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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 3ª VARA

CRIMINAL DA COMARCA DE SÃO GONÇALO DO ESTADO DO RIO DE

JANEIRO

Processo no. xxxxxxx-xx.xxxx.xx.xxxx

CARLOS, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem, por

intermédio do advogado signatário, respeitosamente, perante V. Exª, apresentar

RAZÕES DE APELAÇÃO, com fundamento no art. 593 do Código de Processo Penal,

requerendo que sejam remetidas ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

Pede deferimento.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 2021.

Nome do advogado

OAB xxxx
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Processo no. xxxxxxx-xx.xxxx.x.xx.xxxx

Origem: 3ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SÃO GONÇALO/RJ

Recorrido: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Recorrente: CARLOS

RAZÕES DE APELAÇÃO

Eméritos Julgadores,

Exmo. Desembargador Relator,

BREVE RELATÓRIO DOS AUTOS

O apelante se insurge contra a sentença (evento xxx) em que foi

condenado nas penas do crime tipificado nos artigos 302 da Lei nº 9.503/97, por duas

vezes, e 303, do mesmo diploma legal, todos em concurso material.


Narram os autos que, no dia 08 de julho de 2019, o apelante, na direção

de veículo automotor, com a imprudência em razão do excesso de velocidade, colidiu

com o veículo em que estavam Júlio e Mário, este com 9 anos, causando lesões que

foram a causa eficiente da morte de ambos. Em decorrência da mesma colisão, ficou

lesionado Pedro, que passava pelo local com sua bicicleta e foi atingido pelo veículo

em alta velocidade de Carlos.

As mortes de Júlio e Mário foram atestadas por auto de exame

cadavérico, enquanto Pedro foi atendido em hospital público, de onde se retirou, sem

ser notado, razão pela qual foi elaborado laudo indireto de corpo de delito com base

apenas no boletim de atendimento médico. Pedro nunca compareceu em sede policial

para narrar o ocorrido e nem ao Instituto Médico Legal, apesar de testemunhas

presenciais confirmarem as lesões sofridas.

No curso da instrução, foram ouvidas testemunhas presenciais, não

sendo Pedro localizado. Em seu interrogatório, Carlos negou estar em excesso de

velocidade, esclarecendo que perdeu o controle do carro em razão de um buraco

existente na pista. Foi acostado exame pericial realizado nos automóveis e no local,

concluindo que, realmente, não houve excesso de velocidade por parte de Carlos e que

havia o buraco mencionado na pista. O exame pericial, todavia, apontou que

possivelmente haveria imperícia de Carlos na condução do automóvel, o que poderia

ter contribuído para o resultado.


O M.M. Juízo da 3ª vara julgou totalmente procedente a pretensão

punitiva do Estado e, apesar de afastar o excesso de velocidade, afirmou ser necessária

a condenação de Carlos em razão da imperícia do réu, conforme mencionado no exame

pericial.

No momento da dosimetria, fixou a pena base de cada um dos crimes

no mínimo legal e, com relação à vítima Mário, na segunda fase, reconheceu a

agravante prevista no Art. 61, inciso II, alínea h, do CP, pelo fato de ser criança,

aumentando a pena base em 3 meses. Não havendo causas de aumento ou

diminuição, reconhecido o concurso material, a pena final ficou acomodada em 04

anos e 09 meses de detenção.

Não houve substituição da pena privativa de liberdade por restritiva

de direitos em razão do quantum final, nos termos do Art. 44, inciso I, do CP, sendo

fixado regime inicial fechado de cumprimento da pena, com fundamento na

gravidade em concreto da conduta.

A sentença merece reparos conforme será explicado adiante.

AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CULPA. IMPOSSIBILIDADE DE

CONDENAÇÃO COM BASE EM PRESUNÇÃO.


O Juiz sentenciante afirmou ser necessária a condenação do apelante em

razão de sua imperícia. Entretanto, vale ressaltar que o exame pericial não foi

conclusivo o suficiente para afirmar a imperícia de Carlos, limitando-se apenas a

dizer que “possivelmente haveria imperícia”.

O apelante estava guiando o veículo automotor corretamente, de

maneira prudente e compatível com o dever de cuidado exigível. O buraco com que

se deparou o fez perder o controle do carro, e não houve culpa do apelante, que nada

pôde fazer. Não houve imperícia que possa estabelecer o vínculo penal entre a sua

conduta e o resultado, que se tratou de uma fatalidade. Não há elementos que

permitam aferir que a conduta do Acusado tenha sido a causa determinante da morte

da vítima.

Acerca da produção do resultado e do nexo causal nos delitos culposos,

Cezar Roberto Bitencourt esclarece ser “indispensável que o resultado seja

consequência da inobservância do cuidado devido ou, em outros termos, que este seja

a causa daquele”, pondera que “a inevitabilidade do resultado exclui a própria

tipicidade. Em outros termos, é indispensável que a inobservância do cuidado devido

seja a causa do resultado tipificado como crime culposo. Por isso, não haverá crime

culposo quando o agente, não observando o dever de cuidado devido, envolver-se em

um evento lesivo, que se verificaria mesmo que a diligência devida tivesse sido

adotada” (Cezar Roberto Bitencourt, em Tratado de Direito Penal, vol. 1, 9ª ed., São

Paulo: Saraiva, 2004, p. 276).


Ao analisar às provas dos autos, tem-se que não restou evidente, com a

certeza necessária que a condenação exige, que o Apelante deu causa ao resultado, por

imprudência, negligência ou imperícia, violando o dever objetivo de cuidado. Sobre o

conceito de crime culposo é de ser citada a lição doutrinária do Professor René Ariel

Dotti, verbis:

"Existe o crime culposo quando o agente, violando o dever

de cuidado objetivo a que estava obrigado em face das circunstâncias,

não prevê o resultado previsível ou, prevendo-o, supõe levianamente

que o mesmo não ocorreria ou que poderia evitá-lo." (Curso de Direito

Penal, Parte Geral, Editora Forense, 2001, pág. 314).

Conforme se sabe, para a prolação de um decreto penal condenatório é

indispensável prova robusta que dê certeza da existência do delito e seu autor. A

íntima convicção do Julgador deve sempre se apoiar em dados indiscutíveis. Caso

contrário, transforma o princípio do livre convencimento em arbítrio. É princípio

fundamental do Processo Penal, de que o acusado somente deve ser condenado,

quando o juízo, na forma legal, tenha estabelecido os fatos que fundamentaram a

culpabilidade, com completa certeza. No presente caso, não é possível auferir com

precisão a conduta determinante para a causa do acidente, pois tem questões que não

foram suficientemente esclarecidas.

Assim, há que se aplicar o princípio do in dubio pro reo em favor do

Acusado. Não se pretende fortalecer a sensação de que os crimes de trânsito, cada


vez mais reiterados e violentos, não guardam penalidade proporcional às sérias

consequências geradas. Todavia, cabe ao julgador uma leitura técnica e equidistante

das peças que se formaram durante a fase instrutória. E assumindo esta postura

imparcial, é impossível condenar o Réu, pois não há prova suficiente de que a

suposta violação do dever de cuidado realizada por esse foi a única causa a gerar o

resultado.

Pugna-se, por fim, pela reforma da sentença para que o apelante seja

absolvido tanto pelo delito de lesão corporal quanto pelo de homicídio culposo, haja

vista o princípio do in dubio pro reo (art. 155 do CPP).

Pede deferimento.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 2021.

Nome do advogado
OAB xxxx

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