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O ESOTERISMO OCIDENTAL
E SUAS INICIAÇÕES
INCLUINDO
Seguido de uma
LISBOA, 2013
À Carla,
Comecei a interessar-me por este universo quando, ainda jovem na primeira
metade dos anos 60, frequentava a Licenciatura de Físico-Químicas na Faculdade de
Ciências de Lisboa no vetusto edifício da rua da Escola Politécnica. Aí ao estudar a
História da Químicadeparei-mecomessemundofascinantedaAlquimiaecomoseu
exuberante simbolismo que contrastava com a frieza das fórmulas da química
moderna, exuberância essa quefascinoumuitagente,entreosquaisossurrealistase
que me fascinou também.
Maistarde,depoisdeterexercidoumaactividade,durantecercade20anos,de
criminalista químico no Laboratório de Polícia Científica da P.J., e de ter continuado
uma actividade docente, durante 18 anos, no Departamento de Antropologia da
FaculdadedeCiênciasSociaiseHumanasdaUniversidadeNovadeLisboa(FCSH/UNL)
– tendo leccionado durante dois anos, no final desse período, a cadeira de
Antropologia da Religião e do Ritual -, acabei, já depois de deixar a docência na
FCSH/UNL,pormeDoutorarnessamesmaFaculdadeeUniversidadeemAntropologia
(Social e Cultural) da Religião, particularmente no domínio dos Novos Movimentos
Religiosos e das Espiritualidades Alternativas e concretamente estudando os grupos
quepraticamaalquimiaemfinaisdoséculoXXeprincípiosdoséculoXXI–Tesequefoi
publicada em 2009 na Ed. Ésquilo com o título “A Alquimia, os alquimistas
contemporâneos e as novas espiritualidades”. Devo dizer, neste contexto, que sou
membro (desde praticamente a sua fundação) da ESSWE – European Society for the
StudyosWesternEsotericism,criadapeloProf.WouterJ.HannegraaffdaUniversidade
de Amsterdão e por outros académicos como o veterano destes estudos, o Prof.
Antoine Faivre da parisiense EPHE (Sorbonne).
Opresentelivrosegueoformatodosdiversoscursosquedei,dedicadosaestes
temas,deentreosquaissalientoosprimeiros,de1989a2008noex-ISER(Institutode
Sociologia e Etnologia das Religiões) da FD/UNL, fundado e dirigido pelo Professor
Moisés Espírito Santo, e alguns desde 2000 no Centro Nacional de Cultura presidido
peloDr.Guilhermed’OliveiraMartins,masforamestescursosnoÂmbitoCulturaldoEl
CorteInglêsqueatingiramumaaudiênciamaior,comumtotaldecercade1000alunos
ao longo destes últimos 6 anos, dando-me ainda uma maior experiênciaparaatingir
umpúblicomaisalargado,grandepartedoqualsemgrandepreparaçãoesintoniacom
estas áreas. No entanto, devo dizer queaexposiçãooraldestestemaspodesermais
fácil de digerir que a leitura de um livro,pormenos“universitário”queelepretenda
ser, com este. Mesmo assim procurei,nestelivro,darumtomcoloquialpossíveleao
mesmo tempoapresentaraminhavisãodoesoterismoquedecorrenãosódosmeus
estudos académicos, como também dosmeusinteressesedaminhavivênciapessoal
nestes mundos – cada vez mais a aproximação “reflexiva” e autobiográfica está
presente nos estudos actuais das Ciências Sociais e Humanas.
Paralelamenteàactividadedocentetenhopublicadodiversoslivrossobreestes
temas – ensaios reunidos em livros sobre Hermetismo e Esoterismo, quer na antiga
Editora Hugin (“Re-criações herméticas I e II”,entreoutros),quermaisrecentemente
na Editorial Ésquilo, de entre os quais osmeuslivros“FernandoPessoaeosMundos
Esotérios”, “Os Jardins Iniciáticos da quinta da Regaleira”, “Um outro olhar” e em
colaboração, “Mozart e os Mistérios Iniciáticos”, “O Inferno decifrado” de David
Kingsley, etc.
AgradeçoporfimàEditorialArranhaCéusapublicaçãodestelivroeapaciência
comqueesperaramporele,masnãosócontinuoaterumavidamuitoocupadacomo
osanosvãocadavezmaispesando…Felizmentequetiveapossibilidadedeterlivreo
mês de Agosto deste ano e dediquei as minhas “férias” a escrever estelivro,grande
parte de memória, já que o conteúdo destas aulas, com dois cursos por ano nos
últimos 5 ou 6 anos, estão bem presentes no meu espírito.
Notas:
1 - Este livro não é um tratado de esoterismo nem um livro de texto
universitário sobre o assunto – para facilidade de leitura não introduzi as “notas de
roda-pé” - mas é sim uma introdução às correntes esotéricas e às contribuições dos
esoteristaseaomesmotempoumaespéciedeguiãodoscursosquetenhodadosobre
estes temas, particularmente no El Corte Inglês, faltando no entanto, mais leituras
comentadas de trechos deobrasesotéricasparailustraçãodessesmesmostemas–o
que fazemos nas aulas.
2 - Incluo neste domínio do esoterismo as suas vias iniciáticas e os temas
míticos e simbólicos que têm tido prolongamentos e vivências esotéricas, como é o
casodosrituaismaçónicos,porumladoedasfilosofiasdoSebastianismoedoQuinto
Império portugueses, por outro.
3 – Uma vez que estão esgotados os meus livros sobre a QuintadaRegaleira
(em2ª.Edição)esobreoEsoterismodeFernandoPessoa(em3ª.Edição)decidiincluir
asideiasessenciaisdoprimeiro,tendodadomaisespaçoaoesoterirmopessoanopois
Fernando Pessoa foi um profundo conhecedor eentusiastadasdiversascorrentesdo
esoterismo,sendointeressantefazerumarevisitaçãoaestestemaspelavisãogenial–
aomesmotempohistóricaemítica-doPoeta;sobreoesoterismopessoanodaremos
contadanossaperspectivaactualizada,ultrapassandoalgumasdúvidasiniciais,faceàs
importantes descobertasdejovensinvestigadoresda“arcadePessoa”,especialmente
Jeronimo Pizarro e Stephan Dix.
4 – Apresento no final do livro, em anexo, uma beve cronologia da história
dessa sociedade iniciática que é a Maçonaria a qual tem e vive rituais simbólicos e
míticos,muitosdosquaiscomclarasreferênciasesotéricas,centrandonoentantoessa
cronologia apenas em Portugal.
- Introdução
-IVº.CAPÍTULO:OsesoterismosdastrêsreligiõesdoLivro–I.Oesoterismojudaicoea
Cabala
Bibliografia
Bio-bibliografia do autor
Iª. P A R T E
- O que é o esoterismo?
Podemos avançar,desdejá,comaaproximaçãodeJean-PierreLaurent(cf.“Le
regard ésotérique”), para o qual o esoterismo é uma doutrina interior acerca da
constituição oculta do Homem, da Natureza e do Cosmos, nos diversos planos da
realidade.
Mas,vejamosdeseguidaasdefiniçõesmaisestruturadas,quetêmfeitocarreira
na abordagem académica do tema – a chamada esoterologia. No que diz respeito à
doutrina, temos duas definições principais, a de Faivre e a de Riffard:
Definição de Antoine Faivre (cf. “L’Ésotérisme”, 1ª. Edição, 1992, 5ª. Edição,
2012; já foi publicada uma edição em português).
-AIdeiade“correspondênciasuniversais”:tudoestáemcorrespondênciacom
tudo,ohomemcomouniverso,omicrocosmocomomacrocosmo,diversaspartesdo
corpo humano com planetas, etc. Esta doutrina das correspondências – actuando
sobre uma das partes em correspondência, actua-se sobre a outra - estánabasedo
universo da magia e também da alquimia. Escreveu Fernando Pessoa que “há um
ferro-matéria e ao mesmo tempo um ferro-simbolo, por isso o chymico ao operar
sobre o ferro-matéria, opera sobre o símbolo…” o que antecipa o que René Alleau
escreveu vinte anos mais tarde: “tudo o que é observável é simbólico, tudo oqueé
simbólico é observável…”
- O papel das “mediações” e da “imaginação”: rituais, símbolos, mitos e
espíritosintermédios(anjos,porexemplo),povoamouajudamapovoaroespaçoque
existe entre a matéria e o espírito, entreomundodebaixoeomundodecima,mas
tudo isso só pode ser acedido através da imaginação (criadora) que tem faculdades
“noéticas” (que acede a esses mundos) e “poéticas” (que cria esses mundos). Esta
dupla qualidade da Imaginação criadora leva a que alguns esoteristas digam que ela
acede a esses mundos pré-existentes, enquanto que outros, numa perspectiva
prometeica, afirmem a sua capacidade de criação desses mundos.
- A “experiência da transmutação”: a experiência de uma transformação
profunda,deumarevelaçãotransformadoraradical.Aquinãosetrataapenasdeuma
vivência mística, nocturna, onde o homem se funde com os planos superiores,
espirituais, mas sim de uma vivência sintética em queoesoteristaestáefazaponte
entre o plano diurno e o nocturno.
Para além das quatro características principais, a definição de Faivre apresenta mais
duas características acessórias:
-a“práticadaconcordância”:existemdenominadorescomunsentreasdiversas
tradições religiosas e espirituais – Faivrechamaaisto“concordantismo”-,oqueleva
alguns a proporem uma “tradição primordial” como fonte de todo o conhecimento
sagrado – tese a que chama de “perenialismo”;
- a ideia de “transmissão”: de mestre a discípulo, de iniciadorainiciado,esta
ideia assentando numa regularidade de transmissão da “filiação”.
Para Faivre esta definição, assim estruturada, aplica-se ao conceito de
“esoterismoocidental”,nãofazendosentido,paraele,falar-seem“esoterimooriental”,
uma vez que muito daquilo que chamamos “esotérico” não está fora, mas pelo
contrário, está ainda dentro das religiões orientais como o Hinduísmo, o Budismo, o
Taoismo, etc. Pelo contrário no Ocidente o “campo esotérico” foi constituindo-se
autonomamente das religiões à medida que esses temas iam sendo “expulsos” por
elas,pordemasiadomágicoe“ocultos”–fenómenoderejeiçãoporpartedasreligiões
ocidentais, cada vez mais tomadas,aolongodposséculos,peladimensãoracionalda
teologia (e daliturgia,comonoprotestantismo),oquelevouaquealgunsestudiosos
denominassem o esoterismo de “conhecimento rejeitado” (“neglejected knowledge”).
JáparadePierreRiffard(cf.“l’Ésotérisme”–Laffont),oconceitodeesoterismo
émaislatoeapresentamaiscaracterísticas–as9“invariantesdoesoterismo”-,oque
lhepermiteestabelecerconceitoscomoesoterismoafricano,asiático,etc.–queFaivre
rejeita:
-ADisciplinadoarcano;adisciplinadosegredonaaprendizagem,navivênciae
na comunicação dos Mistérios
-Aimpessoalidadedoautor:oconhecimentovemdefontesocultas,anónimas
–osMestresdesconhecidos,osSuperioresincógnitos,etc,-quepodemdispensa-losa
“instrutores” para que os divulguem a discípulos escolhidos
- O “subtil”; subtil é a fonte desses conhecimentos, subtil é a qualidade de
quem os ministra e de quem os recebe, subtil é o grupo onde eles se conservam
- Onúmeroeasuasimbólica;asimbólicadosnúmerosedasletrasnãoexiste
apenas na cabala hebraica e é um processo cifrado para conservar e comunicar
conhecimento
-Asarteseasciênciasocultaseahermenêutica;desdelogoahermenêutica,a
interpretação das coisas – hermenêutica, de Hermes, o instrutoreomensageirodos
deuses – e artes e ciências ocultas para ocultar os conhecimentos àqueles que não
estão preparados para os receberem
- A iniciação; processo de (re)nascimento, crescimento e aprendizagem que
simbolicamentetemavercomamorteiniciática,aquevaidamorteparaavida–ao
contrario do processo natural que vai da vida para a morte…
-Sintonia.Trata-sedasintoniaentreocernedetodososconhecimentos,entre
osmestres,instrutoresediscípulosedetodoselescomaFonteSuprema–trata-sede
uma posição que A. Faivre chama de“concordantismo”equetemfrequentementea
vercomaaceitaçãodaexistênciadeuma“tradiçãoprimordial”,o“perenialismo”como
Faivre denomina.
Noquedizrespeito,jánãoàdoutrina(dequeocupamasdoutrinasanteriores),
mas sim à estrutura dogrupoesotérico,háqueconsideraradefinição(estrutural)de
OlafHammer(“ClaimingKnowledge.StrategiesofEpistemologyfromTheosophytothe
New Age”, 2001), para o qual o esoterismo, com as partições iniciados/profanos,
conhecimento reservado/conhecimento aberto, etc.,asseguraumpodersimbólicoao
grupo, ao seulídereseusmembros,reforçandoaomesmotempoacoesãodogrupo
faceàsociedadeexterior-comportamentoquepoderíamosdenominarde“sectário”e
que não é, na sua forma extrema, típico de todos os grupos esotéricos.
*
Não posso deixar de dizer que a definição de esoterismo mais aceite pelo
mundo universitário, a de Faivre, está muito centrada na perspectiva hermetista e
alquímica do esoterismo. E – porque sou discípulo que o respeita e o admiramuito,
masqueguardaasuaindependênciaintelectual-ousoincluireexplicitarnela,sema
contradizer, mas em homenagem ao Mestre, a dimensão gnóstica,aoutracolunado
esoterismo ocidental, particularmente no que diz respeito a dois temas fundamentais:
- a importância do Conhecimento espiritual (a Sofia) face à Fé (aPistis),mais
característica da Mística,, no domínio da Salvação;
-ainterioridadedivinadohomem–ogérmendeluz,ogérmendadivindade-
queeletemdedesenvolverequeconduziráá“transmutação”dequefalaFaivreeque
é retomado por correntes esotéricas mais tardias (como veremos) até ao New Age.
É claro que Hermetismo e Gnosticismo são parentes não muito longínquos,
sendo o primeiro mais optimista que o outro, mas creio que faltará à definição de
Faivre o acentuar da dimensão gnóstica do esoterismo – que aliás é salientada por
autores como Jean Vernette no seu livro “New Age”eporWouterHanegraaff(“New
Age Religion and Western Culture: Esotericism in the Mirror of Secular Thouight”).
Poroutrolado,faremosaindareferênciaasímbolosemitos,poisseéverdade
quenemtodososmitosesímbolossãoesotéricos,tambéméverdadeéquealgunso
são explicita ou implicitamente, tendo havido ao longo dos séculos interpretações
esotéricasdeles–dareicomoexemploasobrassetencentistas“Fableségypcienneset
grecqes” e “Dictionnaire mytho-hermétique” do Abade Dom Pernety, dando apenas
dois exemplos portugueses: os mitos do Sebastianismo e o Quinto Império que em
Portrugal tiveram leituras esotéricas, alquímicas, como veremos.
As iniciações
Iniciaçãoéocomeçodeumcaminhoeaomesmotempoamudançadeestado
que marca esse começo – as iniciações situam-se naquilo a que a Antropologia
denomina de Ritos de Passagem. Por exemplo o baptismo, a primeiracomunhãoea
confirmação ou crisma são iniciações na vida de um cristão, enquanto que o
casamento, civil ou religioso, marca a separação da vida de solteiro e aaquisiçãoda
condição de casado. A entrada paraoserviçomilitareaentradaparaaUniversidade
são outras iniciações, de entre as muitas que marcam a vida de uma pessoa.
No domínio do esoterismo, as iniciações – por exemplo maçónicas,
rosacrucianas,teosóficas,etc.-sãoveiculadasatravésderituaisquemarcamaentrada
do iniciado e a sua progressão por etapas numa determinada via esotérica.
Este caminho das iniciações através de símbolos e mitos foi o que Dionísio o
Aeropagita denominou de via positiva – por contraste com a via negativa, a via da
transcendênciaabsoluta.Aprimeira,comosalientaArthurVersluis(op.cit.,p.11)está
ptesentenastradiçõesdosmistériosegípcioseosgreco-romanosquelhesucederam.
A “via positiva”, acrescentaremos, está ainda presente nas iniciações esotéricas
ocidentais e nos respectivos rituais elaborados ao longodosséculos–rosacrucianos,
maçónicos, etc.
Nestesentido,tambéméimportante,comojávimos,nãoconfundiresoterismo
commística,jáqueaquelepertenceà“viapositiva”,poiséumaaproximaçãoiniciática,
progressiva, gradual – sem ritual ou com ritual – das dimensões espirituais,
pertencendoasegunda à“vianegativa”,poiséumafusãonocturnacomessesplanos.
Istonãoquerdizer,porumladoquenãohajaaspectosmísticosdentrodoeoterismo–
mas eles são minoritários–eque,poroutrolado,quenãosejanecessárioemalgum
esoterismo subalternizar a conceptualização racional das coisas (o “regime diurnoi”
propostoporBachalardeDurand)privilegiandoapercepçãodirectadelas,masmesmo
assim não estamos no puro campo da mística.
Nota:
Nem todos os livros académicos sobre esoterismo (como de A. Faivre, por
exemplo) referem as suas raízes arcaicas – que pertencem quer a um “sagrado
selvagem”, longínquo, quer a espiritualidades filosóficas e religiosas antigas -, mas,
apesardonossonãoterpretensõesamanualuniversitário(emboranãorejeiteorigor)
opto por fazê-lo – numa outra divergência/complementaridade com o Mestre - pois
elas vão influenciar correntes esotéricas posteriores.
SigoassimArthurVersluis(inMagicandMysticism–anIntroductiontoWestern
Esotericism, cap. I) – autorqueFaivremeapresentounaCidadedoMéxicoem1996,
no Coingresso da Academia Internacional das Religiões, quepelaprimeiravezincluiu
uma secção sobre esoterismo - o qual considera que as mais remotas “raízes das
tradições esotéricas ocidentais” são:
(1) “as antigas tradições mistéricas”, isto é as religiões (pré-cristãs) de
Mistérios, quer egípcias (Mistérios de Osiris e de Isis), quer
médio-orientais (Mistérios de Attis, de Adonis, etc.), quer
greco-romanas (Mistérios de Deméter/Ceres, de Dionísio/Baco, de
Mitra, etc.)”
(2) “as antigas tradições mágicas greco-romanas”
Falemossobretudodasprimeiras,masemnossoentenderéprecisoreferirque
existe uma ainda tradição anterior a esses Mistérios que os influencia, assim como
influenciará mais tarde, num plano simbólico, os “mistérios” das fraternidades
iniciáticas, tradição essa que é o Xamanismo.
O Xamanismo é, de facto, uma “técnica arcaica do êxtase”(MirceaEliade)ou
uma“religiãoextática”(IanLewis)emqueocorpo–corridas,saltos,danças,gritos,os
trajes, as máscaras, o tocar o tambor, etc. - e as substâncias ingeridas – cogumelos
comoo“peyotl”(AméricaCentral)ea“amanitamuscaria”(Sibéria)eporoutroladoo
vinho(Mediterrâneo)-desempenhamumpepelimportantenodesencadeardoêxtase
- se bem que uma corrente de psicologia moderna, “alternativa” (a psicologia
transpessoal) sustente que o êxtase pode ser atingido pelo intenso trabalho com o
corpo–comoofazoxamanismo-,epormeditaçõeseexercíciosdiversos(respirações,
etc.).
O escolhido para ser iniciado no xamanismo é um indivíduo a quem sucedeu
algodeextraordinário,porexemploalguémquefoiatingidoporumraioesobreviveu
ou umjovemquecaiudeumaárvoreenãomorreu.Ainiciaçãodessapessoaforado
comum consiste numacerimóniacomplexaconduzidapeloxamaneequeprovocano
iniciadoumaexperiênciademorteeressurreição,detransmutação,queolevaasentir
renovadooseucorpo(ossos,carneesangue),istoé,elesente-serenascernumnovo
corpo.
MuitosdeusesdasReligiõesdeMistériospassavam,nomito,peloprocessode
morteeressurreição–Osiris,Attis,Adonis,Dionísio,etc,-eopróprioJesusCristo,que
paraocristão,viveuentrenósapaixão,amorteearessurreição-“morreu,desceuaos
infernos, ressuscitou ao terceiro dia e ascendeuaoscéusondeestásentadoàdireita
de Deus-Pai todo-poderoso” (era este o Credo que me ensinaram, embora hoje a
palavrainfernosestejasubstituídapelaexpressão“moradadosmortos”).Maistardeas
fraternidades iniciáticas no Ocidente centraram os seus rituais de iniciação num
processo elaborado de morte e ressurreição já não realmassimbólico,masquetem
quanto a nós uma origem no sagrado “selvagem” do xamanismo,
Mas para além da iniciação xamânica – desmembramento e recomposição,
“morteeressurreição”-existeo“vooxamânico”,feitopeloespecialistadosagradojá
iniciado, que é o xamane, realizado para resolver algum problema da comunidade
(seca, doenças, etc.) ou para obter iluminação e respostas a determinadasquestões,
“vôo”essequeédesencadeadopelotrabalhocomocorpoesobreocorpoetambém
com o auxíliodesubstânciascoadjuvantesdenaturezaquímico-biológica(cogumelos,
bebidas alcoólicas, etc.), que provocam uma sensação de viagem: para cima, como
uma águia, ou um condor – para obter iluminação – e para baixo, como um jaguar,
penetrando nas fendas da terra - para obter poder.
RELIGIÕES DE MISTÉRIOS
- Mistérios de Osiris
OsiriséraptadopeloseuirmãoSeth–nofinaldeumbanqueteemqueestese
propunha oferecer uma caixão finamente decorado a quem nele coubesse, sendo
Osirisoverdadeirodestinatário,poisSethjálhetinhatiradoasmedidas…Osiris-acaba
por ser morto pelos esbirros de Seth e o seu corpodivididoem14pedaçososquais
foramespalhadospeloEgipto–temadedecomposiçãoqueremeteparaoxamanismo
dasorigens.FoiIsis,irmãeesposadeOsirisqueandouarecolheros13pedaçosdoseu
corpo,reintegrando-odecertamaneira–oFemininointegrador-masfaltandoo14º.,
ofalodeOsiris,quesimbolizaavirilidadeiniciáticaetambémafecundidadeda“terra
negra” (Chem), o Egipto e as suas margens banhadas pelo Nilo.
- Eleusis/Demeter
ProserpinaouPerséfone,filhadeDeméter,andavapeloscamposcolhentolírios
quandoHadés,oreidosmundossubterrâneos,araptousequestrando-anessasregiões
inferiores. Isto tinha sido combinado com Zeus o rei dos deuses, mas perante o
espectáculo do sofrimento de Deméter que, numa gruta – onde mais tarde seriam
celebrados os mistérios – chorou durante largo tempo a perda da sua filha, ele
comove-se e propõe um acordo a ambos, Deméter eHadés,acordoqueconsistiuna
condiçãodaProserpinaterdeficarduranteumapartedoanodebaixodaterraeoutra
parte à sua superfície. Trata-se de uma referência clara à vida de uma planta que
começaquandoasementequesecolocadebaixodeterraapodrece,“morre”,paradar
origem às raízes mas também ao caule quesurgeàsuperfícieprogressivamentecom
folhas, flores e frutos. Trata-se de uma religião de mistérios baseada na meditação
sobreosmistériosdaNaturezaenamaravilhaqueestescausavamnoHomemantigo.
Oseguidordessareligião,oiniciadonosmistérios(o“mixto”),eraconvidadoaimitara
vidadasementee,portantodaPerséfone,numprocessosacrifciialsimbólicodemorte
e ressurreição, de descida e ascensão. Os mistérios de Eleusis, celebradosnaGrécia,
tinham duas festividades, uma no Equinócio da Primavera – os Mistérios Menores –
onde aos candidatos à iniciação era ministrada oralmente uma instrução e outra no
Equinócio de Outono – os Mistérios Maiores – onde se vivia através do ritual uma
experiência radicalmente transformadora do iniciado.
Não sabemos exactamente o que se passava nos mistérios de Eleusis mashá
um trecho do “Asno de Ouro” de Apuleio em que ele, através de Lucius, diz que
embora tendo sido iniciado nos mistérios não pode no entanto revela-los pois jurou
guardarsegredosobreoseuconteúdo,afirmandoqueeleseramumaexperiênciaque
perdurava para o resto da vida. Mas – contrariando, em parte, o seu juramento –
diz-nos que depois de um jejum de dez dias, se dava entrada no templo para uma
cerimóniasecretaemqueseeleaproximoudoreinodamorte,oreinodeProserpina,
noqualeleviuosolbrilharàmeia-noite–sinalderessurreição,deiluminação-,apóso
que, simbolicamente, se aproximou dos deuses e permaneceu entre eles.
- Dionísio
Dionísio – equivalente grego do romano Baco - foi morto pelos Titans que o
cortaram em 14 pedaços, conseguindo reintegrar o seu corpo, ressuscitando –outra
vez uma clara referência ao desmembramento xamânico e à
recomposição/reintegração/”ressurreição”. De notar o desmembramento em 14
pedaços em Osíris e em Dionísio e também, significativamente, que o processo
sacrificial do Deus-Filho Jesus o Cristo se desenrola em 14 estações da Via Sacra.
Osmistériosdionisíacos–celebradosnasmontanhas,ànoiteecomarchotes-
tinhamumaclararaízxamânica,eutilizavamovinhoparaatingirosestadosextáticos,
mas a importância dos tambores e doritmo,doscanticosedosgritos,dadança,das
corridas e dos saltos era decisiva para atingir esses mesmos estados. De salientar a
presença de um falo gigante que desfilava nesses mistérios numa carruagem e a
presença maioritária de mulheres, sendo conhecida a domensãoorgiásticadealguns
mistérios,nãonumadimensãoprofana(emquemaistardecaíram),masnumcontexto
de evocação da força e da energia de Dionísio/Baco.
Ao longo dos séculos e sobretudo a partir do Renascimento, vão merecer a
atenção dos estudiosos do esoterismo contribuiçõescomoadeH.CorneliusAgrippa,
no século XVI, com a sua “De Philosophia Oculta”, no século XVII John Dee e a sua
“MonadaHierogliphica”,amagiaritualdeumMartinezdePasqually,noséculoXVIIIe
já no século XX a magia telemita de Aleister Crowley, a que ele deu o nome de Magick.
Alquimia: prática iniciática e espiritual em que se trabalha com e sobre a
matéria, “sacrificando-a”, fazendo-a passar por um processo sacrificial de “morte e
ressurreição” – do “Solve” ao Coagula”, desde o “nigredo” ou Obra ao Negro, a
destruturação,ao“albedo”ouObraaoBranco,apurificaçãoeporúltimoao“rubedo”
ou Obra ao Rubro, a fase última de exaltação e espiritualização da matéria, que a
conduz a uma derradeira modificação de “estado”, uma verdadeira transmutação.
SalientemosaanalogiadaAlquimiacomoXamanismo,noquetocaà“morte”edecomposição
da matéria nos seus princípios – “solve”, “separatio”, “obra ao negro” – seguida da sua
integração, purificação e exaltação – “coagula”, “conjunctio”, “obras ao branco e ao rubro”,
processo fim do qual a matéria atinge um “estado extático”, isto é, tem um “novo corpo”.
Estenovoestadodamatéria,emqueosalquimistasacreditamserpossívelde
atingir, inclui a Pedra dos Filósofos e por fim a Pedra Filosofal, com propriedades
medicinais–oElixirdaLongaVida-etransmutatórias–quernaArgiropeia(fabricação
da prata), quer na Crisopeia (fabricação do ouro). Estas aplicações daPedraFilosofal
sãoapenasdemonstraçõesdoseupodermas,segundoopreceitotradicional–epara
os que acreditam na Arte transmutatória -, não devem constituir o fim último do
alquimista sob pena de ele se transformarnum“assopradordecarvões”,umhomem
obcecado pela “aura sacra fames”.
NaAlquimiaverdadeiratemdehaverumaíntimaassociaçãoentreooperador,
o alquimista e a matéria, desde a fase de preparação até às fases de evolução da
mesma.Oalquimistaéassimmodificado,espiritualizado,numprocessoevolutivoque
acompanha o da matéria. Esseprocessoalquímicopoderárecorreràcaptaçãodoum
“espírito universal” e/ou a excitação de um “fogo secreto” interior à materia.
Teoria e Filosofia alquímicas; imaginário, símbolo, mito e rito
Comodissemos,aAlquimiaé,emgrandeparte,umaaplicaçãodoHermetismo
alexandrino,exemplarmentesimbolizadopelaTábuadeEsmeralda,atribuídaaHermes
Trismegisto - que é um modelo de muita literatura alquímica posterior e mesmo da
prática alquímica até aos nossos dias -, a qual passamos a transcrever:
É verdade, certo e sem nenhuma dúvida. Tudo o que está em baixoécomoo
que está em cimaeoqueestáemcimaécomooqueestáembaixo,pararealizaros
milagres de uma só coisa. Da mesma maneira que todas as coisas procedem dum
Único,domesmomodo,poradaptação,elasnasceramdessacoisaúnica.Oseupaiéo
SoleasuamãeaLua.Oventotrouxe-onoseuventreeaTerraéasuaama.(oÚnico)É
opaidetodososmilagresdomundo.Oseupoderéperfeito,seela(essacoisaúnica)é
convertidaemterra.Separaaterradofogoeosubtildogrosseiro,suavementeecom
grande prudência. Ele eleva-se da terra ao céu e torna a descer sobre a terra,
recebendo assim a potência das realidades superiores e inferiores Deste modo, tu
ganharásaglóriadomundointeiroetodaaobscuridadeseafastarádeti.Éapotência
daspotências,queestendeasuavitóriasobretodasascoisassubtisepenetratodasas
coisas sólidas. Assim foi criado o microcosmo, segundo o modelo do macrocosmo.
Assim e deste modo se fazem as aplicações maravilhosas. Eis porque eu
sou chamado de Hermes Trismegisto, pois eu possuo as três partes da sabedoria do
mundo inteiro. Perfeito é o que eu disse da obra solar.
Astrologia
Técnicadeprevisão–astrologia“judiciária”-baseadanoestudodossignos,das
posiçõesedosmovimentosdosastrosnozodíaco.Paraseelaborara“cartaastral”de
umapessoaoudeumpaísimportaaposiçãodosplanetasnomomentodonascimento
da pessoa, de uma organização ou de uma nação – signo, ascendente, etc, - mas é
importante igualmente os “trânsitos”, as posições e movimentos num determinado
período da vida.
A Astrologia de antanho – e ainda muito da de hoje pois as pessoas querem
saber o que vai passar com elas - era uma aastrologia “judiciária”, elaborava juízos
previsionais para acontecimentos presentes e futuros. Mais modernamente-apartir
da segunda metade do séculoXIXesobretudoapartirdemeadosdoséculoXX,com
nomescomolanLeoeDaneRudyar-,aastrologiaé“psicológica”ou“psico-espiritual”,
integrando-se como uma componente importante das novas espiritualidades e do
“new age”. Nesta nova astrologia interessa mais sconhecer-se a si próprio para nos
poidermos modificar +positivamente e assim alterar e ultrapassar as nossas limitações
Segundo A. Faivre, a Astrologia estava presente na “Ars Magna” de Raymond
Lull
IIIº. CAPÍTULO
- Orfeu
OrfeuéumheróiqueamaEurídiceaqualmorre,“desceaosinfernos”.Armado
decoragemespiritualefísica,desencadeadapeloamor,Orfeudesceuaosinfernosem
demandadasuaamadaeconseguiuresgata-laparcialmente,masnãototalmentepois
ela olhando para trás, sofre uma segunda morte. Lembremo-nos o que sucedeu à
mulherdeLotque,porisso,ficoutransformadanumaestátuadesal.Lição:quandose
sai dos infernos devemos olhar para a Luz e abandonar as Trevas….
O Orfismo tinha uma teogonia e uma cosmologia complexas, com entidades
como Chaos, Chronos, Hylê, Gaia, Éther, Uranos, Ether, etc..
- Pitágoras – para além do matemático e geómetra insigne que foi –
lembremo-nosquedescobriu,océlebreTeorema“dePitágoras”-,oFilósofodeSamos
foi um mestre espiritual. Tendo vivido vários anos no Egipto – segundo “A vida de
Pitágoras”doseudiscípuloJâmblico–PitágorastrouxeparaasuaGrécianatalnãosó
os conhecimentos científicos mas também os conhecimentos espirituais alguns dos
quais estão presentes nessa obra extraordinária queaelelheéatribuída,quesãoos
“Versos de Ouro” (publicado pelos seus discípulos), onde ele, entre outras coisas
propõe o exame de consciência diário, para evitar “acumular trabalho” para quando
morrermos, mas em que ele nos aconselha a concentrarmo-nos e a valorizarmos
sobretudo aquilo que fizemos de positivo, como estímulo para as jornadas seguintes!
Os Versos de Ouro de Pitágoras têm notáveis trachos sobre a “interioridade
divina do Homem” – oh deuses se mostrasseis aos Homens o génio de que são
habitados” – interioridade que, uma vez purificada e desenvolvida trará a imortalidade:
(…) Mas tu, ganha coragem, pois os mortais são uma raça divina (…)
E na libertação da alma medita sobre cada coisa exercendo o teu juízo (…)
- Platão e os neo-platónicos
Oprincípioplatónicodequeascoisasexistemempotêncianomundodasideias
e só depois se podemactualizarnestemundoéseguidopelascolunasdoesoterismo
ocidental, particularmente pela Gnose e pelos gnosticismos e também pelo
Hermetismo, masaindapelosesoterismosdastrêsreligiõesdoLivro,particularmente
pelo esoterismo judaico, a Kabbalah (ou Cabala) e pelo esoterismo islâmico, o Sufismo.
- GNOSE E GNOSTICISMOS
- Princípios gerais: “Gnose” quer dizer em grego, Conhecimento, Sabedoria e
nessesentidoacorrenteespiritualereligiosaassimdenominada,privilegiaaaquisição
do Saber espiritual sobre a Fé, isto é, da Sofia sobre a Pistis.
AscorrentesgnósticassãodiversaseosseusprincipaisnomesvãodesdeSimão
de Samaria – gnóstico não cristão -, a Valentino – gnóstico cristão.
A Gnose não cristã
Simão de Samaria, ou Simão o Mago, vem mencionado no Novo Testamento
como um rival ou inimigo do Cristianismo. É evidente que havia, na época em que
surgiuoCristianismo,váriascorrentesespirituaisereligiosasemcompetiçãoumascom
as outras, cada qual pretendendo estar mais próxima da verdade que as outras e
pretendendo também angariar mais adeptos. Como a História é escrita pelos
vencedores,SimãodeSamariaaparececomotendoprotagonizadoumpecadoquefoi
denominado de “simonismo”: em Roma ele terá proposto a Pedro oferecer-lhe
dinheiropara,emtroca,estelherevelarcomosefazemmilagres.Ora,averdadeéque
Simão o Mago foi autor de um Tratado gnóstico que chegou até aos nossos dias,
“Apophasis Mégalé”, pelo que se ele não sabia fazer “milagres” (segundo os seus
adversários cristãos) era no “mínimo” um Mestre espiritual, filosófico (no sentido
antigo da palavra) e religioso.
Contra os gnósticos
Foi Justinianoquemescreveuomaiorataquecontraosgnósticosnãocristãos,
concretamente contra os “gnósticos licenciosos”. Os Padres daIgrejaviamcommaus
olhos as correntes gnósticas não cristãs e denunciavam as práticas orgiásticas dos
gruposradicaisminoritários,fazendo-aspassarportodaaGnosenãocristã.Nocélebre
textodeJustinianoelereferequeparaalémdasorgiassexuaisestespequenosgrupos
gnósticos extremos, tentando não trazer a este mundo mau mais seres humanos,
comiam os fetos.
-OsHílicos:osmateriais–matériaé“hyle”emgrego-,osquenemalmatinhamouse
a tinham era rudimentar e perante a morte não sobrevivia;
- Os Psíquicos: os que tinham uma alma (“psiche”) suficientemente consistente para
que fosse eventualmente desenvolvida e pudesse ser habitada pelo espírito;
-OsPneumáticos:osquejátinhamoespíritooqualeraacertezadasobrevivênciada
parte subtil do Homem, após a morte física e anímica.
A GNOSE CRISTÃ
Sobre ela falaremos no capítulo V, que lhe é dedicada, no contexto dos
Esoterismos das três religiões do Livro.
HERMETISMO DE ALEXANDRIA
Alexandria porto egípcio do Mediterrâeo, no delta do Nilo, foi, segundoRené
Alleau, a capital cultural do mundo antigo nasuaépocafazendoasíntesedareligião
egípcia, da filosofia helénica, da religião judaica, das tradições mágicas da
Mesopotâmia, etc. Hermes grego é o equivalente ao deus Thot egípcio, um deus
mediadoreinstrutordoshomens,umdeusiniciadorqueensinaastécnicaseaescrita
e sobretudo que traz as mensagens dos deuses e leva mensagens aos deuses –tem
muitas das características que encontramos no Mercúrio romano. Chamado de
“ Trismegisto”, ou “três vezes grande”, Hermes era um deus que interpretava ou
ajudavaainterpretarosmistérios–daíapalavra“hermenêutica”quetemavercoma
interpretação dos símbolos e dos textos – mas essa característica luminosa,
esclarecedoracedeuopassoàsuadimensão“hermética”,fechada,quandomaistarde
os alquimistas medievais e renascentistasaodescobriremumatécnicaparafecharos
seusvasos–demodoaquenãoentrassenelesnenhumar,nemsaíssenenhumvapor
– disseram: “encontramos o Selo de Hermes”! EdaíoHermesdeluminosoeaberto,
passou a fechado e obscuro…
- o hermetismo “erudito”, textos com uma dimensão filosófico-religiosa e
espiritual – são estes que nos interessam.
“Eis porquê, único de entre todos os seres que vivem na terra, o homem é duplo,
mortalpelocorpo,imortalpelasuaprópriaessência.Imortalesoberanosobretodasas
coisas….”
“Porquê, oh homens nascidos da terra, vos abandonais à morte, quando vos é
permitido obter a imortalidade?... Afastai-vos da luz tenebrosa, tomai parte da
imortalidade, renunciando à corrupção”
“ Todooviventeéimortalpelointelecto(inteligênciaespiritual).Masomaisimortalde
todos é o homem pois é capaz de receber Deus e de entrar em união com Deus”
“Nãohánadamaisdivinoemaisactivoqueointelecto,nadademaisaptoparauniros
homens aos deuses e os deuses aos homens. Feliz a alma que está plena deste
intelecto, infortunada a que está totalmente desprovida dele”.
- Louis Ménard no seu livro “Hermès Trsmégiste” salienta dois temas
importantes:
- asemelhançaentreo“Pimandro”herméticoeoEvangelhodeS.João,notandoque
entreelesexiste,contudo,umadiferençaprofunda,poisemS.Joãovem:“EoVerbose
fez carne e habitou entre nós”.
- a crítica dos herméticos, optimistas, aos gnósticos, pessimistas, pois para estes o
mundo é uma obra má, ao mesmo que distinguem o Criador do Deus supremo.
IVº. CAPÍTULO
- O Nome de Deus/YHWH
OSumoSacerdotedeJerusalémsópodiapronunciaroNomedeDeus,umavez
por anoenoSantodosSantosdoTemplo,coisaqueeraproibidaaosoutrosjudeus–
“não invocarás o Santo Nome de Deus em vão”… O Nome de Deus Criador, é pois
extraordinariamente poderoso esópodeserpronunciadoporquemestápurificadoe
tem qualidades ímpares. Recordemos que uma das características do Sagrado é o
afastamento e a diferença radical, o que está ou deve estar afastado, o que é
“totalmente outro”, ao mesmo tempo “tremendo e fascinante” (Rudolf Otto), daí o
“tabu do sagrado”, pois ele acarreta riscos para quem dele se aproximar ou tocar.
- Bereschit/Génese
Meditaçãosobreosignificadoocultodoprimeiroversículo/capítulodoGénese:
“No princípio Deus criou os céus e a terra…” – Bereshit. Os mistérios da Criação.
Ezequiel tal como Enoch e Elias transcendem a morte, ascendendo aos céus
sem passar por ela. A ascensão de Ezequiel aos céus num carro de fogo é tema de
meditação para uma imitação da ascensão luminosa, “em glória”, de cada um – a
palavra “glória” neste contexto, veio da Pérsia.
- Os Hekhaloth ou Palácios
Junto ao Mar Morto, em Qumram, foram descobertos logo a seguir à 2º.
GrandeGuerra(porumpastorqueperseguiacabrasquesehaviamperdidodentrode
uma gruta), rolos de cobre e em outros materiais,dentrodeâmforasdebarro,onde
estavamdescritosasregrasdacomunidadeesséniadehomensemulhereseostextos
entre os quais os do seu Mestre da Justiça. Os textos essénios são profundamente
apocalípticos e messiânicos e a regra da comunidade era ascética.Estestextosestão
publicados e os rolos podem ver-se no Santuário do Livro no Museu de Israel em
Jerusalém. Note-se que a Biblioteca gnóstica de Nag-Hammadi (AltoEgipto)também
foi encontrada em circunstâncias semelhantes no mesmo período (1945-46).
Foramváriososque,antesdeCristoeduranteedepoisdasuavida,fugiramdas
cidadeseforamparaoscampos,paraodeserto.JoãoBaptistafoiumdeles,masnãoo
único. Coberto de pelas de cordeiro, alimentando-se de gafanhotos e de mel, este
primodeCristofoiquemobaptizou,anunciandoque“eleteriadediminuirparaquoo
outro (Cristo) crescesse”. Alguns grupos religiosos – os primitivos baptistas, os
mandeanos e sabeanos doIraque,Síria,etc.–consideramqueoBaptistaéqueerao
Mestre e que Cristo era apenas um discípulo.
- Os Terapeutas de Alexandria
Trata-sedeumacomunidadejudaicaesotéricainstaladaemAlexandriaequese
dedicavaàcuraespiritual,comconsequênciaspositivasnodomíniodacurafísica–ler
sobreestetemaolivrodeJean-YvesLeloupsobre“LesTheurapeutes”naeditoraAlbin
Michel.
A Cabala hebraica
A Cabala hebraica passa a escrito tradições seculares atribuídas a Abraão,
Moisés, etc., embora elastenhamsidopassadasaesritosobretudoapartirdoséculo
V-VIº. D.C.. Os seus textos principais são o Sefer Yetzirah, o Sepher Zohar e o Sefer
Bahir de que falremos brevemente.
-OSepherYetzirahouLivrodaFormação(sécs.III-VI,Israel)éatribuídoaoRabi
Siméon Bar Yochai e ao seu filho Eléazar. Naturalmente, a Cabala hebraicanasceem
Israel e a tradição apontaumalocalizaçãomaisprecisa,acidadedeSafed(ouSefad),
naGalileia,ondeseencontramostúmulosdeSiméonedeseufilho,sendoaindahoje
considerada a cidade doscabalistas-equeporissotemrecebidoavisitadediversos
gruposcabalistas,entreosquaisosdenew-agecomooKaballahCenterdeLosAngeles
a que pertence Madonna.
Trecho do S. Yetzirah
“Segundo trinta e dois misteriosos caminhos da Sabedoria, Yah, Senhor dos
Exércitos, Deus vivoeReidoMundo(…)gravouecriouoseumundo(…)Dezsefitoth
belima e vinte e duas letras de fundamento”
Note-se, desde já, a referência à ciência das letras dos números e as
correspondências entre aquelas e estes.
Trecho do Bahir
“Quaissãoasdezpalavras(osdez“sefirot”dequefalao“SepherYetzirah”))?A
primeira é a Coroa (Kether) suprema, Bendita e Glorificada seja o Seu Nom (YHWH)
assim como o seu povo (Israel)… A segunda palavra é a Sabedoria (Hockmah)….
Continua o desenvolvimento desta reflexão sobre letras e números e suas
correspondências mútuas.
Trecho do Zohar
“Aalma(“nephesh”)estáintimamenteligadaaocorpoquesutentaemantem;
éembaixooprimeiroimpulso.Quandodignadele,torna-seotronoondeseencontra
oespírito(“ruah”)…Equandoambos,aalmaeoespírito,sepreparamdevidamente.,
são dignos de receber a “alma superior” (“neshamah”) que reside, ela própria, no
trono do espírito(“ruah”)…Aprofundandoestesgrausdaalma,consegue-sepenetrar
na suprema sabedoria; e só a sabedoria permite assim ligar certos mistérios.”
Basicamente o tema mais comum da Cabbalah hebraica é a Árvore da Vida,
comosseus10Sefiroth(pluraldeSefirahouSefira,esfera)divididosem4Mundosque
provêmderegiõesdonãomanifestadoabsoluto(oNada,oVaziodeLuz),Ain,AinSofe
Ain Sof Aur:
- o Mundo de Atziluih, Mundo supra-celestial, com os 3 Sefiroth superiores, num
triangulocomapontaviradaparacima:1)Kether,aCoroa;2)Chockmah,Sabedoria,3)
Binah, Inteligência;
- o Mundo de Briah, Mundo Celestial, com os 3 Sefiroth seguintes: 4) Chesed,
Misericórdia, 5) Geburah, Julgamento, Força, 6) Tifreth, Beleza, o Coração crístico,
numa leitura cristã esotérica, correspondente ao Chakra cardíaco;
- o Mundo de Yetzirah, Mundo espiritual: 7) Netzach, Eternidade, Vitória, 8) Hod,
Esplendor, Glória, 9) Yesod, Fundamento
- um, harmonizador das dimensões masculina, neutra e feminina, com as 3
letras-mãe,Shin,Aleph,Memequeincluioquesepodedenominarum“mantra”,com
a emissão de sons (sussurrados) com cada uma delas: sibila-se Shin (oFogo),depois
sopra-se Aleph (o Ar) e por último vibra-se Mem (a Água), tudo suavemente.
.- o exercício devisualizaçãocriadora–propostoporIsaacLuria-denominado
“tikkun”, de regeneração e de reintegração daspartículasdeluzcaídasnointeriorda
matéria.
Há dois exercícios de meditação mais recentes, sobre a Árvore da Vida, mas
mesmoassimcomraízesantigas,propostosnumaformaactualemfinaisdoséculoXIX,
pela organização cabalística inglesa, fundada em 1888, The Hermetic Order of the
Golden Dawn (“A Ordem Hermética da Aurora Dourada”) – que nada temavercom
uma organização política grega neo-nazi, dos dias de hoje.
- “Raio Flamejante” (Lightening Flash) que se centra na visualização de um raio que
desce repentinamente do vazio luminoso, passando pelos Sefiroth superiores e
percorrendo toda a Árvore da Vida até à Sefira mais baixa, Malkuth.
- “O Caminho da Serpente da Sabedoria” (The Way of the Serpent of Wisdom),
caminhoascensional,lento,quepartedeMalkuthevaiatéKether,passandoportodos
osSefirothemeditandosobretodoselesesobreos4mundoscabalísticos.Ecomodiz
Fernando Pessoa no seu magnífico texto “O Caminho da Serpente – certamente
influenciado,comoveremos,pelaversãodeAleisterCrowleydaGoldenDawn,aA.A.,
“aSerpentequandochegaaDeusnãopara”,“vaialémDeus”–frase(aparentemente)
provocadora cujo significado e lógica veremos mais tarde..
Asequivalênciasnuméricasdasletrashebraicas–aGuematria-,apermutação
das letras/consoantes dando significados equivalentes às respectivas palavras –
Temurah - e as letras inciais (e finais) – Notarikon - são métodos cabalísticos para
interpretação dos textos sgrados.
Porexemplo,Cabalaéformadapor3consoantesCBL–emhebraicocabalístico
são as consoantes que interessam – logo é equivalente, por permutação, a CLB, ora
Calbécoração,logoaCabala–conhecimentotradicional-éumconhecimentoquese
recebe no coração, não na mente, sendo por isso um conhecimento espiritual.
Ainda outro exemplo:
OsquatrosentidosdasEscriturassão:Peshet,oliteral,cujainicialéP;Remetz,
osentioalegórico,cominicialR;Derasha,sentidotalmúdico,moral,cominicialD;Sod,
sentidosecreto,cujainicialéD.OraPRDSsãoasiniciaisdePardés,Paraíso,oquequer
dizer que quando lermos os textos sagrados unindo todos eles no último, no mais
profundo deles, atingiremos o Paraíso.
Vº. CAPÍTULO
- Gnose cristã
Veremos a seguir alguns dos trechos contidos nos Evangelhos Gnósticos ou
Apócrifos,masdesdejáreferiremosquenocontextodoNovoTestamentopoderemos
destacarcomograndegnósticoS.Paulo–eoseu“Cristoemnós”–enodosPadresda
Igreja,S.ClementedeAlexandriaeSto.IreneudeLyon–quedistinguea“verdadeira”
(acristã)da“falsa”Gnose(anãocristã),emrelaçãoàqualéimpiedoso.S.Pauloé,de
facto, o grande teólogo que primeiro valorizou a divindade deCristoenosconvidaa
imitarmos a divindade do Filho, a recriarmos a sua divindade dentro de nós, tema
gmóstico por excelência.
Um exemplo de gnóstico cristão do século IVª., heterodoxo –tendopagopor
isso com a vida,comoveremosadiantenocapítulosobreoesoterismoemPortugal-
foiPrisciliano,BispodeÁvilaquetoinhasidoiniciadoporumamulherAgapê,quepor
suaveztinhasidoiniciadaporumgnósticodoEgipto,MarcosdeMenfis.Oprestígiode
Prisciliano como mestre cristão atingiutodooNoroestepeninsular(incluindoonorte
dofuturoPortugal),tendoproposto,entreoutrascoisasqueadienanteveremos,quea
leitura dos Evangelhos Gnósticos era tão importante como a dos Canónicos.
VejamosentãoalgumaspassagensdosEvangelhosGnósticoscristãos(daescola
valentiniana), descobertos a seguir à 2ª. Guerra Mundial, no Alto Egipto, em
Nag-Hammadi, tudo indicando que pertencesse à biblioteca de um antigo mosteiro
copta da região:
“Aqueles que dizem que o Senhor primeiro morreu e depois ressuscitou estão
enganados,poiseleprimeiroressuscitou,depoismorreu.Seapessoaprimeiroobtem
ressurreição não morrerá…”
“Enquanto existirmos neste mundo devemos adquirir ressurreição, a fim de que ao
despirmos a carne nos encontremos em repouso e nãoentremosnopontodomeio,
pois muitos se perdem ao longo do caminho”
- Outro tema, Maria Madalena, a sua companheira (?), e - independente da
relação de afectividade que tinha com ela -, a maior, melhor, talvez o maior dos
discípulos:
“ TrêsmulherescostumavamandarsemprecomoSenhor-Maria,suamãe,suairmã,e
a Madalena,queéchamadasuacompanheira.PoisMariaéonomedesuairmãede
sua mãe e é o nome de sua parceira”
“ASabedoriaqueéchamadadesabedoriaestériléamãe(dos)anjos.Eacompanheira
de (…) Maria Madalena. O (…amou) a mais do que (todos) os discípulos, (e ele
costumava) beija-la na sua (…mais) vezes do que o resto dos (discípulos)… Eles lhe
disseram: “Porque a amas mais do que a todos nós?”, O Salvador respondeu,
dizendo-lhes: “Porque não amo vocês como a ela? Se uma pessoa cega e uma que
enxerga estãoambasnastrevas,elasnãosãodiferentesumadaoutra.Quandoviera
luz, então a pessoa que enxerga verá a luz, e a cega permanecerá nas trevas”
-CríticaàansiosaesperadoReinodosCéusnotempolineareapotencialidade
do Reino aqui e agora, pois “o Reino já está dentro de nós”:
“MasoReinoestádentrodevós.Eestáforadevós.Qundovostornardesconhecidos
devósmesmosentãosereisreconhecidos.Ecompreendereisquevóséquesoisfilhos
do Pai vivente”
”Seus discípulos disseram-lhe: Quando virá o Reino? (Jesus disse): Não é por ser
esperadoqueelevirá.(…)OReinodoPaiestáespalhadopelaterraeaspessoasnãoo
vêm”
AlgumaGnosecristãconsideraqueJesussóemdeterminadomomentodasua
vidarecebeuoCristo,oEspíritodoFilhodeDeusquesobreeledesceu,passandoaser
Jesus o Cristo:
“Além disso, Jesus tendo sido gerado de uma virgem mediante intervençãodeDeus,
era mais sábio, mais puroemaisjustoquetodososoutrossereshumanos.Oungido
(Cristo), combinado com a Sabedoria (Sofia) desceu nele e assim foi feito Jesus Cristo
Embora gnóstico cristão, adepto da “verdadeira Gnose”, Sto. Ireneu de Lyon
(“Contra as Heresias”) combateu os outros gnosticismos mesmo os cristãos, que
pertenciam à“falsaGnose”comoeramdenominadasessascorrentespelosPadresda
IgrejaOcidental.Porseuturno,Epifaniodeuumtestemunho-quenãosabemossefoi
objectivo,provavelmentefoiparcial-decertasdoutrinasgnósticas,particularmenteas
que eram chamadas de “licenciosas” pelos Padres da Igreja.
Masamaiorpartedascorrentesgnósticaseramcristãsenãotinhamessetipo
de comportamentos “licenciosos” dessas correntes minoritárias que – Ofitas,
Carpocratianos, etc. Pelo contrário, as comunidades gnósticas cristãs, maioritárias a
partir do 3º. século, eram ascéticas.
EstesEvangelhosforamencontradosemgrandenúmeroaseguirà2ªª.Grande
GuerraemNag-HammadinoAltoEgipto,quandoumpastorprocuravaencontrarumas
cabras tresmalhadas, tendo-se deparado com uma verdadeira biblioteca que deveria
pertencer a uma mosteiro cristão gnóstico. Hoje admite-se que a comunidade era
valentinina, que reunia seguidores do gnóstico cristão Valentino.
Evangelho de Filipe
É este Evangelho que refere que “Jesus costumava beijar Maria…” (alguns
perguntam-se se na boca) o que dará pretexto a muita especulação – desde a mais feliz
à menos feliz… - sobre a relação entre Jesus Cristo e Maria de Magdala (localidade
junto ao Lago Tiberíades ou Mar da Galileia). Maria Magdalena, era sem dúvida uma
mulher extraordinária que Jesus admirava – ela foi a primeira testemunha da
ressurreição de Cristo, o que é altamente significativo da sua qualidade espiritual e da
sua proximidade com Cristo - e amava. Sabemos pelo Credo cristão que Jesus era
“verdadeiro Deus e verdadeiro Homem”, pelo que pessoalmente admitimos, sem
escândalo, que o Filho de Deus pudesse amar Maria também fisicamente.
Um tema muito presente nos Evangelhos Gnósticos“ – e muito mais importante
do que a relação entre Jesua e Madalena – é a necessidade imperiosa da aquisição da
resurreição espiritual ainda em vida, antes de morrermos:
Ev. Tomé
É talvez o mais belos dos Evangelhos Apócrifos, pois contem as palavras do
Salvador (como os Gnósticos lhe chamavam), não mencionando o enredo, isto é,
despojadas da história – o que se compreende já que para os gnósticos o que se
passavanestemundomaterialeramenosimportantedoqueamensagemespiritual.É
de salientar que essas palavras de Jesus se encontram também nos Evangelhos
Canónicos e nas boas edições dos Evangelhos Gnósticos, nomeadamente as do
Evangelho de Tomé (por exemplo a de Bentley Landon e a de Jean-Yves Leloup),
encontramosanotadasàmargemoscapítuloseversículosdosEvangelhosdeMarcos,
Lucas e Mateus onde se encontram as mesmas frases.
Desde logo a necessidade de nos “unificarmos”, de nos integrarmos nanossa
dimensão espiritual que abarcará as outras.
“Se não vos fizerdes um (como as criancinhas), não entrareis no Reino
dos Céus”
O ISLÃO e os 5 pilares
Os5pilaresdoIslãosão:as5oraçõesdiáriasojejumpeloRamadão,aesmola,
aperegrinaçãoaMeca(pelomenosumaveznavida)eaUnicidade:sóexisteumDeus
e esse Deus é Allah.
OXiismojáadmiteumainterpretaçãodasescriturassagradas,istoé,paraelea
revelação corânica não está fechada.OXiismotemdoistemasimportantes:oimame
escondido, ocultado e o mahdi (uma espécie de messias)
- O xiismo duodecimaniano, maioritário – com uma forte imamologia
que é a doutrina do Imam, o Mahdi, que virá no final dos tempos;
- O Xiismo septimaniano (aceita apenas 7 Imames) do qual acorrente
maisimportanteéoIsmaelismo;oismaelismofatimidateveoCalifadocomseunome
esedenoCairoegrandeesplendorintelectualeespiritual;oismaelismoreformadode
Alamut–“AGrandeRessurreiçãodeAlamut”-temavercomumaconfrariainiciática,
assim denominada “dos Assassinos” (de “Assass”, Guardião,oudeHashish?),queera
comandada pelo “Velho da Montanha”, sendio o mais célebre Issam i-Sabah que
governavaaconfrariaapartirdasuasedeemAlamut,anortedeTeerão.Osfiéisnão
tinham medo de morrer pois acreditavam que já tinham atingido a ressurreição em
vida (perspectiva gnóstica).
O Sufismo é o esoterismo do Islão e existe tanto no Sunismo (Ibn’Arabi, por
exemplo) como no Xiismo (por exemplo, Sohravardi de Alepo).
OSufismodoSuldesenvolveu-seemzonasondetinhahavidoumaexpansãodo
cristianismo, logo privilegia o Amor e o apagamento (“fanã”) progressivo e suave do
ego,enquantoqueoSufismodoNortesedesenvolveuemzonasmaisorientais,onde
em algumas delas quais havia influência do Hinduísmo e do Budismo, como na Ásia
Central, privilegiando o trabalho intenso sobre o ego e assumindo por vezes uma
grande exigência e dureza com as dimensões física e psicológica da personalidade.
- Al-Hallaj: proclamou a sua interioridade divina, “eu sou Deus” e por isso foi morto
pela ortodoxia muçulmana.
- Ibn’Arabi (natural de Murcia) foi considerado o Sheik Al-Akbar, o “maior dos
Cheiques”edeixouumaobraconsiderávelquefoiestudadamagistralmenteporHenry
Corbin (cf. “L’Imagination créatrice dans le Soufisme d’Ibn Arabi”). Arabi refere que
aprendeu com um livro do silvense Ibn’Cassi – que adiante referiremos.
NodomíniodafilosofiasufideveremosmencionarJabir(Geber)eaAlquimiae
ainda a Enciclopédia dos Irmãos da Pureza. Avicena e o seu “relatovisionário”(cf.O
estudodeHenryCorbin“Avicenneetlerécitvisionaire”)éumnomeinteressanteque
se opõe de certa maneira ao aristotelismo de Averroés.
Falemos agora desse grandenomedapolíticaedaespiritualidadequefoiIbn’
Qassi deSilvesquepodemosfiliarnosufismodaAndaluziaparticularmentenaescola
de Ibn’ Massarrah (cf. Histoire de la Philosophie islamique” de HenryCorbin).Reido
Baixo-AlentejoedoAlgarve(oGarbdoAl-Andalus),de1141a1151,nasceuemSilves,
reinou em Silves e morreu assassinado em Silves. Foi um destemido adversário dos
Almorávidas e sobretudo dos Almoadas, berberes tiranos queseguiamaversãomais
rigorista do Islão e que se opunham às outras correntes muçulmanas e também à
exuberância das formas culturais que se desenvolveram no Al-Andalus.
Fatimida–nãoesqueçamosoCalifadoFatimida,ismaelita,comsedenoCairoe
comgrandeesplendorcultural,comoas“EpístolasdosIrmãosdaSinceridade(séc.IX)
-,logo um xiita septimaniano, Ibn’Cassi foi chefe da Confraria de Cavaria espiritual
(equivalente muçulmano dos Templários),osMuridines,os“discípulos”ou“adeptos”,
que tinham a sede, o “Ribat”, em Jila – agora identificada, pelos arqueólogos Varela
Gomes, em Arrifana (Aljazur), sobre o mar. Deixou um notável tratado desufismo,o
“Descalçar das Sandálias” (que Adalberto Alves comentou em “As Sandálias do
Mestre”, obra que eu tive o prazer de apresentarquandofoieditadapelaextintaEd.
Hugin e que posteriormente foi editada pelaÉsquilo),obraqueIbn’Arabicitacomoo
tendo influenciado.
“ Quem observa com o olhar da Beleza (que é o dos) gnósticos contempla a
totalidadedaárvoredasabedoriaedareligiãobemcomoofrutoautênticoeacrença
firmequedasalturasdesceatéaovéuespessoetenazdaexistênciamundanal.Araíz
(dos gnósticos) é sólida, o seu ramo alcança o céu e o seu alimento chega a toda a
parte…” (in Adalberto Alves, op. cit., p. 393). Nota: gnósticos em árabe é “maruf”.
Ibn´Cassi foi um herói libertador do povo do Sul daquilo que seria Portugal,
lutandocontraostiranosAlmoadas,acabandoporsermortonoCastelodeSilvescom
aacusaçãodequeerao“mahdidoscristãos”,elequesegundoatradiçãopromoviao
chamamentoparaaoraçãode6ª.FSantadoIslão,numadimensãoecuménica,através
de duas personagens no minarete, Jesus e João Baptista. A sua morte trágica e
extremamenteinjustaparaosseusseguidoresdeveterdeixadonestesaesperançade
que ele regressasse não como o mahdi do fim dos tempos mas como um mahdi
intercalar.EmnossaopiniãoamortedeIbn’Cassieaesperançadoseuregressoéuma
das raízes do nosso sebastianismo – mas uma raíz histórica, ao contrário das raízes
céltica e judaica que também devem ser consideradas.
Háumenigmahistóricoemtornodestegrandereiesufipoisenquantoqueos
livros muçulmanos coevos afirmam que D. Afonso Henriques, o “Ibn’ Anrique”, lhe
ofereceuumcavalo,umalançaeumescudo,nenhumdoslivroscristãosmencionaesse
eventualesubtilgestodeofertadeumaaliançaentreoreidePortugaleoreideSilves
contra um inimigo comum, os Almoadas.
- Rumi e os Mawlanyia
Rumi – conhecido como o Mawlana - nasceu no Afeganistão mas veio com o
seu pai para ocidente instalando-se por fim na Turquia onde fundou a confraria dos
Mawlanyia. Esta confraria tem uma vertente de música e dança sagradas que é
praticada pelos Derviches rodopiantes, a qual pretende simular a dança das esferas
cósmicaseaharmoniaeaenergiadoCosmoscomaqualdevemosestaremsintonia.A
sede da Confraria é em Konya, na Turquia central.
SohravardideAlepoéograndenomeda“teosofiaoriental”edos“ishraqyn”–
“ishraq” é o oriente.
- Os Bekthashis e O Livro da Lucidez Implacável
- Nashroddin
Os contosdeNashrodinsãodeumhumornotáveleconstituemensinamentos
preciosos de natureza espiritual e iniciática. Eis um deles: um dia um homem
regressavaacasadeumencontrocomamigosepertodaentradatentouencontrarnos
bolsos a chave da porta da casa, mas em vão. Chegou um outro homem que lhe
perguntouoquesepassavaedesdelogocomeçouaajuda-lonasbuscasnãofosseele
ter deixado cair a chave em algum sítio próximo. Mais um outro homem chegou e
prestável ajudou nas buscas até queumúltimoqueacabaradechegarperguntou:“o
senhor tem a certeza de que terá deixado cair a chaveaqui?Nãomeuamigo,masé
aquiqueestáumcandeeiro”.Defactonóssóprocuramosencontrarascoisasemzonas
iluminadas e raramente nos aventuramos a busca-las em zonas sombrias…
É uma confraria sufi que, pertencendo ao Sufismo do Norte é extremamente
rigorosa com o ego, seguindo práticasmuitopróximasdoBudismoqueatingiuaÁsia
Central.Avigilânciasobreospensamentos,aPresençaConsciente,o“estarsóentrea
multidão”, são alguns dos preceitos desta via. Conheci, emFrança,asuacorrentedo
Ouaysis.
O Dihkr (Zihkr)
Éumapráticaespiritualqueossufisutilizamfrequentementeequeconsisteem
meditações com mantras. Como não faz parte da tradição corânica, os
fundamentalistas radicais –wahabistasedeobandistas-atacaram-na,atacandoassim
o sufismo que eles detestam.
VIIº. CAPÍTULO
A IDADE MÉDIA ALQUIMIA,MAGIA E ASTROLOGIIA. OS TEMPLÁRIOS E OS
CONSTRUTORESDECATEDRAIS.CÁTAROSEFIÉISDOAMOR.ADEMANDADOGRAALE
A CAVALARIA.
Na Idade Média desenvolvem-se as três disciplinas do esoterismo ocidental
tradicional, a Magia, a Alquimia e a Astrologia
- Magia
Temumavertente,queáasuaorigem,popular,ruralearcaicaqueéestudada
pela antropologia e a etnologia e outra, erudita mas também antiga, mais ligada ao
universo das religiões e da filosofia. Pode ser individual ou colectiva, benéfica ou
maléfica.
AetnologiacostumadistinguiraBruxaria,quenãoémaléficaemsimesmaea
Feitiçaria, essa sim destinada em geral a provocar dano físico ou metafísico nos outros.
- Alquimia
As origensarcaicasparecemresidirnotrabalhodosferreiros–ver“Ferreirose
alquimistas” de MirceaEliade)–osquaisnaforja,transformamaosmetais,comoum
demiurgo. Daí o carácter sagrado dos ferreiros que nas civilizações tradicionaiseram
temidos pelo poder que tinham sobre a matéria.
A origem da Alquimia no contexto ocidental parece ser babilónica (cf.
“LÁlchimie babylonique” de Mircea Eliade), tendo-se desenvolvido no Egipto e
posteriormente passado aos árabes invasores que adesenvolveramnasuadimensão
química–GeberouDjabireasua“CiênciadasBalanças”.PassoudepoisàEuropacristã
tendo sido traduzidos para o latim muitos tratados alquímicos árabes.
Não se pode ignorar, no entanto, a importância das alquimias orientais, a
indiana – tântrica, quer hinduísta, quer budista -eachinesa,taoista.Estasalquimias
situam-se também, para além da sua dimensão física, no plano do trabalho com as
energias do corpo, desencadeadasepotenciadasporpráticasdiversas,entreasquais
asrespiratórias,demeditaçãoesexuais.Aquestãoésaberseelasterãoinfluenciadoas
alquimiasocidentaispoisnaverdadenãoévisível,nestas–maspoderiaestaroculta–
uma leitura alquímico-sexual, a não ser a partir do século XIX.
Costuma propor-se uma classificação das diversas alquimias em:
- físicas, laboratoriais (onde se “labora” e ora”), embora o objectivo não seja
apenas físico, mas sim espiritual
- psicológicas, ou psico-espirituais, muito em voga a partir do século XIX e
particularmentecomasnovasespiritualidadesdasegundametadedoséculoXX(new
age, etc.)
- “internas”, ou “das substâncias”, na qual as práticas atrás mencionadas nas
alquimias orientai conduzem à elaboração das substâncias, segregadas pelo próprio
organismo que é, assim, um verdadeiro Athanor ou forno alquímico.
- Astrologia
AAstrologiamedievalé“judiciária”,procurandosaberoquevaiacontecercom
pessoas,soberanosenações.SómaistardeapartirdoséculoXIXéqueseestabelece
uma astrologia de interpretação psicológica. Também veremos mais tarde os seus
desenvolvimentos.
Há quem afirme (p.e., Robert Ambelain) que estas corporações cristãs
medievaisdeconstrutorestinhamcomoantecedentesosCollegiaFabrorumromanose
as Confrarias de ferreiros do Monte Sinai.
- Os Templários
Os Templários foram criados na Terra santa – em Jerusalém, onde nove
cavaleiros, comandados por Hughes de Payns, estiveram nove anos alojados nas
antigascavalariçasdoTemplodeSalomão,preparandoacriaçãodaOrdemdosPobres
Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão – cujo fim era assegurar as rotas dos
peregrinos que se dirigiam para a Terra Santa e aí proteger os lugares santos do
Cristianismo - , cuja Regra foi dada por S. Bernardo de Claraval
Bernardo de Claraval escreveu também o “elogio da nova milícia”, De Laude
NovaeMilitia,e,sendoeleumdevotodeMaria,determinouqueamãedeJesusfosse
a Chefe da Ordem dos Templários, sendo João Baptista o seu Patrono.
Esta questão do Patrono pode explicar a acusação de idolatria que o Rei de
França, em princípio do século XIV, lançou contra os Templários e que levou à sua
prisãoemFrança,naSexta-feira13deOutubrode1307eàsuaposteriorcondenação
papal, depois de um processo iníquo que levou à extinção daOrdemdoTemplo,até
hoje.Defacto,entreasacusaçõesdiversasqueeramfeitasaostemplários,estavaade
magia, a de homossexualidade,adecuspiremepisaremacruz,etc.eadeadorarem
um ídolo, o “Bafomet, que parecia a cara do demónio. Ora – para além de outras
interpretações que o interpretam como Mahomé,oucomo“Bios-fos-metis”–parece
provávelamuitosquefosseaimagemdacabeçadeS.JoãoBaptista–oseupatrono!–
decapitado por ordem de Salomé, segundo reza a Bíblia; denotarquenocalendário
católico existe uma festa anual que é a Degolação de S. João Baptista.
Édereferirqueaordempapal–enessaalturahaviadoispapas,odeRomaque
o rei deFrançadeclaroucomoherético(!),eodeAvignonqueeraseufamiliareque
por isso o rei controlava, apesar dos esforços deste papa -, ordem de proibição dos
Templários, não foi cumprida pelo rei de Portugal,D.Diniz,essegrandeRei,nemem
Castela nem em Aragão. Os três reis da Península decidiram não acatar a ordem do
Papa e pedir a constituição de novas Ordens que substituíssem a do Templo. Em
Portugal foi a Ordem de Cristo que se constituiu em 1318 e que teve sede nosseus
primeiros quarenta anos, não em Tomar mas em Castro Marim, regressando sim a
Tomar posteriormente.
De notar que D. Diniz, para além de ter mandadoplantaroPinhaldeLeiria–
que,paraalémdefixarasareias,dariamadeiraparaaconstruçãonaval–contratouum
almirante genovês, Pessanha, aindanósnãotínhamosumafrotanaval.Atradiçãodiz
quevieram,nanoitedaprisãodostempláriosemFrança,algunsbarcostempláriosda
frota que estava fundeada em La Rochelle, uns para Portugal, outros para aEscócia.
Uns dizem que o tesouro dos templários – outra tradição que não deixa de estar
presente em Tomar com a história de uma certa “louca”, referida por Maurice
Guingand em “O Tesouro dos Templários – Tomar ou Gisors?” - que mais
provavelmente veio para Portugal terão sido as cartas de marear da frota templária
que navegava no Atlântico norte e no Mediterraneo.…
De notar ainda que a Ordem de Cristo – que contou como Mestres como
Rodrigo Anes, Gil Martins, entre outros - teve um período de ouro em Tomarcoma
administração do Infante D. Henrique que, congregando as competências
técnico-científicasefinanceirasdasoutrascomunidades,ajudaica-emTomarhaviaa
JudiariaeaindaháaSinagoga,amaisantigadePortugal-eamuçulmana,ambascom
os seus cartógrafos, navegadores e financeiros, planeou a empresa dos
Descobrimentos. Cada caravelaeracapitaneadaporumCavaleirodaOrdemdeCristo
(nunca houve muitos, o seu número nunca ultrapassou os cem).
InfelizmentenocomeçodoséculoXVI,D.JoãoIII(quesucedeuaD.ManuelI),
ordenouaFreiAntóniodeLisboaqueprocedesseaumareformadaOrdemdeCristo,
que consistiu numa “castração” da mesma (a expressão é de António Quadros em
“Portugal,RazãoeMistério”),passandoosmonges-guerreirosaseremapenasmonges,
rejeitandoaacçãoecentrando-seexclusivamentenacomtemplaçãoenaoração.Além
disso, na sendadeumFilipeoBelo,dandocorpoaumindisfarçávelódiopelaOrdem
do Templo, mandou retirar os túmulos dos Mestres dos Templários portuguesesque
estavam sepultados na Igreja de Santa Maria do Olival (ou dos Olivais), ainda em
Tomar,dooutroladodorioNabão.,queeraumverdadeiropanteãotemplário.Aúnica
lápide tumular que subsiste é é a de Gualdim Pais, mas entretanto e recentemente,
uma organização templária, a Templanima, numa bela homenagem, decidiu colocar
nestaIgrejaumaplacametálicacomosnomesdosMestrestempláriosqueláestavam
sepultados
ÉdenotaraimportânciaqueaOrdemdoTemplotevenaexpansãoparasuldo
Reino de Portugal, acompanhando as batalhasqueossobranostravavam.Domesmo
modo,aOrdemdeCristoesteveassociadaàexpansãomarítima,verdadeiraGesta,dos
portugueses.
As marcas de pedreiros das catedrais e igrejas são para muitos um enigma
simbólico,jáquepodemosvernelas patas de ganços, “chifre de catre”, suásticas,
espirais, cruzes, etc. A versão mais divulgada é a de que cada pedreiro tinha a sua
marca que colocava nas pedras que trabalhava, para poder receber o seu salário do
mestre de obras. São célebres as grande catedrais europeias pelas suas siglas de
pedreirosePortugaltambémastemnaBatalha,nosJerónimos,etc.Noentantoexiste
umaigrejadatadadocomeçodanacionalidadeoumesmoantes,a“capeladassiglas”,
perto de Castro d’Aire,quesegundoFernandoTeixeiraqueaestudouepublicouuma
monografia sobre ela, deve ser das que mais siglas apresenta.
A maçonaria moderna – dos pedreiros livres, dos “freemasons”, dos
“franc-maçons”,dos“franco-masones”,dos“freimaurer”-refere-seàmedievalcomoa
sua antepassada – a dos pedreiros,dos“masons”,dos“maçons”,dos“masones”,dos
“maurer” -, mas na verdade não se pode estabelecer umacontinuidadeglobalentre
uma e outra. Como veremos, houve lojas operativas que receberam maçons
não-operativos – em meados do século XVII temos,atestadamente,aentradadeum
maçon “aceite”, o rosa-cruz Elias Ashmole, numa Loja inglesa – mas houve lojas
modernas sem raíz operativa, a não ser a de desejarem ser construtores, não de
catedrais, mas num plano simbólico, construtores de homens e da sociedade.
- Os Cátaros
Os Cátaros e os Albignses desenvolvem uma florescente civilização no Sul de
França, mais propriamente no Languedoc e são seguidores de uma heresia que se
espalhou, vinda do Médio Oriente, pelo sul daEuropa:naBulgária,osBogomilos,na
Itália, os Patarinos – recordemos o romance de Humberto Eco, “O nome da rosa”.
Esta heresia tem como origem longínqua o gnosticismo radical e mais
concretamenteoManiqueísmo–aprimeirareligiãoglobal,queseestendeuatéàChin
-,noqualexisteumadualidadeabsolutaentredoisprincípiosopostos,oBemeoMal.
Tinham uma liturgia própria com a imposição das mãos, o Consolamentum que
simbolizava a descida o Espírito Santo sobre o fiel, o “puro” (cátaro). Criticavam
violentamente o poder dos bispos e papaseassuasriquezaserejeitavamqueCristo
pudesse ter incarnado neste mundo material o que para eles constituiria uma
verdadeiraofensa.Aomesmotempocriticavamfortementeopodereaostentaçãode
alguns bispos e do próprio papa, o que originou, juntamente com as suas posições
teológicas e litúrgicas, a perseguição da Igreja.
Há uma anedota histórica que é referida amiúde e que nos conta que um
cruzado ao chegar a uma vila ou cidade cátara terá perguntado ao Bispo que
acompanhavaatropa:“Eminênciadizei-nos,deentreapopulação,quaissãooscátaros
para que podermos prendê-los ou mata-los? Ao que o bispo respondeu: Mata-os
todos, Deus reconhecerá os seus!”.
- Os Fiéis do Amor
OamorcomoDemandainciática,instrumentoderevelaçãodanossadimensão
espiritual, através do amor do outro, é umtemauniversal,deorienteaocidente.No
quedizrespeitoaoOcidentereferiremosoimportanteestudodeDenisdeRougemont,
“O Amor e oOcidente”enoquedizrespeitoaoOrienteédereferir,numadimensão
mais sexual, o livro de Julius Evola, .
As Cantigas de Amigo têm a ver com este universosedentreelaslembremos
uma de D. Dinis, com o seguinte trecho:
“Leonoretafinrosetabelasobretodaaflor/finrosetanãomemetaemtalcoi
vossa amor…”
LeonordeAquitâniaeraumaFieldoAmoreorganizavanasuacortesarausde
poesia trovadoresca e Cortes do Amor, provas de amor em que os amantes eram
julgados e condenados, se não amavam devidamente as/os suas/seus amadas/os.
- A Demanda do Graal
VIIIº. CAPÍTULO
- O Hermetismo Renascentista; Cosme de Medici e a tradução do “Corpus
Hermeticum”porMarcilloFiccino;GiordanoBrunoeatradiçãohermética(cf.Frances
Yates)
OHermetismoteveumasegundavida–depoisdaprimeira,emAlexandria–no
Renascimento,concretamenteesobretudonaCortedeCosmedeMédicisquemandou
Marcilo Ficcino traduzir o Corpus Hermeticum.
No contexto da Cabala Cristã que emerge no Renascimento –equepretende
provar os dogmas do Cristianismo através da Cabala -, para além de Pico della
Mirandola, teremosdecitarKnorrvonRosenroth.Exemplo:aletrahebraica“shin”ao
descernocentrodoTetragramadivinoYHWHdáYeshouah,logoJesusoCristoéFilho
de Deus.
Este autor retoma o tema do Deus interior, tão caro à Gnose toda ela e ao
Cristianismo gnóstico emparticular,equeS.Paulofoioprimeiroaafirma-lonoNovo
Testamento, “o Cristo emnós”,promessadaressurreiçãoespiritualqueestáacessível
ao Cristão.
Assim,ÂngelusSilesiusproclama(verversãoportuguesaintitulada“ARosasem
porquê”, traduzida, entre outros por José Augusto Mourão), numa grande e salutar
provocação:
“Que te importa a ti que Cristo nasça mil vezes em Belém, se ele nãonascer
uma vez que seja no tu coração?”
- Jacob Boheme,
Em Jacob Boehme encontramos um claro exemplo da Alquimia mística ou
espiritual, em que os nomes da alquimia operativo-laboratorial ignificam estados da
evolução da alma espiritual.
A Rosa-cruz histórica
OsManifestosdaRosa-Cruzforamescritosepublicadosnocomeçodoséc.XVII,
em 1614, 1615, 1616,respectivamente,“FamaFraternitatis”,“ConfessioFraternitatis”
e “As Bodas Químicas de Christian Rosencreutz”. O seu autor terá sido o pastor
protestanteJohanValentinAndreaoqualserodeavadeumpequenogrupodeamigos
e seguidores, não havendo nessa altura aquilo aquepoderiachamardeumaOrdem
Rosa-cruz, mas sim de uma operção de propaganda e divulgação dos seus ideais.
“Não tínhamos ainda visto o cadáver de nosso Pai prudente e sábio. Por isso
afastamos para um lado o altar. Então pudemos levantar uma chapa forte de metal
amarelo,ealiestavaumbelocorpocélebreinteiroeincorrupto(…),etinhanamãoum
pequeno livro em pergaminho, escrito a oiro, intitulado T., que é,depoisdaBíblia,o
nosso mais alto tesouro nem deve ser facilmente submetido à censura do mundo”
(Fama Fraternitatis Roseae Cruci – trecho posto por Fernando Pessoa em
exergue ao seu poema “No Túmulo de Christian Rosencreutz”)
Os Manifestos encerram os temas relativos a um cristianismo esotérico,
estabelecido no quadro da Reforma protestante, com forte tonalidade alquímica. O
objectivoélançarasbasesdeumaAliançaEvangélica–anti-papista,anti-Habsburgos–
para a criação de uma “sociedade ideal” (cf. Roland Edhigoffer, “Les Rose-croix et la
crisedelaconcienceeuropéenne”e“LesRose-croixetlasocietéidéale”eaindaRobert
Vanloo “L’Utopie Rose-Croix”). Tratava-se de transformar, no quadro da Reforma,
transmutar a sociedade no sentido da pureza do ideal cristão, procurando unir os
Estados protestantes da Europa contra oSacro-ImpérioRomano-germanico.Apósum
período de uma certa abertura a essa ideia de uma aliança entre os estados
protestantes, as rivalidades entre eles acabam por comprometer o projecto que, no
fim, não passou de uma ideia entusiástica e generosa (por mais sectária que fosse).
-osRosa-cruzdeviamreunir-sepelomenosumavezporano,naQuinta-feiraSanta,na
Casa do EspíritoSanto–expressãoquerevelaaimportânciaqueaTerceiraPessoada
Trindade cristã tinha para eles;
-tinham,alémdisso,aobrigaçãodecurargratuitamenteosdoentes–oqueimplicaria
dapartedeles,conhecimentosdemedicina,incluindoaespagíriaparacelsianaetalvez
mesmo de alquimia;
-tinham,ainda,deseadaptarerespeitarareligiãodopaísondeestavamoupassavam,
o que uma tolerância activa, mais do que simples oportunismo, a qual se aplicava a
outras religiões cristãs como o catolicismo ou não cristãs coo o judaísmo e o islão.
Lema da Rosa-Cruz:
“EmDeusnascemos,emCristomorremos,peloEspíritoSantoressuscitaremos”
(Ex Deo nascitur, in Jesu morrimur, in Spirito Sancto reviviscimur”)
EstelemaafirmaocaráctercristãodaRosa-Cruzeaesperançadatransmutação
por Obra e Graça do Espírito Santo. Uma vez mais, encontramos a valorização
transformadora da Terceira Pessoa da Trindade, numa corrente esotérica cristã.
Sem que existisse uma organização mas apenas pessoas que aderiramaoseu
ideal, a Rosa-Cruz expandiu-se muito por acção de uma inteligente, mitificadora e
subtil propaganda. Essa expansão desenvolveu-se sobretudo nos meios intelectuais
protestantesmaisligadosaoesoterismo.EmParissurgiramcartazesafixadosnasruas
que diziam; “Nós, o ColégioinvisíveldaRosa-Cruz…”.NaAlemanhatemosumgrande
nomecomoomédicoealquimistaMichaelMaier,médicodoImperadorRudolfoII,de
Praga. Em Inglaterra Robert Fludd foi um dos eminentes seguidores desta corrente,
mas devemos destacar um “antiquário” inglês – pois estudava as tradições antigas,
havendomesmoaSociedadedosAntiquários-,EliasAshmoledeseunome,quefoium
dos primeiros maçons aceites em Lojas operativas (as do pedreiros).
A entrada progressiva de intelectuais, burgueses e aristocratas – alguns deles
rosa-cruzes-paraLojasoperativasouparanovasLojasquejápoucotinhamavercom
o ofício dos construtores, parece tersidoumaestratégiadaRosa-Cruzpararealizara
transformação social que falhara por projecto próprio. A criação da Maçonaria
moderna,a“especulativa”ousimbólica,terásido,indirectamente,umprojectoremoto
da Rosa-Cruz.
- Emanuel Swedenborg
É outro exemplo, mas já no século XVIII, do esoterismo e da mística cristãs,
neste caso afirmando as realidades angélicas como elemento de aproximação ao
mundo divino (ver a sua obra“Sabedoriaangélica”).OsuecoEmmanuelSwedenborg
não foi maçon masdiscípulosseusfundaramumRitoSwedenborgianodequefoium
dos responsáveis recentemente o esoterista francês e meu amigo Rémy Boyer.
A sua obra “A nuvem sobre o Santuário” (17…) afirma a existência de uma Igreja
Interior,noseiodoCristianismoeapossibilidadededesenvolvimentodeumórgãode
visão espiritual interior ao homem, o “sensorium”, para acesso a realidades espirituais.
IXº. CAPÍTULO
Háváriashipótesespropostasparaexplicarasorigensdamaçonariamoderna,a
que reside na maçonaria operativa medieval, a que temavercomassuaspretensas
origenstempláriase,porúltimo,aquepropõeaRosa-Cruzcomosendoomotordessa
criação.
- Origem na maçonaria medieval - pode estabelecer.se claramente uma
inspiraçãomassóemalgunscasos–porexemplonaInglaterra,comocélebrecasode
EliasAshmole,em1644–épossívelestabelecerumatransiçãorealentreamaçonaria
operativa de origem medieval e a maçonaria moderna, especulativa ou simbólica.
-Origemtemplária–aquiaindaémaisdifícilestabelecerumaligaçãohistórica
entreesteseosmaçonsmodernos.Noentantoédereferirqueporvezesemtempos
medievais ostempláriosforampatrocinadoresdeobrassagradaseoutrasconstruídas
por corporações de pedreiros. Mas a única pista que se encontrou, segundo temos
conhecimento,foiapresençadoesquadroecompasso(paraalémdacruztempláriae
da espada) em túmulos templários no cemitério de Kilmartin na Escócia. De resto
quando o Cavaleiro Ramsay afirma que os “cruzados” são os “antepassados” dos
maçonsmodernos,trata-seapenasdodesejodefiliaçãoespiritualcomumainstituição
tão prestigiada como foi a Ordem do Templo. E o facto de os templários teremsido
extintos pela Igreja Católica não trazia nenhum problema para os criadores da
maçonaria,emgrandeparteprotestantes–sóapartirdemeadosdoséculoXVIIIéque
muitos maçons tiveram cuidado com esse problema, devido à entrada de muitos
católicos (alguns dos quais sascerdotes), como por exemplo a Estrita Observância
TempláriadoBarãoCarlvonHundeoRegimeEscocêsRectificadodosalemãesDuque
de Brunswick e Príncipe Carlos deHasse-CasseleoscatólicosfrancesesJean-Baptiste
Willermoz e JosephdeMaistrequeincluíammuitoscatólicosnassuasfileiras.OProf.
Ferrer-Benimelli, jesuíta e historiador refere, na sua obra “Les archives secrets du
Vatican et de la Franc-Maçonnerie”, a existência de milhares nomes de padres e
monges católicos, maçons, desde meados do século XVIII até à Revolução francesa,
incluindo em Abadias como a de Citeaux (França) e a de Melk (Áustria)
- Os rosa-cruzes – esta parece ser a mais directa influência nas origens da
maçonaria moderna, embora não forneça uma explicação para todo o fenómeno –
recordemos que Elias Ashmole, rosa-cruz, foi dos primeiros maçons aceites a entrar
paralojasoperativas,aindaemmeadosdoséculoXVII.Defacto,falhadooprojectode
transformaçãosocialcristãnoquadrodaEuropaprotestante,algunsrosa-cruzesterão
decidido entrar para as lojas maçónicas já existentes. Tratava-se de manter o
imbolismo da construção de uma nova sociedade, velado pelo simbolismo da
construção “à Glória deDeus”,ou“àGlóriadoGrandeArquitectodoUniverso”como
será dito em finais do século XVII e no começo do século XVIII.
Duas correntes estabelecem-se ainda em meados do século XVII, a dos
“antigos” que defendiam – e praticavam – que a maçonaria implicava a crença num
Deus de uma religião revelada – Teísmo -, devendo ser, desde logo e no caso deles,
estritamente cristã, e a dos “modernos”, iluministas, que queriam abrir as lojas
maçónicas a um ecumenismo, em primeiro lugar no seio do cristianismo, juntando
católicosecristãos,edepoisabrindoaoutrasreligiões,acomeçarpelojudaísmo.Mas
para estes iluministas não era obrigatório ser-se seguidor de uma religião, bastava
ser-secrente,acreditar-seemDeus–Deísmo-num“deusemrelaçãoaoqualtodosos
homens estão de acordo”, como escreve o Pastor Anderson nas suas Constituições,
documentofundadordamaçonariamoderna.Aessaimagemdeumdeusecuménico,
universal, osmaçonsderamonomede“GrandeArquitectodoUniverso”–verolivro
“Mês bien-aimées frères” de Pierre Marion, ilustre maçon e ex-chefe dos Serviços
secretos franceses (DGSE) na época de Miterrand,quecomeçouasuavidamaçónica
no Grande Oriente de França, depois passou para a Grande Loja Nacional Francesa,
terminando asuacarreira maçónica na Grande Loja Unida de Inglaterra.
IsaacNewton,fundadordaciênciamoderna,quernamatemática,quernafísica
- mas ao mesmo tempo um demandador das antigas tradições, particularmente da
alquimia,áreaquedominava(ver“Lesfondementsdel’alchimiedeNewton”,tradução
de “ The Green Lion’s hunt”, da Profª Betty Dobbs) tendo na sua grande biblioteca,
váriostextosdecomentáriosalivrosdealquimia,quepossuía,escritosporelepróprio
– revelendo um profundo conhecimento daArtedeHermes-eaindaumlaboratório
alquímico num anexo da sua casa em Cambridge, onde era um eminente professor.;
nesse laboratório ocorreu uma explosão que afectou a saúde de Newton.
Os discípulosdeNewton,osNewtonianos,estiveramnaorigemdoIluminismo
britânico–enacriaçãodaRoyalSociety,aprimeiraAcademiadasCiênciasdomundo-
eposteriormente,também,naorigemdaMaçonariamodernaedacriaçãodaGrande
Loja de Londres. Estas características definiam os rosa-cruzes e os newtonianos que
como vanguarda social, política, científica e espiritual que, ao mesmo tempo se
interessavam pelas tradições antigas, preoocupação que vamos encontrar em
membros de outras vanguardas, como veremos adiante.
Adimensãosocialdoiluminismoinglêsassentaquernos“BillofRights”querno
“ActodeTolerância”,documentosqueasseguravamosdireitosdoscidadãosedosseus
representantes no Parlamento – e isto em 1691, cem anos antes da Revolução
francesa!Portanto,promovendoa“virtudesocial”eacrençaemDeus–qualquerque
fosseaideiaquetivéssemosdele–amaçonarianascenteemcomeçosdoséculoXVIII
foi um factor de progresso social e da democracia, de tal modo que Voltaire e
Montesquieu viveram refugiados vários anos em Inglaterra, na altura país do
“progresso e das luzes”, pois pelo contrário a grande França da cultura nãooerano
domínio político-social, com a sua monarquia absoluta, era pelo contrário e
simbolicamente um país das “trevas”.
Nasceassim,em24deJunho-diadeS.JoãoBaptista,oudeS.JoãodeVerão-
de 1717 a Grande Loja de Londres, associando3edepois4lojasquesereuniamem
restaurantese“pubs”queeramoslocaisondeosadvogadoseossolicitadoresdavam
consultas,entreoutrasactividades.MuitocedoosmáximosresponsáveispelaGrande
Loja de Londres foram membros da família real britânica pois, após anos de lutas
fratricidas em séculos anteriores, era bastante conveniente para a Coroa juntar
católicoseprotestantesemlojasmaçónicasonde,paraalémdosaspectosespirituaise
simbólicos, eles podiam confraternizar num espírito de concórdia
Paralelamente esta “Grande Loja dos “modernos”, existia as dos “antigos”,
tradicionalistas, que constituíram em meadosdoséculoXVIIIaGrandeLojadeYorke
publicaram um livro com as suas constituições, o Ariman Rezon
A maçonaria nascida em Inglaterra em 1717 – embora com raízes iluministas
também na Escócia – teve um papel muito importante nas Ilhas Britânicas mas
tambémnaexpansãoevalorizaçãodosideaisdemocráticosedeconvivênciatolerante
entre diversas posturasfilosóficas,políticasereligiosas,nospaísesparaondecedose
expandiu,aindanoséculoXVIII:França,PaísesBaixos,Alemanha,PaísesEscandinavos,
Suiça, Itália, Áustria, Espanha, Portugal, etc., e também para as colónias no Novo
Mundo, Estados Unidos em particular–ondeencontramosmaçonsnosdoisladosda
barricada na guerra da Independência
Desde logo em França, onde se constituiu a Grande Loja de França que nas
vésperasdaRevoluçãoFrancesatinhacomoGrãoMestreoDuquePhilippedeOrléans,
o“FilipeÉgalité”queseráumadasprimeirasvítimasdaguilhotina.Éimportantedizer
queaprimeiraRevoluçãoFrancesa,ade1789,correspondeaosideaisdamaçonariae
nela se empenharam os maçons. JáaépocadoTerror,tambémchamadadesegunda
RevoluçãoFrancesa,aqualcomeçaem1791,amaçonariaéperseguidaedizimadapor
ultra-revolucionários radicais e intolerantes.
Em começos do século XIX a situação de normalidade, embora num quadro
imperial,érestabelecidacomNapoleãoeosseusirmãos,algunsdosquaismaçons,tal
como são maçons alguns dos seus oficiais e generais – incluindo portugueses da
Legião,entreosquaisoGeneralGomesFreiredeAndrade,quetinhasidoiniciadoem
Viena, sua terra natal (o pai era Embaixador de Portugal), na Loja de Mozart. A
maçonaria em França teve até aos nossos dias uma grande importância social, e
política, registando nomes como Renault, Citroen, etc.
MaçonfoisemdúvidaWolfgangAmadeusMozartquefoiiniciadonumaLojade
VienadeÀustria–amesmaaquepertenciaonossoGomesFreire(quenoregistoou
quadro de loja aparece com o nome deGomesFreirede“Entrada”etambémcoma
denominação de Conde edeComendadordaOrdemdeCristo,enquantoqueMozart
aparece como “Capelmeister!). Em VienaaparecedepoisumsegundoTellesdaSilva,
DuquedeTarouca,filhodoprimeiroquejáreferimosequesendoamigodoMarquês
de Pombal, este o vai visitar na sua Loja. Ora o Marquês parece ter sido iniciado
quando era Embaixador em Londres numa Loja da City (onde estavam homens da
indústria, com os quais ele terá aprendido algo de útil para o desenvolvimento da
indústriaportuguesa,quandofoiprimeiroministrodeD.JoséI)einiciadopelopróprio
Príncipe de Gales da época, segundo refere Daniel Ligou no seu “Diccionaire de
Franc-Maçonnerie”.
HipólitoJosédaCosta,naturaldeColóniadeSacramento,naalturaRioGrande
doSul,hojeUruguai–quetinhasidoiniciadoemFiladélfia,comooAbadeCorreiada
Serra,quandoteveumcargoderepresentaçãodiplomáticanosEUA-,foiencarregado
pelos maçons portugueses, que entretanto em finais do século XVII já tinham
constituído Lojas, para se dirigir a Londres a fim de obter, segundo se crê junto dos
“antigos”, a carta-patente para constituição da primeira obediência maçónica
portuguesa, independente e reconhecida, cuja denominação –segundoohistoriador
A. H. Oliveira Marques (“História da Maçonaria em Portugal” – 1º. Vol.) -, seria
denominada Grande Loja de Lisboa ou Grande Loja de Portugal.ChegadoaPortugal,
em 1802, Hipólito é preso pela polícia de Pina Manique e depois começa a ser
interrogado pela Inquisição. Passado algum tempoélibertadopelaintercessão,junto
das autoridades portuguesas, domaçonDuquedeSussex–queseráoprimeiroGrão
Mestredaunificaçãodamaçonariainglesa,entreosantigoseosmodernos,em1813-
queestavaviveremLisboanumsemi-exílio,portersidoumgrandeboémio(segundo
diziam).Hipólito,magoado,nuncamaisregressaráaPortugalefundará,naGrandeLoja
de Inglaterra, a Loja Lusitânia. Em Londres, Da Costa escreverá, para além do livro
sobre os Artífices Dionisíacos, um outro relatando as suas desgraças decorrentes da
prisão e dos interrogatórios da Inquisição e será também o fundador da imprensa
brasileira,aoenviarregularmenteparaoBrasilo“CorreioBrasiliense”,poreleescritoe
publicado.ContinuaremosnocapítuloseguinteeemAnexoestasreferênciashistóricas
relativas à Maçonaria, quer relativas a Portugal, quer no plano internacional.
Masosrituaismaçónicoscontêmumesoterismoimplícito,queosinglesesnão
acompanham, pelo menos nos seus primeiros graus, ou simbólicos, de Aprendiz, de
Companheiro e de Mestre e mesmo esoterismo explícito, sobretudo no Altos graus
maçónicos, escritos no século XVIII por gente que ainda dominava muito bem o
simbolismo,omitoeoesoterismo–comoporexemplooBarãodeTchoudycomoseu
grau de Cavaleiro do Sol, que passou a ser o grau 28 do R.E.A.A e Jean-Baptiste
Willermoz, comerciante de sedas em Lyon, que escreveu os rituais para o Rito ou
RegimeEscocêsRectificadoeoutrosqueforamincorporadosnoRitoEscocêsAntigoe
Aceite,comooCavaleirodaÁguiadeOuroedoPelicno.Desalientarquetalvezomais
antigosistemadeAltosgrausseja,ARoyalOrderofScotland.,aOrdemRealdaEscócia
-que,perdoe-se-meoorgulho,fuioprimeiroportuguêsarecebernosseusdoisgraus,
o de Heredom de Kilwining e o de Rose-Croix,noseutemplohistórico,juntoàRoyal
Mile, em Edimburgo.
Rémi Boyer, num livro que eu tive o prazer e a honra de prefaciar – “La
Franc-Maçonnerie comme voie d’éveil” -, afirmaanecessidadedeumavivênciainiciáticaem
todos os graus e em todos os ritos maçónicos. Nesta perspectiva é indispensável a
aquisição de um estado de Presença, de presença consciente aquando da prática
ritualística em Loja, sem o qual o rito não é transformador do maçon.
Osrituaismaçónicostêmumevidentesimbolismosagradoqueéabertodesde
o seu começo, estabelecendo um corte com o espaço e o tempo profanos. Entre a
AberturaeoFechodaLojavive-sepois,noTemplo,numespaçoenumtemposagrados
onde o ritual dá vida e sentido à reunião dos maçons. Aí as conversas e assuntos
profanos são evitados – devem deixar-se preferentemente para o ágape fraterno e
convivial que se segue à reunião de Loja –, dando lugar a discussões filosóficas,
simbólicaseoutrasquetenham,porexemplo,avercomasobrigaçõesdefraternidade
dos maçons.
Os rituais dos 3 primeiros graus simbólicos centram-se essencial e
respectivamente na recepção da Luz maçónica, na descobertadeumAstrointeriore
na cerimónia da morte sacrificial do Mestre Hiram supliciado por se ter recusado a
revelar os segredos do grau de Mestre a três maus companheiros gananciosos de
poder, sem estarem preparados para tal.
É costume dividirem-se os tiros maçónicos em ritos “dos antigos”eritos“dos
modernos” - ver o excelente livro de Jean Solis, “Guide pratique de la
Franc-Maçonnerie” livro que ele dedica a vários maçons entre os quais, eu próprio.
-aEstritaObservânciaTempláriadoBarãodeHundcriadocercade1750poriniciação
–segundorezaatradição–transmitidapelosStuarts,escocesesrefugiadosemFrança.
Trata-sedeumritomaçónicotemplário.Emboraextintainfluenciouacriaçãodeoutros
ritos, de entre os quais o Regime Escocês Rectificado.
- O Rito Sueco
ORitoSuecoderivadaEstritaObservânciaTempláriaalemãefoidesdecedoprotegido
pelaCoroa,quernaSuécia,quernaNoruega,sendooReitambémGrão-Mestrecomo
Carlos XIII da Suécia ou então alto protector da maçonaria, sendo Grão Mestre um
membro da família real. O rito suecoéestritamentecristãoetemplário,sendooseu
último grau (11º.) apenas conferido ao rei.
- Rito de York
OritodeYorkespalhou-secomgrandeêxitopelosfuturosE.U.A.sendoactualmenteo
segundo rito em número de praticantes.
- Rito de Zinnendorf
ÉoritoqueexistenaGrosseLandslodgedesFreimaurervonDeustchland(GrandeLoja
National alemã) que é uma das cinco Grandes Lojas da Grande Loja Federal Alemã.
- o Rito de Emulação, inglês, descristianizado, muito centrado no simbolismo dos
construtores e da construção
- O Rito Escocês Antigo e Aceite (“Scotish Rite”) que é o mais divulgado no muno,
sendo o primeiro mundial em efectivos e também nos EUA.,
- o Rito Francês que tem uma versão mais antiga, rosa-cruz, cristã e outra mais
moderna, descristianizada, mesmo dessacralizada;
-oRito“egípcio”deCagliostro(queesteveemLisboaondefoirecebidonaresidência
doCondedeSobral,aoCalhariz,tendopartidoapressadamentepoisarriscava-seaser
presoporPinaManique),ritomágico-alquímico,nãocristão,massagradonocontexto
o Hermetismo e do Gnosticismo, o qualdaráorigemadoisritos“egípcios”noséculo
XIX nas versões:
- Rito de Misraim de que saliento a versão sob a jurisdição do Grande Santuário do
Adriático (GSA) e de Misraim e Menfis, de Sebastiano Caracciolo, a saber o Antigoe
Primitivo Rito Oriental de Misraim e Menfis (APROMM).
Interessante é referir outros ritos, como o Rito Primitivo de Narbonne, o Rito dos
Arquitectos Africanos de Ecker und Eckofen, o Crata Repoa,
OMartinismodoséculoXVIII:deMartinezdePasquallyeasuaOrdemdosCavaleiros
Maçon,EleitosCohendoUniversocomoseuúltimograudeRéaux-Croix–naverdade
um“martinezismo”-,,atéLouis-ClaudedeSaint-Martin,quefoisecretáriodeMartinez
na OCMECU e foi iniciado no Regime Escocês Rectificado, tendo depois enveredado
pela via cardíaca, a teurgia do coração. De St. Martin destacamos osseguinteslivros
“L’Homme de Désir”, “Le Filosophe Inconnu”,
-OMagnetismodeMesmer-quefazatransiçãoentreoesoterismodoséculoXVIIIeo
ocultismo do século XX - lançou as bases dohipnotismoedaquiloaquesechamava
“magnetismoanimal”,sendoseuseguidoroAbadedeFaria,quesendonaturaldeGoa,
nãogostavadoscolonizadoresportugueses.FariafezcarreiranossalõesdePariscomo
excelentehipnotizador–destasuaactividadeedosseusconhecimentosdácontaEgas
Moniz no seu livro sobre o Abade de Faria.
Xº. CAPÍTULO
Devido à pisão de Hipólito José da Costa e à apreensão, por Pina Manique, dos
documentosqueeletrouxeradeInglaterra,osmaçonsportuguesesvoltaram-separao
Grande oriente de frança, outra fonte de regularidademaçónica,econstituiramuma
obediência denominada de Grande Oriente Lusitano,cujoprimeiroGrãomestrefoio
neto do Marquês de Pombal, o Juiz Sebastião Sampaio de Melo e Castro Lusignan.
Depois assumiu o Grão mestrado o General Gomes Freire deAndrade,oqualtendo
sidoiniciadonaLojadaEstritaObservânciaTempláriadeMozartemVienaerecebidoo
4º.GraudeMestreEscocêsdeSantoAndrénaLojadeLyondeJean-BptisteWillermoz,
fundador do Rito Escocês Rectificado, aparece depois como membro da loja militar
napoleónica dos Cavaleiros da Cruz – elequeeraoficialdoexércitodeNapoleão,no
contextodaLegiãoportuguesa–oquelevaasuporqueeletivesseacedidoao6º.Grau
do R.E.R., o de Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa (o 5º. Seria apenas um grau de
passagem, o de Escudeiro Noviço). O conflito entre franceses invasores do território
português, entre os quais havia vários maçonscomoporexemploSoulteosingleses
que estavam em Portugal auxiliando a Coroa portuguesa - de entre os quais havia
também mitos maçons ,entre os quais Beresford -,,masqueparaalgunseramvistos
como tropa de ocupação, atinge a maçonaria portuguesa já que esta fica dilacerada
entre os dois partidos, a maior parte dos quais empenhados na resistência contra o
invasor, mas Gomes Freire está no epicentro desse conflito, sendo acusado de
conspiraçãoetraiçãoeemconsequênciadissoécondenadoemorto,juntamentecom
outros oficiais. Refere a tradição que Beresford terá oferecido ao seu Irmão Gomes
Freire a possibilidade de fuga para escapar à morte, mas este recusou com aquele
espírito de honra e de militar que o caracterizava.
Nota: Referiremos em anexo uma cronologia da história da maçonaria em Portugal
continuando com o que aqui escrevemos e entrando nos séculos XIX e XX.
A Maçonaria no Brasil contribui para a independência do território face aos
colonizadores – assimcomoaconteceunosoutrospaísesdaAméricacentraledosul,
comooMéxico,aArgentina,oUruguai,oChile,etc.–sendotestemunhodissoaacção
independentista do maçon Tiradentes, contra Portugal. Algumas notas têm de ser
ditas,mesmonocontextorápidodeumaintroduçãocomoesta.Assimreferiremosque
D. Pedro foi iniciado no GrandeOrientedoBrasil–potênciamaçónicaregulardesde
1823, ano do seu reconhecimentopelaGrandeLojaUnidadeInglaterra-,noPalácio
do Lavradio, no Rio de Janeiro (num cadeirão onde os Irmãos brasileiros tiveram a
simpatia de me sentar quando fui, em 2003, na minha visita como Grão Mestre
português).ParaalémdaobediênciahistóricaqueéoGOB,desdehácercade90anos
paracáqueforamconstituídasGrandesLojasEstaduais,reconhecidaspelosEUAeque
uma boa parte delas tem uma boa relação com o GOB. De notar ainda que a
Maçonaria brasileira é actualmente a terceira em efectivos, com mais de 300 mil
membros, depois dos EUA com cerca de 3 milhõesdemaçons,daGrã-Bretanhacom
cerca de meio milhão, tendo ultrapassado a França quedevecontarumtotalde250
milmembrosnassuasdiversasobediências.Dereferiraindaaimportânciapolíticaque
a Maçonaria teve no Brasil com quase 13 Presidentes da República e Primeiros
ministro.
Decorrentes do rito “egípcio” de Cagliostro, o “grande copta”, estabeleceram-se no
começo do século XIX dois ritos, o Rito de Menfis eMisraim,m88grauseoRitode
Menfis em 95 graus, ambos bastante esotéricos quer na sua dimensão hermetista,
quer na dimensão cabalista. No topo daestruturaexisteumaclassesecretaquesóé
dispensada a alguns membrosdosúltimosgraus“visíveis”,classeessaquecontemos
Arcana Arcanorum, “segredo dos segredos” decorrentes de Cagliostro e de outras
tradições mediterrânicas” e que têm a ver com a teurgia – magia divina – e com as
“alquimias internas” - veraesterespeitoolivrodeJean-PierreGiudiccelliCressacde
Bachelerie, “Pour la Rose-Rouge et la Croi d’Or” e os de …..
Não pode deixar de referis-se um rito português criado por Miguel António
Dias, o Rito Lusitano ou da Maçonaria Eclética, que celebrava ritualmente, nos seus
mais altos graus – Português e Perfeito Português –, o martírio de Gomes Freire.
Fundada no começo do século XIX por maçons do Grande Oriente de França esta
Ordempromoveu,logonoseucomeço,cerimóniasespectacularesemIgrejasemParis,
mas para além destas características que a situam como uma “ordem de aparato” –
quepermaneceatéhojesobadenominaçãodeOSMTJ, OrdemSoberanaeMilitardo
Templo de Jerusalém, ordem de grande dimensão internacional cujo Grão Mestre
actual é um português, D. Fernando Campelo de Sousa Fontes – estava associada a
este templarismo um joanismo, a Igreja Joanica dos Cristãos Primitivos, isto é uma
Igreja gnóstica que, cremos, terá desaparecido muito cedo, abandonando assim a
Ordem de Palaprat a sua dimensão esotérica.
Esoterismo ocultista
NaprimeirametadedoséculoXIX,talvezporumcomplexodeinferioridadeemrelação
à ciência triunfante, o esoterismo – mais ocultismo do que esoterismo – precisa de
objectos materiais para exercer o contacto com espíritos e outras realidades
Decorrentedessecomplexodeinferioridade,oEspiritismochama-seasipróprio,com
Alan Kardec, a Ciência do Espírito – título de um livro seu. Nascido em1844comas
irmãsFox,emHydesville(E.U.A.),oespiritismomodernoprocuravanessaprimeirafase
ocontactocomosespíritosdosdefuntos,mascomKardecelepretendeatingiroutros
espíritoseoutrosmundosmaiselevados,adquirindoassimumadimensãoespirituale
filosófica mais profunda. Interessante também a penetração do Espiritismo no
movimento operário e do socialismo utópico, devido à democratização das
reincarnações. França, Inglaterra, EUA e Brasil são países de grande penetração
espírita.
O Rosacrucianismo tem no século XIX um livro de grande projecção, o “ The
Rosicrucians, their rites and mysteris”, de Hardgrave Jennings que curiosamente
apresenta o rosicruanismo como decorrente de cultos fálicos e de fecundidade,com
clara natureza sexual.
Em 1877, a russa Helena Petrovna Blavatksky fundou em Nova Iorque, com o seu
companheiro,oCoronelOlcott,aSociedadeTeosófica,comoobjectivodeestabelecer
um núcleo comum de todas as religiões e de todas as raças, desenvolver as
potencialidades ocultas do homem e aproximar a Ciência da Religião.
MadameHelenaPetrovnaBlavatsky(1831-1891),russadenascimento,foiuma
grande viajante (Europa, Egipto, Índia, Tibet e América do Norte) e uma incansável
estudiosa das Tradições espirituais da Humanidade. Em 1875 ela funda em Nova
Iorque, juntamente com H.S.Olcott e W.Q. Judge, a Sociedade Teosófica (S.T.) que,
mais tarde, mudará a sua sede para Adyar (Madras), na Índia, em 1883 e cujos
-formaronúcleodaFraternidadeUniversaldaHumanidade,semdistinçãode
A doutrina de Blavatsky, após uma fase “hermetista”, ocidental, personificada
pela sua obra “Isis sem véu” (1877), vai dar origem a uma doutrina orientalizante,
fortemente influenciadapeloHinduísmo(edepoispeloBudismo),sobretudodepoisda
viagem à Índia de H.P.B. e Olcott, em 1878. Desta segundaeúltimafasedadoutrina
blavatskiana, a obra em seis volumes “A Doutrina Secreta” (1888) é o seu expoente
máximo.
PoderemossalientarcomoaspectosimportantesdasideiasedaacçãodeHelena
Petrovna, desde logo, a chamada de atenção, a nível de um grande público, para as
espiritualidades orientais, num clima de grande tolerância e ecumenismo (por vezes
sincrético,écerto1) ,valorizando(mesmonaÍndia,faceàculturaereligiãoocidental)as
tradições do Hinduísmo e também, desenvolvendo uma luta política no campo
anti-colonial particularmente na Índia2. No século XX, algumas correntes das novas
espiritualidades“newage”foraminfluenciadaspelaTeosofia,mitoemparticularotema
instruem a Humanidade.
Aventureira física e espiritual, mulher de grande coragem e capacidade, HPB
percorreu meio mundo em demandadastradiçõesespirituais,ilosóficasereligiosas.
Depois de uma viagem ao Egipto escreve “Isis sem véu” que representa a primeira
etapadateosofiadeBlavatsky,ocidentalehermetista.Cedocomeçaasegundaetapa,
oriental – hinduísta e budista – de talmodoqueasededaS.T.semudaparaaÍndia,
para Adyar no Estado de Madras. Nesta perspectiva ela publicará umresumodasua
doutrina teosofista – os puristas preferem esta denominação à de Teosofia, no
ocidentemaisaplicávelàteosofiacristã–namonumentalobra“ADoutrinasecreta”-
emdiversosvolumes,4ou6,consoanteaedição.Háumaobra–queFernandoPessoa
traduzirá–“AVozdoSilêncio”queelareclamaterrecebidodosMestresMoryaeKut-
u-Miequecomeçacomasoleneadvertênciadadoutrinadohinduísmoedobudismo:
“O mental é o grande inimigo do discípulo. Que o discípulo mate o inimigo!”.
A teosofia teve, na Índia, um papel de estímulo e de encorajamento para que os
indianos privilegiassem as suas tradições culturais e religiosas e não se deixassem
oprimir pelas dos ingleses.Estaacçãoanti-colonialista,emborapacífica,exasperouos
colonizadoresqueatravésdasacusaçõesdefraudeporpartedeumcasal,Coulombde
seu nome, que frequentava naÍndiaasreuniõesteosóficas,lançaramumacampanha
destinada a denegrir a imagem de H.P.B. e dos seus seguidores.
OcasoCoulombafectouBlavatskypelainjustiçaepelovexameetevenefastosecosno
ocidente,dequesalientaremosRenéGuénon,comoseulivro“LaThéosophie,histoire
d’une pseudo-religion” – preferido a denominação “teosofismo” à de Teposofia - e
1
Sincretismo esse que iremos encontrar em correntes do “new age”, algumas fortemente influenciadas
pela teosofia de Blavatsky.
2
Não só Gandhi foi fortemente influenciado pela S.T., como a discípula e continuadora de Blavatsky,
Annie Besant, deu um importante contributo a esta luta, assim como à da emancipação da mulher.
FernandoPessoacomtextosdoespólio–queseseguemaoseugrandefascínioinicial-
de reserva e de crítica face a Blavatksky, emboradeixandoescaparumaindisfarçável
admiração, como este: “Madame Blavatsky era um espírito fraldoso mas também é
verdade que recebera uma missão dos Suiperiores Incógnitos”.
OportuguêsViscondedeFiganière–autorde“Submundo,mundoesupramundo”–é,
segundo a própria Blavatsky, um percurtsos de alguns temas da sua Teosofia.
Fundada em 1888, por esoteristas maçons britânicos – e nada tendo a ver com um
actualpartidopolíticogregoneo-nazicomigualnome,“AuroraDourada”-,estaOrdem
rosacruciana – pois pretende descender de documentos rosacruzes alemães de um
século antes – baseia-se na Cabala hebraica. De facto,estarosacrucianaecabalística
OrdemHerméticadaAuroraDourada(“GoldenDawn”)foicriadaporW.W.Wescott,W.
R. Woodman e S.L. Mc Gregor Mathers, tendo sido, mais tarde dirigida pelo célebre
escritor W.Yeats(1865-1939),masveremosadiantequemfoiA.Crowley(1875-1947)
que,nestedomínio,maisinfluênciaterátidoemPessoa-muioprovavelmente,através
da sua organização a A.A..
OsseusGrauscorrespondemaos10sefirotdaÁrvoredaVidacabalística,umporcada
sefira, os 4 mundos
Exercícios de meditação e visualização – o “raio flamejante”, Lightening Flash e “o
caminho da serpente da sabedoria, The Way of the Serpent of Wisdom.:
- O Raio flamejante é um exercício em que se visualiza um raiodeluzeenergiaque
vemrapidamentedasregiõessuperiores,nãomanifestadas,daÁrvoredaVida,oqual
desceportodososSefirotatéchegaraomaisbaixo,Malkuth.Assimaspartículasdeluz
espalham-se na matéria obscura, permitindo a sua reintegração – Tikkun – posterior.
- O Caminho da Serpente da Sabedoria é um caminhoinversoemaislentodoqueo
anteriorquepartedeMalkuteascendeportodososSefirotatéKether,passandoalém
dele – como escreveu Fernando Pessoa, que recebeu esta tradição via a A.A. de
Crowley,noseutexto“OCaminhodaSerpente”,“(ela)quandochegaaDeusnãopara,
vai além Deus…”. Esclareça-se que Pessoa não assenta o seu caminho serpentino na
Árvore da Vida, como a Aurora Dourada, mas sim num losango, embora com uma
função simbólica equivalente.
Será interessante referir uma das várias guerras entre ocultistas, ocorrida na
circunstância entre o grande poeta e futuro Prémio Nobel irlandês Yeats, que
encabeçou a resistência dos membros da HOGD contra atentativadeCrowley–que
elesnãoachavamdignodepertenceremuitomenosdirigi-la,devidoàssuasposturas
provocatórias, com incursões pela magia sexual - para tomar de assalto a Ordem.
Crowley, vai formar outra Ordem,aAA–AstrumArgenteumouSilverStar(SS),com
ensinamentos semelhantes, embora num espírito diferente, de que Pessoa receberá
pelomenosumexemplardascircularesqueeramenviadasaosseusmembros(video
interessantíssimo “Um Encontro Magick –FernandoPessoa/AleisterCrowley”,deLuís
Roza, na verdade Luís Miguel Rosa Dias, sobrinho do poeta). Isto prova queCrowley
iniciou Pessoa na AA.
XIº. CAPÍTULO
Ordens neo-rosacrucianas
Correspondendoàquiloqueosespecialistasdeesoterismodenominamde“3ª.
Rosa-Cruz” – depois da “1ª.”, comosManifestosdocomeçodoséculoXVIIeda“2ª”.
Com a Ordem Rosa-Cruz de Ouro de finais do século XVIII – o começo do século XX
apresenta uma bo presença deste tipo de Ordens.
AleisterCrowleyapósterfalhadooseuplanodetomardeassaltoaHOGD,com
a cumplicidade de McGregor Mathers, funda a A.A. – uma GD“thelemita”,jáquea
Abadia de thelema de Rabelais era um dos seus modelos de comunidade livre – e
também uma ordem que se dizia neo-templária, a OTO – Ordo Templi Orientis que
conferiagrausmaçónicosdebase,Aprendiz,CompanheiroeMestreedepoisodeArco
Real, Holy Royal Arch (o Sacro Real Arco de que fala Pessoa que o terá recebido de
Crowley), seguido de Rosa-Cruz e Templário. Este edifício iniciático – até aqui um
exemplo típico de uma “fringe freemasonry”, uma “maçonaria lateral”, como
qualificam os ingleses – era encimado por graus de magia sexualheterossexual,mas
depois de Crowley ter tomado conta da Ordem ele criou, segundoele,um“necplus
ultra” iniciático, um último grau de magia homossexual.
PapeldedestaqueparaaA.M.O.R.C.–AntigaaMísticaOrdemRosa-Cruz, do
norte-americano Spencer Lewis (a quesucedeuoseufilhoRalphLewis),queelecria
apóstersidoiniciadoemFrança(ToulouseeParis)numramodaMaçonariaegípcia–a
expressão “saudações em todos os pontos do triângulo”, comum às duas ordens é
prova disso. Apresentando o Egipto como origem mítica da Ordem, a AMORC, com
sede emS.JosédaCalifornia,vaiterumagrandeexpansãointernacional(Américado
Norte e do Sul, Europa, África, etc.) chegando a contar com alguns milhões de
membros e grande influência política, sobretudo em África. Criou uma ordem
neo-templária a O.S.T.I. – Ordem Soberana do Templo Iniciático, animada pelo
responsável da AMORC francesa, Raymond Bernard (autor do livro “As Mansões
secretas da Rosa-Cruz”, entre outros).
Jollivet Castelot, autor do livro “Comment on devient-on alchimiste” (“Como
nos tornamos alquimistas”), cria a SociedadeAlquímicadeFrançaepublicaarevista
“LaRose-Croix”.OdramaturgosuecoAugustoStringbergescrevenarevistaadedica-se
a experiências alquímicas no seio da SAF. Jollivet-Castelot defende um “comunismo
espiritualista” num congresso do Partido Comunista Francês e é logo expulso do
partido.
RudolfSteinerafasta-sedaTeosofiablavatskiana,pssapelaOTOdeA.Crowley
efundaaAntroposofia,umateosofiacristã.AsuasedenaAlemanhaélogoatacadae
incendiadapelosnazis,oqueoobrigaafugirparaaSuiçaondefunda,emDornach,o
Gottehanum que se dedica à educação pelas Arte. Asuapedagogiasingularéposta
em prática pala Associação Waldorf, com delegações em váriospaísesentreosquais
Portugal.Puseramempráticaaagriculturabiológicaenocontextodoseucristianismo
esotérico fazem uma interessante leitura das principais festas do ciclo anual.
ARosicrucianFellowship(“FraternidadeRosa-Cruz”)deMaxHeindel,comsede
emOceanside,Ca.,dedica-seàastrologiaeàcuraàdistânciaatravésdeoraçõesede
meditações. Em Portugal o seu responsável, Francisco Rodrigues publica e dirige a
revista “Rosa-Cruz” onde ele próprio púbica uma longa série de artigos sobre o
esoterismo dos Lusíadas. Um membrodestacadodestaOrdeméAntóniodeMacedo
cujo valor como autor de livros esotéricos transcende em muito a dimensão da Ordem.
A Rosa-Cruz de Ouro de Harlem (Holanda) é uma corrente rosacruciana que
associa a tradição dos Cátaros à da Rosa-cruz. Deodat Rocher, com o qual a Ordem
estabelece contacto nos anos 40, procedenaOccitaniaàrestauraçãodatradiçãodos
“puros”. Os seus membros são vegetarianos.
Ordens neo-templárias
- A O.S.M.T.J. – Ordem Soberana e Militar do Templo de Jerusalem,
descendentedaOrdemdoTemplodaFabré-Palaprat,matem-seatéhoje,sendooseu
Grão Mestre internacional o Dr. Campelo de Sousa Fontes, embora tenham surgido
ultimamente algumas cisões, uma delas patrocinada por um português com
colaboração espanhola.
A “ressurgência de Arginy” verificada nos anos 50 em França quedáorigem
directa ou indirecta a um conjunto de ordens neo-templárias:
- a Ordre Rénovée du Temple – que dará origem à funesta OTS – Ordem do
Templo Solar (de que falaremos adiante), a FJRT – Fraternité Joannite pour la
Résurgence Templière que deu origem àOCTCNT–OrdredesChevaliersduTemple,
du Christ et de Notre Dame,ODVT – ordre des Veilleursdu Temple, etc., etc.
- Os três grandes intelectuais do esoterismo: René Guénon, CarlGustavJungeJulius
Evola.
GUÉNON
JUNG
Carl-Gustav Jung, “o psicólogo de Zurich”, foi discípulo de Freud e depois
renegou o mestre seguindo o seu próprio caminho, não na dimensão positivista de
Freud mas sim numa abordagem psico-espiritual, onde a psicoterapia conduziria à
“individuação”. Grande especialista de gnosticismo e de alquimia, escreveu, entre
outros, os seguintes livros; “Aion” e “Os sete sermões aos mortos”, no domínio da
Gnose e “Psicologia e Alquimia” e “Mysterium conjunctionis” no que respeita à
Alquimia.,.
EVOLA
O italiano Julius Evola é tão conhecido pela sua dimensão de grande
especialista de esoterismo, como de adepto militante da extrema-direita (fascismo e
cripto-nazismo).Tendoescritoobrasnotáveiscomo“Atradiçãohermética”,“OMistério
doGraaleatradiçãoimperialgibelina”,“AMetafísicadosexo”,“OYogatântrico”,Evola
escreveu também “Revolta contra o mundo moderno” e “Um homem entre ruínas”
que dãocontadasuaposturaaomesmotempomilitanteeangustiadadehomemde
extrema-direita que olevouaBerlim,porsolidariedadecomHitler,numaalturaonde
eraiminenteaquedadonazismo,tendoEvolasidoatingidoporumbombardeamento
aliado que lhe provocou uma paralisia de que nunca mais recuperou
PaulLeCourfoiofundador,nosanos30,darevistafrancesa“Atlantis”–“revista
dearqueologiatradicional”–queduraatéaosnossosdias.Escreveuumlivroqueum
estudioso como o padre Jean Vernette (in “New Age”, Ed. Eiropa América)considera
que é um livro percursor do New Age, ao considerar – e a provar - que estamos a
entrarnaEradoAquário–recordemosamúsicadomusicalHair(docomeçodosanos
70), this is the dawning of the Age of Aquarius, “esta é a alvorada da era do Aquário”.
NEW AGE
ONewAge–quenascedacontra-culturadosanos60comarecusaeacrítica
dasociedadecapitalistavigenteeassuasdimensõesmilitaristas(aguerradoVietnam),
“Make love nt war”, “Peace and Love” -. não é uma corrente mas sim um conjunto
muito diversificado de espiritualidades, religiões e filosofias. O começo do New Age
deu-se em doislocaisdiferentes:emEsalennaCalifórniaNovaCiência defendendoe
promovendoasíntesedaCiênciaeReligião,oestabelecimentodeumaNovaPsicologia
que favorecesse a “expansãodaconsciência”eemFindhornnaEscócia.Comotema,
posto em prática, do regresso à Natureza, uma ecologia sagrada que vai ter
desenvolvimento futuroa como a Hipótese Gaia.
Estes dois movimentos cedo entraram em contacto entre s, sendo uma das
características do New Age, a formação de pequenas comunidades e o trabalho em
redes, pelo que para além da dimensão de psicologia e de ciência alternativas, o
retorno à natureza marcou profundamente esta(s) nova(s) corrente(s).
- a síntese do Oriente e do Ocidente (que já Blavatsky havia proposto na sua
Teosofia)
- tudo é energia, afirmação que participa da equivalência entre matéria e
energia de Einstein, mas sobretudo da faceta “tântrica” do New Age
- a terra é um ser vivo, sagrado
AExpressãoEspiritualidadesAlternativascaracterizamuitodoqueoNewAge
defende e inclui pois grande parte dessas correntes não são religiões mas sim
espiritualidades.
- de inspiração ocidental: ordens de tipo rosacruciano e templário, cristianismos
esotéricosdetipognóstico,neo-xamanismo,neo-paganismodeentreosquaisavultam
as ordens druídicas e neo-célticas,, neo-bruxarias como a Wicca,
- de inspiração moderna, embora com elementos tradicionais: P.N.L. – Programação
Neuro-linguística, Cientologia/Dianética, cultos de ETs e de OVNIS
- Do New Age comunalista e milenarista ao Next Age individualista e desencantado
colectivamente.
Posteriormente à fase comunalista em rede e milenarista daquilo a que se
convencionou chamardeNewAgeefaceàdesilusãoqueconstituiuacontinuaçãoda
mesma sociedade e da mesma espiritualidade, com características ainda mais
negativasdoqueasqueinformaramosanos60e70,os“newagers”jánãoacreditam
que esteja para chegar, colectivamente, uma Nova Era pelo que assumem que o
caminhoafazerésobretudoindividual.Este“salve-sequempuder”espiritualcomeça
em finaisdosanos80eprincípiosdosanos90doséculoXXetemnomesdestacados
como por exemplo Paulo Coelho, Deepak Chopra.
(quadro)
De todas as tipologias que pretendem fazer uma distinção mais fina no interior dos
NMR, i.e., entre as suas diversas manifestações, parece-nos que a apresentada na
excelenteobradeChristopherPartridge,EncyclopediaofNewReligions,–comprefácio
deJ.GordonMelton,daUniversidadedeSantaBarbara,EUA,quetambémesteveem
2000, em Cascais, no Congresso sobre o esoterismo de Fernando Pessoa que eu
organizei-,éamaisadequadaàdescriçãodestefenómenocomplexoquesãoosNMR.
Assim, nesta tipologia proposta, teremos as seguintes divisões (seguida dosexemplos
mais significativos):
- NMR com raízes no Cristianismo: Mormonismo, Testemunhas de Jeová, Ciência
Cristã, Pentecostalismo da Unicidade, Igreja Universal de Deus, Igreja da
Unificação/”Moonies” (Coreia do Sul), Rastafarianismo, Igrejas Africanas
Independentes (África sub-sariana), Kimbanguismo (Congo ex-Zaire), Igreja do
Senhor/Aladura (Nigéria), Igreja Celestial de Cristo/Aladura (Benin), Igreja Cristã de
Sião (África do Sul), Templo do Povo do Ver. Jim Jones (EUA/Guiana), Ramo dos
Davidianos (waco, Texas), A Família/MeninosdeDeus,EspiritualidadedaCriaçãode
MatthewFox,IgrejasInternacionaisdeCristo/ICOC,FraternidadedeJesus/Exércitode
Jesus, etc.
- NMR com raízes no Judaísmo: Movimento Lubavitch, Cabalismo (T
he Kabbalah
Learning Center, de Rav Berg, etc.), Aleph/Aliança para a Renovação do Judaísmo,
Judaísmo Reconstrucionista, Judaísmo Humanístico, Gush Emunim, Meshihistim, etc.
- NMR comraízesnoIslão:OrdemSufiTurca/OdemdosDervichesHalveti-Jerrahi,
Ordem Sufi dos Naqshbandis Haqqani, Fé Baha’i, Movimento Internacional Sufi, A
Nação do Islão (de Louis Farrakhan, EUA), Subud, etc. 260
- NMR com raízes no Zoroastrismo: Mazdeísmo reformado, Filosofia Parsi, etc.
- NMR com raízes nas Religiões Indianas: Missão Ramakrishna, Brahma Kumaris,
Movimento Meher Baba, Sociedade Satya Sai Baba, Ananda Marga, MT/Meditação
Transcendental (de Maharishi Mahesh Yogi), ISKCON/Movimento Hare Krishna,
YogaseTantrismosdiversos,MovimentoOsho(ex-Rajneesh),FundaçãoKrishnamurti,
Elan Vital, do Guru Maharaji, NKT/Tradição do Kadampa, Shambala International, etc.
-NMRcomraízesnoExtremoOriente:Tenrikyo(Japão),SokaGakkai(Japão),Reiki
(Japão), Aum Shinrikyo (Japão), Taoismo moderno (Mantak Chia, etc.),
Kyodan/Perfeita Liberdade (Japão), Cao Daí (Vietnam), Falun Gong (China), Tai Chi
(China), Artes Marciais diversas, Meditação budista Chan/Zen, Feng Shui (China), etc.
- NMR com raízes nas Tradições indígenas e Pagãs: Cultos “cargo” (Melanesia,
Polinesia), Druidismo/Celtismo, Santeria/Regla de Ocha (Cuba), Umbanda (Brasil),
Candomblé (Brasil), Vudu (Haiti), Brujeria (México), Palo Maiombe(México),Igreja
dos Nativos Americanos (EUA), Xamanismos diversos (Castaneda, Michael Harner,
etc.), Wicca, Eco-paganismo, Heathenismo e Tradição Norse/Paganismogermânicoe
nórdico/Federação pagã, etc.
-NMR com raízes no Esoterismo Ocidental (EO) e nasTradições “New Age”(NA):
a) EO: Teosofiacristã(Swedenborg,JacobBoheme,etc.),Rosacricianismo(AMORC,
Rosicrucian Fellowship, Lectorium Rosacrucianum, etc.), Neo-templarismo (OSTS,
OTS, ORT, OCTCND, OVDT, OSMTJ, etc.), (Franco-) Maçonaria (Judaico-cristã,
Cristã, “egípcia”, etc., de Ofício, de Altos graus, Regular, liberal, etc.), Teosofismo
(Sociedade Teosófica de H.P. 261
Blavatksky,AntroposofiadeRudolfSteiner,EscolaArcanadeAliceBailey,etc.),outras
escolas: HOGD/Hermetic Order of the Golden Dawn, de W. Wynn Wescott, AA, de
Aleister Crowley, OTO/Ordo Templi Orientis, de Karl Kellner, Theodor Reuss e A
Crowley, Grupos Gurdjieff e Ouspensky,IgrejasGnósticas,Satanismo(IgrejadeSatã,
de LaVey, Templo de Set, de M. Aquino), Vampirismo (Templo do Vampiro), etc.
b) NA: Instituto Esalen (California), Fundação Findhorn (Escócia), Summit
Lighthouse/Igreja Universal e Triunfante, “O Curso de Milagres”, “A Profecia
Celestina”400, etc.
- NMR com raízes emCulturasOcidentaisModernas:Espiritualidadecentradanas
Celebridades (Elvis Presley, Princesa Diana, etc.),Psicologiastranspessoais(Stanislav
Grof,PierreWeil,etc.),URANTIA,Ufologia(Raelianos,Heaven’sGate,etc.),Controle
Mental de Silva, Igreja de Cientologia/Dianética de Ron Hubbard, Espiritualidades
Feministas, Movimento do Potencial Humano (Abraham Maslow), NLP/Programação
Neuro-linguística, Doofs e Raves, etc.
(fim do quadro)
Iiª. P A R T E
PreferimosaexpressãoEsoterismoemPortugalàdeesoterismoportuguêspois
noterritórioquedepoisfoiPortugaleclodiramformasdeesoterismoealémdissohá,
para além de algumas variações locais, uma clara característica internacional no
esoterismo ocidental.
Ibn’Cassiéosegundograndenomedatradiçãoesotéricanoespaçoquedepois
foi Portugal. Nascido em Silves, descendente dos Cassius romanos peninsulares que,
sendo arianos, estavam em boas condições para aceitar a unicidade de Deus que a
conversão aoislãoexigia.Convertidoaofatimismoismaelita–nãoesqueçamosqueo
CairofoisededoilustradoCalifadofatimidaqueseespalhoupeloNortedeÁfrica.Rei
do Sul do Alentejo e doAlgarvede1141a1151,Ibn’Cassifoitambémchefedeuma
confraria de monges-cavaleiros, os Muridines, os “discípulos”ou“adeptos”cujasede
emDjilla,foilocalizadarecentementeemArrifana,Aljezur,procedendo-seactualmente
a explorações arqueológicas pelo casal Varela Gomes.
NodomíniodaAlquimia,édereferiroalquimistapadreAntóniodeGouveia–
quechegouasofrerpeloseuinteressepelaArtedeHermeseoextraordinárioTratado
de Anselmo Caetano Munhoz de Abreu Gusmão de Castelo Branco, o “E nnoea –
tratado de aplicação do entendimento sobre a Pedra Filosofal”, editado em Lisboa,
1733, com todas as licençasdoSantoOfício.Estefactosingular-jáquesetratavade
umlivrodeAlquimia–deve-seaofactodehavernaépocaumsacerdoteentusiastada
Arte de Hermes, o padre Rafael Bluteau, autor de umconhecidoDicionário,alémde
que o autor do Tratado elogiaoCondedaEriceira,seupatrono,etambémD.JoãoV,
segundo ele “o Monarca do Quinto império Português”. Anselmo Caetanodefendea
equivalência entre o Sebastianismo e aAlquimia:“assimcomoosfilósofosdegrande
entendimento são alquimistas assim todos os sebastianistas são crysopeios….”.
ENNOEA é um dos mais importantes tratados europeus de alquimia -
infelizmentepoucoconhecidodosespecialistaseuropeus,emboraPauloPereiratenha
publicado na revista francesa de estudos alquímicos“LaTourbedesPhilosophes”um
artigo sobre ele – quedemonstraumprofundoconhecimentodamelhortratadística,
Basílio Valentim, Filaleto, etc.,quernodomíniodateoria,quernodomíniodaprática
(materiais, regimes, etc.). Mantem a disciplina tradicional quanto ao segredo,
utilizando exemplarmente a simbólica alquímica. Dareidoisexemplosapenastirados
do ENNOEA, um em português e outro em castelhano:
o casamento hermético do Leão e da Águia.
D
(...).TomaiaVirgemcomasas,lavada,limpaeprenhada,daSeminaleespiritualmatéria
do primeiro contacto masculino, ficando ilesa a glória da sua virgindade, com as faces
tintas de roxo; ajuntai-a com o segundo sujeito masculino, sem suspeita, nem perigo de
adultério; e por fim parirá um venerável fruto de ambos os sexos, do qual sairá uma
imortal prosápia de poderosíssimos Reis. (...) Ajuntai pois a Águia com o Leão, e
escondei-osnoseuclaustrodiáfano,comaportabemtapada,paraquenãosaiaporelaa
suarespiração,oulheentreoarestranho.AÁguiaacometendooLeão,odespedaçaráde
comerá. E logo adormecerá com um profundo e dilatado sono, inchando-lhe tanto o
estômago que feita hidrópica, se converterá com admirável metamorfose em um Corvo
muito negro, este perdendo paulatinamente as penas, principiaráavoarecomoseuvoo
remontarátantoquesacudirásobresimesmoáguadasnuvens,atéque,ficandomolhada,
dispa de boavontadeasasasedescendoporfaltadelas,seconvertamnumbranquíssimo
cisne.
Manuel Rosales “Bocarro Francês”, alquimista e defensor de uma visão
esotérica o Quinto império. Autor do livro “Anacephaleosis da Monarquia Lusitana”.
A este propósito cite-se a acção dos monges de Alcobaça – Frei Bernardode
Brito à cabeça - em torno de uma escola de (diremos hoje) propagando de muita
qualidade, em torno dos temas do Sebastianismo edoQuintoImpérioquedeuàluz
sucessivamente ao longo de anos os volumes da “Monarquia Lusitana”..
O Visconde de Figanière, natural do Porto, autor de “Submundo, mundo e
suprmundo”, foi considerado pela própria Blavatsky como sendo percursordealguns
temas da sua teosofia.
(caixa)
A QUINTA DA REGALEIRA, OS MISTÉRIOS E AS INICIAÇÕES
A Quinta da Regaleira, com os seus jardins, poços, grutas e capela, sugere,
atravésdasuaarquitecturanosjardins,fortemente,umpercursoiniciático(simbólicoou
real)queune,deummodocoerenteeevolutivo,osdiversoslocaissimbólicosemíticos
nela presentes, na perspectiva da Iniciação aos Mistérios em geral e de diversas
iniciaçõesesotéricasemparticular:todasasqueseguemesse«arquétipo»,istoé,odeo
caminhoque vai das Trevas à Luz.
SendoainspiraçãoliteráriaprincipaldosjardinsadaDivinaComédiadeDante,
isto não exclui outrastradiçõesreligiosas,literáriaseiniciáticas,tambémpresentes-e
de que maneira! - na obra de Carvalho Monteiro e de Luigi Manini. A solução
arquitectónica dos jardins da Regaleira ofereceumaestruturauniversalondeassentam
todas as outras referências, como referi anteriormente no meu livro Os jardins
iniciáticos da Quinta da Regaleira (Ésquilo, 2ª. Ed. , 2006, cuja 3ª. Edição revista.
sairá em breve), fazendo a síntese do Cristianismo e do Paganismo e de diversas
tradições esotéricas e inciáticas.
A QuintadaRegaleiraemSintrafoimandadaconstruirnasuaformaactual,de
1900 a 1910, por António Augusto Carvalho Monteiro(RiodeJaneiro,1848-Sintra,
1920) tendo tido como arquitecto o italiano Luigi Manini, natural de Cremona e
cenógrafoemS.Carlos,oTeatrolisboetadeópera.Maninifoitambémoarquitectodo
Palace Hotel do Buçaco, mas se existe alguma semelhança entre o neo-manuelino de
ambos os Palácios, já nos jardinsadiferençaénotóriaquantoàdimensãosimbólicae
religiosa,asaber,cristã-católicanoBuçaco–comdestaqueparaasuainteressantíssima
Via Sacra, infelizmente em muito mau estado - e ecuménica na Regaleira, onde o
CristianismoeoPaganismoconvivemharmoniosamente,detalmodoqueosseusdois
santuários, o pagão, a Gruta de Leda e o cristão, a Capela “templária”, dizem por
linguagensdiferentesamesmaverdadesimbólicaemítica,istoé,queoEspíritodivino
fecunda a matéria e esta vai gerar filhos: na Gruta de Leda, uma mulher, esta é
fecundada por Zeus, disfarçado de cisne - Zeus é o maior dos deuses do paganismo
gregoeéequivalenteaoJúpiterromano.edaráàluzosGémeos,CastorePollux,De
igualmodosimbólico,oEspíritoSanto–oEspíritodoDeusPai–desce,sobaformade
pomba, sobre Maria, a Mater, a Matriz, a Matéria que recebe o Espírito e dará à luz
Jesus o Cristo, Filho de Deus. Uma diferença é de assinalar entre ambas astradições
religiosas,poisenquantoqueosdeusesdasmitologiasviviamnalendaenomito,parao
cristão Cristo encarnou e viveu entre nós num história e numa geografia determinadas.
Ora,sendooarquitectodosPaláciosdoBuçacoedaRegaleiraomesmoeseno
primeirocasoháapenasrevivalismonacionalistaecristianismocatólico,nosegundohá
a registar elementos esotéricos e míticos quie passamos a enumerar:
- o hermético uroboros (serpente que morde a cauda) à entradadoPalácioda
Regaleira;
-ummedalhãocomoPelicanoalimentandoosfilhos,utilizadoporfraternidades
iniciáticas cristãs, como os rosa-cruzes, também à entrada do Palácio;
-ogibelinoeparaclético“515”deDante,nasaladacaça,encimandoafiguração
doMilagredeSantoHuberto–enocentrodo515,ilmessodidio, estáummonteiro
comumaarmaedoiscãesdecaça,provavelmentedizendoqueCarvalhoMonteiroquis
deixarnaRegaleiraasuamensagem,oseutestamentoespiritual-,enestamesmasalaa
Oriente está uma figura feminina, o Feminino iluminador, iniciador;
- as três Graças maçónicas, Força SabedoriaeBelezanotectodoescritóriodo
proprietátrio no 2º. Andar;
-areferênciasimbólicaaocultopopulardoEspíritoSantonumavarandavirada
a sul, no Palácio da Regaleira,
- a referência ao Encobertoqueestavanumgrandecadeirãonumadassalasdo
rés-do-chão do Palácio e que o sebastianista Carvalho Monteiro reservava para oRei
que há-de vir.
-ofactodenaSaladosReisasefígiesdossobreranosportugusesterminaremem
D. João V, poderá significar queesteseriaoúltimoaquemsepoderiadizerqueerao
Monarca do Quinto Império português – como aliás refere Anselmo Caetano Castelo
Branco no seu Tratado de Alquimia, ENNOEA.
- a presença de um forno no terraço do palácio que – omo asinali no meu
primeiroartigosobreaRegaleira–poderiaserparasecaraspeças(conchas,borboletas,
etc.) desse grande coleccionador que foi Carvalho Monteiro, como para actividades
espagíricas e alquímicas.
A quinta da Regaleira tem pois duas componentes essenciais, o palácio
neo-manuelino – celebração da grande dimensão histórica e míticadePortugal–eos
jardins–celebraçãodastradiçõesreligiosas,espirituaiseiniciáticasqueinformaram,e
informam muito da cultura ocidental e que foram inspiradas por tradições anteriores
vindas da margem sul e oriental do Mediterrâneo, tradições essas que passamos a
referir:
- Religiões de Mistérios, em que os deuses morriam e ressuscitavam: Osiris –
mortoecortadoem14pedaçospeloseuirmãoSeth-,Attis,Adonis,Dionísio–também
morto pelos Titans e dortado em 14 pedaços. De referir que o chamado Patamar dos
Deuses da Regaleira tem vários deuses damitologiagreco-romana:Mercúrio/Hermes,
Vulcano, Baco/Dionísio, etc. mas com referência tambémumadeusaCeres/Deméter-
cuja filha foi arrastada pela os mundos inferiores pelo rei dessas regiões, Hadés,mas
que finalmente acabou por passar uma parte do ano debaixo de terra e a outra à
superfície - e um herói e semi-deus, Orfeu, que também desceu aos infernos em
demanda da sua amada Euridice.
- O próprio Cristianismo – a Quinta da Regaleira tem nos jardins umaCapela
cristã - em que Cristo, depois da Paixão – em 14 estações da Via Sacra -, “morreu,
desceu aos infernos, ressuscitou ascendeu aos céus onde está sentado à direita de
Deus-Pai todo-poderoso…”.
- Este arquétipo de descida e ascensão e de morte e ressurreição vai estar
presentenagrandeliteraturadeantanho,comoasMetamorfosesdeOvídio,aEneidade
Virgílio e a já referidaDivina Comédiade Dante.
-Porfim,associedadesiniciáticas–rosacrucianas,templárias,maçónicas,etc.-
criaramrituaisdeiniciaçãoemqueosneófitosviviam,simbolicamente,umprocessode
morte e ressurreição. Dessas sociedades iniciáticas mencionaremos a presença
iconográfica, na Regaleira, de:
-Athanor(forno)alquímiconastraseirasdacapela–umatorrecomguela,“tour
de gueles”, torres rubra, torre ao rubro, sendo o Athanor o forno onde a matéria se
espiritualiza e o espírito se corporifica.
-LogoàentradadaCapela,pordebaixodocoro,oDeltaRadianteouTriângulo
Luminoso maçónico, com a cruz templária (na versão da Ordem de Cristo),provável
referênciaaumacorrentemaçónico-templáriaportuguesa.EmtornoDeltaencontramos
uma corda contornando orectângulo,provávelreferênciaàcordaquecontornaotecto
dos templos maçónicos e que simboliza a Cadeia de União universal, a fraternidade
universal.
-Cruzestemplária,cruzesdaOrdemdeCristoepentagramasnochãodacapela,
refeencia à tradição templária – note.se que a Igreja de Santa Maria do Olival em
Tomar,quefoipanteãodosMestrestemplários,temumpentagramaàentradaeoutrono
interiorsoboaltar.AcriptadaCapelatemquadrojanelasparaasuperfíciecomcruzes
templárias (na variante teutónica, referênciaàEstritaObservânciaTemplária?)eoseu
chão é o ladrilhado branco o preto – o “xadrez do cjão ritual”, como escreve Pessoa
num seu poema -, o “ladrilhado maçónico” inspirado no estandarte templário, o
Beaucéant.
-ParaalémdomaiorPoçoiniciáticoternoveníveis,simbolizandoosnovecírculosdo
Inferno da Divina Comédia de Dante, não deixa de ser curiosa a coincidência de o grau
maçónico (13º. do REAA) de Cavaleiro do Arco Real de Enoch mencionar um conjunto de 9
câmaras sucessivas, horizontais ou verticais (consoante os rituais), onde se desenrola a
iniciação.
Para terminar esta breve incursão pelos mistérios simbólicos e míticos da Regaleira
deve referir-se que estas descobertas eindentificaçõesquefiznosprimeirostrabalhoapartir
de 1990 (inclusive) e que revelavam um enorme interesse por parte do proprietário e
construtor (com Manini) da Quinta, foram confirmadas quando me foi oferecido (por Paulo
Pereira) o catálogo da Biblioteca do Congresso, em Washington, sobre os manuscritos de
Carvalho Monteiro, e onde estão listados manuscritos sobre Alquimia, Sebastinismo, Quinto
Império, Templários, Maçonaris, etc.
Mas,nãoestariacompletaumareferênciaàQuintadaRegaleirasemmencionarmoso
facto de nos poemas explicitamente esotéricos que Fernando Pessoa escreveu de 1930 até
1935, estarem referências, em nosso entender, explícitas à Regaleira - “Estalagem do
assombro”,“omurodaestrada”,“oxadrezdochãoritual”(aqueasiste…)nacriptadacapela,o
“atropoço”,os“degraus”domesmo,etc.etc.Eospoemas“NaSombradoMonteAbiegno”e
“Do vale à montanha”, ambos de 1932eopoema“Oúltimosortilégio”,publicadonarevista
coimbrã “Presença”nº.29,de1930,sãoemqualquercasoumabeladescriçãodageografiae
daatmosferasimbólicaemíticadaRegaleira,podendosertambémreferênciasàsuadimensão
iniciática e mesmo ritualistica. Vejamos o poema “Eros e Psique” publicado na revista
“Presença”, n~.41/42 de Maiode1934,emqueoPoetaapresentaemexergueumtrechodo
que ele nos diz ser o “Ritual do Grau de Mestre do Átrio na Ordem Templária de Portugal”:
Sonha em morte a sua vida,/E orna-lhe a fonte esquecida,/Verde, uma grinalda de
hera.
Mas cada um cumpre o Destino -/Ela dormindo encantada,/Ele buscando-a sem tino/
E falso, ele vem seguro,/E, vencendo estrada e muro,/Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,/Á cabeça, em maresia,/Ergue a mão, e encontra hera,
(trechos do poema “O Último Sortilégio”, publicado na revista “Presença” em
Dezembro de 1930)
Não tens vestes, não tens nada: tens só teu corpo que és tu,
Teu corpo cessa, alma externa,/Mas vês que são teus iguais (…)
(poema sem data publicado na revista “Presença”, nº. 35, em Maio de 1935)
SalientemosqueAntónioAugustoCarvalhoMonteiromorreuem1920equeem1930
oseufilhoPedrojáeraproprietáriodaQuinta(emboracommuitasdificuldadesfinanceiras,de
talmodoquedepoisvendeaWaldemarD’Orey)ondequeprovavelmenteacolhiaumpequeno
cenáculo iniciático, a “Ordem Templária de Portugal”, eventualmente maçónico-templária,
cenáculo que incluiria, além de Pedro Monteiro, Pessoa e o seu companheiro de andanças
esotéricas Augusto Ferreira Gomes ( jornalista e autor do livro“QuintoImpério”queoPoeta
prefaciou) e ainda Álvaro Ribeiro, nome importante da Filosofia portuguesa – que António
Telmo refere, em entrevista à revista “Ler”, aquele lhe terditoqueA.FerreiraGomesera“o
companheiro de Pessoa da Loja do Arco Real”.
Mas, repito, a Quinta da Regaleira é fruto de dois espírito universais, o proprietário
Carvalho Monteiro e o arquitecto Luigi Manini, que souberam oferecer-no um verdadeiro
testamento filosófico, espiritual e iniciático, numa dimensão ecuménica onde convivem o
Paganismo e o Cristianismo e onde florescem diversas –nãouma,masvárias-referênciasa
tradições literárias e iniciáticas.
(fim da caixa)
OesoterismoportuguêsnoséculoXXdestaca-sepelasuavertenteliteráriaeartística.
Desdelogopeloseupercursor,SampaioBruno–oportuense JoséMariadeSampaio(Bruno)–
quenoseulivro(póstumo,masincluindodiversosartigospublicadosemvida),“OsCavaleiros
do Amor ou a Religião da Razão”, disserta sobre algunsdostemasqueserãoretomadospor
outros autores da segunda metade do séculoXX(LimadeFreitas,AntónioTelmo,ManuelJ.
Gandra,etc.),numadimensãomíticaeesoterisante,aqualtêmavercomosFiéisdoAmor, os
Templários e as sobrevivências da Ordem de Cristo (“A Lusitania transformada” de Fernão
Álvares do Oriente); Bruno também refere o eu contacto com os esoteristas do Paris do
começo do século, particularmente o rosacruciano Sar Peladan.
Almada Negreiros é um neo-pitagórico que dá testemunho disso, desde logo no painel “O
Começar” que está no átrio da Fundação Gulbenkian, em Lisboa, onde encontramos em
posiçãocentral,aEstrelapentagonaldospitagóricoseaindaotraçadodoPontodaBahutedos
construtoresalemães–opontoqueestánocentrodotriângulo,doquadradoedocírculo(“se
encontraresessepontoestarássalvo,senãooencontraresestásperdido”, cantavameles)–e
tambémemváriosartigoseentrevistas(umadadaaAntónioValdemarepublicadanoDiáriode
Notícias) queLimadeFreitaspublicoueestudounoslivros“AlmadaeoNúmero”e“Ver” e
que têm a ver com os segredos da Geometria e da Aritmética sagradas, dando primazia à
figura e depois ao número – “Ao princípio Deus geometrizou, diziam os pitagóricos –
dissertando sobre o Número de Ouro, a Divina Proporção, a Relação 9/10, os Painéis de S.
Vicente, etc.
FERNANDO PESSOA
MaséemFernandoPessoaqueoesoterismoatingeumagrandedimensãoespirituale
filosófica não só em muitos dos seus poemas (exiplicitamente naqueles escritos de30a35,
mas implicitamente em outros anteriores), como também em vários textos do espólio –
publicados, entre outros, por Ivette Centeno e António Quadros. Este último, ensaiou uma
periodização da sua obra ensaística m três“estádios”:apósumestádiofilosóficoquedurará,
segundoesteestudioso,de1905/6a1915/6,começa,paraPessoaumestádioneo-pagãoque
duraráaté1920,findoaqualcomeçaráumestádiognósticoqueacompanharáopoetaatéao
fim da sua vida, em 1935. (cf. António Quadros, Obras de Fernando Pessoa). A dimensão
esotérica do Poeta da “Mensagem” é tão grande, variada e profunda que ele mereceneste
livro um capítulo inteiro – como mereceu da minha parte um livro, “Fernando Pessoa e os
Mundosesotéricos”(Ésquilo,Lisboa,3ª.Edição,2006)queesperoreeditarbrevemente,numa
edição revista e aumentada.
AGOSTINHO DA SILVA
Não sendo propriamente um esoterista stricto senso a sua actividade intelectual e
espiritual situa-se em zonas fonteiras onde o símbolo e o mito tocam o esoterismo e não
apenas o ocidental. Desde logo, as suasreferênciasfranciscanasejoaquimitasnoquetocaà
Terceira Idade e ao Quinto Império do Espírito Santo. A sua valorização docultopopulardo
Espírito Santo, centra-se no simbolismo espiritual das suas três componentes rituais,
começandologopelaCoroaçãodoImperadordoEspírito,umhomemqualquer(tiradoàsorte,
poisoEspíritoSantosopraondebemquer)oumaisrecentementeumacriança,simbolizandoa
coroaçãodasimplicidadedecoraçãoedeespírito–oespíritodescemaisfacilmentesobreos
simples,osparvulli,osquetêmmenosideiasfeitas,menospre-conceitos.Segue-seoBododo
EspíritoSanto,ondepobresericospartilhavamumarefeiçãocomum,símbolodafraternidade
entre os homens; as festas do E.S. foram introduzidas ou valorizadas pela Raínha Isabel de
Aragão, futura Rainha Santa (que embora vindo de um universo heterodoxo, acaba comom
Santadaortodoxiacatólica),começandoporAlenqueredepoisemSintra,ondenoPalácioReal
existeumacapelavermelhacomaspombasbrancaspintadasesvoaçandoedizatradiçãoque
este notável casal real, ela e D. Diniz seuesposo,serviamàmesaduranteoBododoES,em
Sintra. AterceiracomponentedesteCultoPopular–quehojesóestápresentenoContinente,
de quando em vez, na Aldeia do Penedo, na Serra de Sintra e apenas com referências
simbólicas na Festa dos Tabuleuros em Tomar, mas queestápresentenasIlhasdosAçorese
por onde os Açoreanos chegaram, E.U.A. e Canadá - só existe no Brasil, concretamente em
Paraty, cidade colonial do Estado do Rio de Janeiro e consiste na Libertação dos presos,
normalmentedeumpresooupresosemfimdepena,pósacoroaçãodoImperadoredoBodo.
De onde provirá esta terceiracomponente?Aorigemdestecultopopularresidenateoriado
Abade calabrês Joaquim de Fiore, a doutrina das Três Idades, a qual consistia na seguinte
sequência:1)houveprimeiroaIdadedoPai,aidadedaJustiça,aidadedoAntigoTestamento;
2) depois chegou a Idade do Filho, a Idade do Amor, a Idade do Novo Testamento, 3) mas
estavaachegaraIdadedoEspíritoSanto,aidadedaLiberdade,aidadedoEvangelhoEterno,
queéotítulodeumlivrodeumdiscípulodoAbadeJoaquim,publicadonoséculoXIV.Aesta
ideia aderiram os franciscanos mendicantes e os espirituais, os fraticelli que erravam pelos
camposecriticavamosdosconventospeloseuconforto(demasiado,segundoeles)etambém
uma parte da cristandade, entre a qualestavaopaideIsabeldeAragão,correspondendo-se
elaprópriacomosheterodoxosespanhóisdascatalãesedasbaleares,ArnaldodeVillanovae
Raimund Lull, o que não deixa de ser interessante, pois vindadahetedoxia,elaacabacomo
santa da ortodoxia católica.
Também a ideia de Quinto Império cativou Agostinho da Silva que reviu e a
desenvolveunumplanoespiritual,poisseparaoPadreAntónioVieira-etambémparaoautor
do Tratado alquímico ENNOEA, Anselmo Caetano - esse Império era “imperial”, português e
ctólicoenãopoderiadeixardeosernaépoca,jáparaFernandoPessoaoQuintoImpério,uma
vez perdido o Brasil, era um império da Lingua portuguesa, “a nossa pátria é a língua
portuguesa”. Ora regressado do Brasil, para onde fora mandado por Salazar por motivos
políticos – e onde foi Professor universitário, ajudando a fundar universidades – depois da
Revoluçãode25deAbriledaDescolonização,oQuintoImpériodeAgostimnhodaSilvaénão
imperialista, pois como ele diz: “agora que já não temos Império material, podemos
enfimconstruir o Quinto Império do Espírito Santo”!
NãopossodeixardereferiroqueAntónioTelmorefereementrevista,relativamenteà
ocupaçãodoMundopeloQuintoImpérioportuguês,projecto–financiadoporumcapitalista-
que levou alguns portugueses a Brasília para receberem a “ordem de marcha” dada pelo
Professor.Peranteummapa-mundi,Agostinhodistribuiuasáreasgeográficasacadaum,após
o que António Telmo (que iria segundo me lembro patra Granada) perguntou: “e o que
teremos de fazer?”. “Nada, absolutamentenada!”disseo“coordenador”doQuintoImpério
português. “Basta estar nesses diversos pontos do globo e assim procederemos à ocupação
quinto-imperial do mundo”. Ora esta é outra clara referência ao esoterismo chinês,
concretamenteaoTaoismo,poisasuadoutrinadoWuWei,dizque“amaiseficazdasacçõesé
a não-acção”. SE porumlado,naInglaterradeCromwellosultra-puritanos“MenoftheFifth
Monarchy”andavamaostiros,maistardeemPortugalplaneava-seumaocupaçãodomundo,
pacífica, diremos mesmo, poética…
Obras de Agostinho da Silva: “Um Fernando Pessoa”, “Sete cartas a uk jovem filósofo” e
diversos volumes de Ensaios.
NATÁLIA CORREIA
Poetisa, melhor, poeta, muito voltada para os temas simbólicos e míticos, numa
perspectivaheterodoxa,elaassumeumadimensãoexpressamenteesotéricanoseumagnífico
livro de poesia “Sonetos Românticos” ecomas“Núpcias”,ambosclaramenteinspiradospela
alquimia.
LIMA DE FREITAS
Lima de Freitas – que é um grande ensaísta muito apreciado por especialistas
estrangeiros de nomeada, alguns deles universitários como Gilbert Durand – para além dos
515”, o Prestes João, O Encoberto, O Jardim das Hespérides, etc., fez o resumo dos temas
míticos,simbólicoseesotéricosqueestãopresentesnatradiçãoportuguesa,nosseuspainéís
visitadeestudoindispensávelparaosqueseinteressamporestasdimensões.Deentreestes
temas destacamos os que tem a ver com o culto do Espírito Santo, o Quinto Império e o
Sebastianismoedoispainéisdegrandevaloreotérico,umsobreoneo-pitagorismodeAlmada
ANTÓNIO TELMO
AntónioTelmoganhounotoriedade,merecida,peloseutrabalhopioneiro,logo
a seguirao25deAbril,oseulivro“AHistóriaSecretaemPortugal”–reeditadocomo
título de“OHoróscopodePortugal”.Masoutroslivrosseseguiram,deentreosquais
“O Desembarque dos maniqueus na ilha de Camões”, “O Bateleur”, “A gramática
secretadalínguaportuguesa”,“FilosofiaeKabalah”,“OMistériodePortugalnaHistória
e n’Os Lusíadas”, “Congeminações de um neo-pitagórico”, “A Aventura maçónica”.
Referimos acima nomes daqueles que em Portugal deram um contributo no
domínio do esoterismo, quer através de estudos, quer através de textos esotéricos,
mas que somente os que “da leidamortejáselibertaram”–comovimos,noséculo
XX,SampaioBruno,Almada,Pessoa,AntónioQuadros,DalilaPereiradaCosta,Limade
Freitas,AntónioTelmo,etc.–,maséforçosonãonosrestringirmosapenasaesses,pelo
que referiremos também nomes dos queaindaestãoentrenós,sejadeesoterólogos
(os que estudam o esoterismo) seja de esoteristas (os que também e sobretudo o
praticam), como:
- a Professora Yvette Centeno, desde logo com a sua Tese de Doutoramento
(anos70,naFCSH/UNL)sobreAAlquimiaeoFaustodeGoetheeoutroestudosobrea
simbólica do Conto da Serpente Verde, mas é a publicação de ensaios sobre o
esoterismo de Fernando Pessoa que atingem um público maior, interessado nestes
assuntos:“FernandoPessoaeaFilosofiaHermética”,“FernandoPessoa,Amor,Morte,
Iniciação”, etc.
-onotávelestudiosoPinharandaGomes,comolivro“Introduçãoàsaudade”–
comDalilaPereiradaCosta-,massobretudocom“DiccionáriodeFilosofiaPortuguesa”
e a obra em três volumes “Patrologia lusitana”, Filosofia hebraico- portuguesa” e
“Filosofia arábigo-portuguesa”, refere nomes de grande importância no domínio do
esoterismo
-ManuelJ.GandraquecomeçounaEubioseemSintra,tendo-seradicadomais
tarde em Mafra, cujo Convento estudou sob o ponto de vista simbólico e mítico.
PublicouváriosensaioselivrossobretudosobreoSebastianismoeoQuintoImpérioe
em geral sobre a História Mítica de Portugal – “A face oculta do rosto da Europa”, “
Portugalsobrenatural”,“OprojectotemplárioeoEvangelhoportuguês”,“AAstrologia
em Portugal”, “Diccionário do milénio lusíada”, “Cadernos da Tradição”, etc. Foi o
organizador de uma exposição de materialalquímicodogrupo“FiliationSolazaref”,e
deumaconferênciaeperformancemusicaldemúsicagurdjevianadestegrupo,ambos
em Mafra
Paulo Cardoso, químico e astrólogo, estudou desde há muito os textos
astrológicos e horóscopos da “arca” de Fernando Pessoa, tendo publicado
recentemente um livro sobre o assunto, “Fernando Pessoa: cartas astrológicas”, mas
antesjáhaviapublicadooutrosobreomesmotemaesimultaneamenteoutrosobrea
simbólica da Torre de Belém.
Carlos Calvet, arquitecto e pintor de nomeada, é também especialista da
geometriaedaaritméticasagradas,tendopublicadováriosartigonarevistadeArteda
Gulbenkian que depois reuniu em livro, “Mito-geometria de Portugal”, editado na
Hugin.
Pedro Teixeira da Mota, publicou vários livros com textos esotéricos de
Fernando Pessoa, por ele comentados, dos quais “Rosea Cruz”.
VitorAdrião,tendocomeçadonaEubiosecedoformouaComunidadeTeúrgica
portuguesa, com ensinamentos semelhantes aos da Sociedadelideradamuitotempo
por Olímpio Gonçalves. Publicou muitos e diversos livros sobre a história mítica de
Sintra e sua simbólica e sobre Portugalemgeral.Interessanteoseupreciosolivrinho
sobre os lugares mágicos de Lisboa, “Lisboa insólita secreta”.
PauloLoução,dirigeaEditoraÉsquilo,ondepubliqueiváriosdosmeuslivros–e
é responsável também pela associação “Nova Acrópole”. Mais recentemente criou
aindaaEditorialEranos.Deentreasuaobradestacam-selivrossobreasraízesarcaicas
de Portugalesobreostemplárioseosdescobrimentos:“AAlmasecretadePortugal”,
“OstempláriosnaformaçãodePortugal”,“DostempláriosàNovaDemandadoGraal”,
“Portugal terra de mistérios”, etc.
Jorge de Matos, começou também na sintrense Eubiose e é autor de vários
ensaios e do livro “O pensamento maçónico de Fernando Pessoa”, com prefácio meu.
MariaFláviaMonsarazéadecanbadosestudosastrológicosemPortugal,uma
Astrologiaprincipalmentedeauto-conhecimentopsicol-espiritual,baseadanosescritos
de ….. Publicou diversos livros entre os quais…Urano…, com prefácio meu
JoséMedeiros,ceramistadequalidade,éautordelivrossobreainterpretação
das mãos e sobre o Tarot. Foi mecenas de uma ediçãofac-similada,comprefáciode
Manuel Gandra, do tratado português de Alquimia de Anselmo Caetano Castelo
Branco,ENNOEA(1733).DepoisdeumavisitaaPortugaldaAssociaçãoalquímica“Les
Philosophes de la Nature”, de Jean Dubuis, José Medeiros dedicou-se à Espagíria,
seguindo os seus ensinamentos.
AntóniadeSousateveumpapelequivalentenaspáginasdoDiáriodeNotícias
numa época e com um papel equivalentes à de Vitor Mendanha – anos 80 e 90.
FiamaHassePaisBrandão,destcadaescritoraepoetisapublicounaspáginasda
revista“História”algunstextossobrehistóriamíticaportuguesa,dosquaisdestacoum
sobre a interpretação simbólica e esotérica das Capelas Imperfeitas da Batalha.
Paulo Borges, Professor universitário (FLL), é Presidente da União Budista e
anima o grupo de protecção dos amimais….. É autor de livros importantes sobre
Agostinho da Silva.
LuísCarlosMatos,co-fundador(comJorgeMatos)darevistaQuintoImpérioé
autor de um livro sobre Maçonaria regular cristã.
Luís Resina, escreveu recentemente sobre a Astrologia de Fernando Pessoa e
tinha anteriormente publicado um livro sobre o Tarot, com prefácio meu.
Não podemos elencar aqui todas as sociedades e organizações iniciáticas e
esotéricas em Portugal, mas referindo-nos às principais teremos, para além da
Maçonaria nas suas diversas correntes, as mais antigas: a Sociedade Espírita que
sobreviveuàrepressãoquelhemoveuaDitaduraeaSociedadeTeosóficaqueperdura
até hoje equetantoinfluenciouFernandoPessoa;nelahavia,segundoele,umgrupo
hermético–comumaLojaMartinista-dirigidopeloDr.JoséAntunesquepublicouum
livro A Filosofia hermética. De referir também no contexto teosófico, o Professor da
FLL, Délio Nobre Santos, que foi Bispo de Igreja Gnóstica. Também de destacar na
Sintra dos anos 50 a Ordem Esotérica e Iniciática, de Costa Cabral –cujoespóliofoi
oferecido à Câmara de Sintra.
Já no último quartel do século XX é de referir a SociedadePortuguesade
Eubiose,decorrentedosensinamentosteosóficosdobrasileiroHenriqueJosédeSousa
e que foi dirigida durante muito tempo por Olímpio Gonçalves, um Licenciado em
Filosofia que se dedicou também à Alquimia. Publicava a revista “O Graal” com
diversos artigos esotéricos – por exemplo a simbólica do Terreiro doPaçoedaBaixa
Pombalina - que fizeram escola entre os esoteristas portugueses mais jovens;
lembremos quepassaramporela,entreoutros,ManuelJ.Gandra,VitorAdrião,Jorge
Matos, Luís Carlos Matos e ido paraaSociedadeBrasileiradeeubioso,AlbertoVieira
da Silva.
Relevo também para a Antropososofia (de Rudolf Steiner) e a Associação
Waldorf–comasuapedagogiasingular-,aassociaçãoQuirondeFláviaMonsarazque
temtidoumgrandepapelnadivulgaçãoeensinodaAstrologia,sendobemsecundada
pelasorganizaçõesdePauloCardosoeLuísResina.Apareceuemcomeçosdosanos90
o Projecto Uno, animado pelo psicólogo Pedro Veiguinha que reuniu algumas
tendências esotéricas portuguesas (teosóficas, maçónicas, rosa-cruzes, etc.). O jornal
BiosofiadoCLUC–CentroLusitanmoparaaUnificaçãoCultural,detendênciateosófica
mascomrelevoparaavidaespiritualdePortugal,temtidoumapublicaçãoconstante
ao longo de anos. Já em pleno século XX, a CasadoFaunonaQuintadosLobos,em
Sintra (perto da Regaleira),animadaporAlexandreGabriel,desenvolveuumconjunto
deactividadesligadasaoesoterismo,àsnovasespiritualidades,àsterapiasalternativas
(Conferências, workshops, estágios, etc.). Por seu turno o MIL – Movimento
Internacional Lusófono, dirigido por Renato Epifânio, com referência à figura de
AgostinhodaSilva,tentafazerasínteseentreoPolíticoeoMítico,comarevista“Nova
Águia”. Quanto a editoras, teremos a Ésquilo e a novel Eranos e a Zéfiro
Estasreferênciasnãosãoexaustivas,poisháumconjuntodepequenosgrupos
dasmaisdiversastendências–Wicca,neo-pagãos,Reiki,regressão-quesesituamem
tornoasNovasEspiritualidades,doNewAgeemesmodoEsoterismoTradicionaleque
seria difícil de enumerar, tal como é difícil enumerar umconjuntodepersonalidades
que fazem da Astrologia, do Tarot, das cartas, dos búzios, dos cristais, da bruxaria
afro-americana, do Umbanda e do Candomblé, etc. a sua actividade e modo de vida.
O “Fecho da Abóbada”:
O próprio Poeta-esoterista dá conta, com entusiasmo, deste seu interesse – um
interesseeumavivênciasofridos-,no“LivrodoDesassossego”:“Doestudodametafísica,das
ciências, passei a ocupações do espírito mais violentas para o equilíbrio dos meus nervos.
Gasteiapavoradasnoitesdebruçadosobrevolumesdemísticosedecabalistasquenuncatinha
paciência de ler de todo, de outra maneira que não intermitente trémulo (…). Os ritos e as
razõesdosRosa-Cruz,asimbólica(…)daCabalaedosTemplários(…)–sofridurantetemposa
aproximação de tudo isso. E encheram a febre dos meus dias especulações venenosas, da
razãodemoníacadametafísica–amagia,(…)aalquimia–extraindoumfalsoestímulovitalda
sensaçãodolorosaeprescientedeestarcomoquesempreàbeiradesabero(ouum)mistério
supremo (…)”
EstaimportantefacetadePessoaqueduraquaseasuavidatoda,dejovemadultoaté
àsuamorte,mereceuaatençãodelivrosdeestudiososcomoDalilaPereiradaCosta,António
Quadros e Yvette Centeno e de outros académicos comoTeresaRitaLopes,RobertBréchon,
ManuelaParreiradaSilva,RichardZenith,JeronimoPizarro,StephenDix,etc.quepublicarame
estudaramosdiversostemasquemereceramsucessivamenteaatençãodoPoeta:Espiritismo,
Astrologia, Teosofia, Gnosticismo, Hermetismo, Magia, Alquimia, Cabala, Rosacrucianismo,
Templarismo e Maçonaria, dando também atenção a mitos nacionais com ressonância
esotéricacomooSebastianismoeoQuintoImpério.ParaalémdospoemasoPoetaescreveu
trechos e obras esotéricas, de grande interesse (mesmo que incompletas), como o “Ensaio
sobreaIniciação”,“Átrio”,“Subsolo”eonotável“OCaminhodaSerpente”–“olivroquenãoo
é”…-masospoemasexplicitamenteesotéricos–ondealiteraturasecruzacomoesoterismo-
escritosentre1930(anodavisitadomagoinglêsAleisterCrowleyaLisboa,paraoconhecere
iniciar)e1935(anodasuamorte),como“Oúltimosortilégio”,“NasombradoMonteAbiegno”,
“Erosepsique”--apresentantoemexergueumtrechodo“ritualdograudeMestredoÁtriona
Ordem Templária de Portugal” -, “No túmulo de Christian Rosencreutz”, “Iniciação” e “S. João”.
A TEOSOFIA EM PESSOA
FernandoPessoapassaporváriascorrentesesotéricas,desdeoEspiritismoea
Astrologia – neste domínio particular, recomendamos desde logo os livros de Paulo
CardosoetambémdeLuísResina-masadimensãopropriamente“esotérica”começa
com o seu interesse pelasdoutrinasdarussaHelenaPetrovnaBlavatsky(1831-1891).
Pessoa tevecontactoestreitocomateosofia–ou“teosofismo”,paranãoseconfundircoma
teosofiacristã-deBlavastsky(queeledescobreem1915,com27anos),tendotraduzido,para
português, nesse período, vários livros dessa corrente esotérica - segundo José Galvão (in
FontesImpressasdaObradeFernandoPessoa),osseguintes:oCompêndiodeTeosofia,deC.W.
Leadbeater, os Auxiliares Invisíveis, A Clarividência e Os Ideais da Teosofia , estes de Annie
Besant,eaLuzsobreoCaminho,oCarmaeAVozdoSilêncio deH.P.Blavatsky–editadomais
recentemente na Assírio e Alvim com prefácio meu - cf. Arnaldo Saraiva,FernandoPessoa–
Poeta tradutor de poetas. Ssob o pseudónimo de Fernando Castro, traduziu O Mundo de
Amanhã, Conferências Teosóficas e Introdução ao Yoga, deAnnieBesant,eOsServidoresda
RaçaHumana,deC.W.Leadbeater.Todosesteslivrosforameditadosna“ColecçãoTeosóficae
Esotérica da Livraria Clássica Editora, de Lisboa (cf. prefácio de MurilhoNunesdeAzevedoà
ediçãobrasileiradeAVozdoSilêncio,editadaporCivilizaçãoBrasileira,RiodeJaneiro,1969,p.
27-28)
AteosofiacriadaporHPBem1875(veronossocapítulosobreoesoterismonoséculo
XIX) desempenha em Pessoa um papel de grande importância, pois é ela que - com a sua
concepção de um Tradição Primordial, núcleo comum a todas as tradições religiosas e
iniciáticas-vemsustentar,dealgummodo,oneo-paganismoessencialdePessoa,poistodosos
deuses são iguais quanto à sua dignidade espiritual, visto que têm um tronco comum. Por
outro lado, ao poder ser lida como um sistema ultra-cristão (como ele diz), é ela que
curiosamentevaipermitiraPessoa,apassagemdoestádioneo-pagãoparaoestádiognóstico,
quecomeçaráem1920(utilizandoasdenominaçõesdeAntónioQuadros-cf.ObradeFrnando
Pessoa,Vol III).
Numa carta a Mário de Sá Carneiro, datada de 6 de Dezembro de 1915, escreve o
Poeta,emplenafasedefascíniopeladoutrinablavatskiano:”A(criseintelectual)queapareceu
agora deriva da circunstância de eu ter tomado conhecimento das doutrinas teosóficas (...)
conheço aessênciadessesistema.Abalou-meaumpontoqueeujulgariahojeimpossível(...)
Ocarácterextremamentevastodestareligião-filosofia(...)perturbou-memuito(...)”.Edepois
de ter confessadoque“cousaidêntica”lheacontecera“hámuitotempocomaleituradeum
livroinglêssobre“OsRitoseosMistériosdaRosa-Cruz”, Pessoaafirmaqueestáperturbadoou
mesmoassustado(“hanté”)pela“possibilidadedequeali,naTeosofia,estejaaverdadereal”.
Nessamesmacarta,Pessoaexplicitaarazãodasuaperturbaçãoou“crise”,poisaoconsiderara
Teosofiacomoum“sistemaultracristão-nosentidodeconterosprincípioscristãoselevadosa
umpontoondesefundemnãoseiemquealém-Deus”,elaestariaemcontradiçãocomoseu
“neopaganismoessencial”.Mas,poroutrolado,aoadmitir“todasasreligiões”,aTeosofiateria
“umcarácterinteiramenteparecidocomodopaganismoqueadmitenoseupanteãotodosos
deuses”, o que constituiria “o segundo elemento” da “grave crise de alma” de Pessoa (ibidem).
Decorrentedestaposturaorientalista–hinduístaebudista-queFPrecebedeHPBeda
sua teosofia,é–emnossoentenderolongopoema“OGuardadordeRebanhos”(escritoem
1915), atribuído por ele ao Mestre Caeiro.
Passagens do Guardador de Rebanhos com ressonâncias claramente hindo-budistas
“Nãotenhoambiçõesnemdesejos,…”–o“desapego”hindo-budista,quenãosignifica
indiferença, é um dever, uma via do discípulo, um método iniciático.
“Creionomundocomonummalmequer,/porqueovejo.Masnãopensonele/porque
pensar é não compreender…/ O Mundo não se fez para pensarmos nele (…)/Mas
paranolharmos para ele e estarmos de acordo… - pensar, conceptualizar as coisas é não as
compreender, pois só a percepção directa delas nos dá esse entendimento.
“Pensar em Deus é desobedecer a Deus,/Porque Deus quis que o não
conhecessemos,/Porissosenosnãomostrou…”–comoescrevePessoapordiversasvezes(por
exemplo nopoema Além Deus e no Caminho daSerpente)éprecisoir-se“alémDeus”,istoé
irmos além das concepçõesquetemosdeDeus,quesãolimitadas,estandoDeusmuitomais
do que conceptualizamos.
Gnose e gnosticismo
A Gnose é um movimento religioso e iniciáticodocomeçodanossaera,que
preconizaasalvaçãopeloConhecimento.NãosetratadeumConhecimentointelectual
ou especulativo, mas sim de umConhecimentoespiritualquelibertaráoHomemeo
conduzirá aos planos divinos. Por vezes, utiliza-se (indevidamente) o termo gnóstico
para qualificar toda a corrente esotérica ou oculta, mas na realidade não se pode
aceitar essa denominação para identificar uma corrente hermética ou alquímica - o
Hermetismo e a Gnosesãoduascorrentescontemporâneasmasdistintas,mantendo,
no entanto algumas características comuns, sendo a primeira mais optimista que a
segundajáqueadmiteasalvaçãodomundoatravésdasuaespiritualizaçãoenquanto
que a Gnose é pessimista em relação ao mundo, já que só admite a salvação fora dele.
Fernando Pessoa afirmou o postulado gnóstico da Queda do Homem - Ser
espiritual, caído na Matéria e, portanto, estando nesse estado, dividido, separado,
exilado, afastado da “casa do Pai”, do mundo celestialdeondeproveioenoqualele
era Inteiro, mas para onde deve regressar -, quer em textos, como por exemplo,«O
homem não estava destinado a ser o que é: foi pela Queda quesetornoutal.»(in
TeresaRitaLopes,Pessoaporconhecer,II,op.cit.,p.97).MasPessoaabordoutambém
a temática gnósticaempoemascomoNoTúmulodeChristianRosencreutz:«Q
uando,
despertosdestesono,avida,/Soubermosoquesomos,eoquefoi/essaquedaaté
Corpo,essadescida/AtéàNoitequenosaAlmaobstrui.»(F.Pessoa, op.cit.,Vol.I,p.
1131),masaindadopoemasemdata“Iniciação”maspublicadonarevista“Presença”
nº. 35, em Maio de 1935: “O
corpo é a sombra das vestes/Que encobrem teu ser
profundo”. Clara referência ao tema gnóstico da interioridade divina do homem é
ainda o poema de Pessoa datado de 1932 em que ele refere esse “germe da
divindade”: “A
Presença Real sob o disfarce da minha alma presente sem intento”,
“presençaquepodeserdescobertaereveladacoma“técnicadosintervalos”(divisão
da consciência, por exemplo, mas também técnicas demeditação),comodizoPoeta
(poema também de 1932): “Sou entre mim e mim o intervalo…”.
Além disso, ele declarou, no final da sua vida, numtextoemtomanti-clerical
muitotípicodaépoca,queera«C
ristãognóstico,eportantoopostoatodasasigrejas
organizadasesobretudoàIgrejadeRoma.Fiel,pormotivosquemaisadianteestão
implícitos, à Tradição Secreta do Cristianismo, que tem íntimas relações com a
TradiçãoSecretaemIsrael(aSantaKaballah)ecomaessênciaocultadaMaçonaria»
(in Quadros, op. cit. Vol. III, p. 461). Além disso, como refere Yvette Centeno, «Nos
documentos do espólio (ele) alude muitas vezes à via hermética que através da
chamada Igreja GnósticaétransmitidaaosTemplários(Esp.54-10).Estaé,paraele,a
verdadeira Igreja, e a via hermética, a verdadeira via». Mas esta estudiosa do
esoterismo pessoano acrescenta que «já na documentação publicada em Páginas
Íntimas e de Auto-Interpretação e Sobre Portugal, existem referências à Gnoseeaos
gnósticos» (Y.K. Centeno, Fernando Pessoa e aFilosofiaHermética, p.12),sendoum
exemplo destes textos, o seguinte: «Esta heresia não desapareceu nunca. Opressa,
esmagada exteriormente, essa seita de ocultistas tornou-se secreta, desapareceu da
evidência histórica, masnãodavida.Nãoéimpossívelencontrar,aquieali,evidência
da sua permanência secreta. E essa permanência ofereceaspectosdeconflitocomo
cristianismo oficial e sobretudo com o católico. Apardocristianismooficial,comos
seus vários misticismos e ascetismos e as suas magias várias, nós notamos,
episodicamentevindoàsuperfície,umacorrentequedatasemdúvidadaGnose(isto
é da junção da Cabala judaica com o neoplatonismo) equeoranosaparececomo
aspectodoscavaleirosdeMalta,oudosTemplários,ora,desaparecendo,nostornaa
surgirnosRosa-Cruz,para,finalmente,surgiràplenasuperfícienaMaçonaria(...)».-
aqui,PessoautilizaclaramenteadesignaçãoGnose,querparaaGnoseantigaquerpara
as suas manifestações tardias (gnosticismosdiversos).
Alquimia e Hermetismo
A Alquimia é, como vimos, uma sabedoria tradicional (ciência ou arte sagrada) que
aspira à transmutação dos corpos por meio da sua espiritualização, com a concomitante
corporificação do espírito. Tem uma faceta laboratorial - a histórica - em que sepretendea
transmutação dos metais “imperfeitos” em ouro, por meio do pó transmutatório, e a
elaboração do Elixir da LongaVida,ambosresultantesdaPedraFilosofal,ametasupremada
Obra Alquímica. A Alquimia, mesmo na sua dimensão física, laboratorial, tem, pelas suas
técnicasepeloseusimbolismo,umadimensãosagrada,“espiritual”,queparecedifícilseparar
da sua dimensão “material”. OpsicólogoCarl-GustavJungacentuounoentanto,nasuavasta
obra, a dimensão psíquica e espiritual da alquimia.
ÉmuitoricaareflexãodePessoasobreaAlquimia(dadaaconheceremgrande
parte por Yvette Centeno). A partir dos livros existentes na sua biblioteca, na sua
maioria de origem inglesa (Waite, Mathers) esperar-se-ia uma interpretação
exclusivamente “espiritual” ou “psíquica” da alquimia, aliás de acordo com as
concepções da “Golden Dawn” – e da sua equivalente Cowleiana A.A. criada por
CrowleyemesmodaO.T.O.,“OrdoTempliOrientis”queCrowleychefiouetransfomou
e para a qual a alquimia seria de cariz sexual.
De facto, esta interpretação da alquimia, claramente na perpectiva do
rosacrucianismodaGoldenDawn,existeemPessoa.Porexemplo,aoreferirosquatro
estadosdaGrandeObraalquímica-naqual,segundoele,severifica«atransmutação
do inferior no Superior, sem alteração...»(Esp.54-95),Pessoarefereque:«Osquatro
processos da Obra (são): 1) Putrefacção (...); 2) Branqueamento, a purificaçãodoeu
inferior que se segue à putrefacção (...)branqueamento(que)significaaemergência
doeusuperioreverdadeiro,depoisdeseterafastadopelaputrefacçãooeuinferiore
falso; 3) gradação (...) conhecimento gradual do Eu superior. Esta é a verdadeira
iniciação, a obtenção gradual do conhecimento e da ConversaçãodoSantoAnjoda
Guarda; 4) Rubificação, realização completa.» (Esp. 54A- 56). Reforçando esta
interpretação,elereferenoutrotextoquenaputrefacção,«oiniciadotemquemorrer
para si mesmo, ou, antes, que morrer-se» (Esp. 53B-83). Então, para o Poeta, a
alquimiaé,nestaperpectiva,«a transmutaçãodoprópriohomem»,masaessênciaeo
segredo desta operação realiza-se «por meio do contacto com os símbolos
magicamente carregados» (Esp. 53-13). E em consonância com isto – o “contacto”
íntimocomossímboloseosmitos-,voltemosaofragmentodoespólio53A-25,onde
escrevePessoa:«U
mmitopodenãoserverdade,masserverdadeiro(…)Nisto–em
queummitopodeserVerdade–estáumadaschavesdaAltaM.(agia)A“alquimia”
está nisto» (in P. Teixeira da Mota,Rósea Cruz,opcit., p. 181).
Ora, este último parágrafo – que refere o “contacto com os símbolos
magicamente carregados” e, com os mitos, quer sejamverdadeiros,ouVerdade-vai
estabeleceraponteparaainterpretação,porpartedePessoa,daalquimialaboratorial
-queeleconhecia,pelomenos,atravésdoTratadoportuguêsdoséculoXVIII,Ennoea,
ouaAplicaçãodoEntendimentosobreaPedraFilosofal,deAnselmoCaetanodeAbreu
Munhoz e Castelo Branco, livro que pertencia à sua biblioteca. Yvette Centeno -que
patrocinoueapresentouareediçãodo“Ennoea”naGulbenkian,em1987,anoemque
sai, em Mafra, uma outra reedição, com prefácio de Manuel Gandra - é responsável
pela publicação (entre muitas outras valiosas peças) de um interessantíssimo
fragmento do espólio pessoano, justificativo da alquimia laboratorial: «os elementos
que compõem a matéria têm um outro sentido; existem não só como matéria, mas
também como símbolo. Há, por exemplo um ferro-matéria; há porém, e ao mesmo
tempo, e o mesmo ferro, um ferro-símbolo. Cada elemento simboliza determinada
linha de força super-material e pode, portanto,serrealizadasobreeleumaoperação
ou acção, que o atinja e o altere, não só no que elemento, mas também no que
simbolo (...)assimoalchimico,aooperar,materialmentequantoaosprocessos,mas
transcendentementequantoàsoperações,sobreamatéria,visatransformaroquea
matéria symboliza, e a dominar o que a matéria symboliza para fins que não são
materiais.» (Esp. 54-84). René Alleau, no seu livro Aspects de l’Alchimie Traditionelle
(1953),afirmarámaistarde-emnotávelacordocomatesepessoana-queaalquimia,
ao constatar que tudo o que é observável é simbólico, afirma que tudo o que é
simbólico é observável.
Alguns textos de Pessoa, parecem estar de acordo com a afirmação dos
rosacrucianosdequeaAlquimiaespiritualeaalquimiamaterialsãorespectivamente,
oErgoneoParergon.Porexemplo,aqueleexcertoquetemavercomasproximidades
divina e satânica das duas alquimias:«a alquimia material é satânica, a espiritual é
divina».Nestecontexto,cite-seÁlvarodeCamposque,naOdeMarítima,iráevocaro
«Deus dum culto ao contrário, /Um Deus monstruoso e satânico, um Deus dum
panteísmodesangue»(inÁlvarodeCampos-Livrodeversos, introdução,transcrição,
organizaçãoenotasdeTeresaRitaLopes,Lisboa,EditorialEstampa,1993,p.116).Mas
ao mesmo tempo Pessoa escreve que «Tudo é um. O satânico é tamsómente a
materialização do divino» (Esp. 54B-19). Esta perspectica global e integradora dos
diversos planos da realidade - bem característica da alquimia - está bem clara no
poema queDalilaPereiradaCostacitanoseulivropioneiro:«” SursumCorda”Erguei
as almas! Toda a matéria é espírito,/ Porque Matéria e Espírito são apenas nomes
confusos/ Dados à grande sombra que ensopa o Exterior em sonho/ E funde em
NoiteeMistériooUniversoexcessivo!»,comooestánotextoanteriormentecitadoe
queatribuicomo«verdadeiracriaçãodaPedraFilosofal»,o«fazerdentrodesimesmo
a união os dois princípios», o material e o espiritual, o masculino e o feminino, o
racional e o emocional, etc., etc.
Magia, Cabala e vias tântricas
São diversos os livros sobre estes assuntos, que Pessoa possuía na sua
biblioteca(paraalémdosdeA.Crowley,comoveremosadiante)dosquaiscitaremos,a
título de exemplo, os seguintes: (The) Kabbalah unveiled, de Knorr von Rosenroth,
traduzido por Mac Gregor Mathers (um dos cisionistas da “Golden Dawn”, contra o
poeta e Prémio Nobel, W.Yeats, tendo sido acompanhado na sua rebelião por A.
Crowley), Magic white and blak, de Franz Hartman (teósofo e rosacruciano alemão,
fundador em 1888, da “Rosa-Cruz Esotérica”) e Le Kama soutra, de Vatsyayana (o
popular tratado de divulgação de técnicas tântricas).
São de referir as reflexões pessoanas sobre a Magia – sobretudo através dos
textos publicados por Yvette Centeno (in Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética),
parao“Ensaiosobreainiciação”,dosquaisdestacámososeguinte:OMisticismobusca
transcenderointelecto(porintuição).AMagiaatranscenderointelectopelopoder;a
Gnose a transcenderointelectoporumintelectosuperiormas,continuaPessoa,para
transcender uma coisa devidamente, é preciso primeiro passar por essa coisa (Esp.
54A-51). No mesmo “Essay on the Initiation”, podemos ler Há três tipos distintos de
iniciação –simbólicaouexterior,intelectual(exterioràinterior)evital(interior)….Nas
iniciações vitais, que reforçam a emoção e, portanto, conduzem à Alquimia como
realização, o candidato vive aquilo que sente e sabe(Esp. 54A – 52).
Temos aqui que Fernando PessoaconsideraumaMagia“vital”,quepassapela
sensação,ealémdisso,reconheceque“parasetranscenderumacoisadevidamente,é
preciso primeiro passar por essa coisa” – estes são princípios básicos do Tantrismo
(oriental ou ocidental, gnóstico ou hermético). No entanto, no mesmo Ensaio, mas
noutrofragmento,oPoetaescreve:Aprimeiratentaçãoaservencida,paraquesejam
evitadososErrosdoCaminho,éoMundo.Asegundatentaçãoaservencida,paraque
sejamevitadososErrosdaPousadaéaCarne.Aterceiratentaçãoaservencida,para
que sejamevitadososErrosdaCripta,éoDiabo.Astentaçõessãocomunsatodosos
caminhos,masomísticoestámaissujeitoàtentaçãodoMundo,omágicoàtentação
da Carne, o gnóstico à tentação do Diabo. (Esp.54A –62)–odizer-sequeomágico
estámaissujeitoàtentaçãodacarne,implicaseguramentequeeleutilizepelomenos
um tantrismo da mão direita. E, no mesmo fragmento – revelando um bom
conhecimentodahistóriadeumadaspersonalidadesfundadorasda“GoldenDawn”–
referePessoa:Dificilmentehaveráummágicoquenãosucumbaacoisasquerevelama
fraqueza da vontade. O fimterríveldeMacGregorMathersembrutecidopeloálcoolé
um caso pungente.ElepoderiatalvezcontrolarosdiabosdeAbremalin;nãofoicapaz
de controlar os seus (- fossem eles a luxúria, a bebida ou a desonestidade).
Portanto, Fernando Pessoa reconhece a Carne como uma “tentação” a ser
“vencida” pelo Mago (a “carne” está perto do mago…), mas – segundo ele próprio
afirma no mesmo Essay - não a evitando, no entanto, mas “passando por ela”,
“vencendo-a”,demodoatranscendê-la,pois,comoelediz,«quemsabe,porexemplo,
o significadomísticoetranscendentedacópula?(…)istoémaissérioquequantode
sério ́há na vidaaparente»(HermeticPhilosopher–Esp.2719M3(dt),inP.Teixeira
da Mora, op. cit., p. 30). Ao mesmo tempo reflecte criticamente(equemsabecom
quedor)sobreocaminhodeMathersquenãoconseguiu“controlarosseusdemónios
… a luxúria, a bebida…”.
No entanto, numa “página solta, sem data”, citada por António Quadros (“A
procuradaverdadeoculta”),revelaumareflexãocomplementar–umesclarecimentoa
posteriore ou a priori, não sabemos -aestacompreensãodeumaMagiaintegradora
doplanomaterial:Tudoéum.Osatânicoétão-somenteamaterializaçãododivino.A
magia éumasó;amagianegranãoémaisqueamagiabrancafeitamaterialmente.
(Ocultofálico,quandoentendidocomosímbolo,édivino;quandotomadoliteralmente
é orgíaco, e portanto satânico.) Se conhecermos os processos da magia negra e os
interpretarmos como símbolo, chegaremos ao conhecimento dos processos damagia
branca.
Deus é um espírito, diz a Bíblia: e o divino é (em relação a este mundo)
espiritual. O Diabo é a matéria (corpo) e a Trindade Satânica: o Mundo, aCarneeo
Diabo. ODiabo(Saturno)éaLimitação..(Note-sequenabibliotecadePessoaexistia
um livro deFranzHartman,intutiladoMagic,whiteandblack).Então,paraPessoa,a
Magia“material”,satânica,éapenasamaterializaçãodaMagiadivina.Elaé“satânica”,
apenas porque material.
Escreveu Pessoa,numdosfragmentosparaoEnsaiosobreaIniciação,que«O
Misticismo busca transcender o intelecto (por intuição). A Magia a transcender o
intelectopelopoder;aGnose,atranscenderointelectoporumintelectosuperior.»(in
Y.K.Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, op. cit., p.59). Quem se
distinguiu, na época de Pessoa, pelo poder mágico que possuía e desenvolvia, foi
Aleister Crowley-oMagoTherion,a“Besta666”,comosedenominavaasipróprio -
que, vindo da “Golden Dawn” (para onde entrou em 1898), fundou a “Astrum
Argentum” (ou “Stella Matutina”) em 1903 e foiomáximoresponsávelpela“O.T.O.-
OrdoTempliOrientis”,organizaçãopseudo-templária(criadaporCarlKellnerem1901)
que, na realidade praticava uma magia sexual (particularmente desenvolvida por
Theodor Reuss e depois por A. Crowley).
PessoaconheceuCrowley,atravésdasuaobra,tendotraduzidooseupoemaO
HinoaPanecitadováriasvezesolemacrowleyiano«Fazoquequizeres,éaúnicaLei»
(Esp. 54 A -38) - o que olevouadissertar,apropósitoecommaiorprofundidadedo
queoMago:«Descobreaquiloqueés;descobreoqueaquiloqueésdeseja;fazoque
desejas enquanto aquilo que és» (ibidem, publicado por Y.K. Centeno). Além disso,
Crowley decidiu vir a Lisboa conhecê-lo pessoalmente, em 1930, acompanhado de
(uma das suas várias) Mulher Escarlate, a sua parceira tântrica, na época, Hanni
Jaegger. Quem descreve todo este enredo à voltadavisitadoMagoaLisboa,éVitor
BelémnasuaobraOMistériodaBocadoInferno-oencontroentreopoetaFernando
Pessoa e o Mago Aleister Crowley (publicada pela Casa Fernando Pessoa,emLisboa,
em 1995) onde faz uma síntese das informações disponíveis até ao momento.
Defacto,terásidoumacorrecçãodohoróscopodeCrowley,feitaporPessoaea
ele comunicada por carta, que parece ter motivado a curiosidade do Mago de
conhecer o poeta-astrólogo(talveztambém,uma“mensagem”-aMensagem?- que
Crowley refere numadassuascartasaPessoa-inVitorBelem,op.cit.,p.19).Crowley
esteveemLisboa,presumívelmente23dias-de2a25deSetembrode1930-durante
os quais se encontra com Pessoa, eventualmente também com o poeta Raul Leal,
talveztambémcomAugustoFerreiraGomes,jornalista,amigoecompanheirodopoeta
nomundodoocultismo,ecomum“amigo”queCrowley(ouPessoa)tinhaemSintra.
Qualseráaidentidadedessa“amigo”queelepareceteridovisitarváriasvezesaSintra
(cf.A.Quadros,ObradeFernandoPessoa,Vol.II,p.1294eVitorBelém,OMistérioda
Boca do Inferno, op. cit.,pp.21,26e48)?TeráeleavercomaQuintadaRegaleirae
com o seu proprietário (de 1920 a 1945), Pedro Carvalho Monteiro,filhodeAntónio
Augusto Carvalho Monteiro? E quando é dito que Crowley foiaSintra“jogarxadrez”
issonãoteráavercomalgumacerimóniarealizadano“xadrezdochãoritual”dacripta
da Capela (templária) da Regaleira, denominação que Pessoa usa num seu poema
posterior a 30 e referente a uma cerimónia rtitual?
“Oscila o incensório antigo/Em fendas e ouro ornamental.
Sem atenção, absorto sigo/Os passos lentos do ritual.
Mas são os braços invisíveis/E são os cantos que não são/
E os incensórios de outros níveis/Que vê e ouve o coração.
Ah, sempre que o ritual acerta/Seus passos e seus ritmos bem,
O ritual que não há desperta E a alma é o que é, não o que tem.
Oscila o incensório visto,/Ouvidos cantos stão no ar,/
Mas o ritual a que eu assisto/É um ritual de relembrar.
No grande Templo antenatal,/ Antes da vida e alma e Deus…
E o xadrez do chão ritual/É o que é hoje a terra e os céus…
(poema de F.P. datado de 1932)
De qualquer forma, o acontecimento mais mediatizado (em Portugal, em
Inglaterra e em França) dessa visita, foi o desaparecimento do Mago, ocorrido
simultaneamente com uma simulação dosuicídiodeCrowleynaBocadoInferno,em
Cascais e no qual parecem ter desempenhado um papel de alguma cumplicidade,
FernandoPessoaeAugustoFerreiraGomes-oqual,“poracaso”,encontraumbilhete
deCrowleydirigidoàmulherescarlate,nolocaldosupostosuicídio:«Nãopossoviver
semti.Aoutra“BocadoInferno”apanhar-me-à-nãoserátãoquentecomoatua»(in
Vitor Belem, O Mistério daBocadoInferno,op.cit.,p.26)eque,tambémpareceter
“preparado” a notícia sobre este caso, noNotíciasIlustrado, de 5 de Outubro de 1930.
Penso, de facto, que a dimensão mágica em Pessoa assenta, mais
estruturadamente, emreflexõesbaseadasnoesquemainiciáticoda“GoldenDawn”,e
também, em nossa opinião, na versão “crowleyana” do “A. A. - Argenteum Astrum”,
atingindo a sua máxima dimensão nesse «Livro que não o é», «O Caminho da S.
(Serpente)»(inYvetteCenteno,FernandoPessoaeaFilosofiaHermética,op.cit,p.27),
que estudaremos adiante.
Durante a sua vinda a Portugal, em Setembro de 1930 (Crowley e a sua
companheirachegaramaPortugala2dessemês),paraalémdedoisalmoçosa7ea8,
comaBesta666easuaMulherEscarlate,edamuitoprováveliniciaçãoa9–comRaul
Leal - Pessoa teria tido, segundo as suas declarações à Polícia, encontros mais
frequentes com Crowley, a partir de 17 de Setembro,dataemqueHanniJaegerterá
fugido paraaAlemanha.Sobretudo,participou–juntamentecomoseucompanheiro
iniciático Ferreira Gomes, que aliás tem palavras muito elogiosas para Crowley na
notíciado“NotíciasIlustrado”quesaiem5deOutubrodomesmoano-nasimulação
do suicídio de Crowley em relação ao qual é interessante referir, para além dos
detalhesdahistóriajábemconhecida,oqueCrowleyescreveunoseudiário:Sept21.I
decide to do a suicide stunt to annoy Hanni. Arrange details with Pessoa (21 de
Setembro. Decidi fazer um suicídio acrobático para aborrecer a Hanni. Arranjar
detalhescomPessoa).EoseubiógrafoJohnSymondscomenta,apropósito:Fernando
Pessoa did his partofthejobwell(FernandoPessoafezbemasuapartedotabalho).
Tratou-se, na verdade de uma cumplicidade solidária que se expressa no triângulo
Crowley-Pessoa-Gomes.
É importante referirquePessoa,tinhanasuaBibliotecatrêslivrosdeCrowley,
não só o The Confessions of Aleister Crowley (As Confissões de Aleister Crowley) –
comoquasetodosospessoanosindicamequejá,porsisórevelariauminteressepela
vida epelaobradoMagoCrowley–mastambémoutrosdois–queninguémpôsem
evidência, até hoje - que vêm, no entanto, mencionados na mesma lista de livros
pertencentes à Biblioteca pessoal de Fernando Pessoa e que são:
-Magickintheoryandpractice,beingpartIIIofBook4(MagiaemTeoriaeem
Prática, sendo a prte III do Livro 4), de Master Therion, um pseudónimo
iniciáticodeA.Crowley,numaediçãodeParis(Lecram)quesópodetersidooua
de 1929 ou a de 1930 – referido com a cota 1-151 e incluido na rubrica
“Filosofia”;
- 777: Vel Prolegomena symbolica ad systemam sceptico-mysticae viae
explicandae, fundamentum hieroglyphicum sanctissimorum scientiae
summae, London: TheWalterScottPublishingCo.,1910–referidocomacota
2-1 e incluido na rubrica “Religião, Teologia”.
Tratam-se de dois livros importantes da doutrina e da prática “telemita” –
denominação que Crowley vai buscar à liberal Abadia de Thelema do Gargantua e
Pantagruel de Rabelais -– revelando um interesse ainda mais profundo, da parte de
Pessoa,quantomaisnãofosseparaseinformarmaisdetalhadamentesobreotemaem
questão - pois o primeiro aborda os aspectos práticos da Magia do “novo aeon” –
incluindo a sexual, “vermelha”, no seu capítulo XX, On the Eucharist, on the Art of
Alchemy (Sobre a Eucaristia, sobre a Arte da Alquimia) -, e o segundo é uma
exposiçãodadoutrinacabalísticadeCrowley,adaptadaapartirdaqueeleaprendeuna
Golden Dawn - e onde estão referidas, sob a forma de um “diccionário mágico e
filosófico” as diversas correspondências simbólicas (entre as quais as sefiróticas) e
iniciáticas dos graus destaorganizaçãorosacruciana,queCrowleytranspôsparaasua
Ordem,criadaem1907,aA:.A:.(ArgenteumAstrum,EstreladePrata,eminglês,Silver
Star, S.S.).
E pois inquestionável o interesse de Pessoa por Crowley, primeiro porque
adquiriu três livros de Crowley (um dos quais, pelo menos, antes de o conhecer, o
Confessions), em segundo lugar porque resolveu corigir o seu horóscopo dando-lhe
conta do facto (através da Mandrake Press, editora de Confessions) e depois porque
começou a corresponder-se com ele – they had been corresponding for a year (e les
correponderam-se durante um ano, escreve J. Symonds) -, a partir do momento em
que Crowley lhe respondeu a agradecer-lhe. Além disso para além da posterior (em
1931)traduçãoepublicaçãonarevistaPresença,dopoemacrowleianoHynoaPan,há
outraanotaçãonoDiáriodeCrowley,referenteaPessoa–trazidaapúblicoporMarco
Pasi e que Vitor Belém cita no seu livro – a qual nos deixa uma pistasériaquantoà
verdadeiranaturezadaviagemdoMestreTherionaPortugal:…Iwasobligedtoleave
immediatelyforLisboainordertoestablishthereaheadquarterfortheOrderunder
Don FernandoPessoa.(E ufuiobrigadoapartirimediatamenteparaLisboaafimde
estabelecer uma delegação da Ordem sob a responsabilidade de Dom Fernando
Pessoa). EstaOrdemseroa,segundoMarcoPasiseriaaOrdoTempliOrientis-como
que concordo, face às últimas descobertas dos pessoanos que estudam a “arca de
Pessoa”, como adiante veremos, a “OrdemdosTempláriosOrientais”dequeCrowley
foioresponsáveldasecçãoinglesa,aMysticaMaximaMysteria,tendosidoodirigente
máximo da O.T.O., a seguir à morte do fundador Theodor Reuss, em 1923.
DesteprojectodeCrowleyreferenteaPessoadecorreráadesignaçãocomque
aqueleodistingue,istoé,de“CaroFrater”–eaquecorrespondecom“CaroFrater”e
mesmo “Carissimo Frater” – acompanhada damáxima“telemita”,Dowhatthouwilt
shall be the whole of the Law(Fazoquequeres,serátodaaLei)eLoveistheLaw,
Love under the Will (O Amor é a Lei, Amor sob a Vontade)?. Veremos que essa
fraternidade que entre ambos cedo se estabeleceu, vai assumir mais tarde, uma
dimensãoiniciáticaformalquando,tudooindica,PessoaaceitasermembrodaA.:A.:
(vde circular aos membros,napossedoPoeta)emesmomuitoprovavelmenteaceita
ser iniciado na OTO por Crowley para cumprir oprojectoconfessadoporeste–mas,
mesmo após uma eventual iniciação, parece não ter tido grande realização posterior.
A A:.A:. foi fundada em 1907 por Crowley e George Cecil Jones. Baseada no
clássicosistemadegrausrosacrucianodaGoldenDawn,aA:.A:.requerequeoMágico
atinja realmente o stados de consciência e poderes contidos em cada um dos dez
Sefirots, i.e. o Mágico só é um Adeptus Minor quando alcançou realmente o
Conhecimento e a Conversação com oSantoAnjodaGuarda–expressãodequefala
Pessoa várias vezes nosseustextosdoespólio.Note-sequeaA:.A:.nãoéumsistema
emLoja,sendointeiramenediscreta.Éumaordemdeteste,nãoumordemdeensino.
O AspirantesóconheceoficialmenteumapessoanaOrdem,aquelheésuasuperior.
Cada Mágico é,durante a maior parte o tempo, deixado sózinho como o seu trabalho.
Esta hipótese A:.A:., permitiria o conhecimento(tambémbebidono777,p.e.)
que Pessoa tinha da estrutura iniciática da Golden Dawn - e sobre a qualrefleteem
muitosdosseustextos–queaOrdemdeCrowleyretomaapenascomoacrescentodo
grau de “Probacionista” 0º = 0º - e do seu profundo simbolismo iniciático e mágico
relacionadocomcadaumdosSefirothdaÁrvoredaVidaCabalística(apartirdebaixoe
ascendendo):
1ª. Ordem, exterior, da Golden Dawn (que nela era denominadaStella Matutina):
1º = 10º Neophyte; 2º = 9º Zelator; 3º = 8º Practicus; 4º = 7º
Philosophus
2ª. Ordem, interior, denominadaRosae Rubeae et AureaeCrucis(na G.D.):
5º = 6º Adeptus Minor; 6º = 5º Adeptus Major ; 7º = 4º Adeptus Exemptus
3ª. Ordem, suprema (denominada de Aurora Aurea, na G.D. e Argenteum Astrum
(Silver Star,naA:.A:.):
8º = 3º Magister Templi; 9º = 2º Magus; 10º = 1º Ipsissimus.
Note-se, como exemplo desta exigência de interiorização, ou vivênciaprática,
na A:.A:., que o grau de Neófito exigia a “a quisição do perfeito controle do plano
astral”, o de Zelator, o “e
studo da fórmula da Rosa-Cruz”, odePrático,oestudoda
Cabala, para além do já citado exemplo do Adepto Menor, com o “C
onhecimento e
Conversação com o Santo Anjo da Guarda” – temas,repito,sobreosquaisFernando
Pessoareflectiuedissertounosseustextos-,equeasviasespecificamentesexuaisda
“versão Crowley” só começavam no grau de Adepto Exempto, em que se poderia
tornar num “Irmão no Caminho da Mão Esquerda”.
E temos de concordar com Marco Pasi, pois presentemente - face às
descobertas maisrecentesdosestudiososda“arcadePessoa”-parececadavezmais
possívelquetivessesidorealizadaaintençãodeCrowley,istoé,paraalémdainiciação
naAA,atransmissãoaPessoadealgunsrituaiserespectivosgrausdaO.T.O.–também
governada por Crowley -,deumamaneiraeventualmentesimplificada,masquetudo
indica terá tido tido lugar, ritualmente, em 9 de Setembro na casa de Raul Leal -
segundoafirmaStephenDixnocapítuloqueescreveparaaobra“PessoaGuardadorde
papéis”,cooordenadapeloseucolegaJeronimoPizarro.RecordemosqueestaOrdemé
constituida por um sistema de graus maçónicos (sobretudo do Rito EscoçêsAntigoe
Aceite)encimadosporgrausdemagiasexual(tantonosrituaisdeReusscomonosde
Crowley,emboraoprimeironãotenhautilizadoahomosexualidade,contrariamentea
Crowley). Eis a estrutura dos graus da OTO:
0º Minerval; Iº Man; IIº Magician; IIIº Perfect Magician; IVº Holy Royal Arch
(correspondendo os graus 1, 2, 3 e 4, aos três primeiros graus da Maçonaria azul,
acrescidos do grau de Maçon do Royal Arch –quePessoadenominavadeSacroReal
Arco– correspondendo também à Loja de Perfeição –4º - 14º - do R.E.A.A.)
Vº Soberano Príncipe Rosa-Cruz (18º); VIº Cavaleiro Kadosh (Templário) 30º;
VIIº Soberano Grande Inspector Geral (33º); VIIIº Perfeito Pontífice dos
Illuminati;
IXº Iniciado no Santuário da Gnose; XºRex SummusSanctissimos.
Édenotar,emprimeirolugar,quePessoa,numdosseustextossobreainiciação
maçónica e a progressão através dos seus altos graus, refere uma parte importante
desta estrutura da O.T.O. quando diz: «A FMtemessencialmente,ou3pontos,ou5
pontos–3seconsiderarmosos3temposessenciais(Mestre,RealArco,eRosaCruz)
–5seincluirmososdoisprimeirosgrausquesãonecessáriosmassópreparatórios»,
ficandoaquidefora(noquedizrespeitoàcomponentemaçónica)ograudeCavaleiro
Templário (6º. Na OTO, 3º., no REAA). É de referir que a magia sexual da O.T.O.
(presente a partir do IXº grau) - incluiaumtipodeespermofagia,particularmentena
“Santa Missa Gnóstica” – eles próprios se denominavam de “espermo-gnósticos”,
admitindocomoofaziamalgunsdosgnósticosantigos,queoespermaeraoveículodo
Logos (cf. o Logos spermatikos) - e que Crowley introduziu um grau XIº “emvários
sistemas da O.T.O”, do qual existe uma versão “lunar” (usando sangue menstrual) e
outra“mercurial”(homosexual).Jánoquedizrespeitoàsexualidademágicaproposta
e realizada por Crowley é de salientar que ela incluía, para além de práticas
homoeróticas, práticas auto-eróticas e que o onanismo, esse sim (tal como a
homossexualidade,pelomenosempotênciaepacialmente),poderiaestaemsintonia
comomundosexualdoPoeta-«ésumhomemquesemasturbaequesonhacomas
mulheres à maneira dos masturbadores», Fernando Pessoa, Escritos autobiográficos,
automáticos e de reflexão pessoal, editados por RichardZenith, p. 227.
Portanto, sendo possível ter havido uma transmissão de Mestre (Crowley) a
Discípulo(Pessoa)pelomenosdosgrausmaçónicosdaO.T.O.,incluindoodeArcoReal,
derosa-CruzedeCavaleiroTemplário,ouCavaleiroKadosh,semexcluirumaeventual
transmissãodemagiasexual,queeraapenasdispensadaaostitularesdosVIIº,IXºeXº
graus daO.T.O. (e ao grau 7º= 4º daA:.A:., comovimos).
VamosagoraobservaroquepassoudoladodePessoa,afimdedescortinarmos
alguma zona comum entre ambos. Quanto a saber se a doutrina “telemita” terá
eventualmente influenciado Pessoa, é importante estudar os textos esotéricos de
Pessoa,tentandoencontrarnelesreflexosdasteoriasepráticasdeCrowley–apesarde
muitos deles não se encontrarem datados, o que por vezes dificultaaelaboraçãode
uma sequência evolutiva noseupensamento.YvetteCentenoescreveu:Nabiblioteca
deFernandoPessoa,encontram-seAsConfissõesdomagoinglêsAleisterCrowley,por
quem o poeta se interessou ao pontodetrocarcorrespondênciacomele,lhetraduzir
umlongopoemamágico,oHinoaPã,deescreveroutros,comooùltimoSortilégio,de
nítida marca ritual e sob sua influência, tudo isto culmina no encontro lisboeta e na
farsa do desaparecimento do mago na Boca do Inferno, a que o nosso poeta deu
também cobertura. Por intermédio de Crowley e da Ordem rosicrucista da Golden
Dawn, aqueestepertenceu,juntamentecomS.L.MacGregorMathers(atraduçãoda
Kaballa de Knorr von Rosenroth encontra-senabibliotecadePessoa),seabreaporta
daaltamagiaparaPessoa.(paranós,aGoldenDawnaqueY.CentenoaludeéaA:.A:.,
como já referimos).
Parasistematizarmos(emboradeummodonãoexaustivo)possíveisinfluências
de Crowley sobre os textos ensaísticos de Pessoa, iremos agrupá-los em três classes:
a) - textos influenciados pela estrutura em graus e pelo conteudo iniciático,
cabalístico a mágico, da Golden Dawn (provavelmente veiculados por
Crowley, via A:.A:.) –são vários e referem à exaustão o gaus da G.D./A.A.:
Adeptus Major, Adeptus Exemptus, Philosophus, etc., etc. ;
b)–textosquerevelamainfluênciadolema“telemita”,“Fazoquequeresessa
éaúnicaLei”,“OAmoréaLei,oAmorsobaVontade”;refira-se,desdejáque
Vitor Belém foi o primeiro a identificar o lema do Livro da Lei, num texto
pessoano: A principal regra da Ordem Astrum Argentinum era“Dowhatthou
wilt shall be the whole of the Law”, máxima que está na origem de uma das
considerações esotéricas de Fernando Pessoa;
DetodosostextosdePessoasobreasviasesotéricasqueestudou,sentiu,ou
viveu, pelo menos interiormente, o conjunto intitulado O Caminho da Serpente– o
Livro que o não é - é aquele onde o Poeta se eleva a uma altura espiritual ímpar,
filosóficaeinciática,conduzindo,segundoelepróprioàAltaMagia,àAltaAlquimia e
à Identidade su prema, e que faz adivinhar não ter sido apenas fruto de uma reflexão
intelectual distanciada, mas antes constituírem testemunhos de etapas vividas
interiormente , onde o Poeta/Serpente deixou a “pele”, sentida e intensamente.
Claramente influenciado por Crowley, mas transcendendo este,estaviaéultrapassada
em Pessoa nos últimos anos da sua vida por uma perspectiva cristã gnóstica.
Para compreendermos correctamente este percurso serpentino é importante
vermosoesboçoquedeletraçouFernandoPessoa,numdocumentodoespólio,54A–
4, que Lima de Freitas divulgou pela primeira vez, incluindo-o no seu importante
trabalho Fernando Pessoa e o paradigma hermético, publicado em 1991 na obra
colectiva Fernando Pessoa e a Europa do século XX e qual mostramos nesta edição
(juntamente com outro diagrama, com o qual eu pretendo explicitar o de Pessoa). O
diagrama contem como estrutura principal um losango, tendo inscritastrêssegmentos
de recta horizontais que oseccionamemtrêspartes–dandoquatroníveisdeleiturao
literal,oalegórico(eritual),omágico(‘)eoanagógico-,asquaisjuntamentecomo
segmento de recta vertical que une os dois vértices, superior e inferior, determinam
segundo Pessoa, os seguintes 11 pontos que a Serpente irá percorrer, a saber (ver
documento do espólio):
1 –Instinto; 2 –Desejo (Ânsia); 3 –Inteligência; 4 –Arte (… Ciência);
5 –Magia; 6 –Imaginação; 7 –Alquimia; 8 –Magna Magia;
9 –Intuição; 10 –Alta Alquimia; 11 –Identidade(1+1, 10+1).
Escutemos Pessoa – seguindo o texto estabelecido e organizado por Ivette
Centeno(inFernandoPessoaeaFilosofiaHermética,pp.27-35)-nadescriçãodesse
percurso fantástico que tudo atravessa e engloba e que convoca, provocando («É
preciso,quandoseéSerpente,passaremSatan,parachegaraDeus»-Esp.54A-1),
osquenãoreceiam,querosabismos,quer,muitomenos,asalturas,pois«ASerpente,
retida pela Vesica…No vértice nada a retem…» (ibid.). - Dizia Lima de Freitas que o
conhecimento da Vesica Piscis era determinante para o conhecimento do segredo da
construção sagrada; essa geometria sagrada tem a ver também com o conhecimento das
“alquimias internas”, Arcano Arcanorum da Iniciação – ver as obras do Mestre (este artigo
sobre O Caminho da Serpente, oslivros515-olugardoespelho,Hugin,AlmadaeoNúmero,
Soctip, etc.e o painel de azulejos da gare do Rossio, onde está representado Pessoa e o
CaminhodaSerpente…).Olhemos,pois,odiagramadePessoa–emalgunsaspectosmais
eloquente que seus textos correspondentes - , para melhor nos orientarmos nesse
“caminho que não é nenhum”: «A Serpente coleante (…) liga os contrários
verdadeiros (…) ela segue um caminho quepassaportodosenãoénenhum.Ela
parte,comoocaminhodireitoeoesquerdo,doInstintoparaDeus,masnãosofrea
quebra onde os triângulos se unem (…). Nem ascende sem quebra, como o
caminhomédio,doInstintoaDeus.Conhecendoqueháoutroscaminhos,quenão
o médio, ela reconhece-os, pois se desvia do médio, e repudia-os, pois não segue
nenhumdeles.Aosairdovérticeinstintivo,aosairparaovérticedivino,elaroçaa
curvaproduzidadavesicaenvolvente,eassimmostraquesabedela;masroça-ae
passa-a,enãosegueasuacurva(…).Elanãoconheceosmistériosmasosenvolve,
desvia-se dos caminhos e ds iniciações; deixa a ciência por onde passa; nega a
magia que atravessa; e quando chega a Deus não para.»(Esp. 54 A – 9).
A MAÇONARIA EM PESSOA
No entanto, repetimos, e apesar desta visão particular da Maçonaria, Pessoa
defende toda a Maçonaria com respeito pelos outrosritos,istoé,defendea“Ordem
Maçónica” (todos os ritos e todas as Obediências de todos ospaíses),poiscomoele
diz: «Conquanto, porém, a Maçonaria esteja assim materialmente dividida, pode
considerar-se como unida espiritualmente.Oespíritodosrituais,esobretudoodos
Graus Simbólicos (nos quais, e sobretudo no Grau de Mestre, está já, para quem
saibaverousentir,aMaçonariainteira),éomesmoemtodaaparte(…)quemtiveas
chaves herméticas, em qualquer forma deumritualencontrarásobmaisoumenos
véus, as mesmasfechaduras.Resultadestacomunidadedeespíritoprofundo,deste
íntimo e secreto laço fraternal, que ninguém quebrou nempodequebrar,queuma
Obediência, ainda que tenha poucas ou nenhumas relações com outra, não vê
todavia com indiferença o ser esta atacada por profanos».
EstaperspectivaenglobantedetodaaMaçonaria–independentementedasua
perspectivaparticularqueolevaaprivilegiarcertosritos,grauseOrdensmaçónicas–
leva-o ainda – para além do fundo comum da iniciação maçónica os três primeiros
graus,queelesalienta–apôremevidênciaosgrandestemasdaÉticamaçónicaedos
grande valores queaOrdem,emgeral,proclamaparaasociedade.Assim,nomesmo
artigo do Diário de Lisboa, ele escreve a propósito da ausência de uma doutrina
maçónica:«…t odaaMaçonariagira,porém,emtornodeumasóideia–atolerância;
istoé,onãoimporaalguémdogmanenhum,deixando-opensarcomoentender»,o
que acarreta uma necessária defesa da Liberdade como estando intimamente
associadaàvivênciadaTolerância–quenãoéindiferença,comoPssoabemsalienta-,
oqueconstituiumaclaraefortecríticaaoEstadoNovo,entãovigente:«AMaçonaria
nada, pois, tem que ver com qualquer regimen ou partido político, excepto se ou
quandoesseregímenoupartidoatacamatolerânciaouoprimemaliberdade.Nada
temquever,porigual,comqualquerreligiãooudoutrinaexceptoseessareligiãoou
doutrina está nas condições indicadas. (…) Nesse caso é dever de todo o maçon
combater quanto possa esse inimigo daliberdade,eéseudevernaturaldemaçon,
independentedeindicaçãodirectadaoficinadequesejaobreiro,odaobediênciaa
que, ele e ela, pertençam. Tolerantes, o antes indiferentes, de mais têm sido a
M(açonaria) e os maçons para com tais dutrinas, imprevidentes de mais para com
elasquandoaindanoinícioemaisfáceisportantodecombater.»(F ragmentosdeum
texto de réplica, in A. Quadros, op. cit., p. 498)
É importante referirquePessoaafirmanãoterpertencidoanenhumaOrdem,
embora revele um conhecimento iniciático de natureza esotérica que parece
ultrapassar a mera informação livresca. Terá pertencido ele a um círculo iniciático
restrito, ou mesmo a uma Loja ou Capítulo “selvagem” de natureza
maçónico-templária ou rosacruciana, fazendo com que ele fosse «u
m irregular do
transepto» (expressão com que assina, em Janeirode1934,umacartaemdefesada
Maçonaria,dirigidaaoJornalAVoz,incluidanolivroPessoaInédito,coord.TeresaRita
Lopes, Lisboa, 1993, p. 328)?
No entanto, as referências de Pessoa ao templarismo enquadram-se, grande
parte delas, num universo maçónico, como por exemplo a frase esclarecedora meu
Irmão,setuésmaçon,eusoumaisdoquemaçon,eusoutemplárioqueestánoseu
poema S.João–poisseoseutemplarismonãofossemaçónico,elenãodiriaqueera
maisdoquemaçon,masquenãoeramaçon.Deacordocomestaperspectivaemque
ainiciaçãocavaleirescasucedeecompletaainiciaçãoartesanal,assimcomoainiciação
sacerdotal,completaráacavaleiresca,estátambémaseguinteafirmaçãoquepodeser
fantasiosa, mas também pode teralgumfundamentoquantoaumprojectoiniciático
que Pessoa gostaria ou pensaria desenvolver (pelo menos “imaginalmente”), e que
correspondesse à Ordem Templária de Portugal: «T emos espadas porque somos
cavaleiros, veste de rito porque somos sacerdotes, capuzes de velar porque somos
ocultos...» (cf. Yvette Centeno, Esp. 54A/53).
No que diz respeito à relação de Fernando Pessoa com a Maçonaria, para além do
notávelecorajosoartigodo“DiáriodeLisboa”de1935,dedefesadaOrdemmaçónicacontrao
Decreto de proibição da “sociedades secretas” que o Deputado José Cabral preparava da
AssembleiaNacional,édereferirum“textoderéplica”publicadoporAntónioQuadrosequeé
extremamentereveladordoqueterálevadooPoeta(umnãomaçon,comoelediz)adefender
a Maçonaria:
“Deixe o Sr. José Cabral a Maçonaria aos maçons e aos que, embora o não sejam,
viram, ainda que noutro Templo, a mesma Luz”.
Ora,“receberamesmaluznoutrotemplo”éterrecebidograusmaçónicos,nãonuma
organização maçónica mas numa organização não maçónica – que as houve várias, aquiloa
que os maçons ingleses chamamde “fringe freemasonry”,maçonarialateral.Tudoindicaque
foramosgrausmaçónicos,dispensadosaPessoaporCrowley,nocontextodasuaOrdemdos
TempláriosdoOriente–quetinhatrêsníveisiniciáticos,omaçónico,ocavaleirescoeomágico
–quedeterminaramdapartedoPoetaumaexpressãopúblicadasuasolidariedadeemrelação
à Ordem maçónica, ele que no final da sua vida estava a escrever rituais maçónico-cristãos
(que já reproduzimos em parte neste livro).
Defacto,cercadeumanoantesdasuavindaaPortugal,em1930,FernandoPessoae
o poeta “luciferino” Raul Leal estabeleceram correspondência com o mago inglês Aleister
Crowley.PessoaescreveraaCrowleynosentidodeoinformardequeoseuhoróscopoinserido
naobraConfessionsofAleisterCrowley(queoPoetapossuíanasuabiblioteca),estavaerrado.
Estademonstraçãodecompetêncianumaáreadoesoterismoteráimpressionadoomagoque
de seguida pensou expandir asua“ordem”aPortugaleaomesmotempoentregar-lheasua
direcção: I was obliged to leave immediately for Lisboa in order to establish there a
headquarter for the Order under Don Fernando Pessoa (e u fui obrigado a partir
imediatamente para Lisboa para estabelecer aí uma sede da Ordem sob a autoridade de
Fernando Pessoa).
Relativamente a Raul Leal a opinião de Crowley não era tão favorável jáquenoseu
Diárioeleescreveem9/9/30:ToLisbon:Lunchwith4.000esc.MetLeal;don’tlikehim.There’s
somethingverydefinitivelywrongabouthim.Atnightinitiation.(MarcoPasi,2006,223-231)–
“”para Lisboa: almoço com 4.000 Escudos. Encontrar Raul Leal; não gostodele.Háqualquer
coisa de definitivamente errado nele. À noite iniciação”.
É pois muito provável que Pessoa tenha estado presente nessa iniciação pois:
-Ctrowley–queescrevenoseudiário“ànoiteiniciação”-nãoiriaperderoseutempofazendo
uma iniciação apenas para RaulLeal,relativamenteaoqualelenãotinhaboaopinião–“não
gosto dele” - ao contrário de Pessoa que ele considerava;
- Crowley escreveu que, em Lisboa, ele ia “estabelecer uma sede da (sua) Ordem sob a
autoridade de Fernando Pessoa”; ora isso só seria possível se Pessoa fosse iniciado; logo a
intenção da vinda a Lisboa do mago inglês era clara e a sua concretização muito provável.
- de que Ordem fala Crowley? Uma vez que ele tinha duas,esendoumadelasaA.A.,uma
Ordem cabalística decorrentedaGoldenDawnecujosensinamentoseram,emgrandeparte,
dadosdirectamenteporele,porcorrespondência,aosseusdiscípulos,membrosdaAA–videa
circulariniciáticaquePessoatinhanoseuespólioequeoseusobrinhoLuisRoza(naverdade
LuísMiguelRosaDias)publicouem“UmencontroMagick”-,tudoindicaqueaOrdemdeque
CrowleyfalaseriaaOTO-OrdoTempliOrientisquetinhagrausmaçónicos,grauscavaleirescose
graus mágicos e que necessitavadeumainiciaçãoparaatransmissãodessesgraus(pormais
curta que fosse).
- A determinação com que Pessoa escreve o artigo do Diário de Lisboa, em defesa da
Maçonaria e de crítica dos que a queremproibir,revelaqueele,emboranãopertencendoa
nenhuma ordem maçónica, se sente solidário com a Ordem; uma hipótese muito provável
residenofactodaOTOtergrausmaçónicosedePassoa,aotê-losrecebidos–mesmoqueem
transmissãoresumida–sesentirnaobrigaçãodemanifestarpublicamenteasuasolidariedade
com a Ordem maçónica.
-comorefereStephenDix,noseutexto,RaulLealescreveuumcartaaJoãoGasparSimõesem
que ele acusa Crowley de ter realizado “uma certa vingança mágica”, “arrastando porfim o
Fernando para a Morte que poucos anos depois surgiu para ele subitamente (…) e
apanhando-me de ricochete de modo aprovocaremmimumahorríveldoençaquetambém
quase foi mortal…”; seria mais provável, no dicurso de Leal, que essa influência “negativa”
resultasse de uma iniciação ou transmissão iniciática.
Mas após ter recebido a visita (com uma muito provável iniciação) do mago inglês
Aleister Crowley, em Setembro de 1930, ele–quenãofoidiscípulodeCrowleymasrecebeu
deleumimpulsoparatrataroutrostemas-eescreveolemacrowleiano“Fazoquequeres”e
outrotextos como “OCaminhodaSerpente”–“olivroquenãooé”-,etratarpoéticamente
temas esotéricos como “No túmulo de Christian Rosencreutz”, “Eros e Psique”, etc.
ANEXO
1738–Bula“InEminenti”doPapaClementeXIIcontraaMaçonaria,invocandorazões
seculares.
ProcessodaInquisiçãocontraodominicanoO’KellydaLojacatólicadeLisboa,a“Casa
RealdosPedreiros-livresdaLusitania”,queeradirigidapeloCoronelHughO’Kellyese
reunia nos fundos de um restaurante de um irlandês, Rice de seunome,naRuados
Remolares,aoCaisdoSodré;outrosmembrosdaLoja:CapitãoBrown,TenenteHogan,
Charles Mardel, Engenheiro Militar, diversos comerciantes, etc.
1743 – Jean Coustos, suíço, Venerável da Loja protestante de Lisboa (que se reunia na Cruz
Quebrada) – cujo nome desconhecemos mas que era deominda pela Inquisição como a “Loja
dos Herejes protestantes” – foi preso juntamente com outro Irmão dessa Loja, Jacques
Mouton, tendo ambos sido torturados. Coustos era comerciante de pedras preciosas e
consegue ser libertado mas escreve depois um livro contando a hoistória da sua prisão e da sua
tortura.
1762 – O Conde de Lipppe, maçon alemão, vem reformar o Exército português e cria Lojas
militares, de Caminha a Elvas. O seu Regulamento de Disciplina sobreviveu até ao século XX.
1797 – as reuniões maçónicas eram feitas a bordo de barcos ancorados no Tejo; a Loja
“Regeneração” - núcleo de cinco outras lojas – reunia-se a bordo da fragata “Fénix”.
1801 – A Maçonaria em Portugal vai crescendo e neste ano há 5 Lojas maçónicas britânicas em
Lisboia – com oficiais do exército, comerciantes, sacerdotes, professores, etc. -, uma das quais
no Regimento dos Dragões Ligeiros ingleses .
Devido ao crescimento do número de maçons portigueses, começam nesse ano, no Palácio de
Gomes Freire de Andrade, as reuniões preparatórias para a constituição de uma Obediência
maçónica portuguesa regular.
1802 - Hipólito José da Costa é enviado a Londres para obter – juntodaMaçonariainglesa,
tendo-se dirigido, não sabemos porquê, à Grande Loja dos Antigos - a carta patente de
constituiçãodaGrandeLojadePortugal(oudaGrandeLojadeLisboa),masaochegaraLisboa
é preso por Pina Manique e depois interrogado pelaInquisição.Destasituaçãodramáticaele
dará conta num livro quepublicaráemLondresparaondeconseguiráfugir,porinfluênciado
Duque de Sussex - então radicado em Lisboa -, futuro Grão Mestre da Maçonaria inglesa.
1804 – Consagração da Grande Loja de Portuglal que em 1806 passará a denominar-se de
Grande Oriente Lusitano (G.O.L.), tendo recebido a carta patente do Grande Oriente de
França, uma vez falhada atransmissãoinglesa.O1º.GrãoMestreseráonetodoMarquêsde
Pombal, o Juiz Sebastião José de Sampio de Melo e Castro Lusignan,
807 – Primeira Invsão francesa comandada pelo maçon Junot. Embarque da família real
portuguesa para o Brasil, deixando o Comité de Regência em Lisboa. Algumas Lojasreagem
contra a invasão encorajadaspelomaçonDuiquedeSussex.Oexércitofrancêséderrotadoe
expulso pelasopas anglo-portuguesas.
1809 – Segunda Invasão francesa comandada por Soult. Procissão maçónica dos maçons
ingleses em Lisboa. Continua a perseguiçãpo de Pina Manique e em 1810 dá-se a prisão de 30
maçons que logo são libertados por acção do Duque de Sussex. O General Beresford era o
Governador do Exército inglês.
1814 – O General Gomes Freire de Andrade – então oficial das tropas napoleónicas, tendo
constituído nesse contexto, a Loja Militar dos Cavaleiros da Cruz, do Grande Oriente de França -
regressa a Portugal e em 1816 é eleito 3º. Grão Mestre do Grande POriente Lusitano.
1818 – Apesar deste acontecimento a maçonaria portuguesa expande-se, existindo Lojas em
Lisboa, Porto, Coimbra, Satarém, Elvas.
Em 1822 D. Pedro IV, Iº. do Brasil é iniciado na Maçonaria no Rio deJaneiro e será o primeiro
Grão Mestre do Grande Oriente do Brasil, que se constitui regularmente em 1823, sendo logo
reconhecido pela Inglaterra – recorde-se que nesse ano o Duque de Sussex, que tinha vivido
em Portugal, procede à unificação dos “modernos” e dos “antigos”, sendo o primeiro Grão
Mestre da Grande Loja Unida da Inglaterra.
1826 – A Carta Constitucional é aprovada por imposição do Duque de Saldanha, futuro Grõ
Mestre do “Grande Oriente do Porto”, exilado em França. Em Inglaterra estará exilado Silva
Carvalho, futuro Grão Mestre do “Grande Oriente de Passos Manuel”.
1834 – Após 10 anos de Governo miguelista – e de perseguição dos maçons – os liberais
impõem a Convenção de Évora Monte, sendo expulso D. Miguel e os Jesuítas. Extinção das
Ordens religiosas.
1836 – Revulução Setembrista de Passoa Manuel. Divisões na Maçonaria portughuesa entre os
Grandes Orientes e os seus Grão Mestres.
1834/1869 – Cisões e criação de Obediências diversas (da direita à esquerda) no seio da
Maçonaria portuguesa: Grande Loja Provincial do Rito Irlandês (Grão Mestre: Silva Pereira),
Grande Oriente de Portugal (Grão Mestre Moura Coutinho), Grande Oriente do Rito Escocês
(Grão Mestre: Silva Carvalho), Confederação Maçónica (Grão Mestre José Estêvão), Grande
Oriente templário (Grão Mestre: Rodrigo da Fonseca), Maçonaria Eclética/Rito Lusitano (Grão
Mestre: Miguel António Dias), Grande Loja Portuguesa (Grão Mestre: Cónego Castelo Branco),
Federação Maçónica (Grão Mestre: Pina Cabral), Grande Oriente Português (Grão Mestre:
Mendes Leal). O Grande Oriente Lusitano teve por seu turno como Grão Mestre o já citado
Costa Cabral, a que sucedeu o Conde de Paraty.
1869 – O Conde de Paraty, Grão Mestre do G.O.L. procede à unificação da Maçonaria
portuguesa, formando-se o Grande Oriente Lusitano Unido (G.O.L.U.), o qual por volta de
1870regista34Lojas,àsquaissesomam21Lojasespanholasquedevisoaproblemaspolíticos
na nação vizinha, se colocam sob a autoridade do GOLU.
1871 – São criadas duas Constituições: a Maçónica (de Lisboa) e a Constituição do Norte
(Coimbra e Porto) o que constituiu nova dissidência. Também o Tratado entre o GOLU e o
Grande Oriente de Espanha, acarretou a chamada dissidência patriótica.
1882 – Criação da Grande Loja de Portugal do rito Simbólico, de tendência britânica, que
integra6LojasvindasdoGOLU.OsseusGrãoMestresforamDiasFerreiraeFrançaNeto.Esta
G.L., em 1884, terá 18 Lojas.
1897–DepoisdoUltimatoinglêsem1890edarevoluçãode31deJneironoPorto,começaem
1896 a Ditadura de João Franco. No ano seguinte dá-se a criação do Grande Oriente de
PortugaldoGrãoMestrePeitodeCarvalhoquedurarápoucosanos.Tambémem1897écriado
o Grémio Português, a partir da Loja “Comércio e Indústria” do GOLU e integrará a Loja
“Montanha” que acolherá carbonários que também eram maçons.
1908 – Morte do rei D. Carlos e do Príncipe Luís Filipe. De 1860 a 1910 em pleno
desenvolvimento a acção republicana dentro da Maçonaria, com algumas características de
anti-clericalismo – respondendo segundo alguns ao demasido clericalismo vigente – e uma
afirmação política que conduziu a algumas divisões.
1910 – Revolução republicana de 5 de Outubro, com Machado dos Santos na Rotunda, em
Lisboa, emqueaCarbonária(aqueelepertence),temumpapeldecisivo,tendonessaaltura
cerca de 40 mil homens em armas.
1913–NoanodoseuCongresonacional,oGOLU–GrandeOrienteLusitanoUnidoconta4300
membroscom:156LojasdoREAA–RitoEscocêsAntigoeAceite,69doRitoFrancês,1doRito
Simbólico (Emulação?) e 1 do Rio de York.
1914–OSupremoConselhodoGrau33º.–organismoquetemajurisdiçãodosaltosgrasdo
REAA, proclama a sua independência e defende a Cosntituição de 1871 (face à nova
Constituição demasiado socializante, segundo ele). O Grão Mestre do GOLU é irradiado do
SCG33.
1915 – O Grão Mestre Magalhães Lima defnde o princípio “nem reacção, nem revolução”.
Grande actividade maçónica nos domínios da instrução publica e do Registo Civil.
1919/20–LutasinternasnãoimpedemocrescimentodoGOLU:2369membrose105Lojase
Triângulos.
1921 - Nova Constituição do GOLU que conta com 1826 membros. Nela se afirma que “A
Maçonaria é progressistaequeemborapossamsermaçons“indivíduiosdeambosossexos”,
“não são permitidas Lojas mistas”. O GOLU está presente no Congresso Internacional de
Genebra,juntamentecom17paíseseuropeusesul-americanos,grandepartedosquaislatinos
e latino-americanos.
1923–TentativadereunificaçãodoGOLU-GrandeorienteLusitanoUnido comoGLE-Grémio
Luso-Escocês,istoé,dasduastendênciasmaçónicasportuguesas,aprimeiramaisprogressista
e a segunda mais conservadora..
1924 – O Grão Mestre Magalhães Lima refere-se às diferenºas entre as duas tendências
maçónicas,aanglo-saxónica–queé“ritualísticaecrentenoGrandeArquitectodoUniverso”–
e a latina – que é “política e pouco ritualística”. O G.M. Magalhães Lima está presente em
Bruxelas no 3º. Congreso Internacional Internacional.
1925–OGOLUtem2528membrosdosquaismaisde50membrosdoParlamento.Nãoéesse
facto que levanta reservas à maçonaria anglo-saxónica mas sim o facto de a Maçonaria
portuguesa ser atravessada desde o século XIX por lutas político-partidárias.
1926 – Finalmente dá-se a união do GOLU com grande parte doGLE(algunsaindaficamde
fora). O relatório do Conselho da Ordem diz que não foi possível restabelecer as relações–
“troca de Garantes de Amizade” – com as Grandes LojasEstaduaisdosEUAecomaGrande
Loja Unida de Inglaterra, “com as quais desde há muitos anos não temos relações”
1926 –Revoluçãode28deMaio.UmanodepoiscomeçaaperseguiçãodaMaçonariaedos
maçons – sobretudo dos que não estãocomoEstadoNovo.Lembremos,entreoutros,queo
Marechal Carmon, futuro Presidente da República, foi maçon e que um nome como Bissaia
Barreto também o foi (e fazia a ponte do Estado Novo com IInglaterra).
1929 - Depois da morte do GM Magalhães Lima em 1928, é eleito o novo Grao Mestre, António
José de Almeida. Persiguição e crise na Maçonaria portuguesa. O maçon General Norton de
Matos critica o Estado Novo.
1935 – Depois de uma campanha anti-maçónica na imprensa portuguesa, de 1930 a 1934,
prepara-se na Assembleia Nacional um Decreto-Lei. De proibição das “socirdades secretas”, isto
é, da Maçonaria. Fernando Pessoa – que tinha recebido graus maçónicos da OTO-Ordo Templi
Orientis de Aleister Crowley – sente-se na obrigação moral de reagir de imediato com um longo
e corajoso artigo no Diário de Lisboa, poucos meses antes da sua morte.
- 1937 – É eleito Grão-Mestre o Dr. Luís Rebordão. As reuniões dos maçons continuam na
clandestinidade.
- Anos 80 – Criação da Grande Loja de Portugal, com membros vindos do GOL: Vitor Marques,
Fernando Teixeira, etc, Este projecto não dura muito tempo. É criada em França (Bretanha), no
âmbito da GLNF-Grande Loja Nacional Francesa, a Loja Fernando Pessoa,maioritariamente
constituída por portugueses (Nuno Nazaré Fernandes, entre outros). Em 1989 é criado o
Distrito Portiguês da GLNF, reunindo três Lojas.
- 1991 – Criação da GLRP-Grande Loja Regular de Portugal, sendo o seu Grão Mestre, Fernando
Teixeira, ao qual sucede em 1996, Luís Nandin de Carvalho que é consagrado numa reunião no
então Hotel Estoril-Sol na presença de mais de uma dezena de Grão Mestres do Obediências
regulares de diversos continentes.
1996/7 – Em 1996 dá-se uma cisão na GLRP ficando o grup+o minoritário com essa
denominação–tendoJoséMedeiroscomoGrãoMestre-econstituindo-seaGLLP-GrandeLoja
LegaldePortugal,continuandoLuisNandindeCarvalhocomoGrãoMestre.ÉestaGrandeLoja
quevaireceber,empoucosanos,osreconhecimentosdaesmagadoramaioriadasObediências
estrangeiras regulares.
Anos 2000 – sucedem-se os Grão-Mestres na GLLP: José M. Anes (2001), TrovãodoRosário
(2004), Mário Martin Guia (2007) e José Moreno (2010, reeleito em 2012). Aconteceram
algumascisõesnoseiodocampoda“regularidade”:aGLNP-GrandeLojaNacionalPortuguesa
(vinda da GLRP), a GrandeLojaTradicionalPortuguesa,mista,vindadaGLLP-–aqualdepois
sofresuavezumacisão,formamndo-seoGOI-GrandeOrienteIbérico-.Desalientaracriação
recente da Grande Loja Simbólica do Rito de Menfis e Misrim, cujo Grão Mestre é Pedro
Rangel.
“Lastbutnotleast”,éderegistaracriaçãopelaGrandeLojaFemininadeFrança,jádepoisdo
25 de Abril, da Grande Loja Feminina de Portugal, única Obediência Maçónica Femininaem
Portugal – com Grão Mestras como Maria Belo, Júlia Maranha, Feliciana Ferreira, etc.. Já
houve,entretanto,umacisãoprotagonizadaporumasuaex-Grã-Mestra,aProf.MariaHelena
Carvalho dos Santos, tendo criado uma Obediencia mista.
Saliência, ainda, também para uma Obediência histórica mista que existe em França desde
1900,criadaporMarieDesraimesequeéoDireitoHumanoequeseestabeleceuemPortugal
também depois do 25 de Abril.
Bibliografia:
-L’Ésotérisme–AntoineFaivre–Paris,P.U.F.(PressesUniversitairesdeFrance),1ª.Ed.,
1992, 5ª. Edição acualizada, 2012 – existe tradução em português (que está esgotada)
-L´´Esotérisme–PierreA.Riffard–Paris,Laffont,1ª.Ed.,1990–jáexistetraduçãoem
português.
- L’Histoire de l’Ésotérisme et des Sciences Occultes – Jean-Paul Corsetti – Paris,
Larousse, 1ª.ed., 1992
- Magic and Mysticism – An Introduction to Western Esotericism – Arthur Versluis –
Maryland, Rowman &Littlefield, 2007
-TheWesternEsotericTraditions–NicholasGoodrick-Clarke–OxfordUniversityPress,
2008
- Nouveau Dictionnaire de l´Ésotérisme – Piere Fiffard – Paris, Payot, 1ª. Ed., 2008
E ainda:
-HermésTrismégiste–trad.LouisMénard–Ed.DelaMaisnie/GuyTrédaniel,Paris,s.d.
(anos 70)
- Le Soufisme - - L’Originel
- “L’utopie Rose-croix”
Do autor:
JoséManueldeMoraisAnes,nascidoemLisboaa21/6/44,licenciou-se-depoisdeter
regressado do Serviço Militar ObrigatórioemAngola-emQuímica,em1974,pelaFaculdade
deCiênciasdaUniversidadedeLisboa,tendo-seDoutorado,em2009,emAntropologiaSociale
Cultural pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Foi
Assistente de Biomatemática na Faculdade de Medicina de Lisboa (H.S.M.) e estagiou em
Madrid no Instituto de Química-Física Rocasolano do C.S.I.C. Foi Perito Superior de
Criminalística do Laboratório de Polícia Científica, durante 19 anos (1978-1997) e Assistente
convidadodaFaculdadedeCiênciasSociaiseHumanas,nosDepartamentosdeAntropologiae
de Ciência Política, durante 18 anos (1986/7-2004/5).
ÉmembrodaESSWE–EuropeanSocietyfortheStudyofWesternEsotericism(fundada
pelos Profs. Wouter Hannegraaf e da Universidade de Amsterdão e Antoine Faivre da
EPHESS/SSR, Sorbonne. Publicou nestes domínios do Esoterismo os seguintes livros:
Re-criações herméticas e “Recreações herméticas II (Hugin, respectivamente, 1995, 1996),
Maçonaria regular (Hugin, 2003), “Fernando Pessoa e os Mundosesotéricos(Ésquilo,3ª.Ed,
2008),“OsJardinsiniciáticosdaQuintadaRegaleira”(Ésquilo,2ª.Ed.,2006),“Umoutroolhar,
afaceesotéricadaculturaportuguesa”(Ésquilo,2008),“AAlquimia,osnovosalquimistaseas
novas espiritualidades (Ésquilo, 2009) e, com outros autores, “Portugal misterioso”
(SeleccçõesReader’sDigest,2004),“AFlautamágicaeosmistériosiniciáticos”(Ésquilo,2007),
“O Inferno de Dante” (Ésquilo, 2013),etc.
Dirigiu na Ed. Hugin a colecção Biblioteca hermética tendo aí publicado livros de
autorescomoLimadeFreitas,AdalbertoAlves,ManuelJ.Gandra,CarlosCalvet,etc.Leccionou
vários cursos livres sobre temas esotéricos na FCSH da Universidade Nova de Lisboa, na
Universidade Lusófona, noCentroNacionaldeCultura,noÂmbitoCulturaldoElCorteInglês,
etc.
No domínio da Segurança foi co-fundador e depois Presidente do OSCOT –
Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo e éDirector,desdeasua
fundaçãoem2006darevistatrimestral“SegurançaeDefesa”(Ed.Diáriodebordo).ÉProfessor
Auxiliar na Universidade Lusíada de Lisboa das cadeiras de Organizações criminais e de
Terrorismo da Licenciatura de Políticas de Segurança, sendo também Professor Auxiliar na
Universidade Lusíada do Porto, onde lecciona a cadeira de Criminalística e Metodologia de
InvestigaçãoCriminaldaLicenciaturaemCriminologia.ÉtambémProfessorAuxiliarnoISCSEM
– Instituto Superior de Ciências da Saúde “Egas Moniz”, onde lecciona as cadeiras de
Introdução às Ciências Forenses e de Metodologia de Investigação Criminal e Análise de
Informaçõescriminais(opção)daLicenciaturadeCiênciasForenseseCriminais.ÉProfessordo
MestradoemDireitoeSegurançanaFaculdadedeDireitodaUniversidadeNovadeLisboaeno
IESM–InstitutodeEstudossuperioresMilitares.Nestedomínio,foico-autordolivro“Asteias
doterror”(Ésquilo,2006),autorde5artigossobreviolênciareligiosapulicadosnarevistaJanus
2007 (Público/Univ. Autónoma) e coordenador do livro colectivo “Organizações criminais –
uma introdução ao crime organizado” (Edições Lusíadas, 2ª. Ed., 2013).
- “As Tentações de Bosh e o Eterno Retorno”, Lisboa, Museu de Arte Antiga, 1994;
- “Poesia e Ciência”, Lisboa, Cosmos/GUELF, 1994;
- “Caos e Meta-Psicologia”, Lisboa, Fenda/ISPA, 1994;
- “Religião e ideal maçónico”, Lisboa, ISER, 1995;
- “Seminário sobre Newton”, Évora, Universidade de Évora/CEHFC, 1995;
- "Masoneria y religión", Madrid, Ed. Complutense, 1996;
- “A Vivência do Sagrado”, Lisboa, Hugin, 1998,
- “A Quinta da Regaleira: história, símbolo e mito”, Fundação Cultursintra, 1998;
- “Portugal Misterioso”, Lisboa, SRD, 1998;
- "L'Âme secrète du Portugal", Paris, L'Originel, nº 9, 2000;
- “L’Homme à venir - Mémoire du XXe.siècle – nº.2”, Paris, Rocher, 2000;
- “Discursos e práticas alquímicas - I”, Lisboa, Hugin/CICTSUL, 2001;
- “Esoterismo e Humanidades” –Colibri/Faculdade de Letras de Lisboa, 2001;
- “Discursos e práticas alquímicas – II” – Lisboa, Hugin/CICTSUL, 2002;
- “O Homem do futuro – um ser em construção” – São Paulo –Br., Triom/USP, 2002;
- “A Creação – La Création” – Lisboa, Atalaia/Intermundos, 2003;
- “O Esoterismo da Quinta da Regaleira“ (entrevista conduzida por Vitor
Mendanha), Hugin, Lisboa, 1e éd.1998, 2e éd. 2000; 3ª. Ed., 2002; 4ª. Ed. 2003.
-"Templiers: les yeux du baphomet" - Monts, Rafael de Surtis/Éditinter, 2004