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DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITO CONSTITUCIONAL E TEORIA DA


CONSTITUIÇÃO

Visão detalhada sobre direito constitucional e teoria da


constituição

1. Conceito de Constituição e supremacia constitucional

O direito constitucional é uma disciplina que tem por objeto o estudo das normas
constitucionais, as quais se encontram no corpo de uma Constituição. Passamos, então,
a compreender melhor o conceito de Constituição.

A Constituição é o documento que materializa as principais regras e princípios políticos


e jurídicos de um determinado Estado Nacional. É, portanto, a norma suprema de
regência e organização desse Estado.

O Estado, segundo Jellinek (2002), teria três elementos fundamentais: território,


povo/população e poder soberano.

O primeiro desses elementos é o território. No território do Estado, é preciso que se


tenha um povo, isto é, pessoas que estejam ligadas ao Estado e a seu território.

Esse povo precisa estar no território de forma pacífica, para o convívio social. Nessas
condições, o povo passa a ser dotado de soberania. Soberania significa dizer que,
naquele espaço, as pessoas terão a possibilidade de ditar suas próprias normas de
convívio, não podendo pessoas de fora intervir nessas definições.

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Na doutrina, muito se discute a respeito do conceito de Constituição, havendo,
consequentemente, grande divergência acerca do assunto. Por isso, passa-se, a seguir,
ao estudo dos diversos sentidos e conceitos que a doutrina empresta às Constituições.

1.1. Sentido sociológico

Ferdinand Lassalle trouxe a discussão para uma palestra, em 1863, que,


posteriormente, foi anotada e traduzida e, atualmente, pode ser encontrada sob duas
denominações: “A essência de uma Constituição” ou “O que é uma Constituição?”,
embora com o mesmo conteúdo.

A visão estritamente sociológica da Constituição de Lassalle pode ser definida como os


fatores reais de poder de uma determinada sociedade. Para o autor, a Constituição
escrita, tal como conhecemos, não passaria de uma mera folha de papel, irrelevante se
não coincidisse com os fatores reais de poder de uma determinada sociedade, essa sim
a Constituição real.

Apesar de todo o poder emanar do povo, como informa o parágrafo único do art. 1º da
CF/1988, a Constituição real do Brasil expõe que o poder emana de grupos de interesse
com força suficiente para ter voz no Parlamento. A despeito de o art. 37 prever a
moralidade e a impessoalidade como princípios da Administração Pública, a
Constituição real permitiria que determinadas pessoas fizessem dessa Administração
Pública um campo de realização de interesses pessoais. Assim, a Constituição de um
país diz respeito à soma dos fatores reais de poder que efetivamente ditam os rumos de
uma determinada sociedade, indicando que a Constituição escrita só será real se for
uma representação fiel da realidade, do contrário, não passa de uma folha de papel.

A Constituição, para Ferdinand Lassalle, dessa forma, deveria ser um documento


descritivo e, não, prescritivo, da realidade um Estado.

Para o autor, a Constituição organiza o Estado e a vida em sociedade, mas, para isso,
precisa reconhecer as relações de poder intrínsecas à sociedade. Portanto, uma
Constituição, para ser efetiva, precisa reconhecer e respeitar essas relações de poder.

Portanto, Lassalle (2015) entende que a Constituição, em seu sentido sociológico, deve
traduzir a soma dos fatores reais de poder que regem determinada nação, sob pena
de ser inefetiva.

É fato de que cada Estado tem a sua Constituição, normalmente materializada em um

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documento escrito. Essa Constituição precisa ser dotada de um sentido sociológico,
para que efetivamente corresponda àquela sociedade, ou seja, expresse o que acontece
no corpo social.

Se a Constituição não representar efetivamente o modo como as pessoas se relacionam,


tampouco os fatores de poder se darão na realidade, e, assim, a Constituição será uma
mera folha de papel.

Atenção!

Nas provas, é comum que esse tema seja cobrado da seguinte forma:
segundo Ferdinand Lassalle, a Constituição deve ser a soma dos
fatores reais de poder de uma determinada sociedade. Também é
possível a seguinte formulação: o sentido sociológico de Constituição
determina que ela represente a soma dos fatores reais de poder de
uma determinada sociedade, sob pena de se tornar mera folha de
papel sem efetividade social. Ambas as assertivas estão corretas.

1.2. Sentido político

Carl Schmitt foi o jurista responsável pela teorização das categorias jurídicas que
deram sustentação ao regime nazista. O conceito de Constituição no sentido político de
Carl Schmitt inverte a lógica segundo a qual a Constituição consiste em um
instrumento para limitação do poder do Estado. Isso porque, na sua visão, a
Constituição é um instrumento de sustentação, de afirmação do poder.

A Constituição, para este autor, nada mais é do que a decisão política fundamental
do titular do poder, afastando qualquer tentativa de juridicidade. Parte-se do
pressuposto de que há um líder – o Führer –, ungido, soberano, com grau de
legitimidade excepcional na sociedade, e é ele quem deve dizer o que é Constituição e a
que ela corresponde em uma ordem jurídica. Portanto, esse líder pode, por exemplo,
dizer, na hipótese de um documento formal composto de 30 artigos com apenas 12
correspondentes à sua ideologia, que somente esses 12 artigos são a Constituição e os
18 artigos restantes seriam meras leis constitucionais. Assim, a Constituição,
efetivamente, de acordo com o autor, será apenas aqueles 12 artigos que coincidem
com a visão política fundamental do titular do poder.

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O objetivo desse pensamento é legitimar a visão de mundo do Führer – o titular do
poder executivo, dotado de legitimidade extraordinária dada pelo espírito do povo
alemão. Esse entendimento, apesar de ultrapassado e inaceitável nos dias atuais, serve
de inspiração para que alguns autores contemporâneos construam um raciocínio
semelhante, o qual resulta na classificação dentro de uma mesma Constituição, entre
normas formalmente constitucionais e materialmente constitucionais.

De acordo com essa classificação, as normas formalmente constitucionais distinguem-


se por não versarem sobre conteúdo que corresponda a uma norma de importância
constitucional, apesar de estarem dispostas em uma Constituição, v.g. o clássico
exemplo da norma que prevê que o Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, permanecerá
sob a órbita federal, prevista no art. 242, § 2º. Já as normas materialmente
constitucionais obedecem tanto ao critério da matéria quanto ao da forma, ou seja,
tanto tratam de conteúdo, da matéria, de importância constitucional, quanto à forma,
porquanto estão previstas no corpo do documento constitucional v.g. normas que
tratam da organização dos poderes, dos direitos fundamentais.

O sentido político de Constituição pensado por Carl Schmitt é o de que a Constituição


deve servir a quem detém o poder em determinada sociedade, especialmente ao
governante ou líder político. Servirá para que o governante estabeleça o modo como a
sociedade deve se organizar.

Assim, a Constituição não deve se preocupar com aspectos sociológicos, mas exprimir
sentido político. Portanto, não precisaria, como sugere o sentido sociológico,
representar um espelho da sociedade, mas, sim, ser seu paradigma, sua referência, um
modelo a ser atingido.

Como visto acima, Carl Schmitt defendia a ideia de Constituição como a decisão
política fundamental (SCHMITT, 1982). Segundo esse ideal, nela estariam contidas
as normas relativas à estrutura do Estado e dos Poderes e um rol de direitos
fundamentais.

Se normas outras estiverem contidas na Constituição, segundo esse sentido político,


não seriam Constituição propriamente dita, mas meras leis constitucionais. Por isso,
ligada a essa ideia de Constituição está a definição de Constituição material, que
seria o conjunto de normas a respeito da forma de governo, organização do poder,
distribuição de competências, direitos da pessoa humana e exercício da
autoridade, ou seja, normas relativas à composição e ao funcionamento da
ordem política.

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Atenção!

Nas provas, é comum se dizer que Carl Schmitt prega que uma
Constituição, em seu sentido político, deve trazer a decisão política
fundamental, espelhando normas com conteúdo constitucional. Tudo
aquilo que não tiver relação com uma decisão política fundamental deve
ser considerado mera lei constitucional, com menor importância.

1.3. Sentido jurídico

Dentre os sentidos estudados, esse é o mais importante. O sentido jurídico é atribuído


ao jurista austríaco Hans Kelsen, em 1934.

Para Kelsen, a Constituição seria um objeto do mundo jurídico, por isso a necessidade
de concebê-la em seu sentido jurídico. Constituição é norma jurídica, sendo paradigma
máximo de validade do ordenamento jurídico.

Kelsen é conhecido por ter desenvolvido a Teoria Pura do Direito. Para ele, o Direito é
uma ciência pura, e, por isso, ao estudá-lo, não seria necessário verificar aspectos
sociológicos, filosóficos, culturais ou políticos.

Segundo a Teoria Pura do Direito (KELSEN, 1998), o objeto de estudo do Direito é a


norma, que pode ser um princípio, uma regra ou mesmo estabelecer uma finalidade a
ser perseguida. Kelsen defende que, para a análise do Direito e das normas jurídicas,
somente importam as próprias normas.

Para o autor, a validade de uma norma jurídica é verificada quando uma norma que lhe
é superior a sustenta. A representação gráfica disso é dada pela famosa Pirâmide de
Kelsen. Na base da pirâmide, estão os atos infralegais; no meio, as normas legais; e, no
topo, as normas constitucionais.

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A pirâmide espelha um ordenamento jurídico escalonado que trabalha em um plano de
validade. Uma norma deve retirar seu fundamento de validade de outra norma
hierarquicamente superior.

No topo da Pirâmide de Kelsen, está a Constituição, o paradigma máximo do


ordenamento jurídico de cada Estado. Acima dela não há outras normas. Para
esclarecer o paradigma de validade de uma Constituição, Kelsen afirma que toda
ciência e teoria devem contar com verdades pressupostas e não contestáveis.

Assim, por ficção, diz-se que a Constituição retira sua validade de uma norma
hipotética fundamental. Essa norma hipotética fundamental traz apenas um preceito:
“cumpra-se a Constituição”.

A Constituição é o ato normativo mais forte do ordenamento jurídico. Qualquer lei ou


ato que a contrarie não será válido.

A Constituição, nessa teoria, apresenta dois sentidos: um lógico-jurídico e outro


jurídico-positivo. O sentido lógico-jurídico traz como fundamento e paradigma dela
mesma (é a norma hipotética fundamental). Já em seu sentido jurídico-positivo, a
Constituição é um ato posto, uma norma positiva suprema, cujo fundamento máximo de
validade é a Constituição posta.

Em nosso ordenamento, a pirâmide de Kelsen pode ser visualizada da seguinte forma:

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Ainda segundo o autor, a Constituição é uma norma jurídica e, como tal, todas as
categorias relativas às normas jurídicas são aplicáveis: vigência, validade, eficácia,
hierarquia; enfim, a Constituição seria a norma jurídica de maior hierarquia possível
dentro desse sistema organizado de normas. Toda norma jurídica é válida porque existe
um fundamento de validade em uma norma a ela superior; é válida porque existe uma
norma jurídica que lhe dá sustentação e validade; logo, um decreto tem validade
porque é baseado em uma lei federal que ele se propõe a regulamentar. A portaria, por
sua vez, é expedida com fundamento no decreto.

Subindo nessa escala, inevitavelmente, chegaríamos à Constituição que, nessa


metáfora, é o vértice e condicionaria a validade de todo o sistema normativo à
compatibilidade com o seu texto.

Chegando-se ao topo, é inevitável perguntar qual seria, então, o fundamento de


validade da Constituição. Não seria possível abrir um parêntese tão extenso para tratar
do que Kelsen nomeia como “norma fundamental hipotética”, aquele que dá validade a
uma Constituição, pois é necessária uma visão mais objetiva para a prova.

O conceito de Constituição, enquanto norma jurídica superior que condiciona validade


das demais normas à compatibilidade com seu texto, hierarquizado, está arraigado no
entendimento comum do Direito, que desde o início aprende-se na faculdade, no curso
de Direito. Não é possível, contudo, dizer que o raciocínio de Kelsen está ultrapassado.

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Contudo, a visão de Kelsen mostra-se limitada para explicar alguns questionamentos.
V.g., veja-se a questão da moralidade que, a despeito da expressa previsão entre os
princípios da Administração Pública no art. 37 da CF/1988, não é observada na prática
por muitos gestores públicos. O mesmo pode ser dito a respeito da eficiência, que
também não é observada por muitos órgãos públicos, que não atuam com eficiência
para a satisfação do interesse público: seria a Constituição suficientemente descrita
com base em conceitos estritamente jurídicos?

Em outro exemplo, porque, apesar de a Constituição prever o devido processo legal,


contraditório e a ampla defesa, poderia, em tese, uma pessoa ser morta pela polícia
(fora das situações legítimas) por ser suspeita de um crime sem o devido processo
legal? Ou, ainda, que uma pessoa receba a pena de morte, sem que o ordenamento
jurídico a preveja para aquela situação? Ou seja, o conceito jurídico de Constituição não
consegue solucionar o porquê de as normas Constitucionais não serem efetivas,
aplicáveis na realidade prática.

1.4. Sentido culturalista

O sentido culturalista da Constituição foi estudado por Michele Ainis, em 1986.


Segundo esse sentido, a Constituição representaria o fato cultural (AINIS, 1986), ou
seja, disciplinaria as relações e os direitos fundamentais relativos à cultura, como
educação, desporto e cultura em sentido estrito.

Aqui, a ideia é a de que os três posicionamentos anteriores (sentidos sociológico,


político e jurídico) não podem ser adotados de forma isolada. A Constituição é produto
da cultura de um povo, sendo elemento da cultura de um Estado.

Assim, a Constituição não deve atender a apenas um sentido, mas, sim, levar em
consideração todos os sentidos anteriores, observando elementos sociológicos,
jurídicos, políticos dentre outros. Ele deve, ainda, ser total, constituindo-se na soma de
elementos da cultura de um povo, para, dessa forma, se aproximar da sociedade e da
lógica jurídica.

1.5. Sentido aberto

Esse sentido é trabalhado pelo jurista português J. J. Gomes Canotilho (1993) e por
Peter Häberle, em 1975 (HÄBERLE, 2002). Para eles, a Constituição deve estar mais
próxima possível das pessoas que irão usá-la, isto é, do povo.

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Portanto, de acordo com esse sentido, a Constituição será aquela interpretada por
todo o povo, ou seja, deve ser vivida e desvendada por toda a sociedade, pois somente
assim terá efetividade social. A ideia que esse sentido traz seria a de desburocratizar os
elementos que envolvem a Constituição e tornar o povo o seu intérprete, uma vez que é
o seu destinatário.

2. Classificação das constituições

Existem vários critérios para classificar as Constituições. Portanto, passaremos a uma


análise de cada um deles encontrados nas doutrinas, segundo Moraes (2018), Lenza
(2019) e Mendes e Branco (2017). Ao final, concluiremos nossa análise apontando a
classificação de nossa atual Constituição.

2.1. Quanto à origem

Quanto a sua origem, a Constituição pode ser: a) democrática/promulgada/popular/


votada; b) outorgada; c) cesarista ou bonapartista; d) pactuada ou dualista.

a) Democrática/promulgada/popular/votada

A Constituição democrática tem origem na vontade popular, sendo elaborada por


legítimos representantes do povo, normalmente organizados em torno de uma
Assembleia Constituinte. Democrática é aquela Constituição que se origina de um
governo do povo. Promulgada é a Constituição democrática que é posta a cumprimento
pela vontade do povo. Por exemplo: foram democráticas as Constituições brasileiras de
1891, 1934, 1946 e 1988.

b) Outorgada

A Constituição outorgada, ou não democrática, é o oposto da Constituição promulgada.


Ela não provém da vontade popular, sendo imposta, baixada ou ordenada. Em doutrina,
costuma-se denominar a Constituição outorgada como Carta, por isso, critica-se o uso
da expressão “Carta Magna” para referir-se a Constituições democráticas, como a de
1988. A Carta é escrita pelo próprio governante, que a impõe ao Estado, utilizando-se
do poder constituinte originário.

Por exemplo: foram outorgadas as Constituições brasileiras de 1824, 1937 e 1967.

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c) Cesarista ou bonapartista

A Constituição cesarista, bonapartista, plebiscitária ou referendária tem estrutura


mista. O texto é elaborado pelo governante, como ocorre na Constituição outorgada. A
diferença é que ela é submetida à votação popular, por plebiscito ou referendo. Apesar
de haver o plebiscito ou referendo popular, não podemos considerar uma Constituição
cesarista como democrática, uma vez que a consulta é apenas para dar uma
“aparência” de legitimidade popular. Na realidade, já existe uma decisão pautada na
vontade do governante e, não, na vontade do povo. Por exemplo: Constituições
bonapartistas (Napoleão I as submeteu a plebiscito) e Cartas Plebiscitárias do Chile
(Pinochet as submeteu a plebiscito).

d) Pactuada ou dualista

Por fim, tem-se a Constituição pactuada, ou dualista, que é uma reminiscência histórica
da Idade Média. Hoje não mais existem Constituições pactuadas, formadas a partir de
um acordo de vontades entre o soberano e alguns grupos sociais mais favorecidos.
Assim, eram atendidos os interesses dos grupos privilegiados, mantendo-se uma
aparente estabilidade política, evitando revoluções populares e iminentes rupturas. Por
exemplo: Magna Carta de 1215 (pacto entre barões ingleses e o monarca João Sem
Terra).

A seguir, é apresentado um quadro-resumo sobre a classificação das Constituições


brasileiras quanto à origem:

ANO CLASSIFICAÇÃO QUANTO À ORIGEM

PROMULGADA
Sem sombra de dúvidas foi uma
Constituição promulgada com
participação de diversos setores da
1988
sociedade civil organizada e diversos
grupos representativos de interesses da
pluralidade de visões de mundo existentes
no Brasil.

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OUTORGADA
Com o Golpe Civil de 64 e o apoio do
Parlamento, o Presidente eleito João
Goulart foi deposto e uma nova
Constituição foi outorgada em 1967.
Quase toda a doutrina, com exceção de
um autor, considera a Constituição de
1967 uma Constituição outorgada pela
ausência de legitimidade democrática
naquele momento pela deposição de um
Presidente eleito.
Contudo, Gilmar Mendes entende que
essa Constituição foi promulgada, pois a
classificação outorgada ou promulgada
diz respeito ao ato meramente formal,
pelo qual foi introduzida no ordenamento
jurídico. Basicamente, para ele, apenas
importa se houve ou não Assembleia
constituinte nesse momento e se houve ou
não legitimidade democrática. E como o
congresso Nacional estava em
funcionamento e houve uma Assembleia
constituinte formal para a elaboração
dessa Constituição, ele entende que essa
Constituição foi promulgada. O autor
1967/1969
concorda que essa Constituição não foi
democrática, mas afirma que a
classificação quanto à origem não leva em
conta tal critério.
Em 1969, houve a Emenda
Constitucional/1969, cujas alterações

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trazidas foram tão drásticas que alguns
autores entendem que, na verdade,
tratou-se de um novo poder constituinte
originário. O Ato Institucional nº 5 do
mesmo ano representou um grande
retrocesso nos direitos fundamentais:
intervenção do poder executivo no
judiciário com a decretação da
aposentadoria compulsória de seus
membros, afastamento da apreciação da
constitucionalidade dos próprios atos
institucionais pelo poder judiciário,
restrição da garantia do habeas corpus
etc.
Em 1986, com a abertura democrática,
houve o início dos trabalhos da
Assembleia Constituinte, que culminou
com a Constituição da República
Federativa do Brasil (CF/1988).

PROMULGADA
A Justiça Eleitoral retorna, bem como os
partidos políticos, as eleições livres e a
autonomia dos Estados.
Durou até o Golpe das forças
conservadoras, tanto políticas, quanto
1946 civis e militares contra o Presidente eleito
João Goulart, por ter ele adotado um

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posicionamento mais alinhado à esquerda
em um contexto histórico extremamente
maniqueísta da Guerra Fria, Socialismo x
Capitalismo.

OUTORGADA
Estado Novo.
Vargas não acreditava em uma Federação
descentralizada pelo poder das elites
locais, nem que os partidos políticos
representavam as visões de mundo do
Brasil.
Assim, apostava em um Estado
centralizado no poder Executivo e na
União, que foram fortalecidos, sendo a
autonomia do Judiciário restrita.
Vargas dissolveu os partidos políticos.
Ampliação dos direitos sociais,
especialmente dos direitos relativos aos
trabalhadores, já que a base de
sustentação de seu projeto era o
populismo. Fato é que,
independentemente de tal finalidade, são
inegáveis os avanços nas relações de
trabalho.
Constituição polaca, porque,
evidentemente, foi inspirada na
Constituição Polonesa, que, por sua vez,

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1937 era inspirada nos ideais fascistas da
primeira metade do século XX na Europa.
Vargas não ocultava sua simpatia pelos
valores típicos fascistas de culto ao líder,
centralização do poder nas mãos do poder
executivo federal, repúdio ao
pluripartidarismo, o que causou um
déficit democrático importante.
O fascismo não era, naquele período
histórico, necessariamente algo ruim,
apenas uma visão possível de mundo para
aquele momento.
Ocorre que, quando pressionado, Vargas,
escolhe tomar partido dos Aliados,
enviando a Força Expedicionária
Brasileira à Europa para auxiliar nos
esforços de Guerra na Itália,
especialmente. Tendo sido derrotados o
Fascismo e o Nazismo na Europa, o
regime de Vargas entra em colapso, pois
acabara por combater o regime ao qual
ele próprio se inspirou na elaboração da
Constituição de 1937. Assim, Vargas
renuncia em 1945.

PROMULGADA
Revolução de 30. Getúlio Vargas.
1934 Voto feminino.
Justiça Eleitoral.

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Constituição menos duradoura.

PROMULGADA
Após a expulsão de D. Pedro II e a
Proclamação da República, portanto, a
primeira Constituição Republicana.
Foi inspirada na Constituição Americana
de 1787. Forma de Estado Federativa,
reconhecimento de autonomia aos
Estados da federação.
Previa eleições para os cargos não
vitalícios de todos os representantes dos
poderes executivo e legislativo.
Alternância no exercício do poder.
1891
Crítica à importação do modelo
americano, com não observância da
distinção das realidades.
Aumento do Sufrágio, com a incorporação
dos analfabetos e sem a demonstração de
renda, porém, ainda sem a incorporação
do voto feminino.
Falsa democracia. Fraudes
institucionalizadas na República Velha.
Coronelismo. Poder dos senhores de terra
sobre ex-escravos, analfabetos em uma
estrutura essencialmente agrária.

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OUTORGADA
Após a Independência em 1822, D. Pedro
I, imperador à época, nomeou uma
comissão para a elaboração de um projeto
de Constituição, ou seja, uma espécie de
Assembleia constituinte com algum grau
de participação popular. Com a percepção
de que aquele projeto seria
excessivamente liberal, que subtrairia
poderes da monarquia, o Imperador
dissolveu aquela Assembleia e impôs uma
1824 Constituição em 1824.
Essa Constituição previa os três poderes e
o poder Moderador, exercido pelo
imperador, e tinha atribuições que
permitiam intervir nas funções típicas dos
outros poderes. Tinha certa ascendência
sobre a função legislativa, sobre a função
jurisdicional de forma a preservar a
supremacia da Coroa.

Essa Constituição foi também a única


Constituição semirrígida do Brasil.

2.2. Quanto ao conteúdo

Duas são as classificações possíveis: a) formal ou procedimental; b) material ou


substancial.

a) Formal ou procedimental

A Constituição formal ou procedimental é aquela que contém tanto normas de conteúdo

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constitucional como normas outras às quais se queira dar esse status. Nela, são
consideradas constitucionais todas as normas presentes no documento solene,
independentemente de seu conteúdo. Assim, a essência para que a norma seja
concebida com status constitucional está na forma e, não, na matéria. Para ilustrar,
temos o art. 242, § 2º, da CF/1988, que dispõe: “O Colégio Pedro II, localizado na
cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal”. Apesar de não ter conteúdo
constitucional (não é materialmente constitucional), tem status de norma
constitucional, pois a CF/1988 é uma Constituição formal. Exemplo: todas as
Constituições brasileiras, exceto a Constituição de 1824.

Atenção!

Constituições formais estão repletas de normas materialmente


constitucionais. A diferença é que contém também normas outras. O
direito brasileiro, pensando na base jurídico-positiva de Kelsen, no
ordenamento escalonado e na Teoria Pura do Direito, leva em
consideração apenas a roupagem da norma. Se a norma está revestida de
conteúdo constitucional, sendo parte do corpo constitucional, ela tem
status de norma constitucional, sendo irrelevante o tema nela tratado.

b) Material ou substancial

Constituição material ou substancial é aquela composta somente por regras que


exteriorizam a forma do Estado, a organização dos Poderes e os direitos fundamentais.
Não necessariamente são compostas por um só documento, uma vez que todas as
normas que tiverem conteúdo constitucional terão esse status.

Assim, a essência para que a norma seja considerada com status constitucional está na
matéria e, não, na forma. A forma não importa, podendo até mesmo decorrer do
costume. Exemplo: a Constituição brasileira de 1824 considerava materialmente
constitucional apenas o que dissesse respeito aos limites, às atribuições dos poderes,
aos direitos políticos, bem como aos direitos individuais dos cidadãos.

2.3. Quanto à forma

No que diz respeito à forma, é possível classificar as Constituições de duas maneiras: a)


escrita ou instrumental; b) não escrita.

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a) Escrita ou instrumental

A Constituição escrita ou instrumental pode ser subdividida em escrita legal ou


escrita codificada. A Constituição escrita legal é formada por um texto que advém
de documentos esparsos ou fragmentados. Exemplo: Constituições belga de 1830 e
francesa de 1875. A Constituição escrita codificada ou sistematizada é formada por
um texto contido em um único documento. Exemplo: todas as Constituições brasileiras.

b) Não escrita

Não existe conexão com a literalidade do termo, ou seja, não quer dizer que sejam
literalmente não escritas, mas apenas que não apresentam um único veículo solene de
apresentação, não estão consolidadas em um único documento histórico formalmente
identificado como Constituição e, sim, que estão espalhadas em diversos documentos
de valor histórico, em costumes constitucionais. A Constituição não escrita, costumeira
ou consuetudinária é formada pela reunião dos costumes, da jurisprudência
predominante e até mesmo por documentos escritos. Portanto, em grande parte, ela
não é escrita, mas sempre existe uma parte escrita. A doutrina entende que não existe
uma Constituição integralmente não escrita. Veja-se o exemplo do Reino Unido, que
possui diversos documentos históricos esparsos, com valor constitucional
costumeiramente reconhecido, de acordo, ainda, com as práticas sociais reiteradas e
com a construção da jurisprudência dos Tribunais, como a Magna Carta, de 1215, o Bill
of Rights, o Petition of Rights, de 1689, o Human Rights Act.

Atenção!

Cuidado com as provas que afirmam que uma Constituição não escrita é
aquela que não possui escritos. A afirmativa é errada. Uma Constituição
não escrita jamais será integralmente sem escritos.

2.4. Quanto à estabilidade, à mutabilidade ou à alterabilidade

Nesse critério, temos seis possíveis classificações: a) imutável; b) fixa; c) super-rígida;


d) rígida; e) flexível; f) semirrígida, semiflexível ou mista.

a) Imutável

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As Constituições imutáveis ou eternas, como o próprio nome já aponta, não podem ser
alteradas, a não ser que haja ruptura causada por uma nova manifestação do poder
constituinte originário, o que, na verdade, é uma tendência. Isso porque os
ordenamentos jurídicos que a adotarem sofrerão mais intensamente os efeitos da
legitimidade intergeracional, posto que não se adaptarão com facilidade às
necessidades das gerações posteriores, que provavelmente serão divergentes das
visões ideológicas da que a elaborou. Por exemplo: Lei das Doze Tábuas. A Constituição
brasileira de 1824 foi provisoriamente imutável por um período de quatro anos após ser
outorgada, por previsão expressa.

b) Fixa

Constituição fixa é a que só pode ser alterada pelo poder constituinte originário, ou
seja, pela criação de uma nova Constituição. Trata-se de classificação que não tem
consenso na doutrina. Exemplos: Carta espanhola de 1876 e Estatuto do Reino da
Sardenha de 1848.

c) Super-rígida

Essa Constituição contém parte rígida e parte imutável, ou seja, apesar de parte dela
não poder ser alterada por um processo equivalente às leis infraconstitucionais,
dependendo de um processo qualificado, tal como ocorre com a nossa Emenda
Constitucional, parte dela é imutável, ou seja imune ao poder constituinte reformador,
pois, por suas limitações materiais previstas no próprio texto, há partes que não podem
ser alteradas, nem mesmo por um processo qualificado. É o caso das cláusulas pétreas.
Conforme já mencionado, para a doutrina tradicional que adota apenas três
classificações quanto à estabilidade do texto, no Brasil, em tese, temos uma
Constituição rígida. Contudo, para parte da doutrina que amplia esta classificação, a
Constituição brasileira seria enquadrada como super-rígida, conforme os Ministros
Alexandre de Moraes e Maria Helena Diniz. Exemplos: Constituição brasileira de 1988
(cláusulas pétreas são imutáveis e demais normas podem ser alteradas mediante
procedimento dificultoso de alteração).

Atenção!

A espécie super-rígida não é predominante, nem na doutrina nem nas


provas. Prevalece o entendimento de que a CF/1988 é rígida. Conforme
já mencionado, para a doutrina tradicional que adota apenas três
classificações quanto à estabilidade do texto, no Brasil, em tese, temos

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uma Constituição rígida. Contudo, para parte da doutrina que amplia
esta classificação, a Constituição brasileira seria enquadrada como
super-rígida, conforme os Ministros Alexandre de Moraes e Maria Helena
Diniz.

d) Rígida

Constituição rígida é a que pode ser alterada, mas mediante processo de alteração mais
difícil do que aquele normalmente utilizado para as leis. Exemplos: Constituições
brasileiras de 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967.

e) Flexível

Flexível é a Constituição que pode ser alterada pelo mesmo processo utilizado para
alterar qualquer norma do ordenamento jurídico. Exemplos: Constituições da
Inglaterra, da Finlândia e da Nova Zelândia.

f) Semirrígida, semiflexível ou mista

A Constituição semirrígida, semiflexível ou mista é aquela que tem uma parte flexível e
outra rígida. Assim, uma parte dela exige, para sua alteração, um procedimento
especial e mais rígido, enquanto outra parte poderá ser alterada da mesma forma que
as demais normas do ordenamento jurídico. Exemplos: Constituições brasileira de 1824
e irlandesa de 1922.

Atenção!

Outras classificações doutrinárias quanto à alterabilidade:

a) Transitoriamente flexível: como o próprio nome indica, durante


certo prazo essa Constituição admite que seja alterada por um processo
equivalente ao de normas ordinárias. Após esse prazo, ela passará a ser
rígida, admitindo alterações somente pelo modo mais complexo. Há quem
diga, de forma absolutamente minoritária, que a CF/1988, apesar de
considerada majoritariamente rígida, pelo fato de ter previsto um
procedimento de reforma por meio da revisão constitucional, admitindo
essa possibilidade após cinco anos por meio de um procedimento menos

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complexo, poderia ser considerada uma Constituição transitoriamente
flexível. Contudo, não se recomenda a sua opção em gabarito de prova
objetiva.

b) Transitoriamente imutável: diversamente da anterior, como o


próprio nome sugere, durante certo período, essa Constituição não
poderá ser alterada.

c) Constituição silenciosa: Segundo Pedro Lenza (Direito


Constitucional Esquematizado; 2019; p. 116), ao citar a conceituação de
Kildare Gonçalves Carvalho, constituições fixas/silenciosas “...são
aquelas que somente podem ser alteradas por um poder de competência
igual àquele que as criou, isto é, o poder constituinte originário. São
conhecidas como constituições silenciosas, porque não estabelecem,
expressamente, o procedimento para a sua reforma...”.

d) Constituição em branco: é aquela que não prevê nenhum


procedimento de alteração. Presume-se que somente o poder constituinte
originário poderia alterar.

2.5. Quanto à extensão

Nesse critério, temos duas possíveis classificações: a) sintética, concisa, sumária


ou reduzida; b) analítica.

a) Sintética, concisa, sumária ou reduzida

Constituições sintéticas, também chamadas concisas, sumárias ou reduzidas, são as


que regulamentam somente os princípios básicos de um Estado, disciplinando sua
organização e limitando seu poder por meio da estipulação de direitos e garantias
fundamentais. Exemplo: Constituição dos Estados Unidos da América de 1787 (apenas
sete artigos).

b) Analítica

Constituição analítica, também chamada prolixa ou longa, é aquela que trata não
somente dos princípios básicos e direitos fundamentais, como também disciplina outros

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assuntos, como ordem econômica e social.

Por exemplo: Constituição brasileira de 1988.

2.6. Quanto à estrutura

No que tange à estrutura, podemos classificar as constituições como: a) garantia,


liberal, defensiva ou negativa; b) dirigente; c) balanço.

a) Garantia, liberal, defensiva ou negativa

Constituição garantia, também chamada liberal, defensiva ou negativa, é aquela que


protege especialmente as liberdades públicas, ou seja, os direitos fundamentais de
primeira dimensão, baseados na ideia liberal de “Estado ausente”. Aqui, o Estado tem
uma posição negativa, não interferindo muito na vida dos cidadãos.

b) Dirigente

Constituição dirigente é aquela que dá especial atenção à implementação de políticas


públicas pelo Governo. Essa Constituição protege sobretudo os direitos fundamentais
de segunda dimensão, ou seja, direitos sociais que demandam prestações positivas do
Estado.

Atenção!

A Constituição brasileira de 1988 é, ao mesmo tempo, considerada


garantia/ liberal/defensiva/negativa e dirigente, uma vez que dá especial
atenção às liberdades públicas, mas também aos direitos sociais.

c) Balanço

Constituição balanço é aquela que apenas descreve e registra a organização política


estabelecida, ou seja, faz um balanço da situação vivenciada em dado momento
histórico, não tendo por objetivo alterar essa realidade. Exemplos: Constituições
soviéticas de 1924, 1936 e 1977.

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2.7. Quanto ao modo de elaboração

No critério modo de elaboração, podemos classificar as constituições como: a)


dogmática; b) histórica.

a) Dogmática

São consideradas dogmáticas aquelas Constituições influenciadas por uma ideologia


específica, dos valores revolucionários de um momento histórico. A Constituição da
República Federativa do Brasil (CF/1988) é dogmática, pois é intensamente
influenciada pelos ideais do momento de transição do regime militar para a
democracia, a partir de 1986, com o início dos trabalhos da Assembleia Nacional
constituinte.

b) Histórica

São consideradas históricas aquelas Constituições que não são influenciadas por uma
ideologia específica prevalente ou revolucionária de um momento histórico de ruptura.
Antes, representam a consolidação de valores e costumes preexistentes construídos de
maneira gradual e tradicional de um Estado ao longo da história daquele Estado. Por
exemplo: Constituição inglesa.

2.8. Quanto à ideologia

Quanto à ideologia adotada, podemos classificar as constituições como: a) ortodoxa;


eclética.

a) Ortodoxa

Constituição ortodoxa é firmada apenas sobre uma verdade, seja ela moral, religiosa ou
filosófica, ou seja, é formada sob a ótica de somente uma ideologia. Abraça uma única
visão de mundo bastante específica, uma única ideologia oficial, assumida de forma
bastante expressa, clara e evidente. Trata-se de um modelo bem menos preocupado
com o pluralismo de ideias e opiniões e mais preocupado com a defesa e com
veiculação de seu ideal específico. V.g., a Constituição de Cuba, que veicula o ideal e
valores socialistas do partido socialista. Outro exemplo seria o da Constituição
soviética.

b) Eclética, pragmática ou compromissória

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Constituição que abraça a pluralidade de ideias e busca conciliá-las. Representa um
compromisso com a pluralidade de ideias para que todos os ideais possam ser refletidos
pelos seus representantes eleitos. Defende um debate livre de ideias com a utilização
da liberdade de expressão e dos direitos políticos dos indivíduos. Por exemplo:
Constituições brasileiras de 1988 e portuguesa de 1976.

2.9. Quanto ao valor, à essência, à ontologia ou ao grau de


correspondência com a realidade

Esse critério foi estudado por Karl Loewenstein. Segundo ele, podemos classificar as
constituições de três formas: a) normativa; b) nominal ou nominativa; c) semântica ou
simulacro.

a) Normativa

Constituição normativa é aquela que é dotada de valor jurídico legítimo,


correspondendo à realidade. Assim, tem normatividade e efetividade. Por exemplo:
Constituição Americana de 1787.

b) Nominal ou nominativa

Constituição nominal, também chamada nominativa, é aquela que tem baixo grau de
correspondência com a realidade, trazendo em seu conteúdo o que seria a realidade
“ideal”, buscada, mas ainda não atingida. Em razão disso, tem baixa efetividade. É
também chamada de “constituição de fachada”. Por exemplo: Constituições brasileiras
de 1891, 1934 e 1946.

Atenção!

Há controvérsia doutrinária quanto à classificação da CF/1988 no tocante


ao critério ontológico, se nominal ou normativa. Nesse sentido, segundo
Guilherme Peña de Moraes, a Constituição de 1988 "pretende ser"
normativa (Lenza, 2019).

c) Semântica ou simulacro

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A Constituição semântica, também chamada simulacro, é aquela que não tem qualquer
grau de relação com a realidade social. Diferentemente da nominal, na qual se tem na
Constituição um objetivo buscado, a Constituição semântica não pretende atingir
coerência com a realidade. Normalmente, é utilizada com o fim de legitimar um poder
não democrático. Exemplos: Constituições brasileiras de 1937 e 1967. A seguir, é
apresentado um quadro-resumo da classificação das Constituições:

CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES

a) Democrática, promulgada, popular ou


votada.
b) Outorgada.
Quanto à origem c) Cesarista, bonapartista, plebiscitária
ou referendária.
d) Pactuada ou dualista.

a) Formal ou procedimental.
Quanto ao conteúdo b) Material ou substancial.

a) Escrita ou instrumental: escrita legal e


escrita codificada/sistematizada.
Quanto à forma b) Não escrita, costumeira ou
consuetudinária.

a) Imutável.
b) Fixa.
c) Super-rígida.

Quanto à estabilidade, à mutabilidade ou d) Rígida.

à alterabilidade e) Flexível.
f) Semirrígida, semiflexível ou mista.

a) Sintética, concisa, sumária ou


reduzida.
Quanto à extensão
b) Analítica, prolixa ou longa.

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a) Garantia, liberal, defensiva ou
negativa.
Quanto à finalidade b) Dirigente.
c) Balanço.

a) Dogmática.
Quanto ao modo de elaboração b) Histórica.

a) Ortodoxa.
Quanto à ideologia b) Eclética.

Quanto ao valor, à essência, à ontologia a) Normativa.

ou grau de correspondência com a b) Nominal ou nominativa.

realidade c) Semântica ou simulacro.

3. Máximas quanto às classificações das constituições

Após trabalhar com os nove grandes critérios de classificação das constituições, é


possível se chegar a algumas máximas. Vejamos:

a) Toda constituição rígida é escrita, pois é impossível haver rigidez em uma


Constituição não escrita ou consuetudinária, uma vez que é preciso que seu processo
de alteração seja definido, escrito.

b) Nem toda constituição escrita é rígida, uma vez que o texto pode fazê-la
imutável, fixa, rígida, flexível ou semiflexível.

c) Toda constituição costumeira é flexível (ao menos conceitualmente), pois a alteração


se faz junto com os costumes, não havendo imposição de formas específicas para que
seja alterada.

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4. Classificação da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988

Em conclusão ao estudo dos critérios de classificação das Constituições, passamos à


análise da classificação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, uma
vez que esse tema é muito cobrado em provas.

Para facilitar a visualização, segue o quadro:

CLASSIFICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE


1988

1. Democrática/ promulgada/popular/ Foi elaborada por legítimos


Votada representantes do povo, em uma
Assembleia Constituinte.

Documento solene, em que todas as


2. Formal
normas têm status constitucional,
independentemente de seu conteúdo.

3. Escrita codificada Formada por texto escrito em documento


único.

Rígida, pois seu processo de alteração é

4. Rígida ou mais difícil do que o utilizado para criar

super-rígida leis; super-rígida, pois além de ter


processo mais difícil, tem uma parte
imutável (cláusulas pétreas).

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Vai além do conteúdo básico de
5. Analítica
Constituições, trazendo também outros
assuntos.

6. Garantia, liberal, defensiva ou Traz proteção especial às liberdades


negativa e dirigente públicas, mas também à implementação
de programas sociais pelo Estado.

7. Dogmática Sistematizada a partir de ideias


fundamentais.

8. Eclética Fundada em uma pluralidade de ideais e


valores.

Dotada de valor jurídico legítimo,


9. Normativa correspondendo à realidade, atendendo à
normatividade e efetividade.

Tendo já estudado as possíveis classificações atribuídas às Constituições, importante


conhecer a classificação das Constituições que já vigeram no Brasil (MENDES;
BRANCO, 2017).

a) Constituição de 1824

A primeira Constituição brasileira foi outorgada com a independência de Portugal e a


que durou mais tempo, resultado de considerável influência da francesa de 1814. Uma
de suas características era o forte centralismo administrativo e político. Nela

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estava presente ainda, além dos clássicos três poderes, o Poder Moderador, sendo
marcada por unitarismo e absolutismo. O governo era monárquico, hereditário,
constitucional e representativo, adotando a forma unitária de Estado. O território era
formado por Províncias e a religião oficial do Império era a Católica Apostólica Romana,
sendo a capital o Rio de Janeiro. Havia eleições indiretas para o Poder Legislativo, e o
direito a voto era censitário, baseado em condições econômico-financeiras de seus
titulares.

b) Constituição de 1891

Com Assembleia Constituinte eleita em 1890, foi a primeira Constituição


Republicana do Brasil, promulgada. Foi fortemente influenciada pela Constituição
norte-americana de 1787, adotando o governo presidencialista, abandonando o
unitarismo e elegendo a forma de Estado federal, bem como a forma de governo
republicana. Nessa Constituição, não havia mais religião oficial, sendo também extinto
o Poder Moderador. O sufrágio passou a ser direto, assim como as eleições. Houve
também um aumento no que diz respeito às garantias fundamentais, passando a estar
previsto na constituição o habeas corpus.

c) Constituição de 1934

A Constituição promulgada em 1934 foi influenciada pela crise econômica de 1929, de


modo que traz ideais baseados na Constituição de Weimar da Alemanha de 1919,
prevendo direitos humanos de segunda dimensão, correspondendo ao
constitucionalismo social, trazendo um Estado social de direito.

Nela também estava ausente a religião oficial, permanecendo o ideal de laicidade do


Estado. Passa a ser constitucionalizado o voto feminino com valor igual ao masculino,
sendo também garantido o voto secreto. Surgem também nessa constituição o mandado
de segurança e a ação popular.

d) Constituição de 1937: Apelidada de “Polaca”, em razão da influência da


Constituição Polonesa de 1935, dotada de valores fascistas, deveria ter sido submetida
a plebiscito nacional, o que não ocorreu. Foi, portanto, Constituição outorgada.
Composta por ideais autoritários e fascistas, instalou a ditadura (Estado Novo).
Havia autoridade suprema do Presidente da República, escolhido por eleições indiretas.
Para a escolha dos membros do Congresso também foi prevista eleição indireta, sendo,
contudo, dissolvidos Câmara dos Deputados, Senado, Assembleias Legislativas e
Câmaras Municipais, atribuindo-se ao presidente o poder de editar decretos-leis sobre

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todas as matérias de competência da União até que fossem feitas novas eleições para
escolher os membros do legislativo. Esta, contudo, nunca ocorreu. Houve uma restrição
dos direitos fundamentais, retirando a previsão do mandado de segurança e da ação
popular, havendo censura prévia de imprensa, teatro, cinema e radiodifusão. Foi
também prevista a pena de morte para crimes políticos e homicídio em algumas
hipóteses. Foi declarado o estado de emergência que suspendia direitos e garantias
individuais, sendo proibida a greve e o lock-out.

e) Constituição de 1946: Com a expulsão de Vargas do poder, deposto pelas Forças


Armadas, atribuiu-se poderes constituintes ao Parlamento que seria eleito. O texto da
Constituição de 1946 foi promulgado para promover a redemocratização do País.

As eleições diretas foram reaplicadas e a separação de Poderes foi restabelecida,


garantindo o equilíbrio entre eles. Os direitos fundamentais, antes restritos, foram
também restabelecidos. Vedou-se a pena de morte e a de banimento, assim como a de
caráter perpétuo. O direito de greve foi restabelecido.

f) Constituição de 1967: Posteriormente ao golpe militar de 1964, foi outorgada a


nova Carta Constitucional. Houve nela forte preocupação com a segurança nacional.
Formalmente, foi mantida a separação de poderes, mas, na prática, havia um
predomínio do Executivo, que se utilizava dos decretos-leis para atuar de forma
exacerbada. Houve ainda forte restrição de direitos fundamentais.

g) Constituição de 1969: Trata-se de uma Constituição classificada como outorgada,


mas foi, na verdade, uma emenda Constitucional. Em razão do caráter revolucionário,
parte da doutrina considera a EC nº 1/1969 como uma manifestação do poder
constituinte originário (LENZA, 2019, p. 150-155). Nela, o mandato presidencial foi
aumentado para cinco anos, e foi mantida a eleição indireta. Houve uma intensificação
da rigidez do texto constitucional, uma vez que a maioria exigida para sua alteração foi
alterada de maioria absoluta para 2/3 (maioria qualificada).

h) Constituição de 1988: Marcada pela redemocratização com o fim da ditadura


militar, foi elaborada pela Assembleia Constituinte. Promulgada, é dotada de fortes
características sociais, garantista e democrática. Traz forte e especial proteção aos
direitos políticos, bem como aos direitos sociais. Restabeleceu as eleições diretas e o
equilíbrio entre os Poderes.

6. Estrutura e elementos da Constituição


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Nesse ponto, vamos analisar a estrutura da CF/1988, caracterizada por seus
componentes estruturais, bem como seus elementos.

6.1. Estrutura da CF/1988

A CF/1988 tem três componentes estruturais: a) preâmbulo; b) corpo ou


articulado; ADCT.

Atenção!

Algumas provas referem-se aos três componentes da CF/1988 como


elementos.

a) Preâmbulo

O preâmbulo corresponde ao texto introdutório da Constituição. Este não está escrito


sob a forma de artigo. Nele se revela o compromisso do Poder Constituinte, bem como
os fundamentos a partir dos quais se editou a Constituição que está introduzindo.
Discute-se se o preâmbulo é norma jurídica. O STF já se manifestou no sentido de
que o preâmbulo não é norma jurídica (ADI nº 2.076, rel. Min. Carlos Velloso, j.
15.08.2002, Plenário, DJ de 08.08.2003.), mas apenas uma enunciação de valores e
princípios utilizados pelo constituinte para a criação da Constituição. O preâmbulo,
portanto, não tem força normativa, razão pela qual não pode servir de referência
para o controle de constitucionalidade. Adotou-se, portanto, a tese da
irrelevância jurídica do preâmbulo.

b) Corpo ou articulado

O corpo ou articulado é a parte mais importante da Constituição. É a parte tendente a


ser perene, ou seja, durável, da Constituição. Este se encontra disposto em artigos.

c) ADCT

Trata-se do ato das disposições constitucionais transitórias. A eficácia das normas


previstas nessa parte é exaurível, pois são normas que servem à transição e depois
perdem sua função. Esta é a parte responsável por fazer a transição entre a

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Constituição anterior e a Constituição atual, uma vez que uma grande ruptura
institucional exige que medidas de transição sejam adotadas. Exemplo: art. 2º, do
ADCT: “No dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a
forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo
(parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País” (vide Emenda
Constitucional nº 2, de 1992).

6.2. Elementos da Constituição

Segundo José Afonso da Silva (2006), os elementos da CF/1988 são: a) orgânicos; b)


limitativos; c) socioideológicos; d) de estabilização constitucional; ou e) formais de
aplicabilidade.

a) Elementos orgânicos: Elementos orgânicos regulam a estrutura do Estado e do


Poder. Exemplo: O art. 2º, da CF/1988, diz que “são Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Essa norma é elemento
orgânico, pois versa sobre a organização do Estado brasileiro.

b) Elementos limitativos: Os elementos limitativos ocorrem em relação ao próprio


Estado. São eles os direitos fundamentais, que são enunciados para o cidadão, com o
intuito de limitar a intervenção estatal em relação à vida das pessoas, protegendo o
povo. Exemplo: art. 5º − “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes”.

c) Elementos socioideológicos: São os elementos que revelam os compromissos do


constituinte. Trazem uma ideologia do constituinte. Exemplo: art. 1º, IV, CF/1988 − “A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem
como fundamentos: (...) IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”. São
também exemplos desses elementos os arts. 6º e 7º da CF/1988.

d) Elementos de estabilização constitucional: Os elementos de estabilização


constitucional são aqueles criados para estabilizar a Constituição e o regime
constitucional. Servem para solucionar conflitos institucionais entre Poderes e proteger
a integridade do Estado e da própria Constituição. Exemplo: art. 34, I, CF/1988 − “A
União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: I − manter a
integridade nacional”.

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e) Elementos formais de aplicabilidade: Elementos formais de aplicabilidade são
aqueles que explicam como a Constituição deve ser aplicada e interpretada. Exemplo:
art. 5º, § 1º, da CF/1988 − “as normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata”.

Obra coletiva do Curso Ênfase produzida a partir da análise estatística de incidência


dos temas em provas de concursos públicos.
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