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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR-RELATOR DO TRIBUNAL

DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO-SP

Processo nº XXXXXXX

FULANO DE TAL, solteiro, brasileiro, portador da carteira de


identidade XXX, residente e domiciliado na rua xxx, nesta capital, por intermédio de seu
defensor constituído, conforme procuração anexa a este instrumento, vem respeitosamente
à presença de Vossa Excelência, opor

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

com fundamento no artigo 619 do Código de Processo Penal, diante


dos fatos e fundamentos a seguir:

1 - DOS FATOS

Conforme ocorrência policial já inserida nos autos, o acusado foi flagrado


dentro de sua residência com vários comprimidos de ecstasy. Também chamado de droga
do amor, o ecstasy é uma droga psicoativa, conhecida quimicamente como 3,4-
metilenodioximetanfetamina e abreviada por MDMA.

Os policiais civis que estavam fazendo a investigação, lastreada em denúncia


anônima, entraram em sua residência sem mandado judicial, valendo-se do conceito de que
o crime é classificado como permanente, podendo o flagrante ser dado a qualquer
momento e sem autorização judicial. Ademais, ingressaram na residência sem qualquer
consentimento do morador.

Com sua prisão em flagrante, Fulano de tal fora encaminhado para a audiência
de custódia que fora realizada um mês depois do fato. O fato se deu na comarca de São
Paulo/SP

Foi requerido o relaxamento da prisão em flagrante, tendo em vista que ela não
fora feita de forma legal, uma vez que se descumpriu o art. 310, caput, CPP, que exige o
prazo de 24 horas para a sua realização, bem como não estavam presentes os requisitos da
prisão preventiva, forte, ainda, que a investigação foi lastreada em denúncia anônima e o
flagrante foi feito sem observar os balizamentos jurisprudenciais de consentimento do
morador.

Todavia, o magistrado entendeu por bem decretar a prisão preventiva,


afirmando que o prazo de 24 horas é considerado impróprio e não merece ser seguido à
risca, além disso corroborou as declarações do Ministério Público de que o acusado é rico e
isso pode ensejar a prisão com base na garantia da ordem pública, bem como ele poderia
fugir do país e ameaçar testemunhas, em razão da sua excelente condição financeira.

Por fim, o magistrado entendeu que por tratar-se de crime permanente, o


flagrante poderia ser dado a qualquer tempo, independentemente de autorização judicial,
bem como que a inexistência de consentimento do morador para o ingresso em sua
residência constitui mera irregularidade.

Dessa forma, o réu foi preso preventivamente na cidade de São Paulo/SP,


enviando-se os autos para o Delegado de Polícia responsável, tendo sido o feito distribuído
para o juiz da 1ª Vara Criminal da Capital. Além disso, a autoridade policial não requereu a
realização do laudo definitivo.

Sendo assim, foi requerida a revogação da prisão preventiva, mas houve o


indeferimento e o Juiz determinou que o processo fosse para o Ministério Público. O
promotor de justiça responsável pelo caso requereu que a autoridade policial procedesse ao
relatório final, o que foi feito com o respectivo indiciamento. Nesse diapasão, foi oferecida
denúncia pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, na forma do artigo
71, CP, pois foram encontrados vários comprimidos na mesma ocasião fática. Após, o juiz
determinou, na data de 28 de abril de 2022, quinta-feira, que se intimasse a Defesa do
acusado para apresentar a peça processual cabível, sendo que tal intimação ocorrera em 29
de abril de 2022, sexta-feira.

Após, o Juiz determinou, na data de 28 de abril de 2022, quinta-feira, que se


intimasse a Defesa do acusado para apresentar a peça processual cabível, sendo que tal
intimação ocorrera em 29 de abril de 2022, sexta-feira. Apresentada a defesa preliminar, o
Magistrado recebeu a denúncia e determinou a realização da audiência de instrução e
julgamento.

Nessa audiência, seguindo os trâmites do artigo 57 da Lei nº 11.343/06, o Juiz


iniciou pela oitiva do acusado, depois ouviu as testemunhas de acusação e de defesa.
Encerrada a instrução, o Ministério 8 Público ofertou suas alegações finais escritas em
forma de memoriais e pediu a condenação do acusado pelo crime do artigo 33, caput, Lei
nº 11.343/06, na forma do artigo 71, CP, apontando que a inexistência de laudo definitivo
não impediria de imputar-se a condenação, eis que o Juiz poderá valer-se do laudo
preliminar ou de constatação. Após, os autos vieram com vista.

Após a instrução, com a juntada dos memoriais escritos, o processo foi


concluso ao Magistrado que decidiu por condenar o acusado a uma pena de 5 (cinco) anos
de reclusão com fundamento no artigo 33, caput, Lei nº 11.343/06, entendendo que o laudo
preliminar poderia ser utilizado para fins de condenação em substituição ao laudo
definitivo, e que não haveria nulidade pelo fato de os policiais terem ingressado no
domicílio sem mandado e sem consentimento expresso do morador, sendo mera
irregularidade. Além disso, decidiu-se por não aplicar a causa de diminuição prevista no
artigo 33, parágrafo 4º, Lei nº 11.343/06, em razão da quantidade elevada de drogas que
fora encontrada. Por fim, fixou o regime inicial fechado, forte na ideia de que o crime em
testilha é equiparado a hediondo, na forma da Lei nº 8.072/90, artigo 2º, parágrafo 1º.

Aviado o recurso de apelação, fora esse conhecido e no mérito desprovido,


tendo o Tribunal alegado que o crime de tráfico de drogas privilegiado não teria aplicação
no caso em tela, sem qualquer fundamentação. Ademais, entendeu o Egrégio Tribunal de
Justiça que o regime inicialmente fechado estava previsto em lei, podendo ser aplicado,
sendo omisso em relação aos demais pedidos impostos pela Defesa. Esse é o relatório,
naquilo que é pertinente.
3 – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

O Código de Processo Penal possui regramento específico para momentos em


que tais situações apresentam-se no caso concreto, devendo a interposição, por meio dos
embargos de declaração, ser o caminho correto para que se aclare aquilo que a parte
requer, na esteira do que dispõe a letra da lei, in verbis:

Art. 619. Aos acórdãos proferidos pelos Tribunais de Apelação, câmaras ou


turmas, poderão ser opostos embargos de declaração, no prazo de dois dias
contados da sua publicação, quando houver na sentença ambiguidade,
obscuridade, contradição ou omissão.

Art. 620. Os embargos de declaração serão deduzidos em requerimento de que


constem os pontos em que o acórdão é ambíguo, obscuro, contraditório ou
omisso.

§ 1o O requerimento será apresentado pelo relator e julgado, independentemente


de revisão, na primeira sessão.
§ 2o Se não preenchidas as condições enumeradas neste artigo, o relator
indeferirá desde logo o requerimento. (BRASIL, 1941, [s. p.])

Na forma proposta pela lei, a parte pode requerer que algum ponto que não fora
enfrentado pelo julgador seja feito mediante provocação por parte dos embargos de
declaração. Com o fito de tornar a questão rica com conhecimentos doutrinários, cita-se o
escólio do Professor Renato Brasileiro, nesses termos: “Toda decisão judicial deve ser
clara e precisa. Daí a importância dos embargos de declaração, cuja interposição visa
dissipar a dúvida e a incerteza criada pela obscuridade e imprecisão da decisão judicial”
(BRASILEIRO, 2020, p. 1840).

Acerca do cabimento dos embargos de declaração, tem-se acórdão do Superior


Tribunal de Justiça que bem ilustra a matéria, nesses termos:

PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO


REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. AVENTADA AUSÊNCIA DE JUSTA
CAUSA PARA A PERSECUÇÃO PENAL. PRESENÇA DE
MATERIALIDADE E DE AUTORIA DELITIVA. PRETENSÃO DE
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA
PELA NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. I - Nos termos do art.
619 do CPP, serão cabíveis embargos declaratórios quando houver ambiguidade,
obscuridade, contradição ou omissão no julgado. Não constituem, portanto,
recurso de revisão. II - Os embargos de declaração poderão ser acolhidos, ainda,
para correção de eventual erro material, consoante entendimento preconizado
pela doutrina e jurisprudência, sendo possível, excepcionalmente, a alteração ou
modificação do decisum embargado. III - O trancamento da ação penal constitui
medida de exceção, justificada apenas quando comprovadas, de plano, sem
necessidade de análise aprofundada de fatos e provas, inépcia da exordial
acusatória, atipicidade da conduta, presença de causa de extinção de punibilidade
ou ausência de indícios mínimos de autoria ou de prova de materialidade. 8 IV -
No caso, o eg. Tribunal de origem, ao analisar o habeas corpus originário,
consignou existirem elementos suficientes para a continuidade da ação penal,
salientando a presença, ao menos em tese, da materialidade e da autoria delitiva,
bem como ausentes quaisquer causas que justificassem o trancamento da ação
penal na via do mandamus. V - Ausente abuso de poder, ilegalidade flagrante ou
teratologia, o exame da existência de materialidade delitiva ou de indícios de
autoria demanda amplo e aprofundado revolvimento fático-probatório,
incompatível com a via estreita do habeas corpus, que não admite dilação
probatória, reservando-se a sua discussão ao âmbito da instrução processual.
Embargos de declaração acolhidos, apenas para suprir omissão, nos termos
acima delineados, sem efeitos infringentes.

Destarte, a oposição de embargos de declaração é possível no ordenamento


jurídico pátrio.

4 – DO MÉRITO- TRÁFICO PRIVILEGIADO

Houve clara omissão na decisão do E. TJSP, uma vez que os Desembargadores


não manifestaram de forma clara sobre o porquê da não aplicação da figura do tráfico
privilegiado, simplesmente não aplicaram a referida figura que a Defesa pugnou.

Assim, não há outra medida senão o aviamento do presente recurso com as


fundamentações jurisprudenciais do reconhecimento em situações similares do tráfico
privilegiado.

Nesse espeque, nota-se que a quantidade de drogas por si só não obsta ao


reconhecimento da minorante em testilha, na forma da lavra do Superior Tribunal de
Justiça, nestes termos:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS


PRIVILEGIADO. RECURSO MINISTERIAL. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES
CRIMINOSAS NÃO DEMONSTRADA. QUANTIDADE DA DROGA
APREENDIDA QUE NÃO EXTRAPOLAM O ÂMBITO DE PROTEÇÃO DA
NORMA E NÃO PERMITE PRESUMIR QUE O PACIENTE INTEGRAVA
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. 24,1G DE COCAÍNA. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O agravado foi preso em flagrante portando
61 porções de cocaína, com massa líquida de 24,1g e R$ 80,00 (oitenta reais) em
espécie. Circunstâncias que, nos termos da jurisprudência citada, não permitem
concluir que o paciente se dedicava a atividades criminosas ou que integrasse
organização criminosa. 13 2. "A quantidade de droga apreendida não é, por si só,
fundamento idôneo para afastamento da minorante do art. 33, § 4º, da Lei
11.343/2006" (RHC 138117 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma,
julgado em 15/12/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-062 DIVULG
/5/4/2021 PUBLIC 6/4/2021). 3. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no HC
713491, STJ).
4.1 - REGIME INICIALMENTE FECHADO-NÃO APLICAÇAO

Também nessa parte do acórdão houve obscuridade por não reconhecer a


inconstitucionalidade do regime inicialmente fechado, eis que tal matéria já está superada
na Corte Máxima e merece destaque o seu pensamento, a fim de fazer com que o E.TJSP
também reconheça tal situação no caso concreto.

Por todos, a Suprema Corte entendeu pela inconstitucionalidade do regramento


legal previsto na Lei nº 8.072/90, dessa forma:

EMENTA Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Crime praticado durante a


vigência da Lei nº 11.464/07. Pena inferior a 8 anos de reclusão. Obrigatoriedade de
imposição do regime inicial fechado. Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º
do art. 2º da Lei nº 8.072/90. Ofensa à garantia constitucional da individualização da pena
(inciso XLVI do art. 5º da CF/88). Fundamentação necessária (CP, art. 33, § 3º, c/c o art.
59). Possibilidade de fixação, no caso em exame, do regime semiaberto para o início de
cumprimento da pena privativa de liberdade. Ordem concedida.

1. Verifica-se que o delito foi praticado em 10/10/09, já na vigência da Lei nº 11.464/07, a


qual instituiu a obrigatoriedade da imposição do regime inicialmente fechado aos crimes
hediondos e assemelhados.

2. Se a Constituição Federal menciona que a lei regulará a individualização da pena, é


natural que ela exista. Do mesmo modo, os critérios para a fixação do regime prisional
inicial devem-se harmonizar com as garantias constitucionais, sendo necessário exigir-se
sempre a fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo ou
equiparado.

3. Na situação em análise, em que o paciente, condenado a cumprir pena de seis (6) anos de
reclusão, ostenta circunstâncias subjetivas favoráveis, o regime prisional, à luz do art. 33, §
2º, alínea b, deve ser o semiaberto.

4. Tais circunstâncias não elidem a possibilidade de o magistrado, em eventual apreciação


das condições subjetivas desfavoráveis, vir a estabelecer regime prisional 14 mais severo,
desde que o faça em razão de elementos concretos e individualizados, aptos a demonstrar a
necessidade de maior rigor da medida privativa de liberdade do indivíduo, nos termos do §
3º do art. 33, c/c o art. 59, do Código Penal.

5. Ordem concedida tão somente para remover o óbice constante do § 1º do art. 2º da Lei nº
8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/07, o qual determina que “[a] pena por
crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado “. Declaração
incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da obrigatoriedade de fixação do
regime fechado para início do cumprimento de pena decorrente da condenação por crime
hediondo ou equiparado. (HC 111840, STF).

Por esses termos, caberá ao Juiz fixar o regime inicial de cumprimento de pena
na forma do artigo 59, CP, forte no princípio da individualização das penas, devendo der
reconhecida, de forma cabal, a inconstitucionalidade da matéria em testilha.
5. DOS PEDIDOS

Por todo o exposto, respeitosamente, requer seja o presente recurso


conhecido e, no mérito, provido, na forma seguinte:

a) Preliminarmente, seja reconhecida a existência de obscuridade e omissão quanto


aos temas acima tratados para, posteriormente;
b) Ser feito o reconhecimento da figura do tráfico privilegiado;
c) E para que seja reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 2º, parágrafo 1º, Lei
nº 8.072/90.

Nesses termos, pede deferimento.

São Paulo, 06 de julho de 2022.

ASSINATURA ADVOGADO
OAB Nº

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