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AO JUÍZO DA 1ª VARA DO JURI COMARCA DE SÃO PAULO – SP

Processo Nº.

FULANO DE TAL, já devidamente qualificado nos autos do processo criminal


epigrafado, vem, com o devido respeito, através de seu advogado (procuração
em anexo), perante Vossa Excelência, apresentar ALEGAÇÕES FINAIS ,
conforme razões que seguem.

I – DOS FATOS

O requerente foi preso em flagrante por suposta prática de crime de trânsito


onde teria ingerido bebida alcoólica e ao retornar para sua residência
atropelado duas pessoas que estavam em um ponto de ônibus que vieram a
óbito no local.

Após a chegada da policia militar, algumas testemunhas informaram que o


mesmo dormia ao volante quando o acidente aconteceu. Os policiais sugeriram
que fosse feito o teste de alcoolemia, porém foi negado pelo R, que mesmo
assim foi preso em flagrante com base nos depoimentos das testemunhas e
pelo forte odor etílico que saia da sua boca.

II – TEMPESTIVIDADE

A citação pessoal ocorreu no dia 20 de setembro de 2021, quarta-feira. A


interposição da peça está acontecendo no último dia do prazo, 27 de setembro
de 2021, então, tem-se por tempestiva a presente defesa.
III – DAS PRELIMINARES

A) NULIDADE DE TODOS OS ATOS APÓS AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO

No Art. 5º, inciso LV da nossa Constituição está escrito de forma expressa que:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de


qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e


aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”

Conforme termo de audiência Id. Fica evidenciado que houve inversão do rito
processual do interrogatório, prejudicando o direito de defesa do réu, pois o
mesmo foi ouvido antes das testemunhas de acusação e de defesa. Neste
sentido:

“RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. MOMENTO


DO INTERROGATÓRIO. ÚLTIMO ATO DA INSTRUÇÃO.
MAIOR EFETIVIDADE A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS.
MINORANTE. ANÁLISE PREJUDICADA. RECURSO
ESPECIAL PROVIDO.

1. Por ocasião do julgamento do HC n. 127.900/AM, ocorrido


em 3/3/2016 (DJe 3/8/2016), o Pleno do Supremo Tribunal
Federal firmou o entendimento de que o rito processual para o
interrogatório, previsto no art. 400 do Código de Processo
Penal, deve ser aplicado a todos os procedimentos regidos por
leis especiais. Isso porque a Lei n. 11.719/2008 (que deu nova
redação ao referido art. 400) prepondera sobre as disposições
em sentido contrário previstas em legislação especial, por se
tratar de lei posterior mais benéfica ao acusado (lex mitior),
visto que assegura maior efetividade a princípios
constitucionais, notadamente aos do contraditório e da ampla
defesa.

2. De modo a não comprometer o princípio da segurança


jurídica dos feitos já sentenciados (CF, art. 5o, XXXVI), houve
modulação dos efeitos da decisão: a Corte Suprema
estabeleceu que essa orientação somente deve ser aplicada
aos processos cuja instrução ainda não se haja encerrado.
3. Uma vez que a audiência de instrução e julgamento ocorreu
depois da publicação da ata daquele julgamento, prevalece a
nova compreensão do Supremo Tribunal Federal acerca da
matéria, qual seja, a de que, em se tratando de crime previsto
na Lei n. 11.343/2006, o interrogatório deve ser o último ato da
instrução, à luz, especialmente, dos princípios constitucionais
do contraditório e da ampla defesa.

4. Embora, em regra, a decretação da nulidade de determinado


ato processual requeira a comprovação de prejuízo concreto
para a parte - em razão do princípio do pas de nullité sans grief
-, o prejuízo à defesa é evidente e corolário da própria
inobservância da máxima efetividade das garantias
constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Uma vez
que o interrogatório constitui um ato de autodefesa, não se deu
aos recorrentes a possibilidade de esclarecer ao Magistrado
eventuais fatos contra si alegados pelas testemunhas ao longo
da instrução criminal.

5. Porque anulado o processo desde a audiência de instrução e


julgamento, fica esvaída a análise da pretendida aplicação da
minorante prevista no § 4o do art. 33 da Lei de Drogas.

6. Recurso especial provido, para anular o Processo n.


0248691-17.2016.8.04.0001, da 4a V. E. C. U. T. E. da
Comarca de Manaus - AM, desde a audiência de instrução e
julgamento, com a determinação de que seja realizada nova
instrução probatória, dessa vez com a observância de que o
interrogatório dos réus seja o último ato da instrução. (REsp
1808389/AM, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ,
SEXTA TURMA, julgado em 20/10/2020, DJe 23/11/2020).”

Desse modo, requer seja reconhecida a nulidade da audiência de instrução e


julgamento e de todos os atos posteriores.

B) DA IMPUGNAÇAO DOS VÍDEOS JUNTADOS COMO PROVA.

No mesmo sentido do direito ao contraditório e ampla defesa, requer que os


vídeos juntados como prova sejam impugnados, uma vez que não foi
comprovado quem fez os vídeos, impossibilitando a realização de
contraprovas. Conforme art. 306, §2º que diz:
Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade
psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de
outra substância psicoativa que determine dependência:

Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e


suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a
habilitação para dirigir veículo automotor.

§ 1o As condutas previstas no caput serão constatadas por:

I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por


litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool
por litro de ar alveolar; ou

II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran,


alteração da capacidade psicomotora.

§ 2o A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida


mediante teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico,
perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em
direito admitidos, observado o direito à contraprova (grifos
nossos).”

IV – DO MÉRITO

A) DA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EMBRIAGUEZ DO


ACUSADO

Conforme já afirmado nos autos, o acusado apenas bebeu um drink para


brindar o seu aniversário após os parabéns, afastando qualquer possibilidade
de estar bêbado no momento de acidente.

No momento em que os policiais chegaram e propuseram o exame através do


bafômetro, o mesmo se recusou justamente por saber que o teste acusaria que
ele tinha bebido, mesmo em pequena quantidade.

Em audiência de instrução as próprias testemunhas de acusação afirmaram


que não viram o acusado bebendo qualquer tipo de bebida alcoólica e também
que não tinham certeza se o mesmo estava bêbado, o que reafirma que o
acidente apenas ocorreu devido ao condutor ter dormido ao volante e não por
estar dirigindo alcoolizado.

Não basta apenas afirmar que houve dolo eventual, precisa demonstrar no
caso concreto, pois não há uma fórmula legal ou jurisprudencial a ponto de
imputar o crime de homicídio doloso no trânsito. Vejamos:
“Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS.
HOMICÍDIO DOLOSO (ART. 121, CAPUT, DO CÓDIGO
PENAL). CRIME COMETIDO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO
AUTOMOTOR. DOLO EVENTUAL. PRETENDIDA
DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO PREVISTO NO ART.
302 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. EXAME DO
ELEMENTO VOLITIVO. INVIABILIDADE.

1. Enquanto no dolo eventual o agente tolera a produção


do resultado, tanto faz que ocorra ou não; na culpa
consciente, ao contrário, o agente não assume o risco nem
ele lhe é indiferente. Presente essa controvérsia a respeito
do elemento subjetivo, na lição de NELSON HUNGRIA, não
é possível pesquisá-lo no 'foro íntimo' do agente, tem-se
de inferi-lo das circunstâncias do fato externo.

2. Os autos evidenciam, neste juízo sumário, que a imputação


atribuída ao agravante não resultou da aplicação aleatória do
dolo eventual. Indicou-se, com efeito, as circunstâncias
especiais do caso, notadamente a embriaguez, o excesso de
velocidade e a ultrapassagem de semáforo com sinal
desfavorável em local movimentado, a indicar a anormalidade
da ação, do que defluiu a aparente desconsideração, falta de
respeito ou indiferença para com o resultado lesivo.

3. O quadro de circunstâncias descrito não permite identificar


qualquer vício apto a justificar, neste momento e nesta estreita
via processual, a desclassificação da figura incriminadora.
Caberá ao Tribunal do Júri auferir a existência do elemento
subjetivo do tipo (dolo ou culpa), pois diretamente ligado ao
contexto fático da prática delituosa.

4. Agravo regimental a que se nega provimento. (HC 160500


AgR. STF).”

Assim, não havendo o Ministério Público comprovado, através de meios de


prova admitidos em matéria penal, a embriaguez do acusado, não há o que se
falar em homicídio com dolo eventual e o mesmo deve ser enquadrado como
homicídio culposo, na modalidade culpa consciente, art. 18, inciso II, do Código
Penal. Como nos ensina o professor Rogério Greco:

“Na culpa consciente, o agente, embora prevendo o resultado,


acredita sinceramente na sua não ocorrência; o resultado
previsto não é querido ou mesmo assumido pelo agente. Já no
dolo eventual, embora o agente não queira diretamente o
resultado, assume o risco de vir a produzi-lo. Na culpa
consciente, o agente, sinceramente, acredita que pode evitar o
resultado; no dolo eventual, o agente não quer diretamente
produzir o resultado, mas, se este vier a acontecer, pouco
importa” (GRECO, 2018, p. 313).”

Portando, requer o acusado que o autos sejam remetidos a vara competente


para julgar o caso, conforme art. 419 do CPP que diz:

“Art. 419. Quando o juiz se convencer, em discordância com a


acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1o
do art. 74 deste Código e não for competente para o
julgamento,remeterá os autos ao juiz que o seja.”

III – DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer:

a) Nulidade da audiência de instrução e todos atos subseqüentes;


b) Impugnação dos vídeos juntados como prova;
c) O declínio dos autos para vara competente;
d) Que seja enquadrado como crime culposo, art. 18, inciso II, do Código
Penal

Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 27 de Setembro de 2021.

Assinatura do Advogado

Número de inscrição na OAB

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