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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA

VARA SUMARIANTE DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE COLOMBO

RAQUEL MARTINS, já qualificada nos autos em epígrafe, por intermédio de sua


advogada que ao final assina, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência,
interpor recurso em sentido estrito, com fundamento no art. 581, IV do Código de
Processo Penal. Requer-se, assim, que após recebido o presente recurso, com as
inclusas razões, seja exercido o devido juízo de retratação, de acordo com o art.
589 do mesmo diploma legal.

Nestes termos,

Pede e espera deferimento.

Colombo, 08 de junho de 2022.

Leticia Viesser Cequinel Giovanna Gobbo Agnoletto

OAB/PR 150499 OAB/PR 160500


RAZÕES DE RESE

Processo nº XXXXXXXXXX

Apelante: RAQUEL MARTINS

Apelado: Ministério Público

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná,

Colenda Câmara,

Em que pese o ilibado saber jurídico do Juízo “a quo”, não merece


prosperar a referida decisão, sendo imperiosa a reforma por este Tribunal “ad
quem”, pelas razões a seguir expostas:

1. SÍNTESE FÁTICA

Raquel Martins dirigia seu carro em uma via de mão dupla, respeitando
os limites de velocidade, quando decidiu por ultrapassar o veículo a sua
frente e este estava abaixo da velocidade permitida. Ao realizar a manobra,
Raquel, acabou por esquecer de acionar a seta luminosa sinalizadora do
veículo e no exato momento da ultrapassagem atinge Diogo, um motociclista,
que estava em velocidade acima da permitida na via. Raquel imediatamente
prestou socorro, ocorre que Diogo veio a falecer em decorrência dos
ferimentos.

Após concluído o Inquérito Policial, o Ministério Público, ofereceu


denúncia em face de Raquel, pela pratica do crime prevista no Art. 121, c/c
Art. 18, I, parte final, ambos do Código Penal (homicídio doloso simples, na
modalidade de dolo eventual), alegando a imprevisão acerca do resultado
que poderia causar ao não ligar a seta do veículo para realizar a
ultrapassagem, além de não ter se atentado ao transito em sentido contrário.

Durante a instrução probatória, a ordem de oitivas das testemunhas não


foi respeitada e o juiz decidiu pronunciar Raquel.

No entanto, não merece respaldo a decisão de pronúncia proferida


pelas razões de direito a seguir.

2. PRELIMINARES DE NULIDADE

2.1.INVERSÃO DOS DEPOIMENTOS

A inversão da ordem de depoimentos, visto que foram ouvidas em


audiência de instrução primeiramente as testemunhas de defesa, é
notoriamente prejudicial à recorrente, gerando o cerceamento de defesa da
mesma.

No caso concreto em questão, é importante ressaltar que inexistem


demais provas documentais e audiovisuais do acidente, então o depoimento
das testemunhas é de suma importância para a comprovação da ausência de
dolo eventual na conduta da recorrente.

Veja-se, o maior problema gerador de dano do caso concreto não é


propriamente a inversão da prova, mas sim com a ausência de concordância
da defesa com a maneira em que a prova foi constituída.

É evidente a inobservância do previsto no art. 212 do Código de


Processo Penal, gerando constrangimento ilegal ante a violação do devido
processo legal e contraditório.

O magistrado não possui o poder de dispor quanto a aplicação de


norma processual prevista em Lei, e, caso contrario, o Sistema Judiciário
entra em flerte com um regime quase monárquico, relativizando disposições
das quais não existe a menor possibilidade de relativização.
O prejuízo da cliente é comprovado pela mera reanálise das mídias de
audiência, visto que a própria formulação de perguntas para as testemunhas
de acusação por parte do Ministério Público é direcionada à atacar quaisquer
versão afirmada pelas testemunhas de defesa.

A própria sentença utiliza como fundamentação base o depoimento


das testemunhas de acusação, desconsiderando quaisquer versão defensiva
apresentada. O prejuízo da recorrente é implícito, porém as consequências
foram de ordem devastadora, devendo a nulidade supracitada ser levada em
consideração e declarado o ato da audiência de instrução como inválido.

3. MÉRITO

3.1. DA DESCLASSIFICAÇÃO

No presente caso deve ser desclassificada a infração penal imputada à


recorrente nos termos do Art. 419 do Código de Processo Penal, uma vez
que esta agiu através de culpa inconsciente e não com dolo.

Segundo Guilherme de Souza Nucci, culpa inconsciente:

“Significa que o agente tem a previsibilidade


(possibilidade de prever) do resultado, mas na prática
não o previu (ausência de previsão)” (NUCCI, 2021,
pg. 215)

Neste sentido a Recorrente, ao realizar a ultrapassagem, não previu o


resultado de sua conduta de ocasionar a morte da vítima, tampouco quis ou
aceitou o resultado, embora previsível, tendo em vista que realizou a
ultrapassagem, mesmo que sem acionar a seta, e não contava que a vítima
estaria em velocidade superior à permitida na via.
Com efeito, deve assim ser afastada a pronúncia imposta, tendo em
vista estar caracterizada a figura do homicídio culposo na direção de veículo
automotor, assim previsto no Art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, não
se tratando de crime doloso contra a vida a ser julgado pelo Tribunal do Júri.

Portanto deve ser reformada a referida sentença no sentido de


desclassificar a infração penal para homicídio culposo na direção de veículo
automotor, afastando assim a pronúncia aplicada e remetido os autos ao juiz
da Vara de Delitos de Trânsito.

3.2. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE

Ante ao pedido de desclassificação, é importante destacar a


necessidade da aplicação do princípio da especialidade.

Sabe-se que, pelo referido princípio, onde norma especifica afasta a


incidência da norma geral. A norma se diz especial quando contiver os
elementos de outra (geral) e acrescentar pormenores.

Neste sentido, por tal princípio, a normal especial do Código de


Trânsito Brasileiro deve prevalecer sobre a norma geral do Código Penal,
assim é o entendimento da jurisprudência dominante, senão veja-se:

CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE


VEÍCULO AUTOMOTOR. PLEITO DE ADEQUAÇÃO DA
CONDUTA DO RÉU AO HOMICÍDIO CULPOSO DO
CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. DELITO ESPECIAL
COM SANÇÃO MAIS GRAVOSA. OPÇÃO
LEGISLATIVA. PENA-BASE MÍNIMA MAIOR QUE UM
ANO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO.
INAPLICABILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. Hipótese na qual o
paciente foi condenado pela prática de homicídio culposo na
direção de veículo automotor, não tendo sido oferecida
proposta de suspensão condicional do processo. A
diferença do homicídio culposo.
(Tribunal de Justiça de Alagoas TJ-AL - Revisão
Criminal: RVCR 08000518820168020000 AL 0800051-
88.2016.8.02.0000 - Inteiro Teor. )

Deste modo, sendo reconhecida a desclassificação do crime de


homicídio doloso para homicídio culposo na direção de veículo automotor,
necessário o declínio de competência para a Vara de Delitos de Trânsito, por
se tratar de foro especializado.

4. DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer que seja conhecido e provido o presente


recurso em sentido estrito, para que haja a devida reforma, sendo
reconhecida a nulidade do ato da audiência de instrução e julgamento
aplicando a desclassificação do crime imputado à Recorrente, nos termos do
Artigo 419 do Código de Processo Penal, para Homicídio Culposo na Direção
de veículo automotor, assim previsto no Artigo 302 do Código de Trânsito
Brasileiro, remetendo-se os autos para o juiz competente para
processamento e julgamento.

Nestes termos,

Pede e espera deferimento.


Colombo, 8 de junho de 2022

Leticia Viesser Cequinel Giovanna Gobbo Agnoletto

OAB/PR 150499 OAB/PR 160500

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