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Nome: Joana Clara Freire Ribeiro

Número: 2020118128

Prova de Historiografia
I – Este excerto é retirado da obra Esboço de um Quadro Histórico dos Progressos do
Espírito Humano, uma obra da autoria do filósofo e matemático francês Condorcet
(1743-1794). Trata-se de uma obra que foi escrita num período de grande agitação
social e política, pois foi elaborada durante a revolução francesa, e mais precisamente
durante um período no qual o seu autor se encontrava em fuga ou preso em virtude de
perseguição à sua pessoa no contexto dessa mesma revolução.

A obra mencionada é composta pela concretização das concepções centrais


iluministas acerca da concepção da história e foca-se na ideia de uma ascensão
permanente em direcção ao progresso do espírito humano. Apesar de ter sido escrita
num período de grande agitação social (conforme já referimos) ela exprime uma visão
optimista acerca do espírito humano. Esta obra de Condorcet foi talvez a formulação
mais influente da ideia de progresso já escrita. Ela fez da ideia de progresso uma
preocupação central do pensamento iluminista. Nesta obra Condorcet argumentou que
expandir o conhecimento nas ciências naturais e sociais levaria a um mundo cada vez
mais justo de liberdade individual, riqueza material e compaixão moral. Ele defendeu
três proposições gerais: que o passado revela uma ordem que pode ser entendida em
termos do desenvolvimento progressivo das capacidades humanas, mostrando que o
estado presente da humanidade, e aqueles por onde passou, são uma constituição
necessária da composição moral da humanidade; que o progresso das ciências naturais
deve ser seguido pelo progresso nas ciências morais e políticas; que os males sociais são
o resultado da ignorância e do erro, e não uma consequência inevitável da natureza
humana. Ou seja, Condorcet considera três tópicos fundamentais: a destruição da
desigualdade entre as nações, a destruição das desigualdades entre o mesmo povo e o
aperfeiçoamento do homem. É no contexto destas conclusões gerais alcançadas por
Condorcet que podemos comentar o excerto apresentado. Quando Condorcet questiona
que “O único fundamento de crença nas ciências naturais é a ideia de que as leis gerais,
conhecidas ou ignoradas, que regem os fenómenos do universo, são necessárias e
constantes; e por que razão este princípio seria menos verdadeiro para o
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desenvolvimento das faculdades intelectuais e morais do homem do que para as outras
operações da natureza?”, o que Condorcet consegue é projectar no futuro as suas ideias,
o progresso do espírito humano e a própria ideia de progresso. Ou seja, o que Condocert
afirma é que se o homem pode prever os acontecimentos futuros, o homem também
pode traçar as linhas do futuro da espécie humana a partir dos seus resultados históricos.
Temos o paradigma das ciências da natureza que mostra que as leis necessárias e
constantes são transponíveis para o campo das ciências humanas. O que este excerto
também nos transmite é que para Condorcet não existe limitação natural para colocar
termos às esperanças de progresso pois se o homem consegue prever os fenómenos
históricos, sociais e políticos tal como consegue prever os fenómenos naturais, então
tem na sua mão a chave que lhe abrirá a porta de um mundo de abundância e progresso
social, político, económico, moral, etc. E essa chave é precisamente o conhecimento da
história e da historiografia, pois este permitir-lhe-á conhecer as leis gerais que
possibilitam essa previsão de fenómenos históricos, sociais e políticos. Tal é a opção e a
inclinação natural do homem. São estes os motivos da afirmação de Condorcet de que
“acharemos, nas experiências do passado, na observação dos progressos que as ciências
e a civilização fizeram até aqui, na análise da marcha do espírito humano e do
desenvolvimento das suas faculdades, os motivos mais fortes para acreditar que a
natureza não pôs nenhum termo às nossas esperanças”.

Concluindo, os escritos de Condorcet foram uma contribuição fundamental para o


iluminismo francês do século XVIII, particularmente o seu trabalho sobre a ideia de
progresso. Condorcet frequentemente escreveu sobre a sua fé na própria humanidade e a
sua capacidade de progredir com a ajuda de filósofos como Aristóteles. Por meio dessa
acumulação e compartilhamento de conhecimento, ele acreditava que era possível para
qualquer homem compreender todos os factos conhecidos do mundo natural. A
iluminação do mundo natural estimulou o desejo de iluminação do mundo social e
político. Condorcet acreditava que não havia definição da existência humana perfeita e,
portanto, acreditava que a progressão da raça humana continuaria inevitavelmente ao
longo da nossa existência. Ele imaginou o homem progredindo continuamente. No
entanto, ele enfatizou que para que essa seja uma possibilidade o homem deve unificar-
se independentemente de raça, religião, cultura ou género. No século XVIII há a
tentativa de ver a história à escala planetária. Há a utopia de que nos tempos vindouros
as civilizações humanas se nivelarão na ideia de progresso. Esta concepção terá fim nos
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meados do século XX quando se percebe que o homem pode colocar fim à sua própria
espécie, mas estas concepções iluministas de Condorcet e de outros autores
influenciarão o século XIX e a primeira metade do século XX, a sua historiografia e o
seu pensamento.

II

2. – Concordamos com a afirmação de que o século XIX é “o século da História”.


Existem um conjunto de razões para isso. Neste século dá-se a proliferação de correntes
historiográficas, vão verificar-se grandes avanços na disciplina de história e nos
métodos de a praticar bem como na multiplicação de publicações historiográficas. Sem
os progressos na interpretação era impossível dar os passos que foram dados no
progresso da história no século XIX. O iluminismo do século anterior não deteve um
domínio absoluto da historiografia. A reacção é o romantismo feito em nome do
primado do sentimento contra o primado da razão. O romantismo vai manifestar
nostalgia pelo passado e vai haver uma ligação estreita com a história. Existe no
romantismo uma visão idílica das sociedades passadas e uma preferência pela Idade
Média como época de harmonia e por retratar os aspectos mais importantes em termos
de sentidos de uma época histórica. Scott (1771-1832) funda o género do romance
histórico que ficciona acontecimentos históricos e lhe adiciona componentes do
sentimento. Michelet (1798-1874) e Herder (1744-1803), com ideias sobre a filosofia da
história da humanidade, são autores românticos. Dumas (1803-1870) também foi autor
de romances históricos como Os Três Mosqueteiros.

De seguida veio um outro movimento que se opõe ao romantismo que é o


positivismo. Esta corrente não é exclusivamente historiográfica. O positivismo
estabelece o primado da razão, ele vai reatar a tradição iluminista. Há a concepção de
que a sociedade está submetida a leis como as leis naturais. Os documentos históricos
revelam-nos os factos históricos independentemente de qualquer filosofia orientadora. A
busca de leis para compreender os mecanismos sociais não pode estar dependente de
filosofias. Há um optimismo no século XIX motivado pelos progressos do
conhecimento ocorrido nas ciências naturais. Se há possibilidade de prever os
fenómenos da natureza também se podem prever leis para o desenvolvimento da
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sociedade. Comte (1798-1857) fundou o positivismo. O seu modelo de história é uma
história com objectivos científicos de procura das leis que regem o desenvolvimento
social da espécie humana. Essas leis permitiriam a previsão dos eventos sociais.
Segundo o positivismo, o método sociológico é independente de qualquer filosofia, pois
a sociologia apoia-se nalgum sistema do qual se torna solidária quando deveria ser
simplesmente sociologia. Segundo a mesma corrente, o princípio da causalidade aplica-
se aos fenómenos sociais. Uma vez que a lei da causalidade se verifica noutros ramos da
natureza temos de admitir que é igualmente válida para o mundo social. A sociologia
vai-se destacar do conhecimento filosófico geral. Há um retomar e aprofundar do
determinismo. A história como disciplina é a ciência dos documentos de onde se faz a
construção histórica. Há a defesa do método objectivo ao longo de todas as fases da
investigação e a defesa da objectividade sem ideias a priori. O método deve ser
aplicado exclusivamente à sociologia e um facto social não pode ser explicado senão
por outro facto social. A sociologia não é um anexo de outra ciência, ela é uma ciência
distinta e autónoma. Esta perseguição da objectividade e recusa da influência política,
ideológica vai estar na origem do método histórico. Pra o estabelecimento do método
histórico vão ser essenciais os progressos historiográficos que se vão dar na Alemanha
com sínteses explicativas dos acontecimentos.

Uma corrente da historiografia alemã não tem a preocupação de encontrar leis na


história, mas sim de mostrar as coisas tal e qual se passaram. Trata-se de rejeitar os
factos e documentos falsos fazendo a selecção dos verdadeiros. Há a busca das fontes, a
localização das fontes, a crítica histórica e a síntese da construção histórica que é o
estabelecimento da causalidade com o facto histórico. Há a heurística, a crítica interna e
externa. Tal é válido para as disciplinas que consideram a história como disciplina
científica, mas também para aquelas que não a consideram assim como é o caso do
Historismus. Enquanto o positivismo é objectividade e determinismo, o Historismus é
mais espiritualista. A força deste método é definir de forma objectiva o método
histórico.

O século XIX vai conhecer a melhoria das condições materiais. A construção dos
nacionalismos na composição do estado-nação vai estar ligada ao conhecimento
histórico, há uma mobilização e instrumentalização da historiografia para justificar
essas construções. Procura-se na Idade Média e nas lendas do folclore a origem desses

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estados-nação. Há uma especialização do objecto de estudo e os estados vão valorizar a
história e vão aperfeiçoar as condições de quem trabalha na área da história. O século
XIX vai dar aos museus, arquivos e bibliotecas uma visibilidade que não tinham até
então. Vai dar uma grande importância ao coleccionismo e aos vestígios das
civilizações do passado. Vai haver uma multiplicação das universidades que integram o
estudo da história. Também a arqueologia terá um enorme desenvolvimento no século
XIX. Com Schliemann a história ganha um estatuto de autonomia, rigor e
independência. Temos assim uma perspetiva positivista que domina os historiadores
para encontrar apenas os factos e temos o Historismus que é uma perspectiva espiritual
da história. No entanto, o objectivismo dos positivistas também tem o seu lado
subjectivo porque as perguntas que se fazem ao objecto histórico variam de historiador
para historiador.

O historicismo faz uma distinção entre ciências naturais (que são redutíveis a leis
constantes, universais, objectivas e são disciplinas nomotéticas) e a história (que é uma
disciplina ideográfica de ideias e factos únicos como oposição a leis gerais). A história
dependia da intuição do historiador e é subjectiva em oposição às leis objectivas. Esta
corrente afirma que não é possível uma interpretação sistémica da história e apesar de a
considerar uma disciplina de rigor não a considera uma ciência.

No século XIX nasce ainda a historiografia marxista. Os seus fundadores foram


os alemães Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). Para além dos
marcos historiográficos, estes autores têm uma análise jornalística muito significativa
sobre temas da sua actualidade. Assenta sobretudo no método de análise centrado na
infraestrutura material da sociedade (materialismo histórico). Considera uma filosofia
da história com a luta de classes como seu motor, dá predominância ao modo de
produção e às relações sociais pois a estrutura económica da sociedade é aquela sobre a
qual se ergue a superestrutura política e jurídica da sociedade: esclavagismo, feudalismo
e capitalismo. A historiografia marxista dá relevo à acção das classes sociais, à
valorização da história económica, aos fenómenos sociais, às crises de produção, ao
estudo dos instrumentos de trabalho, à cultura material. Há a sistematização dos
conceitos, como os de estrutura e conjuntura. Vai ter enorme repercussão pela atenção
conferida a aspectos da vida social, à história política e económica. Há o interesse pelas
estruturas da sociedade, pelo colectivo em detrimento do individual, há a quantificação

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aplicada à história social. Estas influências reflectem-se em autores marxistas e não-
marxistas. Já no século XX há dois acontecimentos que catapultam a historiografia
marxista para um nível de atenção de grande relevância: a revolução russa de 1917 (e o
interesse prático que ela suscitou ao nível de interpretação histórica) e a crise de 1929
(que confirmaria os diagnósticos de Marx sobre a inevitabilidade das crises económicas
capitalistas). Há uma sequência entre o determinismo racionalista, o determinismo
positivista e o determinismo marxista. No século XX há a continuação de muitas das
correntes historiográficas do século XIX.

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