Você está na página 1de 7

TRADUÇÃO:

Renfrew, C; BAHN, P. Arqueología: teorías, métodos y práctica. Thames and Hudson,


1991. p. 110-114.

Tradução de Keidy Narelly Costa Matias.

Versão original disponível aqui.

Sequências tipológicas

Quando observamos os artefatos, edifícios e quaisquer das criações do homem


que nos rodeiam, a maioria de nós pode ordenar algumas delas em uma sequência
cronológica aproximada. Um tipo de aeronave aparenta ser mais antigo do que outro,
um conjunto de roupas parece estar mais "ultrapassado na moda" do que o seguinte.
Como os arqueólogos exploram esta capacidade de datação relativa?

Como vimos no Capítulo 3, a forma de um artefato, como por exemplo, um


vaso, pode se definir por seus atributos específicos de material, forma e decoração.
Vários vasos com os mesmos atributos constituem um tipo e a tipologia agrupa os
artefatos a esses tipos. Há dois conceitos novos que servem de base à ideia de elaborar
uma datação relativa mediante a tipologia.

O primeiro, é que os produtos de um determinado período e lugar tem um


estilo reconhecível: devido à sua forma e decoração distintas são, em certo sentido,
característicos da sociedade que os criou. Este aspecto se abordará com mais detalhes
nos Capítulos 5 e 10. O arqueólogo e o antropólogo frequentemente podem reconhecer e
classificar os artefatos segundo seu estilo e, baseando-se neste, lhes atribuir à um lugar
concreto dentro de uma sequência tipológica.

O segundo conceito, é que a mudança estilística (de forma e decoração) dos


artefatos geralmente é muito gradual e evolutiva. Naturalmente, esta ideia procede da
teoria darwinista de evolução das espécies, adotada pelos arqueólogos do século XIX,
que se deram conta de que implicava numa norma muito prática: "cada ovelha com sua
parelha". Em outras palavras, os artefatos concretos (por exemplo, os punhais de
bronze) fabricados aproximadamente na mesma época geralmente serão similares,
enquanto que os criados com uma diferença de vários séculos serão diferentes devido a

1
centenas de anos de evolução. O resultado é, portanto, que quando nos enfrentamos à
uma série de punhais de data desconhecida, será lógico que os ordenemos primeiro em
uma sequência, de forma que os mais parecidos se situem uns juntos aos outros. Em
consequência, é provável que esta seja a sequência cronológica correta, e a que reflita
no possível princípio de "cada ovelha com sua parelha".

Estes argumentos foram aperfeiçoados por muitos arqueólogos, que


descobriram que se podiam estabelecer cronologias relativas para distintas classes de
artefatos procedentes de regiões diferentes. O grande mestre do "método tipológico" foi
o estudioso sueco do século XIX Oscar Montelius, que formulou cronologias relativas
locais para muitas das zonas da Europa da Idade do Bronze, fazendo uso de séries
completas de formas de ferramentas e de armas de bronze. Estas sequências regionais,
na maioria dos casos, puderam ser confirmadas, em suas linhas gerais, mediante
escavações estratigráficas em que se redescobriu que as formas mais simples eram, de
fato, as mais antigas. Montelius passou a usar também os mesmos argumentos em
relação ao espaço, para demonstrar como os tipos de artefatos de uma região influíram
sobre os de áreas adjacentes. Desta forma, partindo de certas suposições sobre a direção
da influência, estabeleceu uma cronologia relativa das formas e dos instrumentos e
armas para o conjunto da Europa na Idade do Bronze. (A suposição sobre a direção da
influência – o princípio de que o progresso teve sua origem no Oriente Próximo e dali
se estendeu – tem sido posto em dúvida e, em parte, desmentido por trabalhos mais
recentes. No entanto, em outros aspectos, o sistema de Montelius para a Idade do

2
Bronze europeia se utiliza de forma eficaz do modo como reformulou o pré-historiador
alemão Paul Reinecke, entre outros).

Para muitos propósitos, segue


sendo certo que o melhor modo de se
assinalar uma data relativa de um artefato é
comparando-o com outro já identificado
dentro de um sistema tipológico estável. Na
Europa, isto é exato no que diz respeito aos
objetos da Idade do Bronze, no entanto, a
nível mundial, se aplica de um modo muito
mais geral. Enquanto no Paleolítico, a
primeira datação (relativa) aproximada de
um estrato procederá frequentemente de um
exame das ferramentas líticas encontradas
em seu interior: os bifaces implicam que é
do Paleolítico Inferior (ou Médio, em menor
medida); as lâminas, do Paleolítico Superior.
Para os períodos posteriores, as tipologias
cerâmicas geralmente são a pedra angular do
sistema cronológico. São bons exemplos os
estudos detalhados da cerâmica grega do
período micênico realizados pelo arqueólogo
sueco Arne Furumark e seus discípulos e a
sequência cerâmica estabelecida para os
índios Pueblo do sudoeste americano.
Contudo, quase todas as áreas tem sua
própria série cerâmica estável. Se a
associarmos à sequência estratigráfica dos
depósitos que podem ser datados por
radiocarbono ou outro método absoluto,
então podemos assinalar datas absolutas em
anos aos artefatos da sequência tipológica.

3
Vale a pena destacar que os diferentes tipos de artefatos mudam de estilo
(decoração e forma) em ritmos diferentes e, portanto, as diferenciações cronológicas
que indicam, variam. Por exemplo, as mudanças na decoração da cerâmica Micênica
pintada, antes mencionada, podem ter sido produzidas num intervalo de 20 anos,
enquanto que outros tipos de cerâmica decorada duraram, muitas vezes, mais de um
século. A cerâmica lisa pode conservar quase a mesma forma durante vários séculos.
Em geral, a decoração superficial da cerâmica muda mais rapidamente que a forma e
constituem, portanto, um atributo cronologicamente mais sensível para utilizar em uma
sequência tipológica. A forma de um vaso ou recipiente pode, em qualquer caso, sofrer
com mais força as influências de uma necessidade prática, como o armazenamento
d'água, que não tem porque se alterar em centenas de anos.

Outros artefatos como armas ou utensílios de metal, podem variar em seu estilo
com bastante rapidez e, portanto, serem indicadores cronológicos úteis. Ao contrário, a
forma dos instrumentos líticos, como os bifaces, geralmente mudam com grande
lentidão e, em consequência, raras vezes é um indicador sensível do passar do tempo.

Seriação

As implicações do princípio de "cada ovelha com sua parelha" se tem


desenvolvido mais para fazer frente às associações de objetos (indústrias) do que às
formas dos objetos concretos considerados de forma isolada. Esta técnica de seriação
permite ordenar os conjuntos de artefatos em uma sucessão, ou ordenação seriada, que
logo se aplica para determinar sua ordenação temporal: portanto, é um exercício de
cronologia relativa. Tem-se utilizado duas versões desta técnica: a seriação contextual e
a seriação de frequência.

• Seriação contextual:

Aqui, o que determina a seriação é a duração dos diferentes estilos de artefatos


(forma e decoração). O pioneiro deste método foi Flinders Petrie. Trabalhando em
"Diospolis Parva1", no Alto Egito, em finais do século XIX, escavou várias tumbas pré-

1
Situada próximo à Dendera.

4
dinásticas que não podiam ser relacionadas estratigraficamente entre si, nem incluir-se
dentro das litas de reis pré-históricos do período dinástico posterior. Petrie queria
ordenar cronologicamente as tumbas, de modo que começou a inventariar seus
conteúdos. Assinalou, para cada tumba, uma ficha de papel independente com a lista de
seus tipos de artefatos. Depois, Petrie colocou as fichas paralelamente entre si, uma
sobre a outra, formando uma coluna e seguiu reordenando suas posições acima e abaixo
na coluna. Pensou que a ordem mais adequada seria aquela em que o maior número de
tipos distintos tivesse uma duração mais breve nas fichas. Desta forma chegou a uma
sequência de conjuntos – e, portanto, de tumbas – dispostos no que considerou uma
ordem cronológica relativa.

Os trabalhos posteriores no Egito têm reivindicado à Petrie e têm demonstrado


que, geralmente, sua ordenação de tumbas em série reflita, de fato, sua sequência
cronológica real.

• Seriação de frequência:

Os arqueólogos americanos que trabalharam em assentamentos maias de


Yucatán nos anos quarenta, se enfrentaram a um problema similar – a carência de
qualquer informação cronológica externa. Seus materiais se compunham de conjuntos
cerâmicos que tinham sido recuperados fora de um contexto estratigráfico. Era

5
necessário situá-los em uma ordem sucessiva para construir uma cronologia relativa dos
edifícios e monumentos associados a eles.

A solução foi a seriação de frequências, que se apoia principalmente na


medição das mudanças na abundância, ou frequência, proporcional de um estilo
cerâmico.

Os dois princípios subjacentes ao método foram expostos em um artigo


clássico de W. S. Robinson e em outro de G. W. Brainerd, ambos publicados na
American Antiquity, em 1951. Em primeiro lugar, eles assumiram que os estilos
cerâmicos se fazem cada vez mais populares, alcançam notoriedade e logo se
desvanecem (fenômeno que dá origem a um diagrama com forma similar a de um navio
de guerra visto de cima – daí o nome que é habitualmente designado, encouraçado).

Em segundo lugar, argumentaram que, em dado período temporal, um estilo


popular de vaso em um depósito, também o seria em outro. Deste modo, se o estilo em
questão representasse 18% da cerâmica encontrada no depósito A em um determinado
período, a cerâmica do depósito B, para o mesmo período, teria uma porcentagem de
frequência de estilo similar.

Baseando-se nessas suposições, Robinson e Brainerd objetivaram inserir os


conjuntos em uma sequência tal, que aqueles que tivessem as porcentagens mais
parecidas de certos estilos de vasos estiveram sempre juntos. A validade cronológica do
método tem sido demonstrada por arqueólogos americanos, como James A. Ford, que
trabalhava no sudeste americano e por Frank Hole, no Irã. Tanto Ford quanto Hole

6
estudaram conjuntos cerâmicos todos procedentes de escavações estratigráficas.
Puderam comparar sequências obtidas mediante a seriação de frequência com as séries
estratigráficas reais das escavações. Não havia contradições sérias.

Contudo, deve ser lembrado que a seriação não nos diz por si só qual
extremidade de uma sequência dada é a inicial e qual é a final - a cronologia real tem de
se determinar por outros meios, com suas conexões com as sequências estratigráficas já
mencionadas.

Você também pode gostar