Você está na página 1de 24

Márcio André Lopes Cavalcante

Processos excluídos deste informativo esquematizado por não terem sido concluídos em virtude de pedidos de vista ou
sobrestamento: ADI 4650/DF; RE 565089/SP; RHC 117752/DF; HC 119314/PE.

Julgados excluídos por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em
peculiaridades do caso concreto: MS 28279 ED/DF; RHC 120356/DF.

ÍNDICE
Direito Constitucional
 CE pode prever que compete à ALE autorizar empréstimos, acordos e convênios que acarretem encargos ou
compromissos gravosos ao patrimônio estadual.
 CE não pode exigir autorização da ALE para que o Governador (ou o Vice) se ausente do país qualquer que seja o prazo.
 CE não pode atribuir iniciativa da lei de organização judiciária ao Governador do Estado nem prever a criação de
Conselho Estadual de Justiça.
 Lei estadual pode regular procedimento para homologação judicial de acordo de alimentos com a participação da
Defensoria Pública.
 Estado-membro tem competência para legislar sobre procedimentos do IP desde que não viole as normas gerais
da União.
 Lei estadual não pode fixar prioridades na tramitação dos processos judiciais.

Direito Administrativo
 Inconstitucionalidade de efetivação de substituto em cartório após a CF/88.

Direito Civil
 A capacidade de suceder é regida pela lei da época da abertura da sucessão.

Direito Processual Penal


 Tramitação direta do IP entre Polícia e MP.
 Impossibilidade de se manter o valor da fiança sem analisar a situação econômica do agente.

DIREITO CONSTITUCIONAL

CE pode prever que compete à ALE autorizar empréstimos, acordos e convênios que acarretem
encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio estadual

É constitucional norma da Constituição estadual que preveja que “compete privativamente à


Assembleia Legislativa autorizar e resolver definitivamente sobre empréstimo, acordos e
convênios que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio estadual.”
STF. Plenário. ADI 331/PB, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1


A Constituição do Estado da Paraíba prevê o seguinte:
Art. 54. Compete privativamente à Assembleia Legislativa:
XXII - autorizar e resolver definitivamente sobre empréstimo, acordos e convênios que acarretem encargos
ou compromissos gravosos ao patrimônio estadual.

ADI contra esse dispositivo


O Governador do Estado ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade alegando que essa norma
ofende o inciso I do art. 49 e os arts. 51 e 52 da CF/88.
Esses artigos tratam sobre as competências do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal e em nenhum momento dizem que o Parlamento federal terá que autorizar acordos e
convênios que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio estadual.
Assim, para o autor, o constituinte estadual violou o princípio da simetria ao estabelecer, em nível
estadual, regra que não encontra correspondência no parâmetro da Constituição Federal.

O que o STF decidiu? A norma impugnada é inconstitucional?


NÃO. O Plenário julgou improcedente a ADI proposta.

De fato, o art. 49, I, da CF/88 prevê, como competência exclusiva do Congresso Nacional, resolver sobre
acordos ou tratados internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.
A CE/PB vai além e prevê que a Assembleia Legislativa tem o poder de autorizar e resolver empréstimos,
acordos e convênios que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio estadual.
Os Ministros entenderam que a intenção do constituinte estadual em conferir maior controle dessas
operações à Assembleia Legislativa não é irrazoável.
De igual forma, essa previsão não viola a separação dos poderes. Ao contrário, o fortalecimento do
controle desses atos implica prestigiar os mecanismos de checks and balances, não caracterizando invasão
de competências.

Princípio da simetria
Segundo o princípio ou regra da simetria, o legislador constituinte estadual, ao elaborar as normas da
Constituição estadual sobre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e sobre as regras do pacto
federativo, deverá observar, em linhas gerais, o mesmo modelo imposto pela Constituição Federal, a fim
de manter a harmonia e independência entre eles.
Ex: a CE não pode estabelecer que o projeto de lei para a criação de cargos na administração pública
estadual é de iniciativa parlamentar. Tal previsão violaria o princípio da simetria, já iria de encontro ao
modelo federal imposto pelo art. 61, § 1º, I, “b”, da CF/88.
O princípio da simetria não está previsto de forma expressa na CF/88. Foi uma criação pretoriana, ou seja,
idealizado pela jurisprudência do STF.
Alguns Ministros invocam como fundamento normativo para a sua existência, o art. 25 da CF e o art. 11 do
ADCT, que determinam aos Estados-membros a observância dos princípios da Constituição da República.

Princípio da simetria não é absoluto


O Min. Gilmar Mendes faz a ressalva de que
“Esse princípio da simetria, contudo, não deve ser compreendido como absoluto.
Nem todas as normas que regem o Poder Legislativo da União são de absorção necessária pelos Estados.
As normas de observância obrigatória pelos Estados são as que refletem o inter-relacionamento entre os
Poderes. Assim, uma vez que a regra dizia apenas com a economia interna do Legislativo estadual, o STF
julgou válida a norma da Constituição de Rondônia que permitia a reeleição da mesa diretora da
Assembléia Legislativa. Há, ainda, casos em que o preceito federal não constitui modelo para o Estado, não
podendo ser para ele transposto.” (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo
Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 1ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 864).

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 2


O ex-Ministro Cezar Peluso afirmava que “a invocação da regra da simetria não pode, em síntese, ser
produto de uma decisão arbitrária ou imotivada do intérprete.” (ADI 4.298-MC). Só se pode alegar violação
a esse princípio quando a regra estadual gerar uma contradição insuperável com a CF/88.

Não houve violação ao princípio da simetria


No caso concreto, o STF entendeu que não houve violação ao princípio da simetria, pois a Constituição
estadual apenas complementou o texto federal.
Nesse sistema de complementaridade, pode ser bsalutar que o constituinte estadual faça algumas inovações
que poderão até mesmo, futuramente, influenciar modificações no texto da CF por meio de emendas.
O Min. Gilmar Mendes afirma que “é preciso dar espaço a oficinas e experimentos no âmbito do poder
constituinte estadual.”
Na opinião dos Ministros, a inovação da constituição paraibana não atenta contra os marcos fundamentais
da Carta Magna, mas, antes, procura tornar ainda mais efetivos os comandos constitucionais do equilíbrio
entre os poderes e do controle republicano dos compromissos públicos.

CE não pode exigir autorização da ALE para que o Governador (ou o Vice) se ausente do país
qualquer que seja o prazo

É inconstitucional norma da Constituição estadual que exija autorização da Assembleia


Legislativa para que o Governador e o Vice possam se ausentar do país por menos de 15 dias.
A CE somente poderia prever a autorização se a ausência fosse superior a esse prazo.
STF. Plenário. ADI 775/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 3/4/2014.
STF. Plenário. ADI 2453/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 3/4/2014.

Imagine que determinada Constituição Estadual preveja o seguinte:


Art. 53. Compete exclusivamente à Assembleia Legislativa, além de outras atribuições previstas nesta
Constituição:
(...)
IV - autorizar o Governador e o Vice-Governador a afastar-se do Estado por mais de quinze dias, ou do País
por qualquer tempo;

Art. 81. O Governador e o Vice-Governador não poderão, sem licença da Assembleia Legislativa, ausentar-
se do País, por qualquer tempo, nem do Estado, por mais de quinze dias, sob pena de perda do cargo.

Essa previsão é compatível com a CF/88?


NÃO. Os dispositivos acima são inconstitucionais nas partes que foram assim destacadas.

O STF entendeu que tais previsões violam o princípio da separação dos poderes.
O legislador constituinte estadual excedeu-se, ao prever que a ausência do Governador ou do Vice para o
exterior por qualquer tempo deve ter prévia autorização da Assembleia Legislativa.
Essa regra de “por qualquer tempo” está em desacordo com o parâmetro estabelecido pela CF/88,
considerando que, para o Presidente da República, somente se exige autorização do Congresso Nacional
se a ausência for superior a 15 dias. Desse modo, houve violação ao princípio da simetria. Confira:
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
III - autorizar o Presidente e o Vice-Presidente da República a se ausentarem do País, quando a ausência
exceder a quinze dias;

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 3


CE não pode atribuir iniciativa da lei de organização judiciária ao Governador do Estado nem
prever a criação de Conselho Estadual de Justiça

É inconstitucional norma da Constituição estadual que preveja que a iniciativa da Lei de


organização judiciária é do Governador do Estado.
É inconstitucional norma da Constituição estadual que institua a criação de órgão de controle
administrativo do Poder Judiciário do qual participem representantes de outros Poderes ou
entidades.
STF. Plenário. ADI 197/SE, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014.

A Constituição do Estado de Sergipe previa o seguinte:


 A iniciativa das leis que disponham sobre a organização judiciária é do Governador do Estado (art. 61, III).
 Fica instituído o Conselho Estadual de Justiça, órgão de controle externo do Poder Judiciário e do
Ministério Público, que será composto por membros indicados pela Assembleia Legislativa, pelo
Judiciário, pelo MP e pela OAB (art. 115).

Essa previsão é compatível com a CF/88?


NÃO. O STF considerou que essas normas violam a autonomia e a independência do Poder Judiciário, o
que afronta o princípio da separação dos Poderes.

Iniciativa da lei de organização judiciária


Segundo o § 1º do art. 125 da CF/88, a lei de organização judiciária nos Estados é de iniciativa do Tribunal
de Justiça. Logo, não pode a Constituição estadual atribuí-la ao Governador.

Conselho Estadual de Justiça


Quanto ao Conselho Estadual de Justiça, vale a pena mencionar o enunciado 649 do STF:
Súmula 649-STF: É inconstitucional a criação, por Constituição estadual, de órgão de controle
administrativo do Poder Judiciário do qual participem representantes de outros Poderes ou entidades.

Esse enunciado afirma que é vedada a criação, nos Estados-membros, de Conselho Estadual de Justiça,
com a participação de representantes de outros Poderes ou entidades, considerando que isso viola o
princípio da separação dos Poderes (art. 2º, da CF/88).

Deve-se esclarecer que o raciocínio dessa Súmula 649 não pode ser aplicado para o Conselho Nacional de
Justiça, uma vez que, segundo decidiu o STF, o CNJ é um órgão interno do Poder Judiciário (art. 92, I-A, da
CF/88) e em sua composição apresenta maioria qualificada de membros da magistratura (art. 103-B).

Além disso, o Poder Legislativo estadual, ao contrário do Congresso Nacional, não possui competência
para instituir conselhos, internos ou externos, para fazer o controle das atividades administrativas,
financeiras e disciplinares do Poder Judiciário. O STF afirmou que o Poder Judiciário é nacional e, nessa
condição, rege-se por princípios unitários enunciados pela CF (STF ADI 3367, julgado em 13/04/2005).

Em suma, o CNJ é constitucional, mas os Estados-membros não podem criar Conselhos Estaduais de Justiça.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 4


Lei estadual pode regular procedimento para homologação judicial de acordo de alimentos com
a participação da Defensoria Pública

Importante!!!
É constitucional lei estadual que regula procedimento para homologação judicial de acordo
sobre a prestação de alimentos firmada com a intervenção da Defensoria Pública. Isso porque
tal legislação está inserida na competência concorrente (art. 24, XI, da CF/88).
STF. Plenário. ADI 2922/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014.

Lei estadual do Rio de Janeiro:


A Lei n. 1.504/89-RJ trata sobre homologação judicial de acordo sobre pensão alimentícia. Veja o que ela
diz em linhas gerais:
Art. 1º O acordo sobre a prestação de alimentos, entre pessoas ao amparo da Lei nº 1060, de 5 de
fevereiro de 1950, firmado com a intervenção da Defensoria Pública, será apresentado no Juízo
competente para homologação, emprestando-lhe força executória.
Art. 2º O Defensor Público terá a iniciativa de promover, junto ao Juízo competente a designação de dia e
hora para a audiência dos interessados e eventual homologação do acordo.
§ 1º - O Juiz pode recusar a homologação se comprovar que o acordo não preserva suficientemente os
interesses a que se refere ou se tiver fundada dúvida sobre a liberdade de consentimento de qualquer dos
interessados no acordo.
(...)
Art. 3º - Homologado o acordo será, se for o caso, dirigido ofício, a quem de direito, para o desconto em
folha de pagamento do valor da pensão acordada.
Art. 4º - A pensão se fixará em valor corrigível monetariamente, nos termos do art. 22 e seu parágrafo da
Lei nº 6515, de 26 de dezembro de 1977, e a sua modificação, revisão ou exoneração só se fará ação
judicial própria.

ADI 2922/RJ
O Procurador-Geral da República ajuizou uma ADI contra essa lei, alegando que ela conteria uma
inconstitucionalidade formal por violar a competência privativa da União para legislar sobre direito civil e
processual civil (art. 22, I, da CF/88).

O STF concordou com o pedido? A referida Lei é inconstitucional?


NÃO.

Para o STF, a Lei impugnada não dispõe sobre Direito Civil e Processual Civil. Na verdade, a Lei fluminense
trata sobre critérios procedimentais em matéria processual. A competência para editar normas sobre
procedimento é concorrente, conforme prevê o art. 24, XI:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
XI - procedimentos em matéria processual;

Dessa feita, em matéria de procedimento, cabe à União estabelecer as normas gerais (art. 24, § 1º) e os
Estados têm competência para suplementar, ou seja, complementar (detalhar) essas normas gerais.

Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para
atender a suas peculiaridades (art. 24, § 3º).

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 5


A competência legislativa concorrente, nesse aspecto, tem o condão de transformar os Estados-membros
em verdadeiros laboratórios legislativos, a permitir que novas e exitosas experiências sejam formuladas e
eventualmente adotadas pelos demais.

No caso, a Lei estadual está prevendo a possibilidade de o Defensor Público atuar junto ao juiz no sentido
de promover a homologação do acordo judicial, atividade inserida no âmbito de atuação profissional
daquele, ao encontro da desjudicialização e desburocratização da justiça.

Estado-membro tem competência para legislar sobre procedimentos do IP desde que não viole
as normas gerais da União

Atenção! MP e Delegado
É INCONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a tramitação direta do inquérito policial entre a
polícia e o Ministério Público.
É CONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a possibilidade de o MP requisitar informações
quando o inquérito policial não for encerrado em 30 dias, tratando-se de indiciado solto.
STF. Plenário. ADI 2886/RJ, red. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, julgado em 3/4/2014.

Lei orgânica do MPRJ


A Lei Complementar n. 106/2003, do Estado do Rio de Janeiro, prevê o seguinte:
Art. 35. No exercício de suas funções, cabe ao Ministério Público:
(...)
IV - receber diretamente da Polícia Judiciária o inquérito policial, tratando-se de infração de ação penal
pública.
V - requisitar informações quando o inquérito policial não for encerrado em trinta dias, tratando-se de
indiciado solto mediante fiança ou sem ela.

ADI
A então Governadora do Estado ajuizou uma ADI alegando que esses dispositivos seriam inconstitucionais
por violarem a competência privativa da União para legislar sobre direito processual (art. 22, I, da CF/88).

Esses dispositivos são realmente normais PROCESSUAIS penais?


NÃO. Tais incisos tratam sobre inquérito policial. O IP possui natureza de procedimento. Logo, o STF
entendeu que elas são normas de procedimento (e não de processo).
A competência para legislar sobre processo é privativa da União (art. 22, I). No entanto, a competência
para editar normas sobre procedimento é concorrente, conforme prevê o art. 24, XI:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
XI - procedimentos em matéria processual;

Dessa feita em matéria de procedimento, cabe à União estabelecer as normas gerais (art. 24, § 1º) e os
Estados têm competência para suplementar, ou seja, complementar (detalhar) essas normas gerais.

A União editou normas gerais prevendo o procedimento do inquérito policial?


SIM. As normas procedimentais sobre o inquérito policial estão previstas principalmente no Código de
Processo Penal. Logo, agora resta avaliarmos se os incisos IV e V do art. 35 da LC estadual n. 106/2003
estão de acordo com as normas gerais (CPP).

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 6


O inciso IV do art. 35 da LC 106/2003 é compatível com o CPP?
NÃO. O STF entendeu que esse inciso IV contraria a regra do § 1º do art. 10 do CPP:
Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante,
ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a
ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.
§ 1º A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente.

Logo, o Estado tinha competência para legislar sobre o tema, mas ao fazê-lo somente poderia
complementar as normas gerais. Ocorre que esse inciso IV estabeleceu uma regra contrária a norma geral
editada pela União. Assim, o inciso IV é inconstitucional por violar o § 1º do art. 24 da CF/88.

O inciso V do art. 35 da LC 106/2003 é compatível com o CPP?


SIM. O inciso V contraria nenhuma regra do CPP. Logo, não viola o § 1º do art. 24 nem qualquer outro
dispositivo da CF/88.
Ao contrário, o inciso V está em harmonia com o art. 129, VII, da CF/88, que diz competir ao Ministério
Público o controle externo da atividade policial.

Tramitação direta do inquérito policial entre a Polícia Federal e o MPF


No âmbito da Justiça Federal, ocorre a tramitação direta do inquérito policial entre a Polícia Federal e o MPF.
Assim, se o DPF pede a dilação do prazo para as investigações ou apresenta o relatório final, o IP não
precisa ir para o juiz federal e depois ser remetido ao MPF. O caminho é direto entre a PF e o MPF, sendo
o próprio membro do Parquet quem autoriza a dilação do prazo.
De igual modo, se o Procurador da República deseja a realização de outras diligências, ele não precisa, em
regra, pedir isso ao juiz, bastando que devolve à PF com essa requisição.
Essa regra da tramitação direta somente é excepcionada quando há pedidos que dependem do juiz
federal, como é o caso de busca e apreensão, interceptação telefônica, quando se tratar de investigado
preso etc.
Esse procedimento de tramitação direta no âmbito da Justiça Federal foi estabelecido e regulamentado
pela Resolução n. 063/2009 do Conselho da Justiça Federal e é assim que ainda hoje ocorre na prática.
A referida Resolução foi impugnada no STF por meio da ADI n. 4305, ajuizada pela Associação Nacional dos
Delegados de Polícia Federal. O Relator é o Min. Ricardo Lewandowski e não há previsão de julgamento.
Diante desse precedente, a tendência é que a ADI 4305 seja julgada procedente.

Lei estadual não pode fixar prioridades na tramitação dos processos judiciais

É INCONSTITUCIONAL lei estadual que prevê prioridade na tramitação para processos


envolvendo mulher vítima de violência doméstica.
A fixação de prioridades na tramitação dos processos judiciais é matéria de Direito Processual,
cuja competência é privativa da União (art. 22, I, CF/88).
STF. Plenário. ADI 3483/MA, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 3/4/2014.

Lei estadual do Maranhão:


A Lei n. 7.716/2001-MA estabelece prioridade na tramitação processual, em qualquer instância, para as
causas que tenham como parte mulher vítima de violência doméstica. Veja o que ela diz:
Art. 1º Os procedimentos judiciais em que figure como parte mulher vítima de violência doméstica terão
prioridade na tramitação de todos os atos e diligência em qualquer instância.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 7


ADI 3483/MA
O Procurador-Geral da República ajuizou uma ADI contra essa lei, alegando que ela conteria uma
inconstitucionalidade formal por violar a competência privativa da União para legislar sobre direito
processual (art. 22, I, da CF/88).
Segundo o PGR, a lei maranhense não versa sobre procedimento (art. 24, XI).
Procedimento é a exteriorização do processo. Assim, uma norma sobre procedimento disciplina apenas o
rito, as etapas, ou seja, a sequência dos atos processuais.
A referida lei trata sobre direito processual, uma vez que ela concede uma prerrogativa processual para as
mulheres vítimas de violência doméstica. Só quem pode estabelecer prerrogativas processuais é a União.

O STF concordou com o pedido? A referida Lei é inconstitucional?


SIM.

Para o STF, a fixação de prioridades na tramitação dos processos judiciais é matéria de Direito Processual,
cuja competência é privativa da União (art. 22, I, CF/88).

A referida lei estadual, apesar de ser muito relevante do ponto de vista social, indiscutivelmente trata
sobre matéria processual e, por isso, invadiu esfera reservada à União.

O Supremo, por diversas vezes, reafirmou a ocorrência de vício formal de inconstitucionalidade de normas
estaduais que exorbitem de sua competência concorrente para legislar sobre procedimento em matéria
processual, adentrando aspectos típicos do processo, como competência, prazos, recursos, provas, entre
outros.

DIREITO ADMINISTRATIVO

Inconstitucionalidade de efetivação de substituto em cartório após a CF/88

Não existe direito adquirido à efetivação na titularidade de cartório quando a vacância do


cargo ocorre na vigência da CF/88, que exige a submissão a concurso público (art. 236, § 3º).
O prazo decadencial do art. 54 da Lei n. 9.784/99 não se aplica quando o ato a ser anulado
afronta diretamente a Constituição Federal.
O art. 236, § 3º, da CF é uma norma constitucional autoaplicável. Logo, mesmo antes da edição
da Lei n. 8.935/1994 ela já tinha plena eficácia e o concurso público era obrigatório como
condição para o ingresso na atividade notarial e de registro.
STF. Plenário. MS 26860/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 2/4/2014.

Imagine a seguinte situação adaptada:


João era titular de um cartório de registro de imóveis e faleceu em 1990.
Pedro era seu substituto no cartório e ficou respondendo pela serventia.
Em 1992, o TJMS publicou ato efetivando Pedro no RI, ou seja, ele se tornou titular da serventia.
A decisão do TJMS foi baseada no art. 31 do ADCT da Constituição do Estado do Mato Grosso do Sul, que
previa, em tese, essa possibilidade.
Em 2006, o CNJ, em um procedimento de controle administrativo (PCA), determinou a anulação do ato de
delegação promovido pelo TJMS em favor de Pedro.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 8


Mandado de segurança
Inconformado, Pedro impetrou mandado de segurança no STF (art. 102, I, “r”, da CF) contra a decisão do
CNJ. Apresentou três argumentos principais:
1º) O CNJ não mais teria direito de rever o ato, considerando que houve decadência, nos termos do art. 54
da Lei n. 9.784/99:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para
os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

2º) O art. 236 da CF/88 seria uma norma constitucional de eficácia limitada, de forma que somente
produziu todos os seus efeitos, inclusive a exigência do concurso público (prevista no § 3º), com a edição
da Lei n. 8.935/94, que regulamentou o referido dispositivo:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
(...)
§ 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não
se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de
remoção, por mais de seis meses.

3º) Houve fato consumado, que não mais pode ser revisto, sob pena de violação aos princípios da
segurança jurídica, da confiança e do direito adquirido.

O STF concordou com os argumentos do impetrante?


NÃO. O STF denegou o mandado de segurança, mantendo o ato do CNJ.
Confira o entendimento da Corte para os argumentos levantados:
1º) O prazo decadencial do art. 54 da Lei n. 9.784/99 não se aplica quando o ato a ser anulado afronta
diretamente a Constituição Federal.
Se há uma inconstitucionalidade flagrante, a pessoa que está se beneficiando dessa situação não está de
boa-fé, já que deveria saber que aquela situação é incompatível com o ordenamento jurídico.
A parte final do art. 54 menciona que esse prazo não se aplica se ficar demonstrada a má-fé do
beneficiário. Logo, estando Pedro de má-fé (porque a inconstitucionalidade era evidente), a ele não pode
ser aplicado o prazo decadencial.

2ª) O art. 236, § 3º, da CF é uma norma constitucional autoaplicável. Logo, mesmo antes da edição da Lei
n. 8.935/1994, ela já tinha plena eficácia e o concurso público era obrigatório como condição para o
ingresso na atividade notarial e de registro.

3º) Inexiste direito adquirido à efetivação na titularidade de cartório quando a vacância do cargo ocorre na
vigência da Constituição de 1988, que exige a submissão a concurso público (art. 236, § 3º).
Os princípios republicanos da igualdade, da moralidade e da impessoalidade devem nortear a ascensão às
funções públicas.
Além disso, o impetrante não pode invocar o princípio da confiança (consectário da segurança jurídica)
porque este postulado exige que a pessoa esteja de boa-fé, o que não era o caso já que a
inconstitucionalidade era manifesta.

Ficaram vencidos a Min. Rosa Weber e o Min. Marco Aurélio, que concediam a segurança. Observavam
que o CNJ teria cassado atos praticados por tribunal de justiça há mais de dez anos. Além disso, realçavam
não estar descaracterizada a boa-fé dos impetrantes.

Vale destacar que o entendimento acima manifestado já havia sido adotado pelo STF, sendo o MS
28.279/DF o leading case. Veja trechos da ementa:

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 9


(...) O art. 236, § 3º, da Constituição Federal é norma auto-aplicável.
2. Nos termos da Constituição Federal, sempre se fez necessária a submissão a concurso público para o
devido provimento de serventias extrajudiciais eventualmente vagas ou para fins de remoção.
3. Rejeição da tese de que somente com a edição da Lei 8.935/1994 teria essa norma constitucional se
tornado auto-aplicável.
(...)
5. Situações flagrantemente inconstitucionais como o provimento de serventia extrajudicial sem a devida
submissão a concurso público não podem e não devem ser superadas pela simples incidência do que
dispõe o art. 54 da Lei 9.784/1999, sob pena de subversão das determinações insertas na Constituição
Federal.
6. Existência de jurisprudência consolidada da Suprema Corte no sentido de que não há direito adquirido à
efetivação de substituto no cargo vago de titular de serventia, com base no art. 208 da Constituição
pretérita, na redação atribuída pela Emenda Constitucional 22/1983, quando a vacância da serventia se
der já na vigência da Constituição de 1988 (...)
7. Reafirmada a inexistência de direito adquirido de substituto que preenchera os requisitos do art. 208 da
Carta pretérita à investidura na titularidade de Cartório, quando a vaga tenha surgido após a promulgação
da Constituição de 1988, pois esta, no seu art. 236, § 3º, exige expressamente a realização de concurso
público de provas e títulos para o ingresso na atividade notarial e de registro.
8. Os princípios republicanos da igualdade, da moralidade e da impessoalidade devem nortear a ascensão
às funções públicas. (...)
STF. Plenário. MS 28279, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 16/12/2010.

DIREITO CIVIL

A capacidade de suceder é regida pela lei da época da abertura da sucessão

O art. 377 do CC-1916 previa que o filho adotivo, nessa situação, não tinha direito à sucessão
hereditária. Essa regra vigorou e foi válida até a promulgação da CF/88, quando, então, não foi
recepcionada pelo art. 227, § 6º.
Se a morte ocorreu antes da CF/88, o juiz, ao analisar se a pessoa tem ou não capacidade para
suceder (ser herdeiro), deverá levar em consideração o art. 377 do CC-1916, não podendo ser
aplicado retroativamente o disposto no art. 227, § 6º, da CF/88 para considerar o art. 377 inválido.
STF. Plenário. AR 1811/PB, rel. orig. Min. Eros Grau, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, julgado em
3/4/2014.

Imagine a seguinte situação hipotética:


Em 1980, João e Maria tinham 2 filhos biológicos.
Em 1985, decidiram adotar uma criança, chamada de Clara.
Em 1987, o casal morre em um acidente aéreo, deixando os três filhos (os dois biológicos e Clara).
Em 1989, foi feita a partilha dos bens e Clara não recebeu qualquer parte da herança.

De acordo com o Código Civil de 1916, o filho adotivo (que foi adotado após o casal já ter filhos
biológicos) tinha direito à herança?
NÃO. O art. 377 do CC-1916 previa que o filho adotivo, nessa situação, não tinha direito à sucessão
hereditária.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 10


O art. 377 do CC-1916 era compatível com a Constituição Federal da época? Ele poderia ser aplicado?
SIM. O art. 377 do CC-1916 era válido e não afrontava nenhum dispositivo da Constituição Federal em vigor.
Assim, no momento da morte de João e Maria (abertura da sucessão) essa regra era válida.
Em razão disso, em 1989, houve uma sentença determinando a partilha e Clara não teve direito a qualquer
parte da herança, que ficou exclusivamente com os filhos biológicos.

O art. 377 do CC-1916 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988?


NÃO. A CF/88 consagrou, em seu art. 227, § 6º, o princípio da igualdade entre os filhos. Confira:
Art. 227 (...)
§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Essa previsão da CF/88 foi inovadora. A partir daí, todo e qualquer filho passou a gozar dos mesmos
direitos e da mesma proteção, não importando para mais nada saber se ele é biológico ou adotivo, se
resultante de casamento ou não.
Com isso, o art. 377 do CC-1916 e todos os outros dispositivos que previam diferenças de tratamento entre
filho biológico e adotivo foram considerados não recepcionados pela CF/88 (em sentido atécnico: “revogados”).

Diante da promulgação da CF/88, Clara ajuizou ação rescisória com o objetivo de desconstituir a
sentença que a excluiu da herança. Afirmou que o art. 227, § 6º da CF/88 deveria ser aplicado
imediatamente, inclusive para a sua situação. É possível acolher a tese de Clara?
NÃO. O art. 377 do CC-1916 vigorou e foi válido até a promulgação da CF/88, quando, então, não foi
recepcionado pelo art. 227, § 6º.
O juiz, ao analisar se alguém tem ou não capacidade para suceder (ser herdeiro), deverá levar em
consideração as regras válidas no momento da abertura da sucessão, ou seja, no dia da morte.
Logo, não é possível aplicar retroativamente o disposto no art. 227, § 6º, da CF/88, já que a abertura da
sucessão ocorreu em 1987.

DIREITO PROCESSUAL PENAL


Tramitação direta do IP entre Polícia e MP

Atenção! MP e Delegado
É INCONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a tramitação direta do inquérito policial entre a
polícia e o Ministério Público.
É CONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a possibilidade de o MP requisitar informações
quando o inquérito policial não for encerrado em 30 dias, tratando-se de indiciado solto.
STF. Plenário. ADI 2886/RJ, red. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, julgado em 3/4/2014.

O que é um inquérito policial?


Inquérito policial é...
- um procedimento administrativo
- inquisitorial (sem contraditório e ampla defesa)
- por meio do qual o Delegado de Polícia (presidente do IP) faz e/ou determina que se façam
- diversas diligências (providências) de investigação (oitiva de testemunhas, perícias etc.)
- com o objetivo de coletar elementos informativos (“provas”)
- que comprovem a materialidade (existência) e a autoria do crime
- com o objetivo de que o Ministério Público (ou o querelante) possa oferecer a denúncia ou queixa-crime.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 11


O inquérito policial tem prazo para ser concluído?
SIM. No Brasil, o inquérito policial é temporário, ou seja, possui um prazo para ser concluído.
O art. 10 do CPP traz a regra geral sobre o tempo de duração do IP, mas existem outras leis que
disciplinam o tema para crimes específicos, como o art. 66 da Lei n. 5.010/66 ou o art. 51, parágrafo
único, da Lei n. 11.343/2006.
Salvo previsão de lei especial em sentido contrário, o inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias (se o
indiciado estiver preso) ou em 30 dias (se estiver solto). Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado
estiver solto, o Delegado de Polícia poderá requerer a prorrogação do prazo (art. 10, caput e § 3º do CPP).

O que acontece quando o inquérito policial é concluído?


Quando o Delegado de Polícia termina o inquérito, ele deverá fazer um relatório sobre todas as diligências
que foram realizadas, juntá-lo nos autos e encaminhar o IP para o juiz que seria competente para julgar
aquele crime que estava sendo investigado. É o que prevê o § 1º do art. 10 do CPP:
§ 1º A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente.

O que o juiz faz com o IP que recebeu (sendo crime de ação penal pública)?
Ele determina que seja dada vista dos autos ao Ministério Público.
Quando receber o IP, o Promotor de Justiça terá quatro opções:
a) Oferecer denúncia contra a pessoa suspeita de ter cometido o crime, caso entenda que já há indícios
suficientes de autoria e prova da materialidade;
b) Requerer ao juiz que devolva os autos ao Delegado de Polícia para que sejam realizadas novas
diligências investigatórias, se entender que ainda não há elementos informativos suficientes;
c) Requerer ao juiz o arquivamento do inquérito policial, caso conclua que não há crime ou que não
existem “provas” suficientes, mesmo já tendo sido feitas todas as diligências investigatórias possíveis;
d) Requerer ao juiz que decline a competência ou que suscite conflito de competência, caso avalie que o
atual juízo não é competente para apurar o delito investigado.

Não recepção do § 1º do art. 10 do CPP


Os autores mais modernos de Processo Penal defendem que o § 1º do art. 10 do CPP não foi recepcionado
pela CF/88. Vamos entender um pouco melhor isso.
O inquérito policial é um procedimento investigatório preliminar, ou seja, que ocorre antes de a questão
ser judicializada. Além disso, as diligências são feitas de forma unilateral pela autoridade policial, isto é,
sem a participação da defesa. Trata-se, portanto, da versão dos fatos segundo a visão apenas da Polícia e
do MP.
Assim, não é o momento adequado para o julgador ter acesso a esses elementos, considerando que não
haverá um contraponto imediato feito pela defesa (contraditório), havendo risco concreto de o juiz ser
influenciado pela narrativa dos fatos feita pelos órgãos de persecução penal.
Ademais, adotamos o sistema acusatório, segundo o qual as funções de acusar, defender e julgar devem
ficar bem separadas, não podendo o magistrado interferir nas diligências investigatórias, salvo quando elas
necessitarem de autorização judicial (reserva de jurisdição), como é o caso de uma interceptação
telefônica, afastamento de sigilo bancário, decretação de prisão etc.

Qual seria a solução mais adequada?


A doutrina aponta que o inquérito policial deveria tramitar, em regra, apenas entre a Polícia e o Ministério
Público e de forma direta, sem o Poder Judiciário como intermediário.
Assim, quando o Delegado concluísse o IP, em vez de remeter os autos ao juiz, ele deveria enviar o
procedimento diretamente ao Promotor de Justiça/Procurador da República.
De igual modo, se o membro do Parquet desejasse a realização de outras diligências, ele não precisaria,
em regra, pedir isso ao juiz, bastando que devolvesse à Polícia com essa requisição.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 12


Essa regra da tramitação direta somente seria excepcionada quando houvesse pedidos que dependessem
do Poder Judiciário por implicar relativização de direitos fundamentais.
Vale ressaltar que a tramitação direta, além de ser mais consentânea com a CF/88, revela-se também mais
eficiente, econômica e simples, tendo em vista que a passagem do IP pelo Poder Judiciário antes de seguir
para a Polícia ou de volta para o MP é uma rotina apenas burocrática, considerando que o juiz não deverá
interferir nas diligências investigatórias do IP. Em geral, na prática forense, observa-se a existência de um
despacho padrão com palavras como “Vista ao MP” (quando o IP chega da Polícia) ou “Defiro. Encaminhe-
se à autoridade policial” (na hipótese em que o MP requisita novas diligências).

O que alguns Estados e Tribunais fizeram?


Percebendo que o procedimento trazido pelo CPP estava em contrariedade com o sistema acusatório ou,
no mínimo, desatualizado, alguns Estados e Tribunais passaram a editar leis estaduais e portarias
(respectivamente) prevendo que a tramitação do IP, como regra, deveria ser feita diretamente entre a
Polícia e o MP.

Lei orgânica do MPRJ


A Lei Complementar n. 106/2003, do Estado do Rio de Janeiro, foi uma das legislações estaduais que
previu a tramitação direta do IP. Confira:
Art. 35. No exercício de suas funções, cabe ao Ministério Público:
(...)
IV - receber diretamente da Polícia Judiciária o inquérito policial, tratando-se de infração de ação penal
pública.

ADI 2886/RJ
A então Governadora do Estado ajuizou uma ADI contra o dispositivo alegando que seria inconstitucional
por violar a competência privativa da União para legislar sobre direito processual (art. 22, I, da CF/88).

Primeira pergunta: esse inciso IV é, de fato, uma norma sobre direito PROCESSUAL penal?
NÃO. A premissa invocada na ADI está equivocada. O referido inciso trata sobre a tramitação de inquérito
policial. O IP possui natureza jurídica de procedimento. Logo, esse dispositivo é uma norma que versa
sobre PROCEDIMENTO em matéria processual (não é uma norma processual).

A competência para legislar sobre PROCESSO é privativa da União (art. 22, I). No entanto, a competência
para editar normas sobre PROCEDIMENTO é concorrente, conforme prevê o art. 24, XI da CF/88:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
XI - PROCEDIMENTOS em matéria processual;

Dessa feita, em matéria de procedimento, cabe à União estabelecer as normas gerais (art. 24, § 1º) e os
Estados têm competência para suplementar, ou seja, complementar (detalhar) essas normas gerais.

Segunda pergunta: a União editou normas gerais prevendo o PROCEDIMENTO do inquérito policial?
SIM. As normas procedimentais sobre o inquérito policial estão previstas principalmente no Código de
Processo Penal. Essas são as normas gerais trazidas pela União conforme autoriza o § 1º do art. 24 da
CF/88.
Logo, agora resta avaliarmos se o inciso IV do art. 35 da LC estadual n. 106/2003 está de acordo com as
normas gerais (CPP).

Terceira pergunta: a tramitação direta do IP prevista no inciso IV do art. 35 da LC 106/2003 é compatível


com o CPP?
NÃO. O STF entendeu que esse inciso IV contraria a regra do § 1º do art. 10 do CPP (ADI 2886/RJ, red. p/ o

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 13


acórdão Min. Joaquim Barbosa, julgada em 3/4/2014).
Para o STF, o Estado-membro tem competência para legislar sobre o tema, ou seja, pode editar normas
sobre o procedimento do IP. No entanto, ao fazê-lo, somente pode complementar as normas gerais
trazidas pelo CPP.
Ocorre que esse inciso IV da Lei fluminense estabeleceu uma regra contrária à norma geral editada pela
União.
Assim, o inciso IV é inconstitucional, não por afrontar o art. 22, I, da CF/88, mas sim por violar o § 1º do
art. 24 da Carta Magna.
Frustrando a doutrina, a maioria dos Ministros do STF concluiu que o § 1º do art. 10 do CPP foi
recepcionado pela CF/88 e que se encontra em vigor.
Desse modo, o Supremo entendeu que é INCONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a tramitação direta
do inquérito policial entre a Polícia e o Ministério Público.

Resolução n. 063/2009-CJF


Por meio da Resolução n. 063/2009, o Conselho da Justiça Federal também determinou a tramitação
direta do IP entre a Polícia Federal e o Ministério Público Federal.
Por força da Resolução, atualmente, no âmbito da Justiça Federal, se o DPF pede a dilação do prazo para
as investigações ou apresenta o relatório final, o IP não precisa ir para o Juiz Federal e depois ser remetido
ao MPF. O caminho é direto entre a PF e o MPF, sendo o próprio membro do Parquet quem autoriza a
dilação do prazo.
De igual modo, se o Procurador da República deseja a realização de outras diligências, ele não precisa, em
regra, pedir isso ao juiz, bastando que devolva à PF com essa requisição.
Essa regra da tramitação direta somente é excepcionada quando há pedidos que dependam do Juiz
Federal, como é o caso de busca e apreensão, interceptação telefônica, quando se tratar de investigado
preso etc.

ADI 4305
A Resolução n. 063/2009-CJF também foi impugnada no STF por meio da ADI n. 4305, ajuizada pela
Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal. O Relator é o Min. Ricardo Lewandowski e não há
previsão de julgamento.
Diante desse precedente acima explicado, existe um risco de que a ADI 4305 seja julgada procedente já
que o STF considerou que o § 1º do art. 10 do CPP ainda é válido.
Existe, no entanto, a possibilidade de que o Supremo decida de forma diferente. Isso porque o veredicto
na ADI 2886/RJ foi construído por apertada maioria e dois Ministros que participaram da corrente
vencedora já estão aposentados (Eros Grau e Carlos Velloso).

Lei alterando o § 1º do art. 10 do CPP


Diante da decisão do STF na ADI 2886/RJ, revela-se urgente que o Congresso Nacional altere o § 1º do art.
10 do CPP para prever, como regra, a tramitação direta do IP entre Polícia e Ministério Público, sendo esse
o procedimento mais adequado, célere e eficiente.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 14


Impossibilidade de se manter o valor da fiança sem analisar a situação econômica do agente

O CPP prevê que o valor da fiança poderá ser reduzido ou até dispensado se assim recomendar
a situação econômica do preso. Logo, o juiz, para indeferir o pedido da defesa para dispensa da
fiança, deverá fundamentar sua decisão na análise da capacidade econômica do agente. Não se
pode, portanto, manter a fiança sem levar em consideração esse fator essencial.
STF. 2ª Turma. HC 114731, rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 1º/4/2014.

Conceito
Fiança é...
- uma caução em dinheiro ou outros bens (garantia real)
- prestada em favor do indiciado ou réu
- para que ele possa responder o inquérito ou o processo em liberdade
- devendo cumprir determinadas obrigações processuais
- sob pena de a fiança ser considerada quebrada
- e ele ser preso cautelarmente.

Natureza jurídica
A fiança é uma espécie de medida cautelar (art. 319, VIII, do CPP).

Momento de concessão da fiança


A fiança pode ser concedida:
 Na fase de investigação pré-processual;
 Em qualquer momento do processo criminal enquanto não tiver transitado em julgado a sentença
condenatória (art. 334).

Quem concede a fiança


A fiança poderá ser concedida pelo(a):
a) Delegado de Polícia;
b) Autoridade judiciária.

Em quais casos a autoridade policial pode conceder fiança?


O Delegado somente poderá conceder fiança se a infração praticada tiver pena máxima de 4 anos.
Se o crime tiver pena superior a 4 anos, o preso deverá requerer a concessão da fiança ao juiz, que deverá
decidir o pedido em até 48 horas.

Situações nas quais não se permite a fiança


O art. 324 do CPP prevê algumas situações nas quais não se pode conceder fiança:
a) Se o réu, no mesmo processo, tiver quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem
motivo justo, qualquer das obrigações impostas no arts. 327 e 328 do CPP;
b) Em caso de prisão civil ou militar;
c) Se estiverem presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva.

Valor da fiança

Valor a ser arbitrado Quando a pena máxima prevista for


I - de 1 a 100 salários mínimos de até 4 anos.
II - de 10 a 200 salários mínimos superior a 4 anos.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 15


Dependendo da situação econômica do preso (se rico ou pobre), a autoridade poderá:
a) Dispensar a fiança.
b) Reduzir em até 2/3 os valores da tabela acima;
c) Aumentar em até mil vezes os valores da tabela acima.

Atenção: tanto o magistrado como o Delegado podem reduzir ou aumentar os valores da fiança, mas a
dispensa só quem pode autorizar é a autoridade judiciária.

Quais os critérios que devem ser levados em consideração no momento da fixação do valor?
Para determinar o valor da fiança, a autoridade levará em consideração:
 a natureza da infração;
 as condições pessoais de fortuna do indiciado/acusado (condições econômicas);
 a sua vida pregressa;
 as circunstâncias indicativas de sua periculosidade;
 o valor provável das custas do processo, até final julgamento.

Imagine agora a seguinte situação adaptada:


João foi preso em flagrante. O juiz arbitrou a fiança em 10 salários-mínimos.
A Defensoria Pública, que fazia a assistência jurídica do indiciado, requereu a dispensa ou redução do valor
da fiança alegando que ele era pobre e não tinha condições de pagá-la.
O magistrado não acatou o pedido e manteve a prisão de João, alegando apenas que ele ostentava
antecedentes criminais.

A decisão do juiz foi correta?


NÃO. O magistrado não fundamentou adequadamente sua decisão.
Segundo o art. 325, § 1º do CPP, o valor da fiança poderá ser reduzido ou até dispensado se assim
recomendar a situação econômica do preso. Logo, o juiz, para indeferir o pedido da defesa, deveria ter
demonstrado as circunstâncias de fato e as condições pessoais do agente que justifiquem a manutenção
daquele valor de fiança.
Dessa forma, manteve-se a fiança sem levar em consideração o fator essencial exigido pelo CPP, qual seja,
a capacidade econômica do agente.
O argumento de que a prisão deverá ser mantida em razão dos antecedentes criminais do agente também
não é válido já que, conforme prevê o art. 324, IV, do CPP, a fiança só pode ser concedida quando não
estiverem presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva.

JULGADOS NÃO COMENTADOS

ED: serventia extrajudicial e concurso público


Por reputar ausentes os pressupostos de embargabilidade, o Plenário rejeitou embargos de declaração e
manteve o entendimento firmado no sentido de não haver direito adquirido do substituto, que preencheu
os requisitos do art. 208 da Constituição pretérita, à investidura na titularidade de cartório, quando a vaga
tenha surgido após a promulgação da Constituição de 1988, a qual exige expressamente, no seu art. 236, §
3º, a realização de concurso público de provas e títulos para o ingresso na atividade notarial e de registro.
Inicialmente, a Corte denegou pedido de sobrestamento do feito para que fosse apreciado, em conjunto,
com a ADI 4.300/DF. O ora embargante arguia a ocorrência de conexão por prejudicialidade, uma vez que
na mencionada ação direta questiona-se a legitimidade constitucional do modo de atuar do Conselho
Nacional de Justiça - CNJ no tocante a questão dos cartórios brasileiros. A Ministra Rosa Weber (relatora)

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 16


destacou anterior deferimento de pleito formulado pela mesma parte para que os embargos apenas
fossem examinados após o julgamento do MS 26.860/DF, que versaria o mesmo tema do presente
processo. Salientou sua perplexidade diante de requerimento manifestado da tribuna, para que o feito
fosse analisado anteriormente ao aludido MS 26.860/DF. O Ministro Joaquim Barbosa (Presidente)
observou que, dessa maneira, estar-se-ia sempre fazendo remissão a outro processo. Em seguida, o
Tribunal aduziu que o acórdão impugnado não padeceria de quaisquer dos vícios que autorizariam a
oposição de embargos declaratórios. Consignou tratar-se de tentativa de rediscussão da matéria.
Asseverou que, não obstante a Ministra Rosa Weber tivesse adotado, no MS 26.860/DF, tese consentânea
à defendida pelo ora embargante, haveria distinção entre mérito da causa e mérito do recurso. Afirmou
que o mérito do recurso em debate diria respeito à presença, ou não, de vícios ensejadores de embargos
de declaração. O Colegiado reiterou, ainda, a inocorrência de omissão em torno dos temas relativos à
decadência para a Administração Pública e aos princípios constitucionais da segurança jurídica e da boa-fé,
devidamente analisados e afastados.
MS 28279 ED/DF, rel. Min. Rosa Weber, 2.4.2014. (MS-28279)

Rito da Lei 8.038/1990 e demonstração de prejuízo


A 1ª Turma, por maioria, negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se discutia
eventual nulidade processual por afronta ao princípio do devido processo legal ante a falta de intimação
para cumprimento das diligências previstas no art. 10 da Lei 8.038/1990. No caso, o recorrente, em 1998,
fora absolvido, sumariamente, pelo juízo, da suposta prática do crime de homicídio tentado. Em 2008, o
tribunal de justiça dera provimento a recurso de ofício para pronunciar o recorrente. Ato contínuo,
acolhera, em parte, embargos de declaração para anular a pronúncia e fixar a competência do tribunal de
justiça para o processamento e julgamento do feito, dado o foro por prerrogativa de função decorrente da
superveniente diplomação do recorrente no cargo de prefeito. Estabelecida a competência do tribunal de
justiça, os atos processuais praticados perante o juízo de primeiro grau foram ratificados. Convertido o
feito para o rito da Lei 8.038/1990, o tribunal de justiça condenara o recorrente à pena de oito anos e oito
meses de reclusão, no regime inicialmente fechado, pelo crime de homicídio duplamente qualificado, na
forma tentada. Da tribuna, o advogado sustentara que o tribunal não poderia apreciar o recurso de ofício,
porquanto esse recurso não existiria mais no ordenamento jurídico quando julgado. A Turma concluiu que
não seria possível declarar a alegada nulidade processual sem que fosse demonstrado o efetivo prejuízo
sofrido pelo recorrente. A Ministra Rosa Weber (relatora) salientou que o prejuízo não se aferiria pelo
resultado, mas pela possibilidade de chegar-se a uma posição diferente. O Ministro Roberto Barroso
observou que bastaria para a decretação da nulidade a invocação de aspecto puramente formal. Sublinhou,
ademais, que, por envolver elementos probatórios e por não ter sido apreciado pelo STJ, não poderia
analisar o argumento de que o recurso de ofício não poderia ser mais julgado. O Ministro Luiz Fux destacou
que prejuízo somente haveria se houvesse a supressão de etapas que antecederiam a sentença
condenatória, o que não ocorrera na espécie. No que se refere à arguição invocada da tribuna, reputou que
a lei que regularia o recurso cabível seria a da época da sentença. Explicitou que a sentença desfavorável
seria lesiva e, portanto, a partir desse momento, a parte teria o direito ao recurso cabível para afastar essa
desvantagem. Ressaltou que, na ocasião em que a sentença fora proferida, seria obrigatório e existente o
recurso de ofício. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que pontuava não ter sido observado o rito da Lei
8.038/1990. Realçava que a inobservância de regra que visaria implementar o devido processo legal
inviabilizaria a defesa e acarretaria o prejuízo ao acusado. Além disso, o prejuízo estaria estampado no
acórdão condenatório.
RHC 120356/DF, rel. Min. Rosa Weber, 1º.4.2014.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 17


OUTRAS INFORMAÇÕES

CLIPPING DO D JE
31 de março a 4 de abril de 2014

AG. REG. NO ARE N. 677.617-AP


RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PEDIDO DE ACUMULAÇÃO DE CARGOS
PÚBLICOS DE PROFESSOR E DE FARMACÊUTICO. INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS VERIFICADA PELO ACÓRDÃO
RECORRIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279/STF.
Para dissentir da conclusão do Tribunal de origem, seria necessária uma nova apreciação dos fatos e do material probatório constante dos autos.
Incidência da Súmula 279/STF.
Agravo regimental a que se nega provimento.
AG. REG. NO ARE N. 746.380-RS
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO ADMINISTRATIVO.
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. NECESSIDADE. FORNECIMENTO PELO ESTADO. INCURSIONAMENTO NO CONTEXTO
FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 279 DO STF. INEXISTÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL NÃO EXAMINADA EM
FACE DE OUTROS FUNDAMENTOS QUE OBSTAM A ADMISSÃO DO APELO EXTREMO.
1. A intervenção cirúrgica sob as expensas do Estado, quando sub judice a controvérsia, demanda a análise do conjunto fático-probatório dos autos, o
que atrai a incidência da Súmula 279/STF que dispõe verbis: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.”
2. O recurso extraordinário não se presta ao exame de questões que demandam revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, adstringindo-se
à análise da violação direta da ordem constitucional.
3. In casu, o acórdão recorrido assentou: “CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. INTERVENÇÃO CIRÚRGICA. PORTADORA DE
GIGANTISMO. FALTA DE PROVA IDÔNEA QUANTO AO RISCO À VIDA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A assecuração do acesso igualitário às ações e
serviços, visando à promoção, proteção e recuperação da saúde, reclama a observância das atribuições conferidas a cada integrante do Sistema
Único de Saúde. A exigência de prestações positivas na área de saúde está condicionada à comprovação de situação excepcional em que haja risco à
vida do paciente. 2. APELAÇÃO PROVIDA.”
4. Agravo regimental DESPROVIDO.
AG. REG. NO ARE N. 778.148-RS
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CIVIL. DANO MORAL. DIREITO DE
IMAGEM. MATÉRIA COM REPERCUSSÃO GERAL REJEITADA PELO PLENÁRIO DO STF NO ARE Nº 739.382. CONTROVÉRSIA
DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL.
1. O dano moral, quando aferido pelas instâncias ordinárias, não revela repercussão geral apta a dar seguimento ao apelo extremo, consoante decidido
pelo Plenário virtual do STF, na análise do ARE nº 739.382, da Relatoria do Min. Gilmar Mendes.
2. In casu, o acórdão originariamente recorrido assentou: “DIREITO CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. INCONFORMIDADE DA
AUTORIA COM INFORMAÇÕES VEICULADAS EM JORNAL DO SINDICATO DOS PROFESSORES. CRITÍCA EM CINCO LINHAS QUANTO A
INTERPRETAÇÃO DE UMA LEI. DESCABIMENTO DA PRETENSÃO, FACE AO CONTEXTO EM QUE FOI DIVULGADA A OPINIÃO DAS
GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO.”
3. Agravo regimental DESPROVIDO.
EMB. DECL. NO ARE N. 734.067-RS
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONVERSÃO EM AGRAVO
REGIMENTAL. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. 1. LIBERDADE DE EXPRESSÃO: DIREITO DE CRÍTICA.
CONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES. 2. LITISCONSORTES PASSIVOS. PROVIMENTO DO RECURSO DE UM DELES:
EXTENSÃO AOS DEMAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
HC N. 119.463-SP
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PEDOFILIA. FUNDAMENTAÇÃO
IDÔNEA PARA A PRISÃO CAUTELAR. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA. MATÉRIA NÃO
APRECIADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TRAMITAÇÃO REGULAR DA AÇÃO PENAL NA ORIGEM.
1. As circunstâncias da prática do ato imputado ao Paciente demonstram que os fundamentos adotados nas instâncias antecedentes harmoniza-se com
a jurisprudência deste Supremo Tribunal, que assentou que a periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi e o risco concreto de
reiteração criminosa, são motivos idôneos para a manutenção da custódia cautelar. Precedentes.
2. Alegação de excesso de prazo para a formação da culpa. Questão não apreciada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e também não apreciada no
Superior Tribunal de Justiça. Impossibilidade de atuação jurisdicional, sob pena de supressão de instância.
3. Ação penal tramitando na origem em prazo razoável, de forma regular, consideradas as peculiaridades do feito. Iminência de prolação da sentença.
4. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa parte, ordem denegada.
AG. REG. NOS SEGUNDOS EMB. INFR. NA AP N. 470-MG
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS INFRINGENTES. REQUISITO OBJETIVO DE
ADMISSIBILIDADE. REGRA DO ART. 333, I, DO REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPUGNAÇÃO DAS
PENAS. INADMISSIBILIDADE. CABIMENTO DO RECURSO APENAS QUANTO AO JUÍZO DE PROCEDÊNCIA DA AÇÃO PENAL,
QUANDO EXISTENTES, NO MÍNIMO, QUATRO VOTOS ABSOLUTÓRIOS. CONSTITUCIONALIDADE DO REQUISITO DE

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 18


ADMISSIBILIDADE DO RECURSO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DE AMPLIAÇÃO DA HIPÓTESE LEGAL DE CABIMENTO.
INCOMPETÊNCIA DO STF PARA LEGISLAR. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
É manifestamente incabível a interposição de embargos infringentes sem que existam, no mínimo, quatro votos absolutórios, como estabelecido no
artigo 333, I, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Precedentes.
O agravante, em nenhuma das condenações objeto do presente recurso, atende a esse requisito legal de cabimento dos embargos infringentes.
A pretensão do agravante de ver suprimida a expressão “sessão secreta”, para permitir os embargos infringentes em todos os julgamentos criminais,
independentemente do quórum de votos vencidos, já foi rejeitada por esta Corte no julgamento de agravo regimental interposto por corréu nesta
mesma ação penal.
Não há previsão de cabimento dos Embargos Infringentes contra apenas parte do acórdão condenatório, como a dosimetria. O art. 333, I, do RISTF,
restringe o âmbito recursal ao juízo de procedência da ação penal, oferecendo ao réu uma nova chance de obter a absolvição, e não de rediscutir todas
as decisões proferidas no acórdão. Descabida a pretensão de aplicar o art. 333, I, parágrafo único, à luz disposto no art. 609 do Código de Processo
Penal, pois a norma geral não derroga a norma especial.
O direito ao duplo grau de jurisdição não dispensa a necessidade de que sejam observados os requisitos impostos pela legislação para o cabimento de
um recurso, qualquer que seja ele. É a lei que cria o recurso cabível contra as decisões e estabelece os requisitos que autorizam a sua interposição,
ausente previsão de recurso ex officio ou reexame obrigatório, independentemente do preenchimento dos pressupostos recursais específicos.
Agravo regimental desprovido.
*noticiado no Informativo 735
AG. REG. NO N. 769.309-CE
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Concurso público. Preenchimento do requisito etário.
Discussão. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Ausência de repercussão geral da matéria. Precedentes.
1. Inadmissível, em recurso extraordinário, o reexame dos fatos e das provas dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF.
2. O Plenário desta Corte, no exame do ARE nº 690.113/RS, Relator o Ministro Cezar Peluso, concluiu pela ausência de repercussão geral do tema
relativo ao “preenchimento de requisitos exigidos em edital de concurso para provimento de cargo público”, dado o caráter infraconstitucional da
matéria.
3. Agravo regimental não provido.
AG. REG. NO RE N. 782.997-DF
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA:Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo. Concurso público. Exame psicotécnico. Subjetividade dos critérios
de avaliação. Impossibilidade. Precedentes.
1. É pacífica a jurisprudência do Tribunal no sentido de ser possível a exigência de teste psicotécnico como condição de ingresso no serviço público,
desde que i) haja previsão no edital regulamentador do certame e em lei; ii) que referido exame seja realizado mediante critérios objetivos e iii) que se
confira a publicidade aos resultados da avaliação, a fim de viabilizar sua eventual impugnação.
2. Agravo regimental não provido.
AG. REG. NO ARE N. 788.795-PR
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. DEVER
DO ESTADO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. AGRAVO A QUE SE
NEGA PROVIMENTO.
I – A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que é solidária a obrigação dos entes da Federação em promover os atos indispensáveis à
concretização do direito à saúde, tais como, na hipótese em análise, o fornecimento de medicamento à recorrida, paciente destituída de recursos
materiais para arcar com o próprio tratamento. Desse modo, a usuária dos serviços de saúde, no caso, possui direito de exigir de um, de alguns ou de
todos os entes estatais o cumprimento da referida obrigação. Precedentes.
II – Agravo regimental a que se nega provimento.

AG. REG. NO ARE N. 709.925-PE


RELATORA: MIN. ROSA WEBER
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. IMPLANTE DE “TUBO DE
AHMED”. GLAUCOMA AVANÇADO. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS. PRECEDENTES. PEDIDO DE APLICAÇÃO DA
SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. INADEQUAÇÃO. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE DA CONTROVÉRSIA. ACÓRDÃO
RECORRIDO PUBLICADO EM 08.02.2012.
A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a saúde é direito de todos. É dever do Estado prestar assistência à saúde, conforme art. 196
da Constituição Federal, podendo o requerente pleitear de qualquer um dos entes federativos – União, Estados, Distrito Federal ou Municípios.
Precedentes.
Controvérsia divergente daquela em que reconhecida a repercussão geral pelo Plenário desta Casa – RE 566.471-RG/RN. Inadequada a aplicação da
sistemática da repercussão geral (art. 543-B do CPC).
Agravo regimental conhecido e não provido.
AG. REG. NO ARE N. 729.746-RJ
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ELEITORAL. DEFERIMENTO DE
REGISTRO DE CANDIDATURA NÃO IMPUGNADA. LEGITIMIDADE PARA RECORRER. SEGURANÇA JURÍDICA. APLICAÇÃO
DE ENTENDIMENTO A PARTIR DAS ELEIÇÕES DE 2014. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A legitimidade do Ministério Público para recorrer da decisão que deferiu o registro de candidatura não impugnada será fixada partir das eleições
de 2014, por razões de segurança jurídica.
2. In casu, o acórdão recorrido assentou: “Agravo regimental. Ilegitimidade. 1 Nos termos da Súmula- TSE n° 11, a parte que não impugnou o pedido
de registro de candidatura, seja ela candidato, partido político, coligação ou o Ministério Público Eleitoral, não tem legitimidade para recorrer da
decisão que o deferiu, salvo se se cuidar de matéria constitucional. 2. Infere-se a ilegitimidade do Ministério Público Eleitoral - ante a ausência de
impugnação - para interpor agravo regimental contra decisão deferitória de pedido de registro que versou sobre questão alusiva ao atendimento da
exigência de apresentação de certidão criminal, a que se referem os arts. 27, II, da Res.-TSE n° 23.373 e 11, 1', VII, da Lei n° 9.50419 7. Agravo
regimental não conhecido.”
3. Agravo regimental DESPROVIDO.
HC N. 114.877-MG

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 19


RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA NO CASO. CONTUMÁCIA
DELITIVA. REPROVABILIDADE DA CONDUTA. PACIENTE MONITORADO POR SISTEMA ELETRÔNICO DE VIGILÂNCIA. CRIME
IMPOSSÍVEL. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DA POSSE MANSA E PACÍFICA DA COISA FURTADA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA
MODALIDADE TENTADA. INVIABILIDADE. ORDEM DENEGADA.
1. O paciente retirou a coisa móvel da esfera de disponibilidade da vítima e, ainda que por um curto período, teve a livre disposição da coisa, moldura
fática suficiente para, na linha de precedentes desta Corte, caracterizar o crime de furto na modalidade consumada.
2. Na hipótese em que o sistema de vigilância não inviabiliza, mas apenas dificulta a consumação do crime de furto, não há que falar na incidência do
instituto do crime impossível por ineficácia absoluta do meio (CP, art. 17). Precedentes.
3. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, para se caracterizar hipótese de aplicação do denominado “princípio da insignificância” e,
assim, afastar a recriminação penal, é indispensável que a conduta do agente seja marcada por ofensividade mínima ao bem jurídico tutelado,
reduzido grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão e nenhuma periculosidade social.
4. Nesse sentido, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade envolve um juízo de tipicidade conglobante, muito mais
abrangente que a simples expressão do resultado da conduta. Importa investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, de modo a
impedir que, a pretexto da insignificância apenas do resultado material, acabe desvirtuado o objetivo a que visou o legislador quando formulou a
tipificação legal. Assim, há de se considerar que “a insignificância só pode surgir à luz da finalidade geral que dá sentido à ordem normativa”
(Zaffaroni), levando em conta também que o próprio legislador já considerou hipóteses de irrelevância penal, por ele erigidas, não para excluir a
tipicidade, mas para mitigar a pena ou a persecução penal.
5. Para se afirmar que a insignificância pode conduzir à atipicidade é indispensável, portanto, averiguar a adequação da conduta do agente em seu
sentido social amplo, a fim de apurar se o fato imputado, que é formalmente típico, tem ou não relevância penal. Esse contexto social ampliado
certamente comporta, também, juízo sobre a contumácia da conduta do agente.
6. Não se pode considerar atípica, por irrelevante, a conduta formalmente típica, de delito contra o patrimônio, praticada por paciente que possui
condenações anteriores transitadas em julgado, sendo uma delas por crime contra o patrimônio.
7. Ordem denegada.
HC N. 118.347-PR
RELATOR: MIN. TEORI ZAVASCKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE DROGAS. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.
PERICULOSIDADE DO AGENTE. GRAVIDADE CONCRETA DO DELITO. APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA
PRISÃO. INVIÁVEL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA.
1. Os fundamentos utilizados revelam-se idôneos para manter a segregação cautelar do paciente, na linha de precedentes desta Corte. É que a decisão
aponta de maneira concreta a necessidade de garantir a ordem pública, ante a periculosidade do agente (= suposto membro de uma organização
criminosa dedicada ao tráfico de drogas, com condenação anterior por posse ilegal de arma de fogo com numeração raspada).
2. As circunstâncias concretas do caso e as condições pessoais do paciente não recomendam a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão
preventiva, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal.
3. Ordem denegada.
HC N. 118.576-SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. DIREITO DE DEFESA. AJUIZAMENTO DE SUSCESSIVOS RECURSOS
MANIFESTAMENTE PROTELATÓRIOS. DETERMINAÇÃO DE IMEDIATA EXECUÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. ALEGAÇÃO
DE INCONSTITUCIONALIDADE DA DECISÃO. IMPROCEDÊNCIA. SOBERANIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA
ANALISAR OS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS DE SUA COMPETÊNCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
ORDEM DENEGADA.
I – O entendimento esposado pelo STJ, no sentido de determinar a imediata execução da sentença condenatória, vai ao encontro de diversos
precedentes desta Corte, que, em várias oportunidades, já decidiu sobre a possibilidade de dar-se início ao cumprimento da pena quando a defesa se
utiliza da interposição de recursos manifestamente incabíveis para obstar o trânsito em julgado da condenação.
II – Não é possível utilizar a via do habeas corpus para rever as decisões do Superior Tribunal de Justiça quanto à admissibilidade ou não do apelo
especial. Essa questão, aliás, não está relacionada diretamente com a liberdade de locomoção do paciente.
III – Ordem denegada.
ADI N. 144-RN
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Artigo 28, § 5º, da Constituição do Estado do Rio Grande do Norte. 3. Fixação de data para o pagamento dos
vencimentos dos servidores públicos estaduais e municipais, da administração direta, indireta, autárquica, fundacional, de empresa pública e de
sociedade de economia mista, corrigindo-se monetariamente os seus valores se pagos em atraso. 4. Violação dos artigos 34, VII, c, e 22, I, da
Constituição Federal. 5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente para confirmar a medida liminar e declarar
inconstitucionais as expressões “municipais” e “de empresa pública e de sociedade de economia mista”, constantes do § 5º, art. 28, da Constituição do
Estado do Rio Grande do Norte.
*noticiado no Informativo 736
RE N. 550.769-RJ
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. SANÇÃO POLÍTICA. NÃO-PAGAMENTO DE TRIBUTO. INDÚSTRIA DO CIGARRO.
REGISTRO ESPECIAL DE FUNCIONAMENTO. CASSAÇÃO. DECRETO-LEI 1.593/1977, ART. 2º, II.
1. Recurso extraordinário interposto de acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que reputou constitucional a exigência de
rigorosa regularidade fiscal para manutenção do registro especial para fabricação e comercialização de cigarros (DL 1.593/1977, art. 2º, II).
2. Alegada contrariedade à proibição de sanções políticas em matéria tributária, entendidas como qualquer restrição ao direito fundamental de
exercício de atividade econômica ou profissional lícita. Violação do art. 170 da Constituição, bem como dos princípios da proporcionalidade e da
razoabilidade.
3. A orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal rechaça a aplicação de sanção política em matéria tributária. Contudo, para se caracterizar
como sanção política, a norma extraída da interpretação do art. 2º, II, do Decreto-lei 1.593/1977 deve atentar contra os seguintes parâmetros: (1)
relevância do valor dos créditos tributários em aberto, cujo não pagamento implica a restrição ao funcionamento da empresa; (2) manutenção
proporcional e razoável do devido processo legal de controle do ato de aplicação da penalidade; e (3) manutenção proporcional e razoável do devido
processo legal de controle da validade dos créditos tributários cujo não-pagamento implica a cassação do registro especial.
4. Circunstâncias que não foram demonstradas no caso em exame.
5. Recurso extraordinário conhecido, mas ao qual se nega provimento.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 20


*noticiado no Informativo 707
RHC N. 111.438-DF
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DECISÃO DE MINISTRA RELATORA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
QUE NÃO CONHECEU DE AGRAVO REGIMENTAL POR SER INTEMPESTIVO E POR FALTAR CAPACIDADE POSTULATÓRIA AO
RECORRENTE. WRIT QUE PRETENDIA O CANCELAMENTO DE ORDEM DE SERVIÇO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SÃO PAULO. ORDEM DE SERVIÇO REVOGADA POR PORTARIA DA CORTE PAULISTA. RECURSO PREJUDICADO.
I – A impetração manejada na Corte Superior tinha por objeto o cancelamento da Ordem de Serviço 2/2010 do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, que determinava o encaminhamento das petições subscritas de próprio punho pelos presos protocolizadas naquele Tribunal à Defensoria
Pública do Estado, para as providências cabíveis.
II – Por meio do Ofício 5.906/13 – GAP 1.1/HC, o Desembargador Presidente da Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
esclarece que a Ordem de Serviço 2/2010 foi revogada pela Portaria 1/2011, expedida pela Presidência da Seção Criminal do Tribunal paulista em
25/11/2011.
III – Recurso ordinário que restou prejudicado pela perda superveniente de seu objeto remoto, qual seja, o cancelamento da Ordem de Serviço 2/2010
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
IV – Recurso ordinário prejudicado.
*noticiado no Informativo 719
AG. REG. NO ARE N. 735.077-ES
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Concurso público. Reserva de vagas para portadores de deficiência.
Arredondamento do coeficiente fracionário para o primeiro número inteiro subsequente. Impossibilidade. Precedentes.
1. A Corte de origem concluiu que o arredondamento do percentual de vagas destinadas ao portadores de deficiência equivaleria a 100% das vagas
ofertadas.
2. A jurisprudência da Corte firmou o entendimento de que a reserva de vagas para portadores de deficiência deve ater-se aos limites da lei, na medida
da viabilidade das vagas oferecidas, não sendo possível seu arredondamento no caso de majoração das porcentagens mínima e máxima previstas.
3. Agravo regimental não provido.
AG. REG. NO ARE N. 759.649-RN
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Previdenciário. União estável reconhecida na origem. Reexame de
fatos e provas. Impossibilidade. Precedentes.
1. Inadmissível, em recurso extraordinário, o reexame dos fatos e das provas da causa. Incidência da Súmula nº 279/STF.
2. Agravo regimental não provido.
AG. REG. NO AI N. 836.957-MA
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no agravo de instrumento. Servidor público. Férias não gozadas. Indenização. Possibilidade. Precedentes.
1. É pacífica jurisprudência da Corte no sentido de que o servidor público tem direito ao recebimento de indenização pelas férias não gozadas por
vontade da Administração, tendo em vista a vedação ao enriquecimento sem causa.
2. Agravo regimental não provido.
AG. REG. NO AI N. 851.884-SP
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no agravo de instrumento. Matéria criminal. Cerceamento de defesa. Matéria infraconstitucional. Ofensa
reflexa à Constituição. Precedentes. Negativa de prestação jurisdicional. Não ocorrência. Desnecessidade de o órgão judicante se manifestar
sobre todos os argumentos de defesa apresentados. Fundamentação calcada em razões suficientes para a formação do convencimento.
Reafirmação da jurisprudência em sede de repercussão geral reconhecida. Precedente.
1. Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a afronta aos princípios da ampla defesa e do contraditório, entre outros, quando
depende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais, configura apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal,
o que não enseja reexame da matéria em recurso extraordinário.
2. A jurisdição foi prestada, na espécie, mediante decisão suficientemente motivada, não obstante contrária à pretensão da recorrente, tendo o Tribunal
de origem, como se observa no julgado proferido, explicitado suas razões de decidir.
3. O art. 93, inciso IX, da Constituição não determina que o órgão judicante se manifeste sobre todos os argumentos de defesa apresentados, mas, sim,
que ele explicite as razões que entendeu suficientes à formação de seu convencimento.
4. Ao reconhecer a repercussão geral desse tema, o Plenário do Supremo Tribunal Federal reafirmou essa orientação (AI nº 791.292/PE-RG-QO,
Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 13/8/10).
5. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

RHC N. 118.109-RS
RELATORA: MIN. ROSA WEBER
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO DENEGADA NO STJ POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. FURTO.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. REINCIDÊNCIA. REPROVABILIDADE DA CONDUTA.
1. O Superior Tribunal de Justiça observou os precedentes da Primeira Turma desta Suprema Corte que não vêm admitindo a utilização de habeas
corpus em substituição a recurso constitucional.
2. Avalia-se a pertinência do princípio da insignificância, em casos de pequenos furtos, a partir não só do valor do bem subtraído, mas também de
outros aspectos relevantes da conduta imputada.
3. A reincidência revela reprovabilidade suficiente a afastar a aplicação do princípio da insignificância (ressalva de entendimento da Relatora).
4. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento.
*noticiado no Informativo 719
Acórdãos Publicados: 481

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 21


TRANSCRIÇÕES
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais
aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham
despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Concurso Público - Procedimentos Penais - Ausência de Condenação Irrecorrível - Presunção Constitucional de Inocência -
Exclusão do Candidato - Inadmissibilidade (Transcrições)
ARE 733.957-AgR/CE*
RELATOR: Ministro Celso de Mello
EMENTA: CONCURSO PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO. INVESTIGAÇÃO SOCIAL. VIDA PREGRESSA DO CANDIDATO.
EXISTÊNCIA DE REGISTROS CRIMINAIS. PROCEDIMENTOS PENAIS DE QUE NÃO RESULTOU CONDENAÇÃO CRIMINAL
TRANSITADA EM JULGADO. EXCLUSÃO DO CANDIDATO. IMPOSSIBILIDADE. TRANSGRESSÃO AO POSTULADO
CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA
SEGUIMENTO.
- A exclusão de candidato regularmente inscrito em concurso público, motivada, unicamente, pelo fato de existirem registros de infrações
penais de que não resultou condenação criminal transitada em julgado vulnera, de modo frontal, o postulado constitucional do estado de
inocência, inscrito no art. 5º, inciso LVII, da Lei Fundamental da República. Precedentes.
DECISÃO: Reconsidero a decisão ora agravada, restando prejudicado, em consequência, o exame do recurso contra ela interposto. Passo, desse
modo, a apreciar o presente agravo. E, ao fazê-lo, observo que o recurso extraordinário em questão foi interposto contra acórdão que, proferido
pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, está assim ementado:
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE AGENTE PENITENCIÁRIO.
CANDIDATO ELIMINADO NA FASE DE INVESTIGAÇÃO SOCIAL. INEXISTÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA COM
TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DE CANDIDATO. PRECEDENTES DO STF E DESTA CORTE DE
JUSTIÇA.
– Preliminar de necessidade de intimação dos outros candidatos na qualidade de litisconsortes afastada, visto que esses não possuem
ainda o direito líquido e certo à nomeação.
– No mérito, é entendimento consolidado, quer no Supremo Tribunal Federal, quer nesta Corte de Justiça que a fase de investigação
social deve ser realizada com temperança, haja vista que o princípio da presunção de inocência deve suplantar as situações em que o
candidato não tenha ainda sentença condenatória.
– No caso de que se cuida, foi constatado que o apelado recebeu a decretação de extinção da punibilidade, em processo que tramitou
na 1ª Vara de Delitos de Trânsito e teve arquivada outra ação, que correu na 11ª Unidade dos Juizados Cíveis e Criminais, não se prestando
qualquer delas para infirmar a idoneidade do candidato.
– Os honorários e custas foram fixados em consonância com as disposições do art. 20, § 4º, para as causas de pequeno valor, não
havendo necessidade de mudança.
– Recursos oficial e voluntário conhecidos, mas desprovidos.” (grifei)
O Estado do Ceará, ao deduzir o apelo extremo em referência, alega que o Tribunal de Justiça local teria transgredido os preceitos inscritos
no art. 2º e no art. 5º, “caput” e inciso LVII, da Constituição da República.
O Ministério Público Federal, em manifestação do eminente Procurador-Geral da República Dr. RODRIGO JANOT MONTEIRO DE
BARROS, opinou pelo improvimento do presente recurso de agravo, com apoio em parecer assim ementado:
“AGRAVO REGIMENTAL. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO. INVESTIGAÇÃO SOCIAL. ELIMINAÇÃO
DO CERTAME POR POSSUIR REGISTROS CRIMINAIS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE E ARQUIVAMENTO
PELO ÓRGÃO MINISTERIAL. ELIMINAÇÃO QUE VIOLA O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.
1. A questão constitucional acerca da possibilidade de exclusão de candidato de concurso público por possuir registro criminal, ainda
quando tenha obtido transação penal, sentença de extinção da punibilidade ou quando declarada a prescrição da pretensão punitiva do
Estado não se identifica, em todos os seus aspectos , com a questão constitucional cuja repercussão geral foi reconhecida nos autos do RE
560.900-RG (tema nº 22), referente à restrição à participação em concurso público de candidato que responde a processo criminal a
pressupor a exigência do trânsito em julgado.
2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considerado o princípio da presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII), tem reputado
inconstitucionais as exclusões de candidatos de concursos públicos pelo fato de ter respondido a processo-crime em que tenha obtido transação penal
ou sentença de extinção da punibilidade. Precedentes.
3. Parecer pelo desprovimento do agravo regimental.” (grifei)
Entendo revelar-se inviável o recurso extraordinário a que se refere o presente agravo, eis que a pretensão jurídica deduzida pelo Estado do
Ceará mostra-se colidente com a presunção constitucional de inocência, que se qualifica como prerrogativa essencial de qualquer cidadão,
impregnada de eficácia irradiante, o que a faz projetar-se sobre todo o sistema normativo, consoante decidiu o Supremo Tribunal Federal em
julgamento revestido de efeito vinculante (ADPF 144/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
Com efeito, a controvérsia suscitada na presente causa já foi dirimida, embora em sentido diametralmente oposto ao ora sustentado pelo
Estado do Ceará, por ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal que reafirmaram a aplicabilidade, aos concursos públicos, da presunção
constitucional do estado de inocência:
“CONCURSO PÚBLICO – CAPACITAÇÃO MORAL – PROCESSO-CRIME – PRESCRIÇÃO. Uma vez declarada a prescrição da
pretensão punitiva do Estado, descabe evocar a participação do candidato em crime, para se dizer da ausência da capacitação moral exigida
relativamente a concurso público.”

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 22


(RTJ 183/327, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei)
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO
PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO DO DF. INVESTIGAÇÃO SOCIAL E FUNCIONAL. SENTENÇA PENAL EXTINTIVA DE
PUNIBILIDADE. OFENSA DIRETA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. MATÉRIA INCONTROVERSA. NÃO
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279. AGRAVO IMPROVIDO.
I – Viola o princípio constitucional da presunção de inocência, previsto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, a exclusão de
candidato de concurso público que foi beneficiado por sentença penal extintiva de punibilidade.
II - A Súmula 279 revela-se inaplicável quando os fatos da causa são incontroversos, tendo o Tribunal ‘a quo’ atribuído a eles
conseqüências jurídicas discrepantes do entendimento desta Corte.
III - Agravo regimental improvido.”
(RE 450.971-AgR/DF, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – grifei)
Essa orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal apoia-se no fato de que a presunção de inocência representa uma notável conquista
histórica dos cidadãos, em sua permanente luta contra a opressão do poder.
O postulado do estado de inocência encerra, em favor de qualquer pessoa que esteja sofrendo ou que já tenha sofrido persecução penal de
que não haja resultado condenação criminal transitada em julgado, o reconhecimento de uma verdade provisória, que repele suposições ou juízos
prematuros de culpabilidade, até que sobrevenha – como o exige a Constituição do Brasil (art. 5º, inciso LVII) – o trânsito em julgado da
condenação penal. Só então deixará de subsistir, em favor da pessoa condenada, a presunção (constitucional) de que é inocente.
Há, portanto, um momento claramente definido no texto constitucional, a partir do qual se descaracteriza a presunção de inocência, vale dizer,
aquele instante em que sobrevém o trânsito em julgado da condenação criminal. Antes desse momento – insista-se –, o Estado não pode tratar os
indiciados ou réus como se culpados já fossem. A presunção de inocência impõe, desse modo, ao Poder Público, um dever de tratamento que não pode
ser desrespeitado por seus agentes e autoridades, tal como tem sido constantemente enfatizado pelo Supremo Tribunal Federal:
“O POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O ESTADO TRATE, COMO SE
CULPADO FOSSE, AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A prerrogativa jurídica da liberdade – que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) – não pode ser ofendida por
interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar,
paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da
ordem.
Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime indigitado como grave, e até que sobrevenha sentença penal condenatória
irrecorrível, não se revela possível – por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) – presumir-lhe a culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que
exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado.
O princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes conseqüências,
uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao
réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. Precedentes.”
(HC 95.886/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Mostra-se importante acentuar que a presunção de inocência não se esvazia progressivamente, à medida em que se sucedem os graus de
jurisdição, a significar que, mesmo confirmada a condenação penal por um Tribunal de segunda instância (ou por qualquer órgão colegiado de
inferior jurisdição), ainda assim subsistirá, em favor do sentenciado, esse direito fundamental, que só deixa de prevalecer – repita-se – com o
trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Vale referir, no ponto, a esse respeito, a autorizada advertência do eminente Professor LUIZ FLÁVIO GOMES, em obra escrita com o
Professor VALÉRIO DE OLIVEIRA MAZZUOLI (“Direito Penal – Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos/Pacto de
San José da Costa Rica”, vol. 4/85-91, 2008, RT):
“O correto é mesmo falar em princípio da presunção de inocência (tal como descrito na Convenção Americana), não em princípio da
não-culpabilidade (esta última locução tem origem no fascismo italiano, que não se conformava com a idéia de que o acusado fosse, em
princípio, inocente).
Trata-se de princípio consagrado não só no art. 8º, 2, da Convenção Americana senão também (em parte) no art. 5°, LVII, da Constituição
Federal, segundo o qual toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada por sentença transitada em julgado. Tem previsão
normativa desde 1789, posto que já constava da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Do princípio da presunção de inocência (‘todo acusado é presumido inocente até que se comprove sua culpabilidade’) emanam duas
regras: (a) regra de tratamento e (b) regra probatória.
‘Regra de tratamento’: o acusado não pode ser tratado como condenado antes do trânsito em julgado final da sentença condenatória
(CF, art. 5°, LVII).
O acusado, por força da regra que estamos estudando, tem o direito de receber a devida ‘consideração’ bem como o direito de ser
tratado como não participante do fato imputado. Como ‘regra de tratamento’, a presunção de inocência impede qualquer antecipação de
juízo condenatório ou de reconhecimento da culpabilidade do imputado, seja por situações, práticas, palavras, gestos etc., podendo-se
exemplificar: a impropriedade de se manter o acusado em exposição humilhante no banco dos réus, o uso de algemas quando desnecessário,
a divulgação abusiva de fatos e nomes de pessoas pelos meios de comunicação, a decretação ou manutenção de prisão cautelar
desnecessária, a exigência de se recolher à prisão para apelar em razão da existência de condenação em primeira instância etc. É contrária à
presunção de inocência a exibição de uma pessoa aos meios de comunicação vestida com traje infamante (Corte Interamericana, Caso Cantoral
Benavides, Sentença de 18.08.2000, parágrafo 119).” (grifei)
Disso resulta, segundo entendo, que a consagração constitucional da presunção de inocência como direito fundamental de qualquer
pessoa há de viabilizar, sob a perspectiva da liberdade, uma hermenêutica essencialmente emancipatória dos direitos básicos da pessoa humana,
cuja prerrogativa de ser sempre considerada inocente, para todos e quaisquer efeitos, deve prevalecer, até o superveniente trânsito em julgado da
condenação judicial, como uma cláusula de insuperável bloqueio à imposição prematura de quaisquer medidas que afetem ou que restrinjam,
seja no domínio civil, seja no âmbito político, a esfera jurídica das pessoas em geral.
Nem se diga que a garantia fundamental de presunção de inocência teria pertinência e aplicabilidade unicamente restritas ao campo do direito
penal e do direito processual penal.
Torna-se importante assinalar, neste ponto, que a presunção de inocência, embora historicamente vinculada ao processo penal, também
irradia os seus efeitos, sempre em favor das pessoas, contra o abuso de poder e a prepotência do Estado, projetando-os para esferas não criminais, em ordem
a impedir, dentre outras graves consequências no plano jurídico – ressalvada a excepcionalidade de hipóteses previstas na própria Constituição –, que se
formulem, precipitadamente, contra qualquer cidadão, juízos morais fundados em situações juridicamente ainda não definidas (e, por isso mesmo,

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 23


essencialmente instáveis) ou, então, que se imponham, ao réu, restrições a seus direitos, não obstante inexistente condenação judicial transitada
em julgado.
O que se mostra relevante, a propósito do efeito irradiante da presunção de inocência, que a torna aplicável a processos (e a domínios) de
natureza não criminal, é a preocupação, externada por órgãos investidos de jurisdição constitucional, com a preservação da integridade de um princípio
que não pode ser transgredido por atos estatais (como a exclusão de concurso público motivada pela mera existência de registros criminais em nome do
candidato, sem a nota, porém, do trânsito em julgado da condenação penal) que veiculem, prematuramente, medidas gravosas à esfera jurídica das
pessoas, que são, desde logo, indevidamente tratadas, pelo Poder Público, como se culpadas fossem, porque presumida, por arbitrária antecipação
fundada em juízo de mera suspeita, a culpabilidade de quem figura, em processo penal ou civil, como simples réu!
Cabe referir, por extremamente oportuno, que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento plenário (RE 482.006/MG, Rel. Min.
RICARDO LEWANDOWSKI), e interpretando a Constituição da República, observou, em sua decisão, essa mesma diretriz – que faz incidir a
presunção constitucional de inocência também em domínio extrapenal –, explicitando que esse postulado constitucional alcança quaisquer medidas
restritivas de direitos, independentemente de seu conteúdo ou do bloco que compõe, se de direitos civis ou de direitos políticos.
A exigência de coisa julgada, tal como estabelecida no art. 5º, inciso LVII, de nossa Lei Fundamental, representa, na constelação axiológica
que se encerra em nosso sistema constitucional, valor de essencial importância na preservação da segurança jurídica e dos direitos do cidadão.
Mostra-se relevante acentuar, por isso mesmo, o alto significado que assume, em nosso sistema normativo, a coisa julgada, pois, ao
propiciar a estabilidade das relações sociais, ao dissipar as dúvidas motivadas pela existência de controvérsia jurídica (“res judicata pro veritate
habetur”) e ao viabilizar a superação dos conflitos, culmina por consagrar a segurança jurídica, que traduz, na concreção de seu alcance, valor de
transcendente importância política, jurídica e social, a representar um dos fundamentos estruturantes do próprio Estado democrático de direito.
Em suma: a submissão de uma pessoa a meros inquéritos policiais – ou, ainda, a persecuções criminais de que não haja derivado, em
caráter definitivo, qualquer título penal condenatório – não se reveste de suficiente idoneidade jurídica para autorizar a formulação, contra o
indiciado ou o réu, de juízo (negativo) de maus antecedentes, em ordem a recusar, ao que sofre ou ao que já sofreu (sem sentença condenatória
transitada em julgado) a “persecutio criminis”, o acesso a determinados benefícios legais ou o direito de participar de concursos públicos:
“PRESUNÇÃO CONSTITUCIONAL DE NÃO CULPABILIDADE (CF, ART. 5º, LVII). MERA EXISTÊNCIA DE INQUÉRITOS
POLICIAIS EM CURSO (OU ARQUIVADOS), OU DE PROCESSOS PENAIS EM ANDAMENTO, OU DE SENTENÇA CONDENATÓRIA
AINDA SUSCETÍVEL DE IMPUGNAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA, EM TAIS SITUAÇÕES, DE TÍTULO PENAL CONDENATÓRIO
IRRECORRÍVEL. CONSEQÜENTE IMPOSSIBILIDADE DE FORMULAÇÃO, CONTRA O RÉU, COM BASE EM EPISÓDIOS
PROCESSUAIS AINDA NÃO CONCLUÍDOS, DE JUÍZO DE MAUS ANTECEDENTES. PRETENDIDA CASSAÇÃO DA ORDEM DE
‘HABEAS CORPUS’. POSTULAÇÃO RECURSAL INACOLHÍVEL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO.
- A formulação, contra o sentenciado, de juízo de maus antecedentes, para os fins e efeitos a que se refere o art. 59 do Código Penal, não
pode apoiar-se na mera instauração de inquéritos policiais (em andamento ou arquivados), ou na simples existência de processos penais em
curso, ou, até mesmo, na ocorrência de condenações criminais ainda sujeitas a recurso.
É que não podem repercutir, contra o réu, sob pena de transgressão ao postulado constitucional da não culpabilidade (CF, art. 5º,
LVII), situações jurídico-processuais ainda não definidas por decisão irrecorrível do Poder Judiciário, porque inexistente, em tal contexto,
título penal condenatório definitivamente constituído. Doutrina. Precedentes.”
(RE 464.947/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Tal entendimento – que se revela compatível com a presunção constitucional “juris tantum” de inocência (CF, art. 5º, LVII) – ressalta,
corretamente, e com apoio na jurisprudência dos Tribunais (RT 418/286 – RT 422/307 – RT 572/391 – RT 586/338), que processos penais em
curso, ou inquéritos policiais em andamento ou, até mesmo, condenações criminais ainda sujeitas a recurso não podem ser considerados,
enquanto episódios processuais suscetíveis de pronunciamento judicial absolutório, como elementos evidenciadores de maus antecedentes do réu
(ou do indiciado) ou justificadores da adoção, contra eles ou o candidato, de medidas restritivas de direitos.
É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal já decidiu, por unânime votação, que “Não podem repercutir, contra o réu, situações
jurídico-processuais ainda não definidas por decisão irrecorrível do Poder Judiciário, especialmente naquelas hipóteses de inexistência de título
penal condenatório definitivamente constituído” (RTJ 139/885, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
O exame da presente causa evidencia que o acórdão impugnado em sede recursal extraordinária ajusta-se à diretriz jurisprudencial que esta
Suprema Corte firmou na matéria em análise, o que desautoriza, por completo, a postulação recursal deduzida pelo Estado do Ceará.
Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, conheço do presente agravo, para negar seguimento ao recurso extraordinário, eis
que o acórdão recorrido está em harmonia com diretriz jurisprudencial prevalecente nesta Suprema Corte (CPC, art. 544, § 4º, II, “b”, na redação
dada pela Lei nº 12.322/2010).
Publique-se.
Brasília, 06 de dezembro de 2013.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
*decisão publicada no DJe de 12.12.2013

OUTRAS INFORMAÇÕES
31 de março a 4 de abril de 2014

Decreto nº 8.219, de 28.3.2014 - Altera o Decreto nº 7.535, de 26.7.2011, que institui o Programa Nacional de
Universalização do Acesso e Uso da Água - “ÁGUA PARA TODOS”, para dispor sobre a criação de Conselhos
Consultivos. Publicado no DOU em 31.3.2014, Seção 1, p. 7.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)
Feriado - Secretaria - Expediente Forense - Prazo Processual. Portaria de Prazo nº 63/STF, de 1º de abril de
2014 - Comunica que não haverá expediente na Secretaria do Tribunal nos dias 16, 17, 18 e 21 de abril de 2014. E
comunica, também, que os prazos que porventura devam iniciar-se ou completar-se nesses dias ficam automaticamente
prorrogados para o dia 22 de abril subsequente (terça-feira). Publicada no DJE/STF, n. 66, p. 433, em 3.4.2014.

Informativo 741-STF (29/04/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 24

Você também pode gostar