desrespeito à separação dos poderes, à segurança jurídica e aos valores
inerentes à democracia.
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