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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

FACULDADE DE DIREITO PROFESSOR JACY DE ASSIS

Larissa Camargos Valença Reis (12221DIR011)

Millena da Costa Silva (12221DIR040)

ESTUDO DIRIGIDO 1

Trabalho elaborado para a Disciplina de Direito Constitucional – Prof. Dr. Raoni Bielshowsky

Uberlândia-MG

Maio de 2023
1. Constituição é um conceito complexo e polissêmico, o que significa isso? Também
nesse sentido, o que é e para que serve uma Constituição? No que isso se articula
com aquilo que a Teoria da Constituição brasileira chama de sentidos de
constituição? Explique e justifique de forma fundamentada.
A constituição com os conceitos que conhecemos hoje derivava-se do racionalismo do
século XVIII. Conceituar a constituição se torna difícil, pois existem múltiplos sentidos,
significados e expressões possíveis. A palavra constituição pode ser empregada com
vários sentidos e significados conforme cita o autor José Afonso Silva:

(a) "Conjunto dos elementos essenciais de alguma coisa: a constituição do universo, a


constituição dos corpos sólidos; (b) "Temperamento, compleição do corpo humano: uma
constituição psicológica explosiva, uma constituição robusta"; (c) "Organização, formação: a
constituição de uma assembleia, a constituição de uma comissão"; (d) "O ato de estabelecer
juridicamente: a constituição de dote, de renda, de uma sociedade anônima; (e) "Conjunto de nor
mas que regem uma corporação, uma instituição a constituição da propriedade"; (f)."A lei
fundamental de um Estado". (SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo)
Essas concepções são analógicas e todas exprimem a uma ideia de modo ser algo e, por
consequência, a de organização interna de seres e entidades. “Se diz que todo Estado
tem constituição, que é o simples modo de ser do Estado.” (SILVA, José Afonso. Curso
de Direito Constitucional Positivo)
O Direito Constitucional é matéria do direito que irá se especializar e usar a Constituição
como objeto de estudo, além do próprio conceito de Direito Constitucional e suas
relações com disciplinas tanto jurídicas quanto das ciências sociais, as fontes, o
constitucionalismo, a teoria da Constituição, a teoria do poder constituinte e outros.
"é aquela disciplina; que delineia uma série de princípios, de conceitos e de instituições que se acham em
vários direitos positivos ou em grupos deles para classifica-los e sistematizá-los numa visão unitária" (Cf.
Garcia-Pelayo, ob.cit., p.21)

Gomes, Canotilho afirma que a Teoria da Constituição não se limita a investigações ou


descobertas de problemas constitucionais, ela tão pouco serve apenas para concretizar
normas. Desse modo, a constituição não apenas é instrumento de proteção para relações
existentes, como também é uma norma fundamental, de onde se é possível dar projeções
há sociedade, onde se indicam mudanças, conformação do sistema jurídico e ordem
jurídica.
A Constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria a organização dos seus
elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a
forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o
estabelecimento de seus órgãos e os limites de sua ação. Em síntese, a Constituição é o conjunto
de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado. (Curso de Direito Constitucional
Positivo. São Paulo, RT, 5.°).

A Constituição é considerada norma suprema do ordenamento jurídico, pois é a lei primeira,


que se constitui na soberania do Estado, já que é criada pelo Poder Constituinte.
A Teoria da Constituição brasileira aponta três sentidos a qual a constituição pode ser
compreendida e interpretada, a seguir, dissertaremos sobre.
A visão sociológica da Constituição vislumbra os fatores sociopolíticos-econômicos que
cercam a Constituição. Para visão sociológica interpreta a constituição com uma
decorrência de fatores sociais. Para esse vetor sociológico, a Magna Carta não teria sua
origem em uma norma, mas sim de fatos marcantes produzidos pela sociedade, para
Ferdinand Lassalle, a Magna Carta seria “soma dos fatores reais de poder”.
Para a Constituição poder produzir os seus efeitos, as normas deveriam se adequar aos fatores
reais de poder, isto é, as forças políticas dominantes, como os banqueiros, empresários etc. Se as
normas não se coadunassem com os núcleos de poder vigentes, os mandamentos constitucionais
se tornariam uma simples "folha de papel", uma peça jurídica sem valor, destituída de qualquer
força normativa. (AGRA, Walber.)
Dessa forma, se uma constituição não estiver em sincronia com interesses da sociedade, as
elites podem destituir o valor da lei maior, tornando-a meramente em uma folha de papel.
Segundo a teoria sociologia, quando houver confronto entre a norma e o fato social, o fato
social prevalecerá.
Para o jurista austríaco Hans Kelsen, o direito se resume à norma. A visão jurídica da
Constituição considera a constituição uma norma superior, que possui uma força superior
às outras normas do país. Conforme vislumbra Kelsen, o jurista deveria olhar com um
enfoque no fenômeno jurídico apenas sob o prisma jurídico, deixando quaisquer outras
análises às outras ciências. Em contrapartida, Neil MacCormick e Weinberger advertem
que o positivismo legal não assume qualquer critério de validade para o fenômeno jurídico.
Hans Kelsen, as vê apenas no sentido jurídico; constituição é, então, considerada norma pura, puro dever-
ser, sem qualquer pretensão a fundamentação sociológica, política ou filosófica. A concepção de Kelsen
toma a palavra constituição em dois sentidos: no lógico-jurídico e no jurídico-positivo; de acordo com o
primeiro, constituição significa norma fundamental hipotética, cuja função é servir de fundamento lógico
transcendental da validade da constituição jurídico-positiva que equivale a norma positiva suprema,
conjunto de normas que regula a criação de outras normas, lei nacional no seu mais alto grau. (SILVA, José
Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo)

Kelsen faz um corte axiológico e metodológico, e apresenta a representação de que o Direito


pode ser apenas por métodos jurídicos, assim reduzindo o objeto de estudo da norma
jurídica. Segundo Kelsen, não impenderia analisar a Constituição como uma decisão
política ou reflexo de classes sociais dominantes, se opondo à visão sociológica.
O alicerce do ordenamento jurídico reside na norma hipotética fundamental, a grundnorm,
cabendo a ela validar as demais normas do ordenamento jurídico. Ela valida a Constituição e
esta valida as outras normas, formando-se um sistema hierarquizado em que a norma inferior é
validada pela norma superior. Por isso, a validade, alicerce das normas jurídicas, reside na
compatibilidade vertical e não em uma explicação filosófica ou sociológica, como querem
alguns, dentre outros, Max Weber, Uma norma inferior, para ter validade, necessita estar de
acordo com a norma superior, sendo proferida pelo órgão estatal competente e enquadrada dentro
do ordenamento jurídico. (AGRA, Walber)
A visão política da Constituição é caracterizada pela compatibilidade das normas
infraconstitucionais com a decisão política tomada pela Constituição.
O último fundamento de toda a existência do direito e de todo valor jurídico se pode encontrar
em um ato de vontade, em uma decisão que como tal possibilite a criação do direito, e cuja força
jurídica sejam regras de decisão. (Carl Schmitt)
No vetor político, a decisão tomada tem que ter força suficiente para realizar uma
Constituição e que seja adotada e seguida independente do conteúdo.
A constituição seria uma decisão global e fundamental relativa a espécie e da unidade
política. Um exemplo de Carl Schmitt é a Constituição Francesa de 1791, que trouxe a
decisão política do povo a favor da monarquia constitucional.
Para Schmitt, a Constituição representa a escolha na decisão política, revelando a essência
do ordenamento jurídico.

2. Sobre os dois grandes pilares do constitucionalismo, sempre de forma


fundamentada, articulem:

a. O que são Direitos Fundamentais? O que são gerações de Direitos Fundamentais?


Como elas se articulam? Como elas se expressam na Constituição da República
Federativa do Brasil (CRFB)?
Direitos fundamentais são constantes da Ordem Constitucional, são direitos
considerados prevalentes e universais, eles, na verdade, representam limites para o
Estado.
Para começar a definir o conceito de direitos fundamentais é necessário mencionar a
“Magna Carta”, o principal documento utilizado nos estudos por todos aqueles que se
empenham ao estudo da evolução dos direitos humanos e direitos fundamentais.
Na história dos direitos fundamentais, que são aqueles direitos sem cuja positivação e efetividade
não há Estado de Direito, a Magna Carta, assinada pelo rei inglês, João Sem-Terra, em 1215,
tem uma importância fundamental. É o primeiro documento, no Ocidente, relativo ao
estabelecimento de limites ao poder estatal. É, ademais, o documento originário da Constituição
Inglesa, em que se consagram os direitos costumeiros reconhecidos pela tradição jurídica desse
país, isto é, pela imemorial “lei da terra” (law of the land). Reconhece ela os direitos da nobreza
e do clero, independentemente do consentimento do monarca, que não podia modificá-los. É a
pedra fundamental da democracia moderna. (LEAL, Ana Paula de lemos; AZEVEDO, Plauto
Faraco de. Magna Carta: de 1215 e os Direitos Fundamentais: Importância histórica e principais
disposições. (orient) ULBRA).
Vale- se destacar que embora apresente sua maior relevância dentre os documentos da
época, a “Magna Carta” não foi o primeiro e nem o único documento dessa espécie. Ela, no
entanto, é destacada porque serviu como ponto referencial para certos direitos e liberdades
civis clássicos, como o devido processo legal, a garantia da propriedade, e o habeas corpus.
Entretanto, faz-se necessário excluir o pensamento de que os “direitos” e privilégios
reconhecidos na época medieval são autênticos direitos fundamentais, uma vez que foram
concedidos pela autoridade real em um contexto social e econômico marcado pela
desigualdade. Na verdade, esses “direitos” eram mais específicos para determinados grupos
sociais e estamentais, sendo concedidos a castas privilegiadas que constituíam a
estratificação da sociedade medieval, deixando a maioria da população excluída desses
benefícios.
Entretanto, é essencial destacar a relevância desses acordos, especialmente das liberdades
presentes na Magna Carta, para o futuro progresso e reconhecimento dos direitos
fundamentais nas constituições, sendo necessário não negligenciá-los;
Ainda assim, impende não negligenciar a importância desses pactos, de modo especial as
liberdades constantes da Magna Carta, para a ulterior desenvolvimento e reconhecimento dos
direitos fundamentais nas constituições, ainda mais quando é justamente neste documento que
se identifica (pelo menos de acordo com a maioria dos autores) a origem desses direitos,
precisamente no que diz com a garantia da liberdade de locomoção e sua proteção contra a prisão
arbitrária, tendo em conta o argumento de que a liberdade constitui o pressuposto necessário ao
exercício das demais liberdades, inclusive da liberdade de culto e religião. (SARLET, Ingo
Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito
Constitucional. São Paulo: Saraiva.)
Dessa forma cabe-se dizer que os direitos fundamentais são direitos humanos, mas são
direitos humanos positivados na Constituição Federal, ou seja, apesar de ambos os direitos
serem direcionados a pessoa humana e à sua dignidade, há uma diferença: enquanto os
direitos fundamentais são positivados dentre uma ordem interna constitucional os direitos
humanos estão apenas em uma ordem internacional, e não são positivados. É importante
ressaltar que as constituições democráticas positivaram esses direitos justamente para
proteger os grupos vulneráveis, pois esses grupos poderiam perder suas conquistas e seus
direitos humanos.
No livro Curso de Direito Constitucional, há a seguinte citação:
A importância dos direitos fundamentais é uma unanimidade em todos os ordenamentos
constitucionais, configurando- se como principal característica das Cartas Magnas
hodiernamente. Klaus Stern afirma que uma verdadeira e completa constituição não existia até
o estabelecimento dos direitos fundamentais como parte estruturante do Estado. (AGRA,
Walber. Curso de direito constitucional. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.).
Destarte, retoma-se a ideia anteriormente já mencionada de que os direitos fundamentais
são necessários para tornar uma sociedade mais democrática e igualitária, isso também é
confirmado pelo autor alemão Jürgen Habermas que diz: “A criação dos direitos
fundamentais se assenta na escolha dos direitos dos indivíduos iguais e livres, que decidem
legitimamente regular a vida coletiva pelo direito positivo.”
Desde o momento em que foram instituídos nas primeiras constituições, os direitos
fundamentais têm sofrido diversas modificações, tanto em relação ao seu conteúdo quanto
à sua aplicação, alcance e efetivação. Com o intuito de explicar esse processo, Karel Vasak
propôs, em uma conferência realizada no Instituto Internacional de Direitos Humanos em
1979, a ideia de que o progresso dos direitos humanos e fundamentais pode ser percebido
por meio da identificação de três gerações de direitos, ainda que haja quem defenda a adoção
de uma quarta, quinta e sexta geração.
A primeira geração dos direitos fundamentais é denominada como: “Os direitos
fundamentais no âmbito do Estado Liberal” ela surge ao final do século XVIII e com ela
nasce os direitos civis e políticos, marcando a passagem de um Estado autoritário para um
Estado de Direito.
Assumem particular relevo os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à igualdade perante a
lei, posteriormente complementados por um leque de liberdades, incluindo as assim
denominadas liberdades de expressão coletiva (liberdades de expressão, imprensa, manifestação,
reunião, associação etc.), e pelos direitos de participação política, tais como o direito de voto e a
capacidade eleitoral passiva, revelando, de tal sorte, a intima correlação entre os direitos
fundamentais e a democracia, algumas garantias processuais (devido processo legal, habeas
corpus, direito de petição) também se enquadram nesta categoria. (SARLET, Ingo Wolfgang;
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva).
A segunda geração chamada como “O advento do Estado Social e os direitos econômicos,
sociais e culturais” tem inspiração na revolução europeia, e nasce com a fixação do Estado
Social, assim surgiram os direitos sociais, culturais e econômicos, a maioria dos direitos
trabalhistas também surgiram nesse momento.
Caracterizam-se, ainda hoje, por assegurarem ao indivíduo direitos a prestações sociais por parte
do Estado, tais como prestações de assistência social, saúde, educação, trabalho etc., revelando
uma transição das liberdades formais abstratas para as liberdades materiais concretas. (SARLET,
Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito
Constitucional. São Paulo: Saraiva).
Os direitos fundamentais de segunda geração são também chamados de liberdades positivas
pois geram ao Estado o dever de fazer ou agir e têm relação próxima com o direito a
igualdade. São exemplos ainda dessa geração o direito a educação e a saúde.
Os direitos de pensão produzem uma simbiose entre o estado e a sociedade, propiciando que a
igualdade saia da esfera formal e adentre na esfera material, garantindo o direitos a todos,
principalmente aquela parte da população que é carente de recursos. (AGRA, Walber. Curso de
direito constitucional. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.)
Os direitos fundamentais chamados como a “A titularidade transindividual” da terceira
dimensão, ou também são conhecidos como direitos de fraternidade ou de solidariedade,
possuem uma característica peculiar: diferentemente dos demais direitos, eles são
destinados à proteção de grupos humanos, como um povo ou nação, ao invés de focar
somente no indivíduo como seu titular. Por isso, são classificados como direitos
transindividuais – coletivos ou difusos;
Os sujeitos da relação dos direitos de terceira dimensão não são mais o cidadão-cidadão ou o
cidadão-Estado – a titularidade passa a ser difusa, coletiva, transindividual. O destinatário é o
homem em termos de gênero humano, enfocado sob um prisma coletivo. Se o destinatário é
coletivo, a responsabilidade para a sua concretização também é coletiva, não dependendo apenas
da atuação estatal para assegurar a todos a consecução desses direitos. O cidadão tem especial
participação na sua efetivação. (AGRA, Walber. Curso de direito constitucional. 8 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2014.)
Alguns exemplos desses direitos incluem a preservação do meio ambiente, o direito à paz e
ao desenvolvimento, bem como o direito de grupos de conservar e utilizar o patrimônio
histórico e cultural, além do acesso à comunicação.
Segundo alguns doutrinadores há ainda a existência até mais três gerações dos direitos
fundamentais: que seriam a quarta, quinta e sexta geração, mas não há um consenso objetivo
que afirme se elas devem ou não ser consideradas.
O constitucionalista Paulo Bonavides se posiciona favoravelmente ao reconhecimento de
uma quarta geração, ele então afirma que: “esta é o resultado da globalização dos direitos
fundamentais, no sentido de uma universalização no plano institucional, que corresponde à
derradeira fase de institucionalização do Estado Social” (SARLET, Ingo Wolfgang;
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva).
Essa dimensão tem o objetivo de integrar o cidadão nas decisões políticas tomadas pelos entes
governamentais, intensificando o grau de democracia. Podemos identificar como prerrogativas
dessa dimensão os direitos à informação, à participação política, à democracia participativa etc.
Esses direitos têm a finalidade de propiciar uma democracia substancial, em que os cidadãos
possam votar e contribuir ativamente para a resolução dos problemas cotidianos.(AGRA,
Walber. Curso de direito constitucional. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.).
Haveria também para certos doutrinadores a existência de uma quinta geração dos direitos
humanos e fundamentais, para José Adércio Sampaio essa quinta geração “abarca o dever
de cuidado, amor e respeito para com todas as formas de vida, bem como direitos de defesa
contra as formas de dominação biofísica geradores de toda sorte de preconceitos”
(SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de
Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva).
Além disso, existe fixada ainda na literatura brasileira, defensores de uma possível sexta
geração que é apresentada pelo direito humano e fundamental de acesso à água potável. A
inclusão dos direitos relacionados à bioética na sexta geração é defendida por alguns
teóricos, mas faz-se necessário mencionar que Paulo Bonavides já a colocava na quarta
geração, com ênfase na participação democrática e na defesa da dignidade da pessoa
humana contra intervenções abusivas. Ainda, os defensores da água potável também a
consideram como um direito que pode gerar uma nova dimensão de direitos, apesar de que
seja frequentemente classificada como pertencente à terceira geração.
No Brasil, vinte e um anos após o golpe militar em 1964, foi iniciado um processo
redemocratização, a promulgação da Constituição Federal em 1988 não só instituiu um
sistema político democrático, mas também representou um grande avanço em relação aos
direitos e às garantias fundamentais. Assim, a Constituição reflete nada mais do que a
positivação dos direitos fundamentais no âmbito interno dos Estados.
Logo no preâmbulo constitucional federal vê-se que o compromisso ideológico e
doutrinário dos direitos fundamentais aparece como um pilar para o Estado Democrático de
Direito:
Para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça,
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das
controvérsias (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente
da República, [2016]).
Esses princípios afirmam que um Estado Democrático de Direito só pode existir se houver
a presença de direitos fundamentais, e de forma simultânea, não pode haver direitos
fundamentais sem a democracia. Os direitos civis e políticos, assim como os direitos sociais,
que são consequência do princípio da igualdade, e devem ser protegidos pelo princípio da
liberdade para garantir a dignidade humana.
Através do seu art.3o, pela primeira vez nossa Lei Maior refere aos objetivos do Estado
Federal, que se constituem na estruturação de tais objetificações:
Uma sociedade livre, justa e solidária; na garantia do desenvolvimento nacional; na erradicação
da pobreza e na redução das desigualdades sociais e regionais; e na promoção do bem de todos,
sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
(Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República,
[2016])
Inúmeros direitos e garantias individuais foram elencados nos primeiros capítulos da
Constituição e lhes foi outorgado o patamar de cláusulas pétreas, conforme o art. 60, § 4o,
inciso IV, priorizando assim, os direitos humanos.
Ainda, há em nossa Lei Maior o Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais,”
dividindo-os em cinco capítulos:
Capítulo I: Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos;
Capítulo II: Dos Direitos sociais;
Capítulo III: Da Nacionalidade;
Capítulo IV: Dos Direitos Políticos;
Capítulo V: Dos Partidos Políticos.
Conforme Canotilho reconhece-se a importância dos direitos fundamentais a fim de uma
sociedade justa e democrática, que preze pela igualdade em seus cidadãos:
“...é hoje, sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (no caso de dúvida, deve
preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais)”. (LJ. Gomes
Canotilho, op. Cit., p. 233.)
b. Ao falar da separação dos poderes é possível dizer que na contemporaneidade ela é
marcada por ser uma separação orgânico-funcional, na qual se identificam uma
dimensão negativa (limite do poder) e uma dimensão positiva (responsabilidade pelo
poder). Explique toda essas questões, sempre de forma fundamentada, também
articulando as disposições a respeito presentes na CRFB.
Na obra “A política “ de Aristóteles há os primeiros pensamentos a respeito da ideia da
teoria da separação dos poderes, nela o autor mencionava a existência de três funções
diferentes, que fossem exercidas pelo poder soberano, essas seriam: a função de criar
normas, a de aplicá-las e a função e julgar os conflitos que surgissem a respeito da criação
dessas mesmas normas. Porém, o filósofo havia se prendido a ideia de que a concentração
dessas funções estaria a apenas uma pessoa, que seria o soberano.
Séculos depois, já então na era moderna, a teoria de Aristóteles foi reformulada por
Montesquieu, filósofo iluminista que criou sua obra “O Espírito das Leis”, onde a teoria da
separação dos poderes foi contemplada: “Para que não se possa abusar do poder, é preciso
que, pela disposição das coisas, o poder limite o poder” (MONTESQUIEU. O espírito das
leis, 1748)
Por meio dessa teoria, cada Poder exercia uma função típica, inerente à sua natureza, atuando
independente e autonomamente. Assim, cada órgão exercia somente a função que fosse típica,
não mais sendo permitido a um único órgão legislar, aplicar a lei e julgar, de modo unilateral,
como se percebia no absolutismo. Tais atividades passam a ser realizadas, independentemente,
por cada órgão, surgindo, assim o que se denominou teoria dos freios e contrapesos. (LENZA,
Pedro. Direito constitucional esquematizado. Saraiva, 2010, 14a Ed. P. 397/398).
A teoria de Montesquieu, que surgiu como uma forte oposição ao absolutismo, foi
bravamente estabelecida durante a Revolução Francesa, quando a Declaração de Direitos
do Homem e do Cidadão incluiu a declaração de que um Estado sem a teoria da separação
dos poderes em sua Constituição era então como sem um Estado sem constituição. A partir
daí, o princípio da separação dos poderes tornou-se fundamental para o constitucionalismo
e se tornou o cerne da estrutura organizacional do Estado.
Discriminados assim os poderes nessa linha teórica de separação, segundo os fins a que se
propõem, entra Montesquieu a conceituar a liberdade política, definindo-a como aquela
tranquilidade de espírito, decorrente do juízo de segurança que cada qual faça acerca de seu
estado no plano da convivência social.
A liberdade estará sempre presente, segundo o notável filósofo, toda vez que haja um governo
em face do qual os cidadãos não abriguem nenhum temor recíproco. A liberdade política
exprimirá sempre o sentimento de segurança, de garantia e de certeza que o ordenamento jurídico
proporcione às relações de indivíduo para o indivíduo, sob a égide da autoridade governativa.
(BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. Malheiros Editores 10° edição).
Na Constituição Federal brasileira de 1988 a separação dos poderes é cláusula pétrea e
aparece no artigo 2°: "São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário"(Constituição da República Federativa do Brasil de
1988. Brasília, DF: Presidente da República, [2016).
Diante disso, é possível notar que cada um desses poderes são constituídos em funções
típicas e funções atípicas que limitam o próprio poder.
Sobre a separação dos poderes é possível dizer que na contemporaneidade ela é marcada
por ser uma separação orgânico-funcional, isso é descrito por José Afonso da Silva:
A divisão dos poderes fundamenta-se, pois, em dois elementos: (a) especialização funcional,
significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função; assim, às assembleias
(Congresso, Câmaras, Parlamento) se atribui a função Legislativa; ao Executivo, a função
executiva; ao Judiciário, a função jurisdicional; (b) independência orgânica, significando que,
além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente
dos outros, o que postula ausência de meios de subordinação. Trata-se, pois, como se vê, de uma
forma de organização jurídica das manifestações do Poder. (SILVA, José Afonso. Curso de
Direito Constitucional Positivo. Malheiros Editores, 2012, p. 109).
Canotilho apresenta em seu livro Direito Constitucional a separação dos poderes em dois
aspectos, a dimensão negativa que estaria acerca da limitação, do controle e da divisão dos
poderes, e a dimensão positiva, essa que se baseia na constitucionalização, na organização
e na ordenação do poder:
A constitucionalistíca mais recente salienta que o princípio da separação de poderes transporta
duas dimensões complementares: a separação como divisão, controle e limite do poder-
dimensão negativa; a separação como constitucionalização, ordenação e organização do poder
do Estado tendente a decisões funcionalmente eficazes e materialmente justas (dimensão
positiva). O sentido referido em corresponde, em rigor, à ideia de divisão de poderes; o sentido
referido em aponta sobretudo para a ideia de separação de poderes. O princípio da divisão como
forma e meio de limite do poder (divisão de poderes e balanço de poderes) assegura uma medida
jurídica ao poder do estado e, consequentemente, serve para garantir e proteger a esfera jurídico-
subjetiva dos indivíduos e evitar a concentração de poder. (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito
constitucional e teoria da constituição. 7° Ed).
Há ainda o princípio da lealdade institucional, que refere-se à convivência entre os poderes
constituídos e exige uma atitude cooperativa e leal entre as instituições e seus agentes.
Assim, o propósito é buscar garantia da eficácia da ordem constitucional. Em resumo, o
conceito pode ser dividido em uma dimensão positiva e outra negativa:
A primeira envolve a mutua cooperação entre os diversos órgãos, com a finalidade de realizar os
objetivos constitucionais, de modo a permitir o funcionamento desse sistema com o mínimo de
atritos possível. Enquanto isso, a segunda dimensão abrange o dever dos titulares dos poderes de
respeitarem- se mutuamente, renunciando a práticas de guerrilha institucional e abuso do poder.
(Anais do I Congresso Internacional de Direito Constitucional e Filosofia, v. 1 p 159, Raoni
Bielschowsky).
As características positivas da separação dos poderes podem ser classificas em três aspectos
ainda: Na proteção da democracia, afinal ela não concentra o poder em apenas um lado,
assim reduz o risco do autoritarismo. Pode ser também relacionada a independência dos
poderes, que apesar de poderem se relacionar entre si (através de suas funções atípicas)
assegura o respeito as atribuições de casa um. Ainda, há a relação com a o equilíbrio e
controle dos poderes, pois traz igualdade a eles e reduz o risco de que um sobressaia sobre
o outro.
O principio da separação na qualidade de princípio positivo assegura uma justa e adequada
ordenação das funções do estado e, consequentemente, intervém como esquema relacional de
competências, tarefas, funções e responsabilidades dos órgãos constitucionais de soberania.
Nesta perspectiva, separação ou divisão de poderes significa responsabilidade pelo exercício de
um poder. (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7° Ed).
As dimensão negativa da separação dos poderes pode estar relacionada aos conflitos que
essa separação pode causar, afinal podem haver divergências entre eles. Está relacionada
ainda ao alto custo de manutenção de cada um dos poderes, que somado podem representar
grandes valores. Faz se necessário também, mencionar que as possíveis divergências
medidas pelos poderes podem trazer riscos a governabilidade do país, visto que, em
momentos de crises, dificulta a comunicação entre os mesmos.
Nessa esteira, a própria separação dos poderes deve ser encarada como um princípio do Estado
de Direito, e por essa condição, sua aplicação não pode ser feita de forma negativa ou positiva.
Não há que se falar em observância ou inobservância e sim do princípio da separação dos
poderes, e sim numa relativização de sua aplicação. (O Poder Judiciário na doutrina da Separação
dos poderes, Raoni Bielschowsky).

3. É muito tradicional da Teoria da Constituição brasileira o tema da tipologia


constitucional. Diante disso, de forma fundamentada e referenciada, expliquem e
exemplifiquem a classificação das constituições segundo os critérios quanto: à
origem; ao modo de elaboração; à estabilidade; à forma; à extensão; à finalidade.
Igualmente, aborde o tema da diferenciação entre o que vem a ser constituição em
sentido formal e constituição em sentido material.
A tipologia Constitucional é a classificação encontrada na doutrina das constituições de
acordo com os diversos critérios. Trataremos agora dos critérios à seguir:
1. Quanto à origem;
a) Constituição promulgada: Terminologia imprecisa, pois toda constituição
precisa ser promulgada. É por meio dela que o povo interfere e participa da
escolha dos governantes. Um texto conforme o descrito só pode ser criado em
um regime democrático, para que haja debate nacional sobre os interesses
sociais, no qual o povo tenha voz de decisão.
b) Constituição outorgada: Texto que se origina de uma decisão política autoritária,
pela vontade do governante, como foi a Constituição brasileira de 1824,
outorgada por D. Pedro I. Nesse modelo de Constituição não existe espaço para
participação da população, há a imposição da vontade de poucos. Estados que
aderem esse tipo de constituição tem governos chamados de ditatoriais.
2. Quanto ao modo de elaboração;
a) Constituição dogmática: Sintetiza as ideias vigentes em uma sociedade, aderindo
valores de uma situação histórica. Esse texto expõe-se forma escrita e
sistematizada.
b) Constituição histórica: Formada por ideais históricos. Se delineia por
acontecimentos históricos que inspiram o ordenamento jurídico.

3. Quanto à estabilidade;
a) Constituição rígida: É o texto que exige procedimentos mais difíceis para sua
alteração, exemplo:
Para a reforma de uma lei complementar é exigido um quorum de maioria absoluta, na Câmara
dos Deputados e no Senado, em um turno de votação; para se modificar a Constituição brasileira
é necessário uma emenda que obtenha 3/5 dos votos, em cada uma das Casas, em dois turnos de
votação. (AGRA, Walber.)
Essa exigência se dá com o objetivo de atingir uma maior eficácia nas normas.
b) Constituição flexível: A Constituição não é apontada como primordial no
ordenamento jurídico. Desse modo, isso a torna fácil de ser modificada. Esses
textos não tem supremacia jurídica.
c) Constituição semirrígida: É quando uma parte do texto pode ser modificada por
um procedimento rígido e outra parte por um procedimento flexível.
d) Constituição imutável: Não é possível sofrer reforma, sendo assim, não pode ser
alterada. Assim, ela tem como objetivo perpetuar no tempo.
e) Constituição fixa: É a Constituição que só pode ser alterada por um novo poder
constituinte. Não há formulação para mecanismos de reforma e revisão. Existem
várias restrições nesse tipo de texto, pois quando um novo governo inicia,
começa-se uma nova Constituição.
4. Quanto à forma;
a) Constituição costumeira: Baseia-se em costumes, as normas não vem de um
processo legislativo, mas de condutas constantes que tem convicção de
obrigatoriedade. Esse modelo é adotado pelo common law. As Constituições
costumeiras são flexíveis.
b) Constituição escrita: Essa Constituição é um documento escrito. A ideia é que
esses textos ofereceram mais segurança para a sua sociedade, eles sendo
normalmente feitas pelo Legislativo. Esses textos tem o propósito de resguardar
o princípio da legalidade.
Por serem solidificadas em textos jurídicos, sofrem maiores efeitos com o
tempo.
5. Quanto à extensão;
a) Constituição sintética: Esse texto uniformiza a estruturação de poderes e declara
os direitos fundamentais.
Deve o estatuto supremo condensar princípios e normas asseguradoras do progresso, da liberdade
e da ordem, e precisa evitar a casuística minuciosidade, a fim de se não tornar demasiado rígido,
de permanecer dúctil, flexível, adaptável a épocas e circunstâncias diversas, destinado, como é,
a longevidade excepcional. Quanto mais resumida é uma lei, mais geral deve ser a sua linguagem
e maior, portanto, a necessidade, e também a dificuldade, de interpretação do respectivo texto.
(MAXIMILIANO, Carlos)
b) Constituição analítica: Esse texto deixa normatizado aspectos da vida social,
como a economia, vida familiar, a seguridade social, o meio ambiente e outros.
São comuns em países de instabilidade social. O objetivo é substituir a
instabilidade social, política e econômica por estabilidade jurídica.
6. Quanto à finalidade;
a) Constituição Nominais: Não apresentam efetividade na aplicação das suas
disposições, apesar disso são juridicamente válidas. Um exemplo desse tipo de
Constituição é a Constituição Federal Brasileira de 1988, pois passadas duas
décadas os governantes ainda não conseguiram garantir a sociedade a aplicação
desses direitos presentes no texto constitucional.
b) Constituição Normativas: São aquelas que dominam o processo político e o
poder se submete aos limites desse processo, havendo uma mistura entre
Constituição e comunidade.
Existe também as constituições em sentido formal e material. A Constituição formal é à
regulamentação dos fatos, concebidas com finalidades e respeitando limitações
anteriores. O conteúdo do texto constitucional formal pode conversar com qualquer matéria.
O que não for materialmente constitucional será automaticamente constitucional.
O sentido clássico de Constituição formal é de dispositivos que ajustam as estruturas de
poder de uma sociedade, se exaurindo de direitos fundamentais de primeira dimensão.
A base filosófica da constituição formal é o positivismo jurídico. Segundo Paulo Bonavides,
dentro desta concepção, há uma redução da Constituição a uma visão legalista, fixada
unicamente para sua utilização como técnica de organização de poder e exteriorização formal
dos direitos fundamentais. (AGRA, Walber. Curso de direito constitucional.)
Já a Constituição em sentido material trata particularmente de divisão do poder, direitos
fundamentais e distribuição de competências. Esse texto constitucional busca tratar das
normas constitucionais mais importantes, essas normas representam essência do
ordenamento jurídico.
A constituição formal está na esfera do “dever ser” e corresponde a percepção jurídica, sem
considerar fatores sociais. A constituição material discorre da interação entre as interações
do mundo jurídico e do mundo fático, em que um influencia o outro. A fonte formal é a
Constituição propriamente dita, ou seja, as normas que compõem o texto constitucional,
sendo o estudo da norma.
A fonte material são os fatos sociais que deram a autonomia de criação da constituição.
A Constituição material se diferencia da formal por seu conteúdo, enquanto esta se diferencia
das demais normas jurídicas por ser oriunda do Poder Constituinte e pelos procedimentos
necessários para sua reforma. Não se pode reduzir sua amplitude de elementos a uma concepção
positivista, arrimada em normas jurídicas, se a extensão engloba substâncias várias, tanto
encontradas no mundo jurídico como, principalmente, no mundo extrajurídico. (AGRA,
Walber)
4. Segundo Canotilho:
“O movimento constitucional gerador da constituição em sentido moderno tem várias
raízes localizadas em horizontes temporais diacrónicos e em espaços históricos geográficos
e culturais diferenciados. Em termos rigorosos, não há um constitucionalismo mas vários
constitucionalismo (o constitucionalismo inglês, o constitucionalismo americano, o
constitucionalismo francês). Será preferível dizer que existem diversos movimentos
constitucionais com corações nacionais mas também com alguns momentos de
aproximação entre si, fornecendo uma complexa tessitura histórico-cultural. E dizemos ser
mais rigoroso falar de vários constitucionalismo porque isso permite recortar desde já uma
noção básica de constitucionalismo. Constitucionalismo é uma teoria (ou ideologia) que
ergue o princípio do governo limitado indispensável à garantia dos direitos em dimensão
estruturante da organização de uma comunidade. Neste sentido, o constitucionalismo
moderno representará uma técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos.
O conceito de constitucionalismo transporta, assim, um claro juízo de valor. É, no fundo,
uma teoria normativa da política, tal como a teoria da democracia ou do liberalismo’’.

Diante disso, sempre de forma fundamentada, apresente e diferencie os momentos


do constitucionalismo, articulando-os a partir das matrizes constitucionais que podem ser
tidas como mais influentes e paradigmáticas do constitucionalismo, bem como com como
esses momentos se expressaram na realidade constitucional brasileira na história.
Segundo Canotilho, constitucionalismo é um teoria ou ideologia que valoriza o princípio do
governo limitado indispensável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização
política e social de uma sociedade. O conceito de constitucionalismo transporta de certa um
forma, um juízo de valor, se tornando uma teoria normativa da politica, como a teoria da
democracia ou a teoria do liberalismo.
O movimento constitucional gera o que conhecemos por constituição moderna que tem várias
raízes localizaras em horizontes temporais, espaços geográficos e culturais diferentes. Dessa
forma, não há a possibilidade de dizer um constitucionalismo, mas vários constitucionalismos
(o constitucionalismo inglês, o francês e o norte-americano). É preferível o termo “movimentos
constitucionais” que faz alusão à diversidade constitucional, mostrando que são corações
nacionais, mas também com momentos de aproximação entre si.
Um dos momentos do constitucionalismo é chamado de constitucionalismo antigo, para
Canotilho, esse constitucionalismo é: “O conjunto de princípios escritos ou consuetudinários
alicerçadores da existência de direitos estamentais perante o monarca e simultaneamente
limitadores do seu poder” (LJ. Gomes Canotilho, op. Cit., p. 233.)
Na Grécia, entre o século VI e IV a.C., florescem ideias e instruções que podem ser entendidas
como um modelo antigo de constitucionalismo. A polis grega durante determinado período
exercia uma democracia direta, pela qual os cidadãos, sem moderadores, decidiam em
assembleias (ecclesia) em praças públicas (ágora) sobre os interesses gerais. Porém, a
participação política era limitada a homens livres, sendo assim, mulheres, escravos, estrangeiros
e seus descendentes (metecos) não tinham participação política.
A polis tinha a organização política chamada de politeia, que designava um modo ser da
comunidade política, que devia ser seguido para o benefício do bem comum, mas que não se
caracterizava de um conteúdo jurídico.
Não se priorizava a proteção dos direitos da individuais, por que prevalecia a ideia de que as
pessoas deveriam se ocupar com à comunidade política, não se atento a direitos. Nesse sentido,
o cidadão não era observado por sua dignidade individual, mas como integrante do corpo social.
Era considerado um cidadão virtuoso, aquele que melhor se adequava aos padrões sociais. “A
liberdade individual não era objeto da especial valoração inerente ao constitucionalismo
moderno.” (Sarmento, Daniel. Direito Constitucional: Teoria, história e métodos de trabalho)
Desse gregarismo, por certo e desde logo, surgiram conflitos de interesses, por mais rudimentar
e pequeno que fosse o agrupamento humano, donde a necessidade de criarem-se normas mínimas
de convivência e, sobretudo, de um núcleo de poder responsável pela sua aplicação e coibição
de suas transgressões. Daí a consciência, desde logo, de normas que disciplinassem a existência
do próprio grupo social, ou seja, com um mínimo de estrutura de poder e seus detentores, normas
que podemos chamar exatamente de normas constitucionais, porque estruturais da própria
convivência humana, e atingimento de seus objetivos. Por isso mesmo é que, embora não
escritos, os costumes e tradições dos grupos humanos mais primitivos podem ser considerados
como sua Constituição, ainda que com rudimentos de direito, mas que, de qualquer modo,
preservavam a própria sociedade porque disciplinadores do poder social e seu exercício.
(FILOMENO, p. 214).
Na Roma antiga, não se cogitava a ideia de constitucionalismo moderno. O período republicano
romano já demostrava uma concepção de separação dos poderes, obtendo uma separação por
instituições, como o Consulado, o Senado e a Assembleia, de forma a tentar obter um equilíbrio
nos estamentos da sociedade. A concepção vigente na época, se contrariava a da Grécia, que
presava pela submissão do indivíduo à coletividade social. Ali percebia a valorização do
individual e da propriedade, aprimorando o Direito Privado romano e reconhecimento de
direitos civis aos cidadãos romanos.
Na Idade Média aparece um grande pluralismo político. O poder político divide-se em múltiplas
instituições, como os reis, a Igreja, os senhores feudais, as cidades, as corporações de ofício e
o imperador, sem uma divisão de funções entre elas, não existia um poder mediador capaz de
contestação.
Para Maurizio Fioravanti não existia a possibilidade de se pensar em uma Constituição em
sentido moderno, pois a dispersão de poder ao limitar um de seus titulares, caracteriza-se como
um componente do constitucionalismo medieval.
É no final da Idade Média que se desenvolve uma ideia que antecipa o constitucionalismo
moderno. Surgem pactos estamentais, cujo o principal é a Magna Carta, ajustada em 1215 na
Inglaterra pelo Rei João Sem Terra, na qual o Rei se comprometia a respeitar determinados
direitos da nobreza inglesa, para assim obter o reconhecimento do seu poder. Porém, nesses
pactos faltavam a universalidade que caracteriza as constituições modernas, já que não se
reconheciam os direitos individuais a todos os cidadãos, privilegiando os estamentos.
Em oposição ao constitucionalismo antigo, Canotilho propõe para o Constitucionalismo
moderno:
Fala-se em constitucionalismo moderno para designar o movimento político, social e cultural
que, sobretudo a partir de meados do século XVIII, questiona nos planos político, filosófico e
jurídico os esquemas tradicionais de domínio político, sugerindo, ao mesmo tempo; a invenção
de uma nova forma de ordenação e fundamentação do poder político. (CANOTILHO, J. J.
Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7° Ed)
Dessa forma, o constitucionalismo moderno sustenta a premissa da limitação jurídica do poder
do Estado em favor da liberdade individual. Esse modelo surge na modernidade, para a
superação do Estado Absolutista, em que os monarcas não estavam sujeitos ao Direito e eram
legibus solutos, ou seja, legisladores absolutos.
O Absolutismo foi fundamental para a formação do Estado Moderno, um dos principais teóricos
do absolutismo, Thomas Hobbes, justifica a centralização do poder por meio de sua teoria de
“Estado de Natureza”, que para ele é um Estado de todos contra todos, onde os indivíduos
abrem mão da liberdade, através do contrato social em favor do Estado. O direito então seria
produto da autoridade do soberano e não das leis da natureza, não importa qual seja a norma
desde que ela tenha emanado do soberano.
Entretanto, a centralização do poder passou a ser um empecilho para a prosperidade do
capitalismo, assim a burguesia pretendia proteger a liberdade, a propriedade, os contratos e o
livre arbítrio, defende-se que os governantes deveriam se submeter também a ordenamentos
jurídicos manados de estabilidade e racionalidade, assim tem-se a ambiguidade de interesses da
burguesia e o ideal do constitucionalismo, de contenção de poder estatal em prol da liberdade
individual.
Constitucionalismo é a teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo limitado
indispensável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização político-social de
uma comunidade. Neste sentido, o constitucionalismo moderno representará uma técnica
específica de limitação do poder com fins garantísticos. (CANOTILHO. 2002: 51; com ênfase
acrescentada)
Passou-se assim, a se valorizar o indivíduo, entendido como um ser racional, merecedor de
direitos, que tinha direitos e dignidade independente do lugar ocupado no coletivo. O contrato
então, se torna instituto por excelência de formalização de vínculos sociais.
O constitucionalismo moderno se assenta em três pilares: a contenção do poder dos governantes,
por meio da separação de poderes; a garantia de direitos individuais, concebidos como direitos
negativos oponíveis ao Estado; e a necessidade de legitimação do governo pelo consentimento
dos governados, pela via da democracia representativa. (Sarmento, Daniel. DIREITO
CONSTITUCIONAL: Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte, Fórum. 2012.)
O constitucionalismo moderno conheceu três versões mais influentes: a inglesa, a norte-
americana e francesa.
O modelo inglês de constitucionalismo tem como seu palco a Inglaterra. Esse
constitucionalismo tem suas raízes nas tradições e atos solenes. Em um momento histórico de
diversas reviravoltas políticas, a Revolução Gloriosa de 1688 assentou o princípio da
supremacia política do Parlamento inglês, pautada principalmente pelo respeito dos direitos
individuais. Nos movimentos do século XVII, três documentos constitucionais de exímia
importância são editados: a Petition of Rights, de 1628; o Habeas Corpus Act, de 1679; e o Bill
of Rights, de 1689, documentos que garantiam liberdades para os ingleses, dando limites à
Coroa e transferindo poder ao Parlamento. Tornado o Parlamento representação e soberania
indeclinável para estruturação do governo moderado. A soberania parlamentar afirma-se como
elemento estruturante da constituição mista, pois o poder não se concentra nas mãos do monarca
e sim partilhado pelo monarca e por outros órgãos do governo (rei e Parlamento).
Uma ideia central do constitucionalismo inglês é o respeito das tradições constitucionais.
Apesar da existência de documentos escritos, não existe um único texto constitucional que
organize e consolide, seguindo assim os princípios do common law. Desse modo, o modelo
inglês valoriza às tradições imemoriais. O constitucionalismo britânico é então, um modelo
historicista, pois se baseia a constituição e os direitos fundamentais nas tradições históricas do
povo britânico.
Embora não haja no direito inglês uma Constituição escrita, o que os ingleses chamam de
Constituição, na verdade, é o conjunto de regras de origem jurisprudencial ou legislativa que
garantem as liberdades e os direitos fundamentais e estabelecem limites às autoridades.
(BARBOZA, 2011).
A Constituição britânica tem um carácter flexível, já que o Poder Legislativo editar norma com
qualquer conteúdo, assim a constituição pode ser alterada da mesma maneira que as leis são
editadas.
Da soberania do parlamento emanará também a ideia de poder supremo através da forma de lei
do Parlamento, essa ideia se rege do princípio básico do constitucionalismo: the rule of law.
A interpretação do sentido da fórmula Rule of Law foi variando, mas é possível assinalar-lhe
quatro dimensões básicas. The Rule of Law significa, em primeiro lugar, na sequência da Magna
Charta de 1215, a obrigatoriedade da observância de um processo justo legalmente regulado,
quando se tiver de julgar e punir os cidadãos, privando-os da sua liberdade e propriedade. Em
segundo lugar, Rule of Law significa a proeminência das leis e costumes do "país" perante a
discricionariedade do poder real. Em terceiro lugar, Rule of Law aponta para a sujeição de todos
os atos do executivo à soberania do parlamento. Por fim, Rule of Law terá o sentido de igualdade
de acesso aos tribunais por parte dos cidadãos a fim de estes aí defenderem os seus direitos
segundo os princípios de direito comum dos ingleses (Common Law) e perante qualquer entidade
(indivíduos ou poderes públicos). (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da
constituição. 7° Ed)
Um momento significativo para o surgimento do constitucionalismo moderno na França foi
com o início da Revolução Francesa em 1789, onde houve uma ruptura incomparável com o
modelo do passado.
Os revolucionários franceses não tinham a intenção de apenas modificar pontualmente o Antigo
Regime. Muito mais que isso, eles visavam a formar um novo Estado e uma nova sociedade,
erigida sobre o ideário Iluminista da igualdade, da liberdade e da fraternidade. (Sarmento,
Daniel. 2012)
De acordo com a teoria constitucional, o pensamento de romper com o passado foi expressada
pela teoria do poder constituinte, criada por Abade Emanuel Joseph Sieyès em sua célebre obra
"Qu’est-ce que le Tier État?".
Nessa teoria; "o poder constituinte exprimiria a soberania da Nação, estando completamente
desvencilhado de quaisquer limites impostos pelas instituições e pelo ordenamento do passado."
(Sarmento, Daniel, 2012).
A Constituição deve ser correspondida a uma lei escrita e distinta de um repositório de tradições
imemoriais , diferente da fórmula inglesa. Ela tem a possibilidade de romper com o passado e
guiar o futuro da nação por meio de valores universais centrados no indivíduo. Esses valores
foram resumidos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, estabelecida em 1789,
cuja definição de Constituição, detalhada no artigo 16, expressava o pensamento liberal: “Toda
sociedade, na qual a garantia dos direitos não é assegurada nem a separação de poderes
determinada, não tem Constituição”.
No sistema constitucional francês, o Poder Legislativo é considerado o protagonista do
processo constitucional, que de acordo com a teoria tem como a responsabilidade de proteger a
soberania e garantir os direitos, sendo mais confiável nessa função do que o Poder Judiciário.
Durante o século XIX e o começo do século XX, o modelo constitucional francês foi mais
influente. Contudo, a ideia de que o Legislativo é supremo tem sido superada com a difusão da
jurisdição constitucional por todo o mundo, que ganhou força na segunda metade do século
passado:
Aliás, na própria França, essa também é uma tendência que se verifica sob a égide da atual
Constituição, que instituiu o controle preventivo de constitucionalidade das leis, confiado ao
Conselho Constitucional, o qual passou a desempenhar um papel cada vez mais importante na
vida pública francesa, sobretudo a partir dos anos 70. (Sarmento, Daniel. 2012)
A França recentemente aprovou uma nova medida que permite o controle de
constitucionalidade a posteriori, uma grande mudança no constitucionalismo francês.
As origens do constitucionalismo norte-americano vem de antes da promulgação da
Constituição do país e da sua Declaração de Independência. Em decorrência do fato da
colonização do país ter sido realizada por imigrantes que fugiam da perseguição religiosa na
Europa a cultura política dos Estados Unidos foi influenciada por uma necessidade de limitação
do poder de governantes e da proteção de minorias diante da força das maiorias.
A Constituição dos Estados Unidos aprovada na Convenção da Filadélfia em 1787 e aprovada
depois pelos cidadãos de todos os estados do país vigora até hoje. Instituíram o presidencialismo
e o sistema de freios e contrapesos afiliado à separação dos poderes. A constituição
estadunidense conta com texto sintético, posto por 7 artigos, que em seus quase 236 anos sofreu
apenas, 27 emendas. Há uma dificuldade em mudar formalmente a constituição norte-
americana, porém a “elasticidade” das normas constitucionais mais importantes, tornou
possível adapta-las as novas demandas e valores. Por isso, não impedida pela formalidade de
seu texto, a Constituição norte-americana é uma living Constitution.
A ideia de living Constitution é objeto de intenso debate nos Estados Unidos, sendo combatida
por uma importante corrente do pensamento constitucional do país, identificada como o chamado
"originalismo" - crença segundo a qual a Constituição deve ser interpretada de acordo com as
leituras das cláusulas constitucionais existentes na época da sua aprovação. (Sarmento, Daniel.
2012.)
O modelo constitucional norte-americano baseia-se no vetor democrático, de autogoverno do
povo e um vetor liberal que se preocupa em conter o poder das maiorias em defesa dos direitos
das minorias. Em suma, essa Constituição busca garantir um poder controlado que não se torne
opressivo de modo a ameaçar a liberdade individual. No pensamento estadunidense
constitucional, é função da constituição organizar o Estado e impor limites aos governantes,
mas não reger os rumos da vida social.
Em suma, no modelo constitucional dos Estados Unidos, a supremacia da Constituição não é
apenas uma proclamação política como na tradição constitucional francesa, mas um princípio
jurídico judicialmente tutelado. É verdade que o controle judicial de constitucionalidade das leis
(judicial review) sofre até hoje contestações nos Estados Unidos, sendo frequentemente apontado
como um instituto antidemocrático, por transferir aos juízes, que não são eleitos, o poder de
derrubar decisões tomadas pelos representantes do povo, com base nas suas interpretações
pessoais sobre cláusulas constitucionais muitas vezes vagas, que se sujeitam a diversas leituras.
Contudo, a jurisdição constitucional não apenas criou profundas raízes no Direito Constitucional
daquele país, como também acabou se disseminando por todo o mundo, sobretudo a partir da
segunda metade do século XX. (Sarmento, Daniel. 2012)
O constitucionalismo norte-americano deixa o legado de suma importância, como a Lex Mater,
que exerce supralegalidade sobre todas as normas do ordenamento jurídico. As leis superiores
(higher lawmaking) funda as estruturas jurídicas da sociedade e cria e fundamenta as leis
inferiores (lower lawmaking).
No Brasil, a primeira época constitucional, já em seu início, já na sua trajetória ao longo do
Primeiro Reinado, tem vínculos com Portugal, cercando-se numa singular comunhão de textos
constitucionais, resultado da mesma outorga imperial nos dois países: no Brasil, a Constituição
de 1824; em Portugal, a Carta de 1826, cópia daquela que D. Pedro nos concedera e que ele fez
chegar à Regência de Lisboa através do embaixador inglês.

O texto foi eficaz, tanto em termos de restrição de poderes, como nesta quanto em outras áreas,
apesar de apresentar um baixo nível de legitimidade teórica e que não estava conformidade com
as crenças democráticas e representativas do século da revolução, que defendia os direitos do
homem e a integridade constitucional da separação de poderes.

A linha originalíssima das nossas nascentes constitucionais se enraíza em fatos históricos que,
de início, acompanham os dois povos, decidem-lhe o destino e fazem depois ambos perseverarem
na busca de um denominador comum das aspirações nacionais que é o Estado de Direito em toda
a sua amplitude e solidez; um objetivo no caso brasileiro ainda por alcançar, decorridos já cerca
de 200 anos de malogros institucionais, por obra de uma crise constituinte, instaurada ao começo
da nacionalidade e recorrente em distintas ocasiões históricas, fazendo assim instável a base do
regime político e jurídico, à míngua de elementos valorativos e espirituais suscetíveis de
consolidar a ordem normativa da Constituição. (BONAVIDES, Paulo; PAES DE ANDRADE,
Antônio. História constitucional do Brasil. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. )
Em todo o continente americano, nenhum país testemunhou um ato de poder semelhante, lá as
constituintes fundaram repúblicas; aqui, no Brasil, a constituinte não pôde cumprir sua tarefa,
dissolvida que foi pelo Golpe de Estado de 1823:

Houve de uma monarquia absoluta em monarquia constitucional, abrangendo esta ao longo de


sua trajetória o Primeiro Reinado, a Regência e o Segundo Reinado; três épocas políticas que
marcaram o Império sob a égide da Constituição Outorgada, a célebre Carta de 18 outorgada, a
célebre Carta de 1824. (BONAVIDES, Paulo; PAES DE ANDRADE, Antônio. História
constitucional do Brasil. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. )

Durante o período imperial, a Constituição de 1824, criada através da outorga do Imperador,


governou o país até a queda do Império em 15 de novembro de 1889, dando origem a um novo
sistema institucionalizado que estabeleceu a república e a federação, conforme o Decreto nº 1
do Governo Provisório. Com o fim da monarquia, os membros do Governo Provisório
assumiram o encargo de estabelecer uma nova ordem política no país.

A primeira Constituição republicana parecia ser a mais sólida em termos formais em


comparação com as outras Constituições no novo sistema que começou em 15 de novembro de
1889.

Durou 39 anos e passou por uma única reforma que aliás veio demasiado tardia, não podendo
conjurar o seu colapso na sucessão do presidente Washington Luís, em 1930. Mas a evidência
histórica de uma estabilidade que acabamos de referir era de teor apenas aparente, não
disfarçando a república constitucional deveras violenta. Com efeito, a violência se instalou com
a ditadura de Floriano, quando a república correu o risco de soçobrar e prosseguiu dissimulada
nas comoções políticas ligadas à sucessão dos governos presidenciais. (BONAVIDES, Paulo;
PAES DE ANDRADE, Antônio. História constitucional do Brasil. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1991. )

Encerrado o interregno ditatório ditatorial de quatro anos na Era Vargas, a Segunda República
iniciou com a promulgação da Constituição de 1934. No entanto, sua existência foi breve e
vulnerável, uma vez que surgiu em um contexto político caracterizado por exclusões, crises,
dificuldades, suspeitas, incertezas, contestações e ressentimento;

As forças políticas situacionistas, por sua vez, elegeram presidente da República, por via indireta,
o ex-ditador e chefe revolucionário do movimento de outubro de 30, um homem cujo apetite
pelo poder o levou, três anos, depois a desferir o golpe de Estado de 10 de novembro de 1937.
(BONAVIDES, Paulo; PAES DE ANDRADE, Antônio. História constitucional do Brasil. 3 ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. )
Durante sua gestão, Vargas governou o Brasil sem seguir a Carta que ele próprio outorgou, a
famosa “polaca” criada pelo jurista Francisco Campos. O regime de exceção só chegou ao fim
devido a um golpe militar inspirado no sentimento de redemocratização que se enraizara na
consciência nacional após a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial, quando os
soldados da Força Expedicionária Brasileira batalharam na Itália contra as forças totalitárias do
fascismo e do nacional socialismo.

A Constituição de 18 de setembro de 1946, composta por 218 artigos e 36 cláusulas transitórias,


simbolizou um acordo entre as correntes conservadoras que seguiam a tradição republicana e
representativa de 1891 com as forças remanescentes do radicalismo liberal de 30.

As pressões ideológicas da década já não eram contudo tão fortes e os constituintes de 46


lograram escrever uma Constituição com pontos significativamente positivos. Constituição que
traduzia equilíbrio e bom senso para as circunstâncias da época, pôde ela atenuar e fazer latente
e adormecida durante largos anos de sua vigência o vulcão da crise constituinte, cujas erupções
não vieram tão imediatas e de súbito como as que implodiram a Constituição de 1934. (
(BONAVIDES, Paulo; PAES DE ANDRADE, Antônio. História constitucional do Brasil. 3 ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. )

Devido às comoções políticas de origem social, o país acabou por entrar na segunda ditadura
do século, que se caracterizou pela corrupção do regime presidencial e pela manutenção de um
Congresso manipulado sob uma Constituição de fachada, enquanto reprimia a formação de
novas lideranças através da censura da imprensa e a formação do debate livre. Esse sombrio
período, que durou duas décadas, ocorreu em 1964 e é considerado a ditadura militar mais
obscura da história do brasileira.

Por fim, chega- se a Constituição de 1988, a que perpetua até hoje no país.

A Constituição de 1988, ao revés do que dizem os seus inimigos, foi a melhor das Constituições
brasileiras de todas as nossas épocas constitucionais. Onde ela mais avança é onde o Governo
mais intenta retrogradá-la. Como constituição dos direitos fundamentais e da proteção jurídica
da sociedade, combinando assim defesa do corpo social e tutela dos direitos subjetivos, ela fez
nesse prisma judicial do regime significativo avanço. (BONAVIDES, Paulo; PAES DE
ANDRADE, Antônio. História constitucional do Brasil. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.)

Desse modo, conclui-se que a Constituição de 1988 representa um grandes avanços em relação
às constituições anteriores, as quais, muitas vezes eram limitadas em estabelecer a organização
do poder político, sem fazer a garantia dos direitos fundamentais.
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