Você está na página 1de 26

Prof.

Solano Santos
▪ Quando nos deparamos com o tema do constitucionalismo em geral estamos
envoltos em dúvidas. Como estudar o constitucionalismo, uma matéria que
discute movimentos constitucionais, se não sabemos ao certo o que é uma
Constituição?

▪ Calma! Vamos por partes...

▪ Como vocês já estão acostumados a estudar o Direito em suas


“ramificações”, primeiro veremos uma definição sobre o que é o Direito
Constitucional. A seguir temos um quadro que representa a referida divisão
em ramificações:
▪ Segundo José Afonso da Silva o Direito Constitucional está ligado à
dimensão do Direito Público. Todavia, se distingue desse por sua
particularidade nos princípios que o informam e seu objeto (o objeto
do Direito Constitucional será visto a seguir). Logo, se conclui que o
Direito Constitucional é o Direito Público fundamental, pois se
refere diretamente à organização e funcionamento do Estado,
estabelecendo as bases de sua estrutura política, econômica, social
etc.

▪ Podemos defini-lo como o ramo do Direito Público que expõe,


interpreta e sistematiza os princípios e normas fundamentais do
Estado. São esses princípios e normas fundamentais do Estado que
compõe o conteúdo das Constituições.
▪ Apesar da definição de José Afonso atender muito bem a fins
didáticos, contemporaneamente não se utiliza mais a clássica
divisão dicotômica entre público e privado (e social como está no
quadro das ramificações).

▪ Existe uma tendência em se estudar o Direito como algo que é uno,


indivisível. Tal tendência encontra abrigo a luz da teoria da
constitucionalização do Direito. O Direito é estudado como um
sistema e nesse sentido as partes que o compõe encontram como
fundamento de validade a Constituição.

▪ É nesse sentido que se fala em constitucionalização do direito, pois


todas as normas possuem como fundamento de validade a
Constituição, e, sendo assim, deverão estar de acordo com seus
mandamentos.
▪ Cabe ao Direito Constitucional o estudo sistemático das normas que
integram a constituição do Estado. Seu objeto, portanto, é
constituído pelas normas fundamentais da organização do Estado,
isto é, pelas normas relativas à estrutura do Estado, sistema de
governo (presidencialismo ou parlamentarismo), forma de governo
(república ou monarquia), modo de aquisição e exercício do poder,
estabelecimento de seus órgãos, limites de sua atuação, direitos
fundamentais do homem e respectivas garantias e regras básicas da
ordem econômica e social.
▪ O conteúdo científico do Direito Constitucional compreende três dimensões:

▪ a) Direito Constitucional Positivo: é aquele que tem por objeto o estudo dos
princípios e normas de uma Constituição concreta, isto é, a Constituição de um
Estado determinado.
▪ b) Direito Constitucional Comparado: é aquele responsável pelo estudo
teórico de normas jurídico-constitucionais de vários Estados. Trata-se, pois, de
um método contrastivo cuja importância reside no passo além da identificação de
semelhanças e diferenças. Isto é, reside na possibilidade de observar estruturas
jurídico-políticas que permitirão formular novas normas e aprimorar o Direito
Constitucional interno.
▪ c) Direito Constitucional Geral: é, de fato, uma ciência que visa generalizar
os princípios teóricos do direito constitucional positivo, bem como comparar com
o método contrastivo as semelhanças e diferenças do Direito Constitucional de
outros Estados. Desse modo, o objeto do DCG será o próprio conceito de DC, seu
conteúdo, a evolução do constitucionalismo, etc.
▪ José Gomes Canotilho fala sobre diversos movimentos constitucionais, como por
exemplo, o inglês, o americano e o francês. Para o autor o constitucionalismo se
caracteriza nesses diferentes movimentos.

▪ Em termos gerais podemos dizer que o:

Constitucionalismo é a técnica da liberdade, isto é, a técnica jurídica


pela qual é assegurado aos cidadãos o exercício dos seus direitos
individuais e, ao mesmo tempo, coloca o Estado em condições de não os
poder violar. (MATTEUCCI, Nicola. 2016, p. 247-8)
▪ Canotilho apresenta, ainda, uma divisão dicotômica do
Constitucionalismo: a) na antiguidade e; b) na idade moderna.

▪ Na Antiguidade Clássica, Karl Loewenstein – jurista alemão -, cita


como exemplo o exercício da “democracia direta” nas Cidades-
Estados gregas em que os cidadãos possuíam parte do poder político e
eram possível se identificar governantes e governados.

▪ Na Idade Média outro exemplo seria a Magna Carta 1215, assinada


pelo rei “João Sem Terra” concedendo direitos aos nobres ingleses
como, por exemplo, o habeas corpus.
▪ Na contemporaneidade o constitucionalismo (equivalente a
idade moderna que Canotilho faz menção) é marcado pela
existência de constituições escritas que visam limitar o arbítrio
do poder.

▪ Segundo Pedro Lenza os marcos históricos do constitucionalismo


contemporâneo são: a Constituição estadunidense de 1787 e a
Constituição francesa de 1791.

▪ Ambos os movimentos se levantam contra o poder absolutista e


possuem ligação com o pensamento liberal. Como resultado
temos uma forte proteção da propriedade privada, absenteísmo
estatal, e proteção do indivíduo.
▪ Agora que já temos uma ideia sobre o que é e a que se
destina o Direito Constitucional podemos partir para
outro questão. Então, vamos lá: o que é uma
Constituição?

▪ Obviamente essa não é uma questão simples. Isso


significa que encontraremos diversas definições sobre o
que é uma Constituição. Entretanto, podemos trabalhar
com três concepções:
▪ Nesse sentido a Constituição seria “a soma dos fatores reais de poder
que regem um país”. Esse conceito é que caracteriza a “Constituição
real” e efetiva de um Estado, a Constituição escrita diante desses
fatores não passa de uma “folha de papel”.

▪ O que Lassalle quer dizer com isso é que Constituição têm um sentido
real, que se espelha nos padrões sociopolíticos em vigor num
determinado Estado. Assim, a conceito de Constituição deveria ser
expresso em termos sociológicos.
▪ Os textos constitucionais baseados no modelo liberal, que
proclamavam valores como a da igualdade e da liberdade, não
possuíam efeitos práticos em sociedades refratárias a esses valores.

▪ Por essa razão, Lassalle afirmava que um texto constitucional


(Constituição escrita) que não estivesse de acordo com os fatores
reais de poder (o Rei, o Presidente, a burguesia) presentes no Estado
não passaria de uma mera “folha de papel”, algo irrelevante na vida
social do país.

▪ A essência da Constituição encontra origem na realidade social em


que se insere o texto escrito, e não na própria norma nele escrita.
▪ Nesse sentido a Constituição será considerada “a decisão política
fundamental”, decisão concreta “de conjunto sobre modo e forma
de existência da unidade política”.

▪ Schmitt defende que a Constituição (norma, lei escrita) não dá


forma a unidade política de um povo, mas que essa unidade é
anterior ao ato de dar-se uma Constituição. Para o autor a essência
da Constituição está em uma decisão consciente que a unidade
política, através do titular do poder constituinte – o povo em uma
democracia, ou o monarca em uma monarquia autêntica –, adota
por si mesma e se dá a si mesma.
▪ Schmitt distingue entre o que seja: 1) Constituição e 2) Lei
Constitucional. A primeira como já falamos é a decisão política
fundamental, isto é, decisão política (do povo, do monarca, do
ditador, etc.) que dá forma a estrutura do Estado. A segunda será cada
uma das normas escritas na Constituição formal (isto é, do texto
escrito da Constituição) que podem ser reformadas. Para esse autor
não há identidade entre Constituição e Lei Constitucional. Ou seja, são
fenômenos distintos.

▪ As chamadas Leis Constitucionais podem ser alteradas, pois não


influenciam na totalidade da Constituição. Com isso o autor se refere a
normas que não alterem, por exemplo, o regime de governo
(democracia ou monarquia, por exemplo), pois para Schmitt tudo o
que diz respeito a estrutura de funcionamento do Estado é decisão
política fundamental e, portanto, parte da substância, ou essência da
Constituição.
▪ Nesse sentido a Constituição será “uma norma pura, puro dever ser,
sem qualquer pretensão a fundamentação sociológica, política ou
filosófica” (SILVA, p. 39).

▪ A Constituição, na leitura dos juristas brasileiros feita da obra


kelseniana, será o fundamento de validade do sistema jurídico. Para
Kelsen, cabe ressaltar, a própria Constituição encontra seu
fundamento de validade em uma norma hipotética fundamental que
não podendo ser posta será pressuposta.
▪ Essa definição apresentada por Kelsen tem origem na necessidade de
focar principalmente nos aspectos formais da Constituição, uma vez
que por diversas razões os textos constitucionais foram incorporando
conteúdos estranhos a estrutura dos Estados.

▪ A Constituição de Weimar de 1919, por exemplo, trazia em seu texto


normas referentes a direitos trabalhistas, previdenciário e etc. A
multiplicidade de conteúdos não permitia mais definir um conceito de
Constituição que levasse em consideração apenas seu conteúdo.

▪ Assim, nasceu o conceito formal-normativo segundo o qual a


Constituição é uma lei (uma norma). Mas não se trata de qualquer lei,
a Constituição é a lei fundamental, a mais alta hierarquicamente.
▪ Para Kelsen o Direito se representa como um sistema de normas. Nesse
sistema o fundamento de validade (vigência) de cada norma é uma
outra norma superior. Desta forma, existe uma espécie de
escalonamento de normas, ou verticalidade hierárquica.

▪ Existirá, portanto, uma norma que será superior a todas as outras.


Trata-se daquela que ocupa o ápice do ordenamento jurídico e que
será, por consequência, fundamento de validade de todas as outras.
Essa norma não está em um plano positivado (escrito, visível), mas em
um plano lógico que impõe obediência a tudo o que for estipulado pelo
Poder Constituinte Originário.
▪ A doutrina do direito possui diferentes formas de classificar as
Constituições. Essas classificações visam explicitar características dos
modelos constitucionais como, por exemplo, a sua origem dizendo se
uma constituição se formou de atuação popular ou se foi imposta por
um governante autoritário.
▪ Material: segundo essa classificação materialmente constitucionais as
normas escritas ou costumeiras que regulam a estrutura do Estado, ou seja,
somente se considera materialmente constitucional o que disser respeito à
estrutura essencial de funcionamento do Estado.
▪ Formal: é a classificação sobre o documento escrito da Constituição, que
somente pode ser modificado por um processo qualificado nele próprio
estabelecido. Bonavides dirá que a Constituição formal possui em seu texto
elementos que não são propriamente essenciais a estrutura do Estado, assim
as normas não essenciais serão chamadas de formalmente constitucionais,
pois fazem parte de seu texto embora não digam respeito ao essencial para
o Estado.
▪ Escritas: é a Constituição que “codificada” estabelece em um único documento
toda a forma de estruturação do Estado.

▪ Não escrita: é a baseada nos costumes de um povo, se expressam principalmente


por meio de jurisprudência e documentos (nacionais ou internacionais) que possuam
matéria constitucional de forma esparsa.
▪ Dogmática: é aquela elaborada de forma escrita. Possuindo um documento formal
que expressa seu conteúdo.

▪ Histórica: é aquela que se elabora com o decorrer do tempo, por meio de decisões
jurisprudenciais, tratado internacionais, leis nacionais que regulem características
essenciais ao Estado. Corresponde a forma de elaboração “não escrita”, vista
anteriormente.
▪ a) Populares ou democráticas: são as elaboradas por um órgão constituinte
composto por representantes eleitos pelos cidadãos que compõe o Estado.

▪ b) Outorgadas: são as elaboradas sem participação popular. Essas são


estabelecidas pelo governante ou a seu mando e são impostas.
▪ a) Rígidas: são as constituições que possuem um procedimento solene, mais difícil,
para modificar as suas normas do que será o processo para criar e modificar a legislação
infraconstitucional.

▪ b) Flexíveis: são as constituições que possuem semelhante procedimento para


alterar suas normas e a legislação infraconstitucional. Nesse cenário, segundo José
Afonso, a própria lei infraconstitucional modifica a constituição.

▪ c) Semi-rígida: é a que possui parte de seu texto rígido e outra flexível. Um


exemplo é a constituição de 1824 que em seu art. 178 previa que parte do texto da
Constituição necessitava de um quórum qualificado (especial, maior) para ser alterado e
o restante poderia ser alterado pelo mesmo quórum requerido para criar ou modificar
leis infraconstitucional.
▪ BIBLIOGRAFIA:
▪ BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola;
PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política.
vol. I e II. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 2016.
▪ CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito
Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003.
▪ LENZA, Pedro. Direito Constitucional
Esquematizado. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
▪ SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. Madrid:
Alianza Editorial, 1996.
▪ SILVA, José Afonso da. Curso de Direito
Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros,
2013.
▪ ______________________. Aplicabilidade das
normas constitucionais. 8. ed. São Paulo:
Malheiros, 2012.

Você também pode gostar