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ANO III JANEIRO

a o
N° 8 RASIL 1977

SOCIALISTA

ORGANIZAR A RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES


CONSTRUIR O PARTIDO RE\(QLUCIONARIO DO PROLETARIADO

•*

Editorial

Notas críticas *

para a discussão do P.S.B.


Henrique Lima

O proletariado

e as eleições de novembro
APML

Socialismo

e liberdades democráticas
Daniel Terra

O processo da revolução

democrática popular

em Moçambique
Samora Moisés Machei

toci ; , A
BRASIL SOCIALISTA— revista teórica e política trimestral, editada no pais e no
exterior. Preços : no Brasil— 10 cruzeiros (ordinário) e 40 cruzeiros (de apoio); no
exterior—2 US dólares (ordinário) e 4 US dólares (de apoio). Assinatura anual no
exterior (4 exemplares); 8 US dólares (ordinária), 10 US dólares (por aviSo) e 15 US
dólares (de apoio). Cheques para CCP 10-29659 Nouvelles Edltions Populaires
(Brasil SocialIste) —1004— Renens—Suiça; ou para M. Thery—B.P. 229-03—Pa-
ris— França. Endereço para correspondência no exterior: M. Thery— B.P.
229-03— Paris—França.
Os artigos assinados sSo de responsabilidade de seus autores. nSo expressan-
do necessàriamente o ponto de vista do Comitê de RedaçSo.

SUMA A10 CQ PÍÜMfcftÜ $

EDITOFflAL— Na página 1, o Comitê de Redaçffo analisa o episódio eleitoral de 15


de novembro, a intervenção das diversas forças políticas na campanha e os
resultados, entregando, ao mesmo tempo, alguns elementos para a análise da
conjuntura.
TATICA — Na página 11, publicamos um texto do Secretariado Nacional da AçBo
Popular Marxista Lenlnista(APML), Intitulado «O Proletariado e as EleiçGes de No-
vembro», onde silo aprofundadas inúmeras questóes sobre a atual sítuaçao
política, o pleito de 15 de novembro passado e a poslçffo da APML frente a ele.

DEBATE — O companheiro Henrique Uma dá prosseguimento ao debate de


diversos problemas programátieos, em seu artigo «Notas Criticas para a Discussão
do Programa Socialista para o Brasil (PSB)», publicado na pagina 34.

DEBATE — O camarada Daniel Terra, militante do Movimento Revolucionário 8 de


Outubro (MR-8), prossegue a critica contra o doutrlnarlsmo e o économlcismo,
através de novo artigo: «Socialismo e Liberdades Democráticas». 0 texto foi
discutido e aprovado pela direção do MR-8. Pagina 64.

INTERNACIONAL — Nossa seçflo internacional está dedicada desta vez à


RevoluçSo Moçambicana. Publicamos um texto do presidente da Frente de
LibertaçSo de Moçambique, companheiro Samora Moisés Machel, que fornece
valiosos elementos para a compreensão da história da luta anti-colonialista e
antl-Imperiallsta dirigida pela FRELIMO. Página 114

BRASÍL SOplAUSTA: diretor de pubúcaçSo -f Míchei Thery.


DENUNCIA
A ditadura militar prossegue em seu caminho de terror e de crimes contra a
classe operária e o povo, atacando suas lutas, reprimindo suas organizações,
prendendo, torturando© matando seus militantes. Nos últimos meses do ano, uma
nova e selvagem ofensiva repressiva foi desencadeada pelos orgSos de repressão.
Os grupos terroristas para*policiais, como a Aliança Anti-comunista Brasileira
(AAB), composta por oficiais das forças armadas e por policiais, atuam
ímpunlmenle, sob o olhar cúmplice da ditadura militar. Inúmeras agressões contra
militantes operários e estudantes, contra religiosos combativos, contra personali-
dades e instituições que $e opõem à ditadura, continuam a serem praticadas por
estes bandos ultra-reaclonárlos.
Os orgSos de segurança investem também contra os setores religiosos,
notadamente da igreja Católica, que vem reconhecendo seu lugar no campo da
oposiçSo popular e manifestando seu repúdio à situaçSo atual. O assassinato do
padre JoSo Bosco Burnler peia policia de RlbeirSo Bonito marcou tràglcamente a
leia de provocações e intimidações orientadas pelos centros de repressSo e
torturas das FFAA.
Os crimes da ditadura militar ganharam sua expressSo mais brutal com o
assassinato dos militantes revolucionários PEDRO POMAR, ÂNGELO ARROIO e
JOÂO BATISTA DRUMONO e com a detençSo de numerosos militantes e dirigentes
do Partido Comunista do Brasil (PCdo B), que foram submetidos a todos os tipos
de maus-tratos e torturas nas dependências do II Exército.
E Indispensável denunciar todos estes crimes, defender as lutas e as
organizações operárias e populares, entregar ampla e irrestrita solidariedade aos
combatentes perseguidos.
Chamamos a todos a:
— NBo se intimidarem diante dos orglos para-pollcíals tipo AAB, a
prosseguirem ativamente a luta operária e popular, a reagirem o a organizarem a
reaçSo das massas contra qualquer atentado terrorista, a lançarem campanhas
sistemáticas de denúncia da AAB.
— A entregarem especialmente, no momento atual, a mais ampla solidariedade
aos militantes, simpatizantes e amigos do PC do B, sobre quom vem, se
concentrando a última investida repressiva. Defender o PC do B, proteger seus
militantes, entregar-lhes a solidariedade revolucionária — eis uma tarefa que cabe
atodososqueiutamcontraa ditadura militar em nosso pais, e especialmente,-aos
verdadeiros comunistas.

Comitê de RedaçSo.
editorial

Editorial :

As eleições de novembro,

o movimento popular

e a conjuntura nacional

t. A conjuntura pré-eieltoral
ção à ditadura, cada vez ela encon-
Como havíamos situado em nos- trava maiores dificuldades para se
so editorial anterior, o episódio manter nessa posição, desgastan-
eleitoral de novembro último reali- do-se diante do movimento de mas-
zou-se numa conjuntura marcada sas, o que foi então agravado pelo
pela crise economica que atravessa caso de corrupção na Assembléia
o pala e pelo acirramento das contra- Legislativa de São Paulo, envolven-
dições sociais e políticas em todos do seu presidente, o emedebista
os níveis. Leonel Juilo.
No que toca às ciasses dominan- A democracia pequeno-burguesa
tes, o processo de institucionaliza- seguia expressando-se na oposição,
ção da ditadura militar entrava em ainda que de forma vacilante, osci-
àgua morna. Sofrendo pressões de lando entre uma posição firme e o
todos os lados — da corrente Mèdicl compromisso. Destaca-se nessa â-
no sentido de um endurecimento, rea, a abertura de novos e importan-
dos setores «liberais» da grande tes atritos entre a ditadura e a igreja,
burguesia no sentido de apressó-lo provocando a radicalização dos seus
— o processo de Institucionalização setores progressistas e o agrava-
da ditadura militar não conseguia mento das contradições — expres-
sair do impasse a que chegara. sas públlcamente — entres estes e
Por sua vez, a oposição moderada os setores pró-dltadura.
ck> MDB vinha se moderando cada Ao nível do movimento de mas-
vez mais. Ainda que mantendo a sas, persistia o descontentamento
hegemonia do movimento de oposi- generalizado, que se manifesta seja

1
v3
através das explosões, violentas, tivos. Ao nivei regional, fortalece-
como quebra-Quebras tao comuns ram-se os DCEs, onde já existiam, e
hoje, seja através do aproveitamento novos DCEs foram criados, como
de todas as brechas legais, como em São Paufo e em Brasflia. Ao nlvef
ficou demonstrado no enteno de JK nacional, diversos encontros foram
e, mais recentemente, no de Jango. realizados, gerais e por áreas, con-
O movimento operário e popufar tribuindo para a sistematízaçSo e
seguia em seu processo de reanima- troca de experiências, e avançando
ção, ainda que se mantendo numa no caminho da reorganização nacio-
posição de defensiva. No movimento nal do ME.
operário, aumentava o número de Ainda ao nivei da pequena bur-
conflitos. Neste ano que passou, guesia radicalizada, novos setores
fortaleceram-se as o posições avançaram no processo de retomada
sindicais e demais lideranças cias- de suas lutas especificas, de reor-
slstas. Novas o posições foram cria- ganização ou criação de oposições
das. Porém, as lutas continuam em sindicais e entidades por categoria,
geral mantendo seu caráter eccno- além de alguns deles terem partici-
mico, parcial e localizado. As o posi- pado destacamente das lutas por
ções sindicais « demais lideranças liberdades democráticas. Nesse
classistas nlo conseguiram ainda processo, destacam-se as categori-
Íianhar uma base de massas nas as dos bancérios, Jornalistas, pro-
abrtcas e se firmar enquanto alter- fessores e advogados.
nativa ás direções pefegas. Ainda ao nivei do movimento
Por sua vez, o movimento de operário e popular, a luta pela anis-
bairros ganhou um impulso bastan- tia geral e irrestrita vem flrmando-se
te grande, expandindo-se para no- como uma bandeira levantada por
vas áreas, criando-se novas entida- setores cada vez mais amplos. Por
des de bairro, clubes da mfisa, etc, e sua vez, o movimento de mulheres,
ensaiando os primeiros passos no unindo a luta pela emancipação
sentido de uma maior coordenação. feminina com a luta pela emancipa-
Exemplo vivo e significativo desse ção social, surgia como um dado
fenômeno foi a Assembléia do Cus- novo, forjando seus canais de ex-
to de Vida, realizada nos bairros da pressão e ensaiando suas primeiras
periferia de Sio Paulo. manifestações. Um fenômeno tam-
No campo, prosseguiam e se bém novo, que vem ganhando exten-
Intensificavam em diversas áreas do são e merecendo uma maior aten-
pais as lutas pets posse da terra. Ao ção, ê o surgimento e proliferação
mesmo tampo, faziam-se manifes- de uma imprensa independente em
tar sinaie ainda débeis de movimen- relação aos grandes meios de co-
tações trabalhistas entre os assala- municação'de massa, a chamada
riados agrícolas, tanto em 81o Pau- «Imprensanahlca». Com jornais de
lo, como no Nordeste. diversas características, hoje so-
O movimento estudantil avançou mam quase 80 em todo o pala.
bastante no seu processo de reani- Todos esses fenômenos revelam
mação. Este ano, as lutas foram o prosseguimento da rean imoção do
mais constantes, prlnclpeiments ao movimento de massas. Porém, este
nível relvindlcatôrlo, mas também permanece globaimente numa situ-
no plano político. O processo de ação de defensiva. Ainda que as
reorganlzaçSo das entidades estu- lutas operárias venham se generali-
dantis paâsòu por avanços significa- zando® deixando marcas na conjun-
2
tura, permanece a contradição entre meote contra sua expressão mais
o grau de combatividade alcançado gritante, cuja encarnação ô a PO,
pelo ME e o nlvel ainda incipiente do que aprofunda eua marcha no senti-
movimento operário, que, no entan- do de tomar-ae cada vez mala foco
to, è a única força capaz de estabili- de Hquldackmismo no Interior da
zar e dar uma direção consequente esquerda brasileira. No entanto,
ao movimertb de massas. quanto a esta questão á digno de
No tocante à esquerda, o PCB nota o fato de que a PO enfraqueceu-»
prosseguia sem conseguir superaT se e perdeu terreno, sèndo o seu
sua crise política e orgânica. Essa peso político hoje bastante mais
crise è resultado, por um lado; dos reduzido que há um par de anos
golpes profundos que sofreu da atrás.
repressão, edos quais ainda nSo se Por outro lado, organizações co-
recompos inteiramente, e, por ou- mo o Movimento de Emancipação
tro, dos erros de sua política que vão do Proletariado {MEP)é o Movimen-
ficando cada vez mais claros com o to pela Revolução do Proletariado
avanço do movimento de massae. (MRP), marcadas pelo centrlsmo e
Assim, ele não vem conseguindo pela vS tentativa de conciliarem o
manter uma atuação unificada ao aasumlmentò parcial de uma tática
nível do movimento de massas, para de luta revolucionária contra a dita-
o que terá de passar pela superação, dura — expresso na aceitação de
de uma forma ou de outra, de sua algumas bandeiras democráticas —
crise política e do seu processo de com uma série de posicionamentos
reorganização. de carater doutrináristas, acabam
Quanto ao populismo revolucio- por expor na pratica mala uma vez
nário, depois de um periodo de grandes deblüdades polttlco-ldeolô-
refluxo, provocado por suas vleSes gicas. E significativo o fato de terem
esquerdistas ao nlvei da tática, ten- bisado em 76 sua equivocada posi-
tava retomar uma maior participação ção para as eleições de 74, Insistin-
no movimento de massas, com uma do em assumir a defesa do voto
proposta marcadamente direitista nulo. No entanto, è digno de nota ver
de frente anti-ditadura. que um número considerável de
Ao nivel da pequena burgueala, e forçás políticas, especial mente gru-
mais particularmente no movimento pos independentes, prosseguia em
estudantil, notava-se a presença, sua marcha convergente para o eixo
como uma força secundária, do de poslçdes políticas revolucionári-
trotskiarqp. Esse fenômeno tem sua as, sustentadas hoje mais firme-
base objetiva no estagio ainda inici- mente pela APML e pelo MR-d,
al de reanimação do conjunto do trazendo sangue novo à defesa des-
movimento de massas, o qua dá sas posições.
margem a que correntes pequeno- Em suma, a esquerda revolucio-
burguesas, como o trotsklsmo, pos- nária que se reorganiza em tomo de
sam manter uma certa Influencia uma alternativa proletária, ainda que
Junto a camadas de intelectuais e enftentando enormes debilidade* e
universitários. tendo pela.frente tarefas gigantes-
No campo da tendencla proletári- cas, vivia e vive um processo de
a, a APML e o MR-8 davam passos importantes avanços no rumo da
importantes no terreno político e construção partidária.
recolhiam frutos da firme luta aberta tais eram aa linhas gerais da
contra o doutrinar!smo — especlal- conjuntura política em que se de-
senrotou o episódio eleitoral de no* genda, quaae todos oa setores are-
vembro passado. n latas apresentavam seus próprios
candidatos pela Arena. Este atrilf leio
2. ÇanctMltlioM parttoularae d» esconde muitas contradições exis-
ui «MçBm qM condicionam mu tentes em seu seio, e faz com que
mutlado. muitas vezes a disputa entre Arena-1
e Arena-2 seja extremamente acirra-
Além doa fatores Qarala que con- da, e que a Arena-2 cumpra com o
dicionam todo • qualquer resultado papel de oposIçSo moderada onde
eleitoral numa alelçSo burguesa, a nSo existam diretórios do MDB.
mas partlcularmenta, no caso das Todos esses fatores favoreceram
eleições no Brasil sob a ditadura ainda mais o peso do poder econô-
militar, nease pleUo vieram somar- mico e das máquinas administra-
se ainda outros (atores que limita- tivas no resultado eleitoral, Jogando
ram mala ainda o aau alcance políti- poitanto a favor da ditadura a da
co enquanto expressio de uma eon Arena. ,
Juntura determinada. Neste sentido, o resultado dessas
Destaca-saa«lsi Falcão», que ao eleições não pode ser comparado
proibir a propaganda política pela com às de74, à medida em que eles
rádio e TV contribuiu fortemente tem um caráter maie limitado, seja
para restringir o debata ao nível das pelo seu caráter distinto, seja pelas
questões locais, prejudicando a dis- novas limitações introduzidas. Ao
cussão doa grandes temas nacione- analisarmos seus resultados temos
is.Por outro lado, esta lei reeultou que levarem contaestee fatores que
num verdadeiro monopólio dos mei- se sobrepõem a todas as limitações
os de comunicação, de massas pala jà existentes em quaisquer eleições
ditadura, que esta sim, pode utlJlzà- burguesas!
los amplamente.
A«lei PalcSo» veio assim a refor- 3. A campanha eleitoral
çar fortemente uma tendência«mu-
nicipal ista* que jà existe nesse Dentro das condições acima a*
tipo de pleito. De fato, o caráter pontadas, cada corrente política pro
municipal dessas eleições, ao colo- curou enfrentar a campanha eleito-
car « disputa em termos do restrito ral buscando cumprir determinados
poder local, Jà limita objetívamente objetivos.
o campo da discussão. Por outro No seio das classes dominantes,
lado, isso faz com qua o voto de enquanto que a corrente Médfcf
cabresto, o «compadrlsmo», etc., tentava Impedir a realização das
venham a ter um peao maior ainda. eleições, o ditador Gelsei conseguia
Multas vezes, o voto não 4 portanto unir em torno de 8l durante a
dado em funçlo de um posiciona- campanha, todos os setores da
mento frente à attueplo global do grande burguesia interessados ha
pais, mas sim em função do’interes- política de institucionalização do
se imediato da cMadrdti do b&inp. regime. Lançando-se intelramente
Um outro fator que merece desta- na campanha arenlsta, repetidas
que é a aútFtaòándi. Enquanto que vezes ele enfatiza a importância da
em 74 na* eleições para o. Senado, vitória eleitoral para o prossegui-
muitos setores descontentas da A- mento da política de distensão e nas
rena deram o seu vote para o MDfi, entre-llnhas para o seu fortaleci-
dessa vez, dado o artificio da aub-te- mento diante da corrente Médfd.
4
A oposição moderada do MD6, sença em termos nacionais, seu
reforçada pela maior parte doa anti- surgimento se constitui no mais
gos autênticos, dentro de sua políti- importante acontecimento dessas
ca de «uniSo nacional» com a dita- eleições do ponto de vista do movi-
dura, pretendia nestas eleições ob- mento operário e popular.
ter um avanço considerável com Aproveitando as brechas legais,
relação às eleições de 72, ganhando este último conseguiu avanços im-
um npmero bem maior de prefeitu- portantes durante a campanha. Em
ras. Com Isso, buscava acumular muitos lugares, coordenou-se a
forças para 76. Dentro desses obje- campanha com o encaminhamen-
tivos, e favorecida pelas limitações to de reivindicações especificas,
desse pleito e pela desagregação abrindo perspectivas de desdobra-
dos autênticos enquanto corrente, mento para o trabalho realizado.
ela pode realizar uma campanha Propagandeou-se com uma certa
moderada, centrada nas questões amplitude a plataforma de lytas
municipais, com a alegação de nâo táticas e a perspectiva da organiza-
correr o risco de « provocar» a linha ção Independente dos trabalhado-
dura.' res; denunciou-se — ainda que com
A democracia pequeno-burguesa limitações — a farsa eleitoral, o
nessas eleições, viu por um lado a caráter da ditadura e o próprio
desagregação dos «autênticos» en- caráter da oposição consentida do
quanto corrente se manifestar. En- M DB. Avançou-se também durante a
quanto que a maior parte dos anti- campanha na criação ou fortaleci-
gos «autênticos» engrossava a filei- mento de organizações populares,
ra dos moderados, alguns poucos tais como oposlções sindicais, entl-
mantinham uma posição combativa. dades de bairro, comitês de luta,
Mas por outro lado, novos «autênti- etc. Por outro lado, pesou bastante
cos» apareceram nesta campanha, na campanha a Inexperiência da
expressando ao nível Institucional o grande maioria dos candidatos, a
descontentamento da pequena bur- falta de uma maior coordenação
guesia. entre eles e a ausência de uma
No que toca ao movimento operá- direção política mais firme, fazendo
rio e popular, estas eleições foram com que muitos desses candidatos
marcadas pelo aparecimento de uma chegassem a se envolver com as
série de candidatos que levantavam manobras da direção emedeblsta.
bandeiras de luta pelas liberdades No que diz respeito à esquerda, o
democráticas e por melhores condi- PCB realizou uma campanha de
ções de vida para as massas, que «voto no MDB de ponta a ponta»,
denunciavam o caráter de classe da dentro da visão de que estas elei-
exploração e opressão existentes, e ções eram um plebiscito a de que era
que viam sua participação no pro- necessário a todo custo InfUngir
cesso eleitoral dentro da perspectiva uma derrota À ditadura através da
de utilizá-lo para desenvolver o grau vitória do MDB. Com base nesta
de consciência e de organização visão, desenvolveu uma campanha
independente dae massas. Estes liberal, sem distinguir aa distintas
candidatos surgiram em muitos cen- correntes no Interior do MDB. No
tros urbanos e concentrações operá- decorrer da mesma, se por um lado
rias do pais, e apesar de todas as sua política direitista e eleitoralra
limitações que enfrentaram, e do contribuiu para desgaatà-lo junto a
caráter ainda limitado de sua pre- certos setores da parcela avançada
S
5
das massas, d* outra (Mito porém, participação conjunta na campanha
ele conseguiu alguns avanços no eleitoral contribuiu para fazer avan-
seu processo de reorganização. çar o processo de aproximação polí-
0 popullsmo revolucionário por tica entre a tendência proletária e
sua vez, permaneceu hesitante du- outras organ izações e grupos, abrin-
rante um largo período, só vindo no do novas perspectivas psrso futuro.
decorrer da campanha a definir uma
posição de apoio sómente aos can- 4. O resultado eleitoral
didatos populares, a qual, em algu-
mas Áreas, foi levada com bastante Aparentemente, a Arena venceu.
hesitação. Para eles, a campanha Teve cerca de 18 milhões de votos
eleitoral sarvltrpara Impulsionar seu contra 13,5 milhões do MDB, e
processo de integração nas lutas, ganhou 83% das prefeituras.
tragicamente abalado, porém, logo Mas este resultado não 6 tao
após pela ação da repressão. cristalino assim. Se agregarmos aos
Quanto aos setores que defende- votos do MDB os votos nulos e
ram o voto nulo, enquanto alguns brancos, os quais em geral tem um
deles nem sequer se propuseram a caráter oposicionista mais ou me-
fazer campanha, outros a realizaram nos consciente, teremos uma soma
— em geral timidamente — chegan- total de 19,6 milhões, ou seja, uma
do a capitalizar uma certa érea soma maior de votos do que a da
minoritária do movimento estudantil Arena. Qeisel, antes das eleições,
e da pequena burguesia radicaliza- chegou a declarar que era importan-
da, Ao nível mais amplo, porém, sua te que a Arena obtivesse uma soma
campanha ficou restrita a o saldo de votos maior que os do M DB mais
que t Ivéram do ponto de vista de sua os nulos e em branco. Depois das
aproximação com o movimento ope- eleições, parece que ele se esque-
rário e popular foi pratlcamente ceu desta sua afirmação...
nulo. Outro fator importante a ser con-
Os setores da esquerda revolucio- siderado ó o falo do MDB não ter
nária que, como nós, defenderam a sequer apresentado candidatos em
posição de participação no processo cerca de 1500 municípios; por outro
eleitoral, tendo em vista aproveitar Por outro lado, ô importante anail-
as brechas abertas para avançar na sar-seem particular a votação nos
perspectiva da organização da resis- grandes centros e concentrações
tência dos trabalhadores contra a industriais do pais, onde o eleitora-
ditadura, tiveram ganhos importan- do tem um grau relatIvamente maior
tes na propaganda de suas posições de Independência política, e cujo
e na sua integração junto ao movi- peso político ó determinante na vida
mento operário e popular. Apoiando polltlcá.braslleira.
os candidatos que melhor condi- Aj veremos que entre as 100
ções oferecessem para cumprir com maiores 6Idades do pais, o MDB
estes objetivos, chegaram mesmo conquistou a prefeitura ou a maioria
efn alguns çasòs a ter participação na Cámarai de Vereadores em 59%.
destacada ria campanha. Com Issò, $e ‘reduzimos a análise aos 15
abriram-se novas áreas de trabalho, majores centres urbanos, al então o
reforçpu-ee a Influência política em MDB vence em 67%. Isto sem
outras. Èm átgümas, disputaram contármos com os votos nulos e
yitpríosamerite a influência política brancos, „
óqm ó PCB, Em alguns casos, a Nas principais áreas metropollta-

?
nas dos principais estados, o MDB •m 79 obteve 41 %. O MDB subiu de
venceu em geral por larga margem. 20,9% em 72 para 31,7% em 76.
Em São Paulo, além da vitória na Quanto aos votos nuloa e em branco
capital e em todos os municípios sortados, etes passaram de 11,7%
importantes da área do Grande S. em 72 para 14,3% em 76. Por outro
Paulo (Santo André, São Bernardo lado, as abstenções desceram de
do Campo, S. Caetano do Sul, 15,1% para 13%.
Osasco, Guarulhos, Diadema, Mauft Assim, em relação a 72 hè um
e Caraplculba), ele vence também avanço considerável do MDB a nível
em importantes éreas de concentra- nacional, tanto em número de votoa,
ção urbana e industrial no interior, como no de prefeituras s câmaras
tais como na Baixada Santlsta (San- conquistadas. O único estado onde
tos, S. Vicente e Guarujá), em ele regride é em Santa Catarina. Este
Sorocaba, Campinas, S. José dos avanço se dft na mesma proporção
Campos, Araraquara, Americana e da queda da Arena. Hé um ligeiro
outras. aumento dos votos nulos e em
No Rio, além da vitória na capital, branco e uma ligeira queda nas
o MDB foi vitorioso em todos gran- absteriçOes.
des municípios do Grande Rio (com Mesmo comparando os resulta-
excessSo de Nova Iguaçú) e em dos de agora com o das eieiç&es
outros centros industriais importan- para as Assembléias Legislativas
tes do estado (Volta Redonda, Nova em 74 e levando-se em conta todas
Friburgo, Barra Mansa). No Rio as diferenças e limitações aponta-
Grande do Sul ele vence em nove dos das acima, veremos que a Arena
dez maiores municípios. Em Minas, subiu de 34,1 % em 74 para 41 % em
ele é vitorioso em Belo Horizonte e 76. O MDB subiu um pouco, de
no importante centro Industriai de 31,3% para 31,7%. Os votos nulos e
Betlnri-Além disso, obtém sua maior em branco baixaram de 15,6% para
vitória ao nível nacional em Conta- 14,3% . As abstenç&ep caíram bas-
gem, onde alcança 94% dos votos. tante: de 19% para 13%.
Na Bahia, ele vence em 5 dos 6 Assim, de 74 para cé, nSo variou
principais municípios. Vence tam- muito a votaçfio do MDB e os votos
bém em Importantes centros urba- nulos e em branco. A Arena recupe-
nos do pais, como Golanla, Belém, rou-se portanto fundamentalmente
Natal, Araçajú, Londrina, Olinda, ganhando òs votos na àrea das
Joinville e Blumenau. abstenções, ou seja de eleitores que
Entre os principais centros urba- nas elelçGes mais gerais nfão sé
nos, ele vence portanto na grande mobilizaram a Ir votar, mas que
maioria, As principais excessões dessa vez compareceram âs: Umas.
foram Recife, Fortaleza, Curitiba, Isso reforça ainda mala nosaa áfir-
Nova Iguaçú, Campos e Juiz de mação <!•■que o carfcter munlclpál
Fora. E mesmo al, se agregarmos os dseaés slefçoet teve um papel deci-
Votos nulos e brancos aos votos do sivo na relativa recuperação da Are-
M DB, a situação se inverte em quase na em comparação a 74, mostrando
tódós. ainda mala como sua «vitória» é
Comparando com o resultado das aparente e ilusória.
elelçães municipais dé 72, equiva- Porém, na camisa de força do
lente portanto a estas, veremos que bl^rtidariamo. Arena é MDB abri-
em 72, do total dos eleitores Inscri- gam distintas correntes políticas e
tos, a Arena obteve 52,3% devotos e comparar os resultados de um s
outro tem um significado bastante
7


umuaao poimcameme. aua vanaa- tivamente o quinto e o sexto mais
de está em que do ponto de vista das votados do MDB.
massas, eparticuiarm ente das mas- Em S. Paulo, apesar de apenas um
sas urbanas votar no MDB significa, candidato mais combativo ter sido
em geral, votar contra o atual estado eleito, a votação dos 5 candidatos
de coisas, expressando o grau de mais expressivos deste ponto de
descontentamento existente. Mas vista (Flávlo Bierrenbach, Antônio
esse é apenas um aspecto do proble- ResK, Marco Aurélio, Benedito Cin-
ma, porque se o voto no MDB tem tra e Joao Paulo) atinge a expressiva
esse aspecto comum, não 6 a mes- soma de 130 mil votos.
ma coisa porém o voto num adesista Em Porto Alegre, além da bancada
ou num candidato popular, por e- emedeblsta em geral ter um maior
xempio. Assim, seria necessário número de candidatos combativos,
analisar a votação de cada corrente o candidato apoiado pelos estudan-
no Interior dos dois partidos con- tes, Marcos Kiassman, atingiu mais
sentidos. de 12000 votos, estando entre os
Dado entretanto o caráter munici- mais votados do MDB. Em Salvador,
pal dessas eleições, e mais do que o candidato Marcelo Cordeiro, o
isso, o caráter munlcípetlst* que mais combativo da Aia Jovem do
predominou na campanha, em geral MDB foi destacadamente o mais
0 voto a um candidato foi dado em votado, com 18000 votos. Em Juiz de
função de dois fatores: ser da Arena Fora, o candidato Ivam Barbosa,
ou do MDB; as promessas ou me- ex-presidente do DCE da Universi-
lhorias que ele trazia para o bairro ou dade local, lançado pelo estudan-
cidade. Poderiamos dizer que se as tes, é o mais votado do MDB. Em
massas votaram indlstlntamente Niferói, o candidato Coimbra de
num moderado ou adesista, em Melo, apoiado pelos estudantes,
função de teu» interesses comuni- obtém também votaçao expressiva.
tários Imediatos, em grande parte Assim, apesar da precariedade
elas não votariam num arenista em dos dados, vemos que não obstante
função destes mesmos Interesses. todas as limitações e restrições que
Uma confrontação das votações enfrentaram durante a campanha,
obtidas pelas distintas correntes em alguns dos principais centros do
que compõem cada partido perde, pais os candidatos que apresenta-
por isso mesmo, parte de seu slgnfc- ram uma campanha mais combativa
ficado nestaa eleições. Salvo para foram contemplados com votação
análise dos votos mais conscientes, expressiva.
ou seja, os obtidos por aqueles
candidatos progressistas, que de- 5. Repercussões na conjuntura
senvolveram uma campanha mais
combativa e na qual predominaram Do ponto de vista das classes
os temas nacionais sobre os muni- dominantes, cada uma de suas ten-
cipais. dências políticas tirou conclusões
Apesar da precariedade dos da- diferentes sobre o resultado eleito-
dos, podemos constatar que no Rio ral. De uma maneira geral, a princi-
Janeiro a votaçap dos 4 candidatos pal corrente polftica em seu interior,
mais combativos (Frejat, Antônio expressa através de Qeisei, e da
Carlos, Euclldese Hélio Fernandes) «distensão», saiu fortalecida com a
atinge um pouco mais de 100 m li «vitória» da Arena. Por outro lado, a
votos. E dois dentre eles são. respec- «linha dura» foi quem mais se
1
pequena burguesia (que será Inape- enfraqueceu, seja pela própria reali-
1 ave!mente atingida pelas medidas zação das eleições, seja pelo forta-
econômicas a serem adotadas) e a lecimento de Geisel. Mas esse forta-
provocaçSo de novas e maiores lecimento è extremamente relativo,
tensões ao nível do movimento de à med ida em que a vitória é aparente
massas, com a perspectivS de orear> e ilusória.
cimento do desemprego. Entretanto, logo após se ter co-
Nesse quadro de crise, toda dls- nhecido o resultado eleitoral, já se
cussSo em torno da política econô- reavivam as contradições entre os
f
mlca, das reformas políticas e das distintos setores das classes domi-
elelçÇes de 78, está por sua vez nantes. Sem dúvida, apesar de tal
subordinada à grande batalha que |à falação sobre a « vitória» da Arena, o
se al>r)u em torno da sucessão resultado eleitoral nBo tranquiliza
presidencial, em que cada corrente ninguém com relação às eleições de
busca Impor seu candidato fazendo 78. Para os setores «liberais» da
para Isso as composições necessá- grande burguesia, trata-se de, com
rias. A luta pela sucessão, concen- base no fortalecimento relativo re-
trando assim as disputas no selo da sultante da «vitória», aproveitar o
grande burguesia e das forças arma- momento para promover certas re-
das, condiciona portanto a própria formas poJItlcas, atendendo certas
realização e o caráter das eleições de reivindicações secundárias do mo-
78, bem como das reformas políti- vimento de massase criando maio-
cas adjacentes. res canais de expressão para a
Quanto à o posição.moderada do burguesia. Para outros setores mais
M D B, el a con seg ui u no f pn dam ental chegados ao ditador, também ó hora
cumprir seus objetivos no processo de promover alterações, porém num
eleitoral, obtendo avançoconeiderá- outro rumo, n&o o de acelerar medi-
vel em relaçSo à 72, aumentando o das« líberqlizantes», mas ao contrá-
número de prefeituras que detém e, rio, no sentido de introduzir mudan-
principalmente, ganhando prefeitu- ças que evitem surpresas em 78.
ras de cidades de grande peso Além de sugestões no sentido da
econômico e político, como as do manutenção da «lei Falcão», da
Grande São Paulo e Grande Rio. sub-legenda, da adoção do voto
Porém, esse avanço foi menor do distrital e de outras invenções da
que o que ela esperava, prinoipal- «imaginação criadora» dos políticos
mente ao nivel das cidades médias da ditadura,.surge com grande peso
do Interior. Ademais, eofreu algu- a tese da prorrogação de mandatos,
mas derrotas em cidades importan- levantada por certos setores próxi-
tes onde detinha anteriormente a mos a Geisel. Com isso, adfar-se-ia
- prefeitura, e onde o boicote da por mais dois anos os problemas.
ditadura às administrações emede- E necessário levar-se em conta
bistas aliada á péssima administra- ainda, que essa discussão se dá
ção municipal dos moderados, cau- num quadro de aprofundamento da
sou uma insatisfação generalizada crise econômica, que se avizinha da
na população. Tal foi o caso em Juiz recessão. Neste contexto, teremos
de Fora, Maringá, Taubatè, entre sem dúvida um acirramento entre as
outras. diversas frações da burguesia no
Passadas as eleições, dentro de que toca aos rumos da política
sua tática de acumular forças para econômica, um aumento significati-
78, ela faz declarações moderadas, vo do descontentamento entre a

i
chegando mesmo «eu secretário-ge- setores mais conscientes da oposi-
ral — Th ales Ramal ho — • afirmar o ç5o popular.
caráter Inquestionável da vitória da Contando Já com um certo acúmu-
Arena! Com Isso buscaria talvez lo de forças obtido nos últimos três
«enganar» algum militar despreve- anos, e diante de um quadro global
nido, ao mesmo tempo em que, da conjuntura mais favorável ao
«comportando-se bem» procura co- desenvolvimento de suas lutas, ele
laborar para que a disputa no «elo da deverá prosseguir no seu movimen-
grande burguesia e das FFAA nao to de reanimação.
termine por «virar a mesa», no que Esse processo, á medida em que
toca ás eleigóes de 78. se desenvolve, expõe de forma mais
Com relação aos «autênticos», clara e aguda a enorme contradiçSo
estes nSo conseguiram ter uma entre todo o seu potencial e ausên-
atuaçSo unificada no processo que cia de uma direção correta à altura
contribuísse para a sua reartlcula- das necessidades.
çBo. Enquanto a sua maioria aceita De fato, ainda estamos longe de
com prom 13808 cada vez maiores ter construído a vanguarda política
com a dlregSo moderada do MDB, proletária da revolução brasileira.
realizando uma campanha modera- Sem dúvida, temos avançado bas-
da, alguns poucos mantém sua tante nesse sentido e a nossa parti-
cipação no processo eleitoral veio a
campanha mais radical. E interes- contribuir para esse avanço. Isso
sante ver-se que por exemplo em para nós, ao mesmo tempo, coloca
Juiz de Fora, onde o autentico Tarcl- maiores responsabilidades, princi-
ao Delgado realizou uma campanha palmente para as organizações polí-
moderada que o comprometia com a ticas, forças mais avançadas da
administração moderada anterior, tendência proletária. Exige-nos um
ele foi derrotado. De outra pane, em esforço redobrado no sentido de,
Feira de Santana, cpm uma campa- suprindo nossas debllidades, avan-
nha mais radical que oontou com a çarmos resolutamente no rumo da
participação direta de Chico Pinto, o construção partidária, em estreita
MDB saiu vitoriosoI vinculação com o desenvolvimento
Do ponto de vista do movimento do movimento de massas.
operário e popular, este segue acu-
lando força. Além dos ganhos, prln- Comitê de Redação
palmente obtidos na campanha, ele
conseguiu eleger uma série de can- dezembro de 76.
didatos em centros políticos Impor-
tantes do pais, abrindo mais uma
frente de luta contra a ditadura. Em
outros centros Importantss porém,
como 3ao Paulo, esses candidatos
nSo conseguiram se eleger, devido
principalmente á ausência de uma
direção mais firme e unificada na
condução da campanha, o que le-
vou, entre outras coisas, • uma
dispersão de forças, com o lança-
mento da várias candidaturas que
dividiram entre 8l os votos doa
10
làlTba"

O proletariado

e as eleições de novembro

APML

LA QUESTÃO ELEITORAL o OS PRINCÍPIOS DO MAftXISMO-LENINISMO

t. Nossa OrganízaçSo adotou, em 1974, uma nova posiçBo frente à questSo


eleitoral- Até entío tivemos como única e exclusiva posiçSo política frente és
eleições a arma do boicote, através das sucessivas campanhas de «voto nulo» e,
em 1970, também a do «voto em branco». Agora, vamos retomar a essência da
posiçSo exposta no documento «Na denúncia da farsa alaitorai, ampliar a
resistènçia à ditadura», de outubro de 1974, para reafirmà-la e desenvolvê-lá;
Como subsidio para adiscussSo da questSo eleitoral entre os revolucionários,
decidimos editara resoluçBo adotada no II Congresso da III Internacional a respeito
da questSo eleitoral, onde estão sistematizadas, desde um ponto de vista marxista
revolucionário, as experiências que o proletariado tinha acumulado até entflo e
onde também é traçada uma orientaçSo política que consideramos, ainda hoje,
inteiramente justa.
Como consta de nosso documento de 74, consideramos que a «questSo
eleitoral » nSo é para o proletariado nenhuma questSo de principio. Embora ela,
natural mente, seja uma questSo que envolva princípios, nSo existe uma posiçSo a
prior! que deva ser aplicada em qualquer pais e em qualquer situaçSo.
2.Para os comunistas revolucionários as eleições, dentro de um regime de'
exploraçSo capitalista, numa sociedade burguesa, sSo sempre instrumentos de
fraude da vontade dos explorados, organizados pelos exploradores. Mesmo
quando sé trata dô uma república burguesa típica, utilizando òs instrumentos
formais da «democracia representativa», onde tinham vlgánçia as liberdades
democráticas burguesas, mesmo assim , as «eleições livres » nàò passam de uma'

11
farsa. Este principio foi formulado por Marx e encontrou ampla comprovação
prática ao longo da história. Em sua obra* A Guerra Civil na França»», ele formulou
o seguinte juízo das eleições burguesas:«Em vez de decidir ume vez a ceda fres ou
seis anos, que membros da classe dominante hão de represenrar e reprimir o povo
no parlamento, o sufrágio universal havería de servir ao povo...»(e refere-se ao que
seria o sufrágio universal na Comuna revolucionária).
Lènin considerou este enunciado de Marx como a melhor síntese do parlamento
burguês, ao reafirmá-lo em várias oportunidades. Em « O Estado e a Revolução»,
por exemplo, ele escreveu que: « Decidir ume vez cede certo número de anos que
membros da c/asse domlnentehão de oprimir e reprimir ao povo no parlamento: es-
tá aqui s verdadeira essência do parlamentarismo burguês, nao somente nas mo-
narquias parlamentares, mas também nas repúblicas mais democráticas»(O.c.,
cap. III).

Entretanto, Marx e Engels inúmeras vezes ressaltaram a necessidade de comple-


tar este avaliaçSo com outra que diz respeito òs condições de luta política do prole-
tariado. Neste caso insistiram na necessidade do proletariado aproveitar todos os
meios legais de luta e, dentre eles, o das eleições parlamentares, como uma forma
de atingir os objetivos imediatos na lute política, como também de propagandear
e agitar seus objetivos políticos mais gerais; Engels no prefácio á obra de Marx,
« As Lutas de classe na França de 1848 a1650 * escreveu: * No entanto, utilizando
tão eficazmente o sufrágio universal, o proletariado praticou um método de luta
inteiramente novo que se desenvolveu com rapidez. Viu-se que instituições
estatais, nas quais se organiza o domínio da burguasia, ainda oferecem
possibilidades novas de utilização que permitem à classe operária combatê-la ».
Na experiência revolucionária russa, com o partido bolchevique à cabeça, foi
usada tanto a tática de boicote eleitoral como a de partícipaçSo nas eleições. Lá,
antes de fevereiro 17, nffo existia nenhuma democracia burguesa; as eleições sob a
autocracia tzarista eram uma farsa muito mais descarada do que nas democracias
parlamentares européias. Foram particularmente os bolchevlques que cunharam
uma experiência mais ampla de utilização revolucionária da luta parlamentar,
mostrando que a poslçáo política a respeito do episódio eleitoral é sempre
particular e concreta, ou seja, condicionada pelos elementos da conjuntura que se
vive, dependente e subordinada à tática que se pratica. Para tanto viveram a
questão envolvidos em grande polêmica até que prevaleceu a posição de Lèninln.
Como ele mesmo afirma, em sua obra * Esquerdlsmo, doença infantil do
comunismo», :« Oquefá constituira èrro, embora pequeno e facilmente corrigível,
toi o boicote dos bolchevlques ò Duma em 1906. Os boicotes de 1907, 1906 e dos
anos seguintes foram érros muito mais sérios e dificilmente reparáveis, pois de um
lado, nfo era acertado esperar que a onda revolucionária se reerguesse com muita
rapidez e se tran formasse em Insurreição e, por outro lado, o conjunto da situação
histórica originada pela renovação da monarquia burguesa Impunha a necessidade
de combinar-se 6 trabalho legal com o ilegal (...). Os bolchevlques nao terlam
poòklo conservar (fé não digo consolidar, desenvolver e fortalecer) o núcleo sólido
do partido do proletariado durante os anos 1908/1914, se não houvessem
defendido em árdua luta, a combinação obrigatória das formas legais com as
Ilegais,,a participação obdgatorta num parlamento ultra-reacionário a numa séria
de instituições regidas poríeis reacionárias (associares de mútuo socorro, etc).
(Obra citada, cap. IV, os grilos são dç autor);

ü
//. ESTRATÉGIA REVOLUCIONÁRIA E REFORMISMO
1. Para o s verdadeiros comunistas a estratégia para a tomada do poder supOe uma
clara determinaçSo do caráter da revolução, que se define tanto peias tarefas que se
propSe cumprir, pelos inimigos que enfrenta, como pelas fôrças que mobiliza.
Assim, entendemos que sendo o Brasil um pais capitalista dependente, dominado
pelo Imperialismo e estando a burguesia no poder, estamos objetivamente vivendo
as contradlçCes fundamentais que só podem se resolver pela revolução socialista
proletária. Tratando-se de destruir o poder burguês, só o proletariado pode
assumir a tarefa de construir um novo poder revolucionário urbano e rural e
antagônico àquele, para o que deverá contar com seus aliados, o sernf-proletaríado
urbano e rural e a pequena burguesia urbana (partlcularmente a assalariada) e a
rural.
Temos que levar em conta para a elaboração de uma estratégia o conjunto de
elementos que formam o complexo quadro da luta de ciasses num pais e época
determinados. De certa forma já são conhecidos e experimentados três modelos de
revolução, onde )à foi feito tanto o enunciado de suas leis básicas, como o teste da
comprovação prática.
Um primeiro tipo genérico trata da revolução democrático-burguesa sob a
direção do proletariado. Suaexperiencla histórica vai ter dois marcos de referencia
fundamentais: a revolução russa de 1905 e de fevereiro de 1916, onde se destaca a
contribuição de Lènin em condu2ir o proletariado para dirigir a revolução
democrática, transformando-a em revolução proletária; Outra experiência,
abrangendo um maior número de países, é a revolução nacional e democrática,
agrária e anti-imperialista, realizada em paises coloniais ou seml-colonlais e
semi-feudais, cujas leis foram tio bem enunciadas por Mao Tse Tung e cuja
experiência prática atinge hoje jà grande número de países, como a China, Coróia,
Vietnam, Cambodja, etc.
Ooutrotipo se refere a paises capitalistas. Suas leis foram enunciadas por Marx
Engels e Lènin, como as leis gerais da revolução proletária; Até hoje ela não teve
condiçOes de se concretizar em nenhum pais capitallata-imperiallsta avançado,
sendo seu marco de referência fundamental a revolução de outubro na Rússia, pais
que guardava importantes particularidade em relação aos citados.
Nosso pais se enquadra num caso distinto destas. Embora dentro do conjunto
formado pelos países capitalistas, enesse sentido determinado por leis comuns, é
evidente que existirão leis especificas para a revolução proletária num pais
capitalista-lmperialista e num pais capitaltst&dependente.
Se è veroade que nosso pais, ao ser dominado pelo imperialismo, terla uma
«questão nacional» aenf rentar, Isto não o coloca no rol dos palse9 que fazem parte
do Jftovimento dé' libertação nacional. Isso se deve & particularidade do
desenvóivimento capitalista de nosso pats, dependente e Integrado ao imperialis-
mo, ontfe a burgusla, associada ao imperialismo, detém o poder de Estado e vai
mòldatídq a sociedade a seus interèsses, num processe especifico e original de
revolução burguesa...
Assim é que as leis da revolução proletária num pais capltaiista-dependente
ainda estão sendo formuladas e não tiveram ainda nenhuma experiência prática de
uma revolução vitoriosa a respaldá-las. Para nós trata-se de apreender o estágio de
enfrentamenió destas questões (conscientes de que somos parte ativa na produção
destas respostas), acrescentando-lhes as particularidades decorrentes deum páls
determinado, no caso, o Brasil
11
Assim é que partindo das leis gerais da revolução proletária, aproveitamos o que
nos concerne das ieis da revolução proletária nos paises capital istas-lmperiallstas
para centrar, fundamentatmente, o eixo da nossa teoria na realidade dos paises
capitalistas dependentes, que nos darSo a base comum para chegarmos às leis
especificas da revolução proletária no Brasil.
Como marxistas, guiamo-nos pelo principio da revolução violenta. Como disse
Mao Tsé Tung:«Todos os comunistas devem compreender a seguinte verdade; o
poder político nasce do fuzil» e ainda que «a tarefa central e a forma suprema da
revolução é a conquista do poder político pelas armas, é a soíuçBo desse problema
pela guerra. Esse principio revolucionário do marxfsmo-lenlnismo é válido
universalmente, tanto na China como em todos os outros paises. (Problemas da
guerra e da estratégia », OE, tomoll);
Entendemos que o caminho estratégico da revolução socialista brasileira passa,
necessariamente pelo armamento do proletariado o dos trabalhadores em geral
para, através de um processo insurrecional, criar as condições de instalaçao do
novo poder revolucionário, a ditadura do proletariado.
Denunciamos vigorosamente atraiçSo dos revisionistas modernos, encabeça-
dos pelos revisionismo soviético, de inventarem uma pretensa «nova estratégia»
de um «caminho pacifico», explicitado,por exemplo nos chamados «caminho
italiano, francês, espanhol,etc»...para o socialismo que, como a estratégia do
PCB, nada tem de novo e representam a reedlçSo, em termos modernos, da velha e
esfarrapada estratégia eleitoralIsta que seguiram os partidos sociais-democratas
da II Internacional.
Esta poslçSo, de fato abandona o objetivo político da revoiuçSo, renunciando à
preparaçSodas massa para o efetivo uso da violência revolucionária, essencial para
a tomada e consolidação do poder..Esse «caminho pacifico» só tem a funçSo de Ir
adiando os objetivos revolucionários do proletariado, ao mesmo tempo que vai
semeando ilusões e tentando amoldar os interesses da classe operária aos
interesses da burguesia; vai buscando desarmar o proletariado, política e
ideologicamente para enquadrá-la dentro das perspectivas reformistas do
capitalismo, criando uma MusSo de transformação social e participação no poder.
Quando essas experiencias s5o, de algumà forma, radicalizadas pelas massas e
assustam à burguesia, o que tem ocorrido são as derrotas, como a do Brasil em 64,
ou a sangrenta contra-revolução chilena de 73,
Epor isso que os marxistas revolucionários remetem sempre a questão eleitoral
para o terreno da tàtioa, não aceitando jamais tratá-la como unia questão
estratégica. E, mesmo dentro da tática, dfib-lhe um. lugar subordinado e
secundário.
A revolução socialista no Brasil encontra-se estrategicamente ainda na etapa
defensiva, onde a disputa real do poder ainda nao se coloca, dedo que a çorrelaçSo
de fôrças é ainda intelramente desfavorável. 0 proletariado não conta ainda com
seu partido, com organizações de massa, amplas e representativas, mobilizadas
em torjno deposições políticas revolucionárias. Até masmo sua luta sindjcal, ainda
é bem limitada. Muito menos conta com condições de enfrentar qualquer luta
armada. Por Isso mesmo è que as tarefas políticas alndasão centradas no processo
de acumulação de forças.
Uma particularidade que se destaca no caso brasileiro, no que,toca.a estratégia
de tomada do poder, è a forma concreta de dominação burguesa, onde o exercício
do poder é feito ppr maio de uma dltacjura militar. Para os comunistas
consequentes, a luta pela derrubada revolucionária chi ditadura militar coloca-se

14
como parte integrante de sua estratégia da destruição do podar burguês em nosso
pais, portanto de nossa revolução socialista.
NSo pretendemos, sob nenhuma hipótese, formular qualquer «estratégia
intermediária» que tenha como objetivo essencial derrubar a ditadura e postergar
para uma_fase ou etapa posterior a efetivação da revoluçSo socialista, a
implantação da ditadura do proletariado. Se a burguesia nos impuser, entretanto,
derrotas na luta pela derrubada revolucionária da ditadura, criando situaçQes inter-
mediárias entre esta e a implantação da ditadura do proletariado, saberemos
manter a essencia de nossa estratégia de destruição do poder burguês, adaptando-
a para as condiçSes concretas.Reafirmamos portanto que nossa estratégia não vi-
sa simplesmente a derrubada da ditadura para criar uma nova situação e uma
nova estratégia. Visa, sim, a derrubada do poder burguês em nosso pais, para o que
devemos nos esforçar por conduzir a luta pela derrubada da ditadura militar, em
condlçães revolucionárias, de forma que possibilite a criação de uma situação em
que a constituição dos órgãos do poder proletário se faça como seu desdobramen-
to imediato.
Quando reafirmamos que não restringimos nosso objetivo estratégico à
derrubada da ditadura militar (senão cairiamos na corrente dos que defendem um
tipo quaiquer de «etapa» préviaà revolução socialista), nSocafmos, porém, noèrro
de desconsiderara particularidade que tem a luta contra a ditadura militar dentro de
nossa estratégia. Queremos destruir o poder burguês, mas como não vamos
tratá-lo em abstrato (como querem fazer os doutrinarlstas), temos que tomar como
ponto de partida concreto a forma efetiva como ele está sendo exercido no pais, que
é hoje, a ditadura militar.
2. O proletarido brasileiro sofre o pôso de uma herança populista que tem de ser
vitoriosamente enfrentada para que possa assumir uma estratégia realmente
revolucionária. Temos que levarem contaquedesdel930, ele vem sendo envolvido
política e ideológicamente pela burguesia, de forma direta s sistemática. As
particularidades que regem estas relações (burguês ia/proletariado no Brasií)
levam-nos a ter uma atenção especial no que toca à qualquer situação que
confunda a luta política do proletariado com objetivos políticos de setôres
burgueses, como é o caso da luta contra a ditadura mlljtar.
Tendo em conta nosso objetivo de organização Independente do proletariado -
condição essencial para que ele possa agir na aréna política em Interèsse próprio e
vánguardear o conjunto dos trabalhadores - temos para nós que a luta contra a
tutela ideológica da burguesia não pode sê dar acenas através de lutas
teórico-ideológicas ou no terreno propágandlstlco. E na luta política concreta que
as massas aprendem. Portanto, temos que buscar traduzir nosso objetivo de luta
contra o at rolamento polltlco-ldeçlógldo da classe operária à burguesia (partleu lar-
mente à sua fração reformista-popullsta) e ao Estado burguês nos embates
concretos da luta política. Temos que aproveitar cada çpisódlo concreto para fazer
avançar na consciência do proletariado o rompimento desta tutela, a partir de seus
setores mais avançados. E assim que não podemos observar simplesmente o
comportamento político deste setôr burguês que faz « oposição»à ditadura militar,
vendo sòrnsnteo aspecto de seus atritos econtradiçffes com a ditadura militar e, de
alguma forma deixarmos que as massas se identifiquem com ele, como
explicitamente fizeram no passado populista, onde se deixaram conduzir.
Toda a situação que na luta política concreta possa dar a aparência de
proximidade dos interèsses do proletariado e desse setôr burguês, tem que ser

1*
analisada pelos comunistas com grande cuidado, dado que ela tem um alcance
verdadeiramente estratégico em nossa luta revolucionária. E claro que o
proletariado só vai se reconhecer a si mesmo como ciasse, na medida em que se
descobrir antagônico à burguesia - como classe - e isto se dará não num único e
concentrado momento, mas sim ao longo de todos os embates políticos da luta de
ciasses, num período razoavelmente longo.
3. A atuação do PCB refletiu historicamente uma tendência ao reboquismo em
reiaçSo á burguesia, destacadamenteao seu setor concorrencial, n5o monopolista.
Pratlcamente não se encontra na história do PCB nenhum momento em que tenha
formulado uma posição que correspondesse efetivamente aos Interêsses próprios
do proletariado. Ao lado dos esforços da burguesia por atrair e envolver o
proletariado num «pacto de pa2 social», o PCB atuou sistematicamente por
descaracterizar os interesses independentes de classe do proletariado
O PCB, ao formular uma estratégia de revoluçSo democrática'burguesa, ao
reconhecer o pretenso papel progressista (ás vêzes revolucionário) de um setôr
burguês nacionalista e democrático, colocou-se claramente como um mero
apêndice na disputa inter-burguesa no Brasil. Como dissemos antes, pelo caráter
da revoluçSo que defende o PCB, tanto seus objetivos, inimigos e fôrças motrizes
são inteiramente diferentes dos que correspondem realmente aos interêsses do
proletariado. A isto se soma sua pregaçao de um «caminho pacifico» e
fundamentai mente eleitoral, em substituição a uma estratégia revolucionária, e
fica claro o papel histórico que o PCB tem tido, de fôrça auxiliar da burguesia.
As experiências do PCB diante da q uestSo das eleições (excetuando-se u m único
episódio, em 1950) marcaram-se sempre pela diluição, tanto polHica como
orgânica, dentro de amplas frentes burguesas onde ele seguidamente recua de
suas já tao atrasadas pdsiçSes para amoldar-se aos «aliados». No que toca à
participação eleitoral, para ele o principio ô o de participar sempre, não importa em
que condições, dado a mistificação que fazem dos instrumentos da democracia
burguesa e do parlamento como caminho do poder.
ftl.CONJUNTURA £ TATICA
1. A atual conjuntura está marcada, princlpalmenje, portrôs aspectos: a irrupção
da crise econômica, em substituição ao chamado «milagre»; o acirramento das
contradições mter-burguesas, substituindo o relativo monolitismo do período
anterior e a ativação das tendências oposicionistas pequeno*burguesas; e,
destacadamente a generalização do descontentamento popular, levando à
Intensificação da reanimação do movimento operário e popular, em contraposição
ao acentuado descenso do período anterioi. Vejamos súmariamente cada um
destes aspectos.
Desdeo llm do governo Mêdlcl, por voltade 73. já se Insinuavam os elementos de
estrangulamento do moaelo economlco, q ue tinha sido tão exaltado e apelidado de
«milagre» por ter mantido uma elevada taxa de crescimento continuo, durante
vários anos seguidos. As condições que favoreceram este desempenho iam, uma a
uma, sofrendo modificações e prenunciando uma nova situação. E assim que o
«milagre»'tendo Integrado de tal maneira a economia brasileira ao capitalismo
internacional, fez com que a acentuação da crise deste tenha um profundo reflexo
no Brasil. O «milagre» tinha se favorecido, entre outros, dos seguintes aspectos;
uma brutal repressão sobre a classe operária e o povó, garantindo as condições de

suoer-exploraçSo; a utilização da capacidade ociosa instalada das indústrias; o
tavorecimento do excesso de recursos financeiros ao nível Internacional,
possibilitando um crescente Individamento externo; uma alta no preço de matérias
primas e a oportunidade de exportá-las mais intensamente. Aos poucos o quadro
vai se modificando claramente: a inflação ressurgia em escala crescente; as
exportações caiam, o valor das Importações aumentavam, criando um desequilí-
brio na balança comercial; a dívida crescia e as reservas baixavam. Prenunciava-se
u ma crise e para enfrentà-laô que surge a alternativa Gelsel, tanto no plano político
como econômico.
Neste, a solução apresentada foi consubstanciada no II Plano Nacional de
Desenvolvimento, o IIPND, válido para 5 anos, com Indicações de um programada
açSo do governo. Embora fazendo reparos no modelo anterior, ele ainda mantinha
suas bases essenciais. Suas previsões, entretanto, eram no mfnimo mirabolantes,
por exemplo, ao fixar em 10% a taxa de crescimento anual para os próximos 5 anos.
Ele diagnosticava também que o capitalismo brasileiro nSo podería continuar a se
desenvolver sem completar o setor produtivo industrial; ou seja, precisaria
produzir no pais os bens de produção que lhe eram essenciais, para chegar ao
objetivo de uma economia «auto-sustentada». Decidia-se por levantar uma soma
de recursos necessários aos Investimentos concentrados neste setor de bens de
produção e intermediários, visando dar uma nova arrancada na economia, tendo-o
como novo eixo dinâmico.
Entretanto, dois anos a melo depois, qual é o balanço? Todo o sonho acabou e
surgiu o pesadelo. O II PNO foi intelramente abandonado, como uma miragem e
voltou-se às cruezas do presente. A agricultura não cresceu quase nada nSo
apresentou taxas muito diferentes das que sempre teve; as exportações
aumentaram pouco; o déficit na balança comercial persistiu; a divida externa
aumentou assustadoramente (para os credores, é claro); surge um estrangulamen-
to nas importações (essenciais); aumentam as dificuldades para levantar
empréstimos fora; e o governo entra no corre-corre dos cortes. O programa de
ivestimentos públicos para 77 foi abandonado e passou-se a discutir as
«prioridades», relegando a segundo plano a grandiosidade das metas antes
consideradas essenciais. A inflação avança célere, a taxa de crescimento da
economia decaí e tudo demonstra estar longe ainda de ter atingido o ponto critico.
Inicial mente estabelece-se a retração, a caminho acelerado para a recessão,
prevista para o ano próximo.
0 imperialismo val pressionando, já temeroso por ter tanto dinheiro a titulo de
empréstimo, e começa a exigir uma «políticade austeridade e estabilização», com
a evidente criaçSo de facilidades para ele. O espectro da divida é impressionante,
devendo atingir os 30 bilhões de dólares até o fim de ano, com um pagamento de
juros e amortizações de 5 bilhões anuais. Ora, val chegando a hora de renegociar o
pagamento da divida, ciadas as dificuldades de enfrentar os compromissos
assumidos. E, para tanto, o Imperialismo já prepara o seu conhecido esquema de
pressões, cujo primeiro fruto positivo foi a conquista da quebra do monopólio
estatal de petróleo, com a adoção dos chamados «contratos de risco » na pesquisa
de petróleo dentro do pais.
O espectro da recessão jã começa a render e a assustar setores da burguesia. A
situação de crise fez reacender contradições (manifestas e latentes), levando-as a
um processo de acirramento.
A necessidade de estabelecer um novo programa de ação econômica^ desde
1973, já recoloca a questão do consenso, ou das condições de exercício da
17
hegemonia dentro da burguesia enquanto classe, por sua fração industriai-finan-
ceira, monopolista e Intlmamente aliada ao Imperialismo. Diante da crise, a
burguesia não responde em uníssono. A situação exige certas reacomoaaçCes,
tanto nas relaçí es com o imperialismo, como dentro aa própria grande burguesia.
E assim que podemos ver como, curíosamente, a campanha de desestatizaçBo, tão
bem orquestrada, aparentemente serviría aos interôsses das várias frações
burguesas, quando na verdade significava uma manobra de Interôsses imperialis-
tas e de setores da grande burguesia mais Intimamente ligada a eles na disputa do
novo filão levantado pelos investimentos no setor de bens de produção e
intermediários. Secundariamente visavam tambóm conseguir talvez a passagem
para suas mãos de empresas estalais ou para-estataís. O processo de crescente
monopoiização, que deve s« intensificar no decurso da crise, reacende as
contradições com os setores médios e pequenos, que se sentem pressionados e
acuados pelo grande capital.
Como a alternativa à crise não é uma mera questão técnica, mas fundamental-
mente política, este quadro levou edeu fundamento à busca de novos canais de
expressão dp jogo político das diversas fraçOes burguesas, de modo a buscarem
absorver as contradições do bloco dominante e reforçar a hegemonia do grande
capital monopolista dentro dele.
E dal que surge o projeto de «distensão» de Geisel, visando oferecer um
caminho na busca da tSo sonhada «Institucionalização» da ditadura.Entretanto, o
ritmo de sua iniciativa teve fôlego curto, pois já em agosto de 75, através de já
famoso discurso, ele se viu forçado a recuar, reafirmando seus amores pelos atos
de excessão. Esclareceu então que a «distensão» nada tinha a ver com
«redemocratizaçSo», e deu o sJnal verde ao novo ciclo repressivo que se acentuou
fortemente desde então. Isto revelava que seu esquema tinha encontrado eficientes
resistências dos partidários da chamada linha dura, capitaneados pelo ex-ditador
Mediei. O confronto entre as duas forças básicas no selo da ditadura, longe de se
expressar por meios políticos Institucionalizados, ocorre todo ele dentro dos quar-
téis, part icularmente no seio da alta oficialidade e por vias que também se vinculam
aos setores da grande burguesia. Terminaram estabelecendo acordos, necessa-
ríamente sempre em prejuízo - fundamentalmente * do movimento operário e
popular. O relativo equilíbrio em que se encontram levou a que a situaçSo política
do pais entrasse num processo de marca-passo, em que, por um lado o grupo de
Geisel reduziu sensivelmente suas Iniciativas institucionallzadoras - embora
mantendo seu rumo, e por outro, a fúria da linha dura foi momentãneamente
moderada.
0 surgimento da Aliança Anticomunista Brasileira e seu impeto, com um ja
grande número de atentados, mostra que o progresso do enfrentamento das forças
no seio da ditadura continua aceso e ascendente. E evidente a inspiração ou efetiva
direção do grupo Médici sobre estas iniciativas, dando sequência prática ao seu
discurso de Viçosa do 1o semestre, quando de sua reaparição pública, onde fez
uma explicita reprimenda aos «liberais» e recolocou a necessidade de acentuar a
repressão para fortalecer a ditadura.
A esta altura o pano de fundo de tais entrechoques já está sendo aos poucos
moldado pela questão sucessória. Como a ditadura não dlspOe de mecanismo
institucionais de regulação do processo de sucessão presidencial, o problema
sempre surge abruptamente Já na metade do mandato o começa a tomar corpo,
passando a ser um dos eixos fundamentais do jogo político burguês.
O MDB, expressando principalmente os interesses de setores da burguesia que
ainda viveriam o sonho do capitalismo concorrencial e, por isso mesmo, sofreu
18
grande reviravolta. Beneficiário em 74 da grande insatisfação popular, que não
tendo canais próprios para se expressar, descarregou na votação um protesto
contra a ditadura, tinha se apresentado ao eleitorado quase que unlficadamente em
cima das bandeiras políticas levantadas pelo setor democràtico-pequeno burguês,
os chamados «autênticos». Mesmo tendo conseguindo uma inesperada votação,
ganhando a maioria das cadeiras em disputa no Senado, dobrando sua
representação na Câmara Federal, fazendo maioria em 5 Assembléias estaduais e
aumentando sua força slgnif icadamente nas out ras, mesmo com toda essa força de
pressão n^ m3o, o que fez o MDB?
Em primeiro lugar, sofregamente, buscou através de seus lideres moderados
atribuir sup «vitóriaeleitoral »», não a um protesto do povo, mas a uma vitória do
projeto de distensão de Gelsel.
Logo no começo da legislatura, essa maioria moderada busca colocar todos os
obstáculos possíveis a qualquer uso da força de pressão recèm-conquistada.
Torpedearia mesmo todas as Iniciativas que os «autênticos » tentam levar á frente,
alegando que significariam nova«radicalização » para eles Inteiramente prejudicial
ao bom andamento do projeto de distensão do ditador, do qual tomaram-se
entusiásticos partidários. Seguiram ao pé da letra a frase atribuida ao General
Golberl, referlndo-se ao MDB: «Voces segurem seus radicais, que nos seguramos
os nossos.».
Na verdade, o resultado foi unilateral, na medida que pràticamente só o MDB
segurou os seus. O recuo do projeto Geiset, simbolizado no discurso de agosto de
75 foi o sinal de marcha-à-ré para estes setores do MDB. Reer>quadram-se
rapidamente à direita. Foram claramente se colocando no cenário politico como
uma reseva das até então frustadas tentativas de institucionalização da ditadura.
Queriam negociar com base num pretensa representação popular, suas condições
de participação no regime. Suas propostas cada vez mais vão situando o MDB não
mais como uma corrente de real oposição à ditadura, mas sim como uma corrente
reformista dentro da ditadura, que se propõe a fazer reformas na ditadura e não a
derrubá-la. Seu recuo é tão evidente que nem mesmo estão mantendo mais seus
projetos democratlzantes. De uma defesa anterior de um estado de democracia
burguesa, terminaram por se satisfazer com a derrubada do AI-5 (identificando-o
com a ditadura e o «estado de excessáo») e aceitando ou propondo o retorno à
Constituição de 67 de Castelo Branco. Atualmente já recuaram mais, aceitando a
tese de que é viável fazer «reformas no A1-5», substituindo-o por um conjunto de
«medidas lortes de proteção do Estado», inseridas na Constituição. Trocado em
miúdos, isto significa que esta tração burguesa, ao agir assim, está fazendo-o
como parte do bloco dominante que é, ou seja, agindo também como beneficiária
da violenta exploração dos trabalhadores. Ela também concorda, no fundo, com a
tese de que o Estado burguês, nas condições concretas de nosso pais, só poderá
garantir o desenvolvimento capitalista se estiver devidamente aparelhado (legal e
materialmente) para reprimir o movimento de massas, como condição para
assegurar sua própria existência e pretensa estabilidade.
Mas o recuo, ppra espanto dos que acreditaram em seus cantos de sereia, está
sendo maior ainda. Já vai para dois anos que volta e mela surge a tese de «união
nacional». Agora, entretanto, o côro aumentou. Com esta proposta a oposição
burguesa abre mão de tudo. inçiusiv? de seu caráter de oposição è ditadura.
Entretanto, a ditadura ainda não sente necessidade (e condlçóes) deste apoio,
como bem declarou o governador Paulo Egidio: «A união nacional è uma proposta
patriótica, mas ainda não está na hora». A oposição burguesa, com esta proposta.

19
caminha para transformar-se numa parte da própria ditadura militar, surgindo
como sustentação política para ela.
A oposição pequeno ourguesa também sofreu o Impacto do reenquadramento à
direita da vida política legal do pais. Sua fração parlamentar, conhecida como o
grupo dos «autênticos », sai das eleiçOes de 74 amplamente fortalecida, dado que
seus candidatos tinham obtido em quase todos os estados as maiores votaçães.
Em condiçSes internas bem mais favoráveis, ela tenta tomar a iniciativa dentro do
MDB. ensaiando algumas medidas de arregimentacSo política contra a ditadura,
como toi o caso da CPI de direitos humanos. Logo no início de 75 suas forças sao
fracionadas com deserçóes, inclusive de algumas lideranças de destaque do
período anterior, como è o caso do recém-eleito senador Marcos Freire. Mesmo
assim, ao longo de 75. ela tenta manter-se ativaeoperante, declinando jà em 76 seu
reio de açao. A partir da convenção do MDB começam suas maiores crises, que
atingem o pico no episódio das cassaçSes. Ao final do ano de 75, concluiram que
tinham quequebrarocirculodeçizqueestavalímitando suas iniciativas edecidem
partir para uma atividade política mais agressiva, que teve no comício de Palmeira
da MissSes. no Rio Grande do Sul. um dos seus primeiros e últimos ensaios. Lâ, a
ditadura foi atacada de maneira mais direta, com amplo apoio da massa presente. A
ditadura reage com cassações e a maioria moderada do MDB recua, assustada.
Coloca-se um dilema para os autênticos e a perda do mandato de deputado
Lysaneas Maciel (oi seu epílogo. A ditadura tinha posto a questão em termos
práticos:« alguém tem que parar e, obviamente nao será o governo». Ora, isto
significa entSo que a oposiçSo deveria » parar» ( no caso parar de protestar contra
as cassaçães). ou seja aceitar o papel de « oposição consentida e limitada». O
esforço desesperado, representado no discurso de protesto de Lysaneas, não foi
suficiente. Após sua cassação, o recuo foi generalizado. Os autêntico tentam ainda
negociar dentro do MDB, porém aceitando um enquadramento defensivo, que para
eles foi fatal. A partir de entSo se perdem, aumentam as dissençSes internas, e .
como grupo, ele se descaracteriza. Enfim, também ai, houve um reenquadramento
à direta, ressalvando-se uma ou outra excessão. Na verdade, a maioria dos
autênticos, terminou por aceitar o papel de mera ala esquerda da oposição
burguesa, renunciando à explicitação de qualquer fisionomia política própria,
ficando a reboque da oposição burguesa. Haja visto, como exemplo disso, a
posição que tomaram dlanteda proposta de«união nacional», queàparte algumas
tímidas criticas, terminaram por aceitar passivamente, colocando como condicio-
nante o acréscimo de algumas reivindicações, como anistia. Enfim, vão aceitando
cada vez mais trabalhar dentro do projeto da oposição burguesa, radicalizando-o
suavemente, aqui e all. Com isto deixam de assumir a bandeira de urna real
oposição . com um programa de luta próprio, que poderia atè mesmo se beneficiar
das muitas bandeiras que a oposição burguesa chegou a empunhar (mesmo que a
contra-goslo) e das quais vai se defazendo uma a uma.
Entretanto essa atenuação da atividade desse setor parlamentar da oposição
pequeno-burguesa nâo teve repercussão em termos do movimento de massas da
pequena burguesia mais radicalizada. Ao contrário, o que se verifica nestes dois
últimos anos è a acentuação do nível üe mobilização de parcelas crescentes deste
setor, .tendo à cabeça a Intensa reanimação que vive o movimento estudantil.
Reaimente o ME além de uma elevação das lutas no eixo São—Paulo-Rlo. tem
apresentado uma elevada combatividade em outros estados, como Minas, Bahia,
Distrito Federal, etc.... que vem demonstrar o quanto seu potencial de lutas está
entravado. Também setores de artistas, intelectuais, jornalistas, setores do clero.
20
etc. vão dando mostras de uma crescente reativação de sua atividade políticas.
Traço marcante na conjuntura é a generalização do descontentamento popular,
com a intensificação da reanimação do movimento operário e popular. O processo
de futas que toma certo impulso a partir de 1973, nao somente se manteve, como
lem sido cada vez mais intenso. E verdade que as lutas são ainda tipicas do
descenso, onde os objetivos sao principaimente econômicos < e mesmo assim,
bem limitados), as formas de luta bastante dependentes das brechas legais, muitas
vezes agindo na estreita margem entre o que è expressamente proibido e o que é
expressarnente permitido, explorando inteligentemente a situação. As íormas de
organização sSo ainda instáveis, pouco firmes, até mesmo camufladas dentro de
coberturas legais, as vezes pouco adequadas. Ao lado da maior incidência dos
conflitos labris. onde mesmo que secundariamente chegaram a ocorrer lutas mais
radicalizadas, verifica-se um crescimento dos movimentos de oposição sindical,
onde um trabalho político amplo vem agindo no sentido de uma maior
movimentação de parcelas de massas, a partir das tentativas de sua organização e
mobilização pela base de fábricas.
Um dos aspectos Importantes a destacar é também, o surgimento de um
movimento de donas de casa trabalhadoras, moradoras de bairros de periferia, cujo
melhor exemplo foi a realização da Assembléia do Custo de Vida, na região sui da
cidade de-SSo Paulo, onde alguns milhares de trabalhadoras aprovaram uma
contundente tomada de posição contra a essência do arrôcho salarial, contra a
carestia de vida (bandeiras econômicas que tendem rapidamente a se politizar
pelo próprio caràler de oposição que tem ao se conflitar com os apetites da
burguesia) e reivindicações parciais bem limitadas, porém significativas para as
condições de vida das massas, como a criação de creches e a organização de
cooperativas nos bairros pobres.
O que se constata é que cada ve2 mais sSo os novos setores da massa operária e
popular que despertam • premidos pelas péssimas condições de vida e trabalho *
principaimente para a necessidade de reagirem á brutal exploração a que estão
submetidos. Fenômenos como a quebra e incêndio de trens e estações, no Rio e
em São Paulo, quebra òe ônibus, invasão de conjuntos habitacionais ou recusa de
pagamento de prestações drasticamente aumentadas, e até mesmo alguns casos
de conflitos fabris violentos, vêm demonstrar o potencial de luta represado durante
estes últimos anos. 0 que tem aparecido nfio é senão a pontinha do grande iceberg
da revolta popular submersa. Isto vaí demonstrando, pouco a pouco, queoascenso
do movimento de massas operário e popular está se gestando e é multo em função
dele também que o jogo político burguês busca .se situar. Haja visto as propostas
de « união nacional» da maioria moderada do MDB, que se justificam, entre outras
coisas, pelo argumento de que é preciso «se unir para enfrentar a difícil situação
que o pais passará a viver»; ou seja a crise econômica, gera uma crise política, que
o MDB se esforça por desarmar, ao invés de se aproveitar, e fatalmente uma crise
social, onde o movimento de massas operário e popular tende a ocupar gm papel
fundamental.
no campo, os conflitos também tem aumentado em intensidade 6 amplitude.
Destacam-se os conflitos de posse, onde os camponeses tem sido forçados a uma
reação desesperada para garantirem contra as grilagens a terra que desbravaram
com tanto esforço. Amplos contingentes de trabalhadores rurais, particularmente
os volantes e bóias-frias, vão aumentando sua consciência e organização. Fato de
destaque foi a conquista, este ano pela primeira vez, de um acordo salarial no

21
Estado de São Paulo, incluindo todos os boias-frias, o que deverá ter um peso
importante na ativação da vida sindical dessa parcela que já atinge um número bem
grande de trabalhadores.
Destes traços da conjuntura, podemos concluir que a tendência é à agudi2ação
da crise econômica, ao acirramento das contradições inter-burguesas, a uma maior
ativação da oposição à ditadura, particularmente dè setores da pequena burguesia,
que tende a se desprender cada vez mais para o lado do movimento operário e
popular, e a um aumento do papèl deste no processo de luta política geral. Enfim,
isolamento da ditadura mais acentuado, provável desmacaramento da falsa
oposiçSo burguesa, possível revigoramento da oposição pequeno-burguesa e,
principalmente crescimento de um movimento de oposiç3o revolucionária e
popular com base na classe operária, seriam as tendências mais de fundo na virada
desta situaçSo atual.
2. A materialização da estratégia em política concreta se faz através da tática. Para
estabelecer um tática temos que tomar como referencial fundamental os objetivos
estratégicos e a situaçSo de conjuntura, ou seja, um momento determinado da
correlação de (orças. A tática se propõe objetivos mais imediatos realizáveis, que
buscam conjugar dois aspectos chaves: por um lado, parte do real nível de
consciência, organização e mobilização das massas, de suas reivindicações mais
sentidas e mais imediatas; por outro procura não se limitar a conduzir estas lutas
neste nível, e sim apoiar-se nas camadas mais avançadas do movimento de
massas.para puxà*lo para objetivos mais radicais, para formas de luta mais
contundentes e para formas de organização mais profundas e estáveis.
Con seguir esta justa articulação é o papel chave da vanguarda: nem ficar ao nível
do que as massas jà estejam dispostas a lutar ( seria cair no reformismo), nem
propor objetivos Irreaiizáveis que só levariam ao aventureirismo ou à desmobiliza-
çSo (seria cair no «esquerdismo»),
Nossa tática leva em consideração à; situaçSo objetiva em que se encontra o
proletariado como classe hoje no Brasil. A Inexistência de um verdadeiro partido
revolucionário do proletariado, què léhha efetivas bases implantadas no seio do
movimento operário brasileiro, que-interfira nele de forma significativa, é um
condicionamento fundamental a nossa atuação, bem Còmo de todas as forças
cdmpro metidas com òprojetodé construção de partidos. Como jà aflrmàvamos em
74 ( e hoje estamos mais avançados', obviamente) embora nao tenhamos ainda o.
partido, jà temos um importante ponto de'partida nessa caminhada, dado pelas
organizações da esquerda revolucíiònària, de tendência proletária, que autocriti-
cando-se cfe suas trajetórias, buscam tomar firmemente nas mSos os objetivos da
revolução socialista em nosso páis, eque pára .tanto se esforçam na elaboraçSo de
úm programa, uma estratégia éürna tàtlcáréálmente revolucionários.
Entendemos claramente na àtuál conjuntura que n5o se coloca ainda o objetivo
de chamar à imediata derrubadá revolucionária da ditadura. Estamos ainda no
processo anterior a esta situação, onde ©: aspecto principal é o de «resistência à
ditadura», visando acumular forças, para chegar à sua derrubada. Sendo assim
nossa tàrica vai justamente no sentido de avançar na constituição de uma efetiva
vésiôtèncladostt-abalhadorés, àcumúlando forças para tomar â ofenisiva, com base
nfas ações de massa. Para nô's, o objetivo chave desta conjuntura continua sendo o
esforço no sentido dá construção do partido, para o que precisamos caminhar
justamente no -Compasso do movimento de massas, e como estamos nos
preparando para um àscénso de massas em nosso pais, entendemos que o esforço

22
de construção partidária tem que levar em conta estas condições que estão se
gestando hoje, como já se pode notar pelo pipocar, ainda inicial, de uma firme
retomaoa das lutas.
Nossos objetivos políticos, do ponto de vista tático, condicionados pela atual
conjuntura, levam em conta a necessidade de imoulsíonar o movimento operário e
popular na intensificação de sua lutas econômicas, no incentivo oe suas lutas
políticas, visando dar-ihe um conteúdo cada vez mais claro de resistência à
ditadura militar, de uma verdadeira oposição revolucionária e popular. Para os
comunistas revolucionários esta luta política tem objetivos, formas de luta e de
organizaçSo distintos dos que se propõem frações da pequena-burguesla
radicalizada.
O objetivo da ditadura militar, expressando os interesses do bloco dominante,
part leu larmente da grande burguesia industrial-flnancelra associada ao imperialis-
mo, éo de encontrar um novo centro oe equilíbrio consensual, onoe a negemoma
deçta fraçSo esteja garantida, colocando a seu serviço a oposição burguesa,
atrajndo alguns setores da pequena-burguesia e Intimidando outros, para com isso
atingir seu objetivo chave que é o de isolar o movimento operário e popular, freiar
sua reanimação, truncar seu ascenso de lutas, e então poderem institucionalizar a
ditadura.
O objetivo do proletariado nSo pode sér outro senão o exatamente inverso deste,
isolar a ditadura - centrando fogo na suas tentativas de institucionalização
desmascarara média burguesiae sua falsa oposiç9o, neutralizar uma parte e atrair
outra da pequena burguesia, forjando um poderoso movimento de massa operário e
popular que irrompa na cena política como o verdadeiro eixo de uma oposição
radical à ditadura, cujo projeto pòlitico aponta para sua derrubada revolucionária,
para a constituição de um novo è revolucionário.poder.
Dai que a constituição dessa força social revolucionária caminha a lado com o
esforço de construção dé sua vanguarda politica, o partido revolucionário do
proletariado. Das eleições de 74, para cá, v|mos um progresso significativo na
IqtervençSo das organizações revolucionárias da tendência proletária na luta
política em nosso pais. E cada voz mais é a própria sltuaçflo do movimento de
massas que nos cobra uma intervenção mais decidida; E de pe notar que, dè então
para çâ,. houve um duplo movimento. Uma parte da tendência proletária,
assumindo efetivamente o eixo das tarefas centrais que a conjuntura nos impõe,
passou resolutamente ao enfrentamento dos desafios da construção partidária, tal
como foi exposto acima. Outra, entretanto, confundiu-se e entrou num
emaranhado doutrlnarista de repercussões extremamente negativas, Uma destas
organizações, que tem revelado um doutrinarismo mais empedernido, na, verdade
vem desenvolvendo um trabalho político iiquldaclonlsta, altamente prejudicial ao
processo de formação do partido. Outra força, embora distanclando-se do
doutrinarismo mais empedernido, émbaraçour-se neste processo e, particularmen-
te em suas definições táticas vem tentando uma equidistáncla entre as duas
posiç^és. em luta, impos.sivel de se manter. <
fVT 0$'COMUNISTAS E AS «ELEIÇÕES» DA DITADURA '
Nas eleições que existiram de64 a 72, o grosso da esquerda revolucionária optou
pelo boicote eleitoral, sob a forma de «yotò nulo». A prática demonstrou que o
boicote proposto tinha bases, ao nível da consciência de massas, dados as
significativas percentagens obtidas. Somando votos nulos, brancos e abstenções
(mesmo sabendo que nem lodo esse resultado tem o mesmo conteúdo político)
vè-se que o índice foi elevado, chegando em 1970 a quase 40% •
Ingenuamente, o grosso das forças que defenderam o voto nulo fizeram-no
como se eslefôsse um principio a dividir revolucionários de reformistas, e n8o uma
pisiçao política que podería mudar segundo as condiçoes concretas. E só
observarmos o conteúdo político dado às várias campanhas de voto nulo para
verificarmos como elas expressam um estágio ainda multo Inicial de luta
consequente contra o reformismo, embora tenha tido nesta luta sua motivação
fundamental. Na verdade para diferenciar-se dos reformistas, para denunciá-los,
não tinha a esquerda revolucionária uma proposta política global, uma justa visSo
estratégica/programâtlca. Menos ainda, é claro, no que toca á tática. E assim que
se coloca co mo alternat Iva palavras de ordem do tipo: « Só a g uerra popu lar derruba
a ditadura»: «eleições é tapeação»; <■ abaixo a ditadura», ètc. NSo se ia além de
propagandear a esuatégia e de utilizar recursos clandestinos para se comunicar
com as massas. Nz verdade, pretendia-se mobilizar as massas diretamente em tor-
no dosobjetivosestratégicose, nessa medida, dispensava-se qualquer «tática» —
o que term inava, é claro, sendo obviamente uma tática. Ao nfval s ubjetlvo; Identifi-
cava-se «tática» com reformismo, pois afinal a tática tratando das questões de lu-
tas parciais, lutas legais e clandestinas, estava bem distante da preocupação
fundamentai de iniciar o mais imediatamente possível a luta armada contra a
ditadura.
A excessSo talvez do PC do 8. (que fe2 um zig-zag nesta questão), o conjunto das
forças que se consideravam anti-PCB, defenderam sempre ao lonao destes anos o
voto nulo. Partlcularmente nossa O. tem uma rica experiência nessas campanhas,
colocando-se a serviço de uma agitaçSo política e de organizaçSo de massas que,
apesar dos erros de linha, renderam certos frutos.
A posição de boicotar ou nSo foi levantada por Lênin, para a Rússia, com base
num fundamental critério: a proximidade ou não da transformação do movimento
de massas em tuta insurreicional. O critério seria: próximo de uma virada deste
lipo, boicotar, dando sequência no esmagamento revolucionário das Instituições.
Distante de tal virada, com o movimento de massas ainda lutando por objetivos
limitados, a orientação seria participar.
Entendemos que no caso brasileiro, a poslçfio de voto nulo praticada pela grande
maioria da esquerda revolucionária de 64 a 72 deve ter mais alguns aspectos a
destacar, que inclusive ajudarão a compreender porque existe ainda uma reserva
acentuada de certos setores da esquerda a uma participação eleitoral. Achamos
que, para compreendermos bem o verdadeiro significado que teve essa posição,
precisamos colocá-la no contexto da luta pela formação da vanguarda revolucioná-
ria em nosso pais.
Após 64 o que ficou evidenciado fo) a grande derrota do reformismo do PCB. A
reação à deformação do marxismo feita por ele vinha Já de antes de 64, embora
incloientemente. v»i sendo colocada na ordem do dia, no período pós-golpe. a
questão da formação dum partido realmente revolucionário do proletariado em
nosso pais. Mesmo organizações pequeno-burguesas e não marxistas, como era a
nossa então, já demarcavam terreno com o reformismo ao PCB, mesmo que de
forma ainda inconsequente.
Apôs 64, com a derrota do movimento de massas e da tinha reformista, as
organizações que defendiam a luta revolucionária tomavam o PCB e suas posições
como o exemplo negativo com o qual jamais podariam vír a concordar. E assim que
a posição eteitoreira, frentistae fundamentalmente reboqulsta do PCB, sua prática
manobrista, dentro do jogo político buguês, colocava para os revolucionários, em
grande parte Jovens e Inexperientes e com pouca formação teórica, a Identificação
de lutas parciais, a utilização de recursos legais, e particularmente a participação
em eleições, como algo intrlnsico ao reformismo.
E justo lembrar aqui o camarada Lènin, quando procura entender os desvios
esquerdistas do final da década de 1910, como uma espiação dos pecados
oportunistas da II Internacional. O nosso caso foi semelhante. 0 oportunismo do
PCB foi tão grande que gerou uma repulsa profunda a qualquer atividade ou
posição política que pudesse de alguma forma ser parecida com as suas. Era,
enfim, como se o problema fosse: lutas parciais, legais, significam reformismo e,
como não se acreditava que elas pudessem ser dirigidas revolucionariamente, era
preferível ficar com as «posiçOes revolucionárias» e... abandonar as lutas parciais,
e nessa medida, abandonar o próprio movimento de massas.
O voto nulo teve em grande medida, para a Jovem esquerda revolucionária, uma
função defensívadiante do PCB, de repugnância por seus tradicionais métodos de
luta. ao mesmo tempo em que revelava a ingenuidade e o esquerdismo de
considerar o voto nulo como uma forma elevadíssima de luta política, dado que
indicaria, por parte das massas, a superação das ilusões eleitorais e a
disponibilidade em apoiar o caminho da luta armada contra a ditadura.
Na verdade, a esquerda revolucionária, carecendo de clareza quanto ao programa
e à estratégia da revolução brasileira — senSo claramente equivocada a respeito (a
única, ou principal, Organização que tinha um programa e uma proposta de
estratégia socialista não tinha nenhuma proposta tática) —, via a questão da
acumulação de forças fundamentalmente no terreno militar. Partia da errônea
consideração, no que se incluíam todas as suas forças componentes, de que
estaríamos na iminência da guerra revolucionária (foco para uns, guerra popular
paraoutros. uma mistura dessa alternativas para outro, etc.) e, como tal, não cabia
na tática qualquer outra coisa senão a preparação imediata da luta armada.
Nesse sentidoéque entendemos as esperiências das campanhas devoto nulo de
64 a 72. O próprio fato de, a partir de 74, ter sido colocada a questão em outros
termos é um indicio revelador do grau de amadurecimento que os processos
autocríticos dentro da esquerda revolucionária foram gerando, de forma a colocar
para a tendência proletária o enfrentamento concreto de um tática proletária de luta
contra a ditadura militar, na atuai conjuntura.
2. A nossa posição de desmarcarar a farsa eleitoral em 74, não 9òmente através do
voto nulo e branco, mas apoiando também um ou outro candidato que nos desse
condições de participar mais diretamente do debate e da mobilização política das
massas não se deu sòmente em função de nossa posição de considerar a questão
eleitoral como uma questão dentro de uma tática; também fomos levados a Isto,
exatamente analisando aconjunturae formulando aspectos da tática, ao observara
tendência natural existente no seio da massa de fa2er do voto MDB uma forma de
protesto contra a ditadura. Se pretendemos de fato conduzir o movimento de
massas e não nos colocar à margem dele, não nos cabia outra atitude senão a de
ousarmos nos misturar á massa, e de dentro dela, conseguirmos demonstrar-lhe
quão enganosa é a alternativa do parlamento burguês (e mais ainda numa ditadura
militar), como meio para resolver seus problemas fundamentais.
Hoje, podemos afirmar que nossa posição demonstrou-se, na prática,
fundamentalmente correta.
Vejamos: nas cidades, a classe operária, a pequena burguesia de nível salarial

25
mais baixo e os setores seml-proletarizados, votaram em massa no MDB, Os
estudantes, artistas, jornalistas e Intelestuais, votaram principalmente nos
«autênticos>»eapenas um setor menor optou Delo voto nulo. A pequena burguesia
proprietária e os setores da pequena burgueslade melhor ntvel salarial dividiram-se
entre Arena e MDB. mas ainda assim a maioria apoiou o MDB. E pelos dados que
temos, apesar de precários, podemos também afirmar que os assalariados
agrícolas e a maioria da pequena burguesia agrária também votaram no MDB.
O MDB acabou por venceras eleiçffes para o Senado em 16 estados e conseguiu
fazer mais de um terço na Camara de Deputados. Conquistou maioria em
cinco Assembléias estaduais e reforçou-se lias outras. Venceu em quase
todos os centros urbanos médios e grandes. A única excessão foi Sal-
vador, onde o MDB perdeu, pela primeira vez, como decorrência bem di-
reta do adesismo do MDB de là. Ao concluirmos que a ampla votação do
MDB representa o protesto que amplos setores das classes revolucionárias
julgaram possível utilizar contra a repressão e a exploração da burguesia
sustentada pela ditadura militar, somos levados a concluir também que isso
representa ainda um baixo grau de consciência política, de mobilização e de
organização das massas, que não dispondo de meios mais consequentemente
revolucionários de luta. utilizaram aquefe mais fácil e mais a seu alcance.
Alèm do mais, setores da média burguesia industrial e agrária e mesmo da
grande burguesia industrial-financeira, também jogaram influências e votos para o
MDB, o que vem demonstrar a diversidade de interêsses de classe dessa maciça
votação.
Como causa principal dessa votaçSo, vemos, como já foi dito, a necessidade
sentida pela massa de utilizar algum canal para expressar sua revolta contra a
opressão e a super-exploração. A esta causa se ligaram ainda as brechas maiores
que passaram a existir para a utilização dos meios legais, no período pós-Médicl. O
crescimento da margem de votação do MDB deveu-se também à atração de setores
que até 72 apelaram para o voto nulo ou em branco, como forma de protesto,
impulsionados pela posiçSo da esquerda revolucionária e pela falta de alternativa
maiores de luta, ainda que legais. Em 74, boa parte dos setores da esquerda
revolucionária optam pelo voto participante.
3. Consideramos, no fundamental,.justa a posiçSo que adotamos em 74.
Entretanto, temos algumas observaçCes a fazer. Estávamos saindo da posiçSo
fechada de voto nulo em geral, com certa insegurança e ainda algo defensivos.
Quase que pedindo descuI pas por nSo estarmos tendo a a posiçSo mais rad ical ►> de
pregar o boicote generafozado, Foi assim que mantivemos a posiçSo de boicote,
articulada com a participante, admitindo que esta última poderia ter uma aplicação
particularlssima. Como dissemos antes, o processo de amadurecimento da
esquerda revolucionária de tendência proletária é sinuoso, com altos e baixos. Ele
vem colocando as tarefas concretas de direção da luta de classe do proletariado,
mesmo este se encontrando ainda numa posição de defensiva na luta política.
Sair dos marcos de uma vanguarda ideológica simplesmente (onde pretendem
ficarosdoutrlnaristasmais empedernidos, posando de guardiães do«»marxismo»)
e se propor também se situar como vanguarda política, isto implica, necessària-
menteem se colocar diante das condiçdes concretas em que se processam as lutas
de massas, visando interferir nestas. Para Isso a esquerda proletária tem que
assumir uma justa tática peljtica.
A falsa opção de identificar tática com reíormismo (levando portanto ou a ficar
com o reformismoou sem tática) mantem-se, ainda hoje, nos doutrlnaristas mais
enraizados. Preferiram ficar sem tática alguma, satisfazendo-se com o propagan-
dismo; soa«tática» resume-se a atacar a tudo e a todos, especialmente a tática das
organizações da esauerda revolucionária de tendência proletária que assumem a
lula pela organizaçao da resistência dos trabalhadores e a bandeira de liberdades
democráticas.
No que toca à questão do voto nulo em 74, ou agora, a argumentaç8o dos
doutrlnaristas é bem escassa. O problema central está colocado na análise de
conjuctt ura e na questSo da tática e não especlfIcamente na questão das eleições. O
que eles fazem ô questionarem o conjunto articulado de nossa tática, a pretexto
que ela se somaria à onda «democratista» burguesa e pequeno-burguesa. Houve
até quem fizesse deformações grosseiras de nossas posições para melhor
atacá-las, como se isto ajudasse alguma coisa na polêmica que se trava em nosso
melo. Mas, não é aqui e agora que vamos tratar de tais deformaçOes.
V. A ELEIÇÃO DE 76 E NOSSAS TAREFAS POUTICAS
Uma orientação em 10 pontos
1. As pleições deste ano e suas particularidades
As eleições deste ano aparecem na atual conjuntura como um momento
importante para a ditad ura. De certa forma elas servirão de termômetro aval iador do
processo político em curso e deverão dar base à reformulação no projeto de
institucionalização de Geiset. 0 ditador chegou mesmo, em momentos de
exaltação, a colocar o pleito de novembro como um plebiscito, onde ete pedia o
julgamento de seu governo ao eleitorado, posição da qual veio a recuar depois. O
governo decidiu jogar para ganhar e, para isso, foi tomando as providencias
necessárias.
A principal delas foi a instituição de uma nova legi9laçao sobre propaganda
eleitoral, a chamada «lei Falcão» que veio proibir o acesso ao rádio e televisão
pelos candidatos, reduzindo-o à apresentação de foto e de um pequeno histórico
pessoal. De fato a lei introduziu varias modificações, todas elas visando impedir o
debate, a discussão calorosa, a manifestação, enfim, dos anseios de participação
popular tão bem explicitados em 74 e já então reprimidos.
Além desse arrolhamento da campanha, a ditadura está jogando toda a sua
máquina governamental (em todos os níveis: federal, estadual e municipal) alem da
figura do ditador e seus ministros. Inundaram de propaganda o rádio, a televisão,
o cinema, os jornais e revistas e estão numa grande atividade, visando assim
marcar uma presença polittca junto ao eleitorado para influenciá-io. Descarada-
mente o governo faz uma grande propaganda eleitoral de seus candidatos,
ao mesmo tempo em que impede que a oposição faça a sua. ■
Com a declaração do presidente da Aréna de que «as eleições de 76
condicionam as de 78*. a ditadura quis realçar o que já tem se tornado uma
sisiemàtica: toda vez que estiver ameaçada de perder algo que considera
importante, ela não se perturba. Simplesmente muda a regra do jogo, seja
fabricando novas leis, seja cassando, seja editando novos atos.
Isto só vem confirmar nossa justa posição de que a ditadura só será levada à
defensiva, à derrota e à derrubada e esmagamento, se o movimento operário e
popular tomar realmente em suas mãos, com seus métodos próprios de luta, seus
objetivos mais amplos e suas formas de organização especificas, o centro d© um
poderoso movimento de massas contra ela. Os que pretendem reformá-la, por tora

27
ou por dentro, a partir de pressões eleitorais, estão fadados a serem desmascara-
dos como os grandes impostores da luta pela derubada da ditadura militar em
nosso pais.
2.Nossos ob/etivos nestas eleições.
Como já afirmamos antes, como comunistas revolucionários, não temos
nenhuma ilusão no processo eleitoral burguês, agravado ainda pelas condições de
ditadura militar, e ainda mais num pleito municipal. As eleições para nós sSo mais
uma batalha política, e trata-se de tirar delas o melhor proveito possível dentro de
nossos objetivos táticos e estratégicos.
Nosso objetivo fundamental nestas eleições é fazer avançar a organlzaçSo da
resistência dos trabalhadores, éavançar na denúncia da ditadura e no desmascara-
mento dô sua farsa eleitoral. Enfim, é fa2er avançar seu isolamento, ao mesmo
tempo que buscamos aumentar nossa própria força, nossas próprias bases de
apoio político.
Estas eleições são um combate político complexo, que nSo se dà sómente numa,
mas em variadas frentes. Por um lado, temos a frente principal, que é o combate à
ditadura, aos seus representantes e candidatos. Esse é natural mente o nossoalvo
chave, para onde faremos convergir nosso esforço no processo eleitoral. Mas,
temos também dois outros combates importantes, que embora subordinados a
este, tem que ser bem compreendidos e levados à prática.
Um é a luta política que visa desmascarar a oposição burguesa à ditadura,
demonstrando como elaé uma falsa oposição 0 uma real conciliação. A maioria
moderada do MOS, que na verdade chega a se identificar com esse partido, pois
detém praticamente todos os seus postos de mando, tem que ser submet ida a uma
impiedosa denúncia junto ao movimento operário e popular.
Coiocaranúo processo de suas conciliações, buscar subtrair o apoio que ainda
desfruta dentro deste movimento, ó uma tarefa política importante nesta
conjuntura. O movimento operário e popular, que ainda padece de ranços
populistas, justamenie enraizados por esta fração burguesa, sòmente conseguira
surgir no cenário político do pais deforma independente e realmente autônoma, na
medida em quese desfizer da cangalha de influencias deste setor burguês. Quando
mais nós aaprofundarmos as críticas a est setor da burguesia, mais estaremos
reforçando nossas próprias forças, criando condições de atuação de uma oposição
realmente de massas, centrada nos interêssesdos trabalhadores,e, por outro lado,
mais estaremos também atingindo os próprios projeto alternativos da ditadura (por
exemplo, o projeto da burguesia de contar com este setor para «segurar» o
movimento de massas, para disciplíná-lo num projeto reformista qualquer).
Devemos denunclá-lo como traidores de hoje, de ontem e de amanhã. Hoje é a
união nacional, ontem foi o apoio ao golpe de 64, amanha será a participação no
governo da ditadura, quando ela disso necessitar. Jâ despontam até candidatos a
ministros dentro do MDB, já que para governador nem se fala, já estão lançados.
Ora, é só vermos o que tem sido a maioria do MDB nas 5 assembléias estaduais e
mais a experiência do governo do MDB no governo do antigo Estado da Guanabara,
através do adesista Chagas Freitas, para termos uma idéia do que será 0 futuro
destes adesistas encobertos.
Também devemos levarem contar que. a ditadura cogita de uma reforma política.
Ela está, desde há muito, vasculhando íórmulas paraenfrentaro possível dilema de
78. Para tanto tem sido inslstentemente levantada a hipótese de supressão do
bi-partidarismo, criando condições para surgimento de novos partidos - certamen-

28
1
te como mera extnsao dos atuais, mas que permitiríam juntar os atuais adesistas
(que sSo pràticamente o mesmo que elementos da Arena infiltrados no MDB) e
moderados do MDBà grande maioria da Arena, e formar assim, um grande partido
de apoio à ditadura, admitindo-se, talvez, dois outros partidos, um à esquerda
deste, outro mais à direita, devidamente disciplinados e enauadrados.
Para nós. o objetivo dè eleger um candidato apoiado por nós deve estar
inteiramente subordinado ao objetivo político da campanha. Eleger o candidato
apoiado é para nós, uma decorrência lógica de uma correta conduçSo da campanha
política. Afinal n3o estamos disputando com a ditadura ou com os adesistas e
moderados do MDB em quantidade de votos simplesmente. No fundamental nSo
estamos disputando votos e sim influência política. Conhecemos bem o vicio
intrínseco que tem o processo eleitoral burguês, e ainda mais a farsa montada pela
ditadura. O que nos Importa é o significado político dos setores de massa que
sejam atingidos pela campanha e que expressam isto através de uma partlcIpaçSo,
a mais organizada possível, em atos de massa, em discussões, em ativar lutas
especificas, em destacar elementos avançados. Enfim, a grande massa eleitoral
n£o é exatamente a que temos condições de atingircom eficiência. 0 que podemos
prlnclpalmente atingir s3o as parcelas avançadas e intermediárias das massas e
devemos fazer da campanha eleitoral uma oportunidade a mais de acesso à ela.
Facilitados pelo episódio eleitoral, devemos ativar discussões políticas, articular
as reivindicações mais sentidas, Imediatas e por vezes locais, com a luta política
pelas liberdades democráticas, visando avançar na organlzaçflo da resistência dos
trabalhadores contra a ditadura militar.
Num pais como o nosso, submetido à férrea ditadura sanguinária, o debate polí-
tico encontra-se praticamente proibido. Nas épocas de campanha eleitoral (em 74
mais do que agora), surge uma pequena brecha para tais discussões. Com habilida-
de se poderá explorá-la bem, razão porquen3o podemos perdê-la de forma alguma.
Dai que nosso objet ivo nas atuais eleições podem ser resumidos em lazer avançar a
luta política contra a ditadura, dentro dos interesses e objetivos táticos do
proletariado revolucionário.
3. A quem apoiamos
Consideramos correto apoiar è base de um apoio critico, além obviamente de
eventuais candidatos comprometidos com as posições do proletariado revolucio-
nário, os aliados objetivos: candidatos do MDB que efetlvamente demonstrem
tanto pelo seu passado político, como no processo de disputa eleitoral, que este-
jam comprometidos com uma plataforma de lutas que real mente interessa aos
trabalhadores, que se disponham a ajudar na resistência dos trabalhadores á
ditadura, visando sua derrubada revolucionária, e que n5o coloquem suas
esperanças fundamentalmerne na lula parlamentar, mas *im no movimento de
massas, que n3o queiram atrelar a resistência dos trabalhadores às limitadas
condições de luta dentro da legalidade, e, partlcularmente, dentro do MDB.
Ao apoiarmos um cadidato com tais características, temos claro para nós que é
decisivo manter nossa Independência polltico-ldeoigica e orgânica mente a ele
e sua campanha, dado que visamos através da campanha chegarmos diretamente
às massas e n3o pela intermediação do candidato.
Podem ocorrer situações em que surjam mais de um cadidato em condições de
receber nosso apoio critico, levando sòmente em conta as posições políticas.
Nesse caso, nossa orientação é no sentido de fixarmo-nos (supondo que nSo
estejamos em condições de apoiar mais de um) naquele que tenha melhores

condições de aproveitamento de sua campanha e que se disponha a colocar seu
mandato, de forma mais incisiva, à serviço da organizaç9o da resistência dos
trabalhadores.
Êstà claro já que em quase, senão em todos os grandes centros, surgiram
candidatos, que, na sua maioria, tinham algum tipo de vinculo com o movimento
operário e popular, em condiçCes de receber nosso apoio crítico. Em outros
centros menores ocorrerão situações em que os candídadtos do MDB serão
adesistas ou no máximo moderados. Nesse caso, não existindo nenhum candidato
em condições de receber nosso apoio (dado que excluímos preliminarmente a
possibilidade de apoiarmos um adesista ou moderado) defendemos então a
posição de voto em branco, visando uma participação na campanha eleitoral,
fazendo sua denúncia e desmascaramento.
Não consideramos válido nenhum tipo de «apoio critico» a qualquer candidato
moderado, como formade melhor participar de sua campanha e de desmascara-io.
Consideramos que o próprio fato de não existir um candidato com as condições de
receber nosso apoio revela o estágio ainda atrasado do movimento político local, a
fraqueza de posições vinculadas ao movimento operário e popular e que neste
caso, pretender participar da campanha de um moderado, denunciado de dentro
dela, ó mera ilusão. O que determinará por prevalecer ó o apoio. As denuncias,
supondo-se que possam ser feitas adequadamente, ficarão diluídas, até mesmo
pela fraqueza de quem faz, por suposto. Nesse caso entendemos que a campanha
de voto em branco (ou nulo, conforme,.as condiçoes de efetivação), sendo uma
posição legai (embora passível de repressSo arbitrária) permite muito mais uma
discussão política aberta, desperta maior interesse, pejo próprio fato de propor o
não voto, através do voto em branco. Mesmo que atingindo um setor de massa bem
menor, dado a fragilidade do movimento político local, estará permitindo atingir
setores de vanguarda e massa avançada, que serSo fundamentais para o
desdobramento do trabalho político junto à massa.
Ocorrerão casos em que o candidato que apdíamos terá vínculos ou certos
compromissos políticos com candidaturas a prefeitura que não estejam em
condições de receber nosso apoio. Nesse caso faremos a campanha defendendo o
apoio ao candidato a vereador, e com nossa participação esclareceremos a
posição de voto em branco para o candidato a prefeito. Não consideramos
essencial para o nosso apoio que o candidato a vereador necessariamente assuma
essa nossa posição,, embora devamos fazer pressões explicitas sobre ele neste
sentido.
Nosso apoio critico deve ser preferenclalmente a candidatos a vereador. Pelas
próprias características da Câmara e do executivo municipal, é aquela a que oferece
melhores condições de atender aos nossos objetivos de buscar fundamentalmente
tribunas de mobilização. E claro que não descartamos a possibilidade de
apoiarmos aigum candidato a prefeito, embora consideramos que não serão
muitos os casos em que surjam candidatos em condições políticas de receber tal
apoio.
Numa eleição com características nacionais, como as de 74 e de agora, deverá
existir sem preuma posição política fundamental a nortear suas aplicações locais.
E assim que a tática de boicote, através do voto nulo, nao é para nós, a posição
fundamentai nessas eleições. Poderá ocorrer, local Izadamente. Neste sentido,
modificamos um aspecto da posição adotada em 74, quando colo*camos quase que
tendo o mesmo significado a utilização de uma ou outra posição no decorrer do
mesmo pleito. Entendemos que o pleito tem também um significado de batalha
políticaglobai. Neste sentido é que consideramos que b aspecto principal de nossa
tática eleitoral hoje é a do voto participante, desde que tenhamos condições de
efeiivâ-10 átrávés do apoio a candidatos Ctftn as condições jà referidas^ PoderJa-se
também chamà-la de voto-programa, noJ sehtldo que é vinculada a um
prògrama/plataforma determinado. Utilizaremos o voto em branco, caso nSo
encontrámos'essas condições. Ou seja, afirmamos còmo posição fundamental, a
necessidade de participação na campanha eleitoral legal, seja apoiando um
candidato, sèja defendendo o voto em branco. No caso de náo estarmos apoiando
um candidato, seja defendendo o voto em branco. No caso de nSo estarmos
aoolando nlnauém faremos a campanha legal do voto em branco e a campanha
clandestina do voto nulo, segundo as condiçoès concretas. Temos consciência
das limitações do voto em branco,Inclusive de sua utilização na soma da legenda
majoritária, m&s entendemos que Isto é compensado pela participaçao política
mais ampla na campanha e por dar-nos condiçoès de acesso às massa na
campanha legal.
4. Aglutinar os mais avançados.
Para nós, é decisivo o esforço de aproveitar a agitação política da campanha para
aglutinar os elementos mais avançados que se destaquem nesse processo,
atralndo-os para atividades è esforços mais fecundos. Üai que nossa participaçao
em qualquer campanha deverá levar em contá nossos recursos focais, para saber
dispô-los. tendo em vista os setores de massa que mais nos interessa ating Ir e de
onde podemos tirar melhores resultados. Pouco nós sèrviria uma participação
simplesmente agltacionista. feita em ampla escala, mas sem condições de
aprofundar o debate político. Integrando-o com as reivindicações mais sentidas e
locais, ou de contatar os setores mais avançados para eles desdobrar o trabalho
político.
Ampnar a mf lència da Organização entre as massa é o objetivo que se cumpre de
diipla forma: por um lado com a atração e articulação dos elementos mais
avançados dentro das massas; por.outro, aumentando nossa Influência política
mais amplamente, também na medida em* que coloquemos nossas posições,
mesmo que fórq do raio de nossa Influência orgânica.
5. Lula legal e clandestina na campanha eleitoral.
Consideramos que na campanha de74 não tratamos essa questão eorretamente,
dadeque nos concentramos exclusivamente na campanha legal. Este ano estamos
nos propondo utilizar o mais eficientemente os recursos da campanha eleitoral,
também clandest inamente, onde ten hamos condições de desenvolver mals nossas
posições políticas, aprofundar mais o trabalho com os mais avançados è fazermos
uma'agitação e propaganda de nossa luta pelo socialismo e da necessidade de
■ usarmos a violência revolucionária na destruição do Estado burguês, e no nosso
caso, da drrubada revolucionáriada ditadura militar. A campanha iegal não permite
que apresentemos nossas soluções por interlo, dadas as restrições que nos
obrigam, às vezes a usar até metáforas, para nos referirmos a nossos objetivos.
Entendemos que esta campanha clandestina n5o tem condições de atingir amplos
setores do movimento de massas, mas devemos nos esforçar por difundir o mais
amplamente possível nossas posições.
6. Denunciar os reformistas, centrando fogo nos revisionistas.
’ Devémos ter especial atencSo nestas eleições em denunciar com vigor os
reformistas de todo tipo, particularmente os revisionistas, as posíçoes do PCB.
E preciso fazer chegar ao movimento de massas, destacadamente em sua parcela
mais avançada, a denúncia da traiçao aos interesses dos trabalhadores destes
falsos comunistas que com seu reboquismo histórico, seu frentlsmo burguês, só
tem entravado a luta operária no pais, ao atrelá-ia à burguesia. O apoio que dSo ao
MDB como conjunto significa claramente o apoio consciente à uma fração da
burguesia, com a qual continuam comprometidos e da qual esperam todas as
iniciativas na luta contra a ditadura.
Chamamos a atençao para um fenômeno relativamente recente e aue se
enquadra dentro desta denúncia. Trata-se de setores da intelectualidade que
estiveram em poslçoés mais avançadas e que desde as eleições de 74, renderam-se
de alguma forma à participaçSo política centrando seus anseios na maioria
moderada do MDB. Casos como o de Fernando Henrique Cardoso, que defende e
justifica (em jornal do MDB) a posiç3o de «apoio ao MDB», dando-lhe claramente
um conteúdo social-democrata, revelando o surgimento de uma tendência
reformista oequeno-burguesa de conteúdo anti-comunista e de enquadramento
dentro do chamado jogo político legal, ou seja, burguês, como tem demonstrado
seus recentes artigos para o jornal « Folha de São Paulo » e também presentes em
seus últimos livros. Partlcularmentecasos como este, devem ser objeto de criticas
junto ao movimento estudantil e setores da intelectualidade.
/. Criticar incisiva mente os «botcotadores» em geral
Devemos este ano, díferenlemente de 74, tomar a iniciativa de criticas incisivas
às equivocadas, nocivas e oportunistas posições dos que defendem a tática do
boicote em geral como a posiç3o revolucionária de interesse do proletariado nestas
eleições. E preciso fazer, certamente, diferenciações entre os que estlo fazendo a
campanha devoto nulo, poiso gráu de equivoco e enraizamento de desvios náo é o
mesmo para iodos. De qualquer forma é preciso mostrar como eles estão nesta
posição como uma espécie de eco de um período, ainda recente, mas que jà vai
sendo ultrapassado, ondea vanguarda se limitava praticamente a discursar para si
mesma, onde a ligação com o movimento prático e real da luta de classe, dado à
desmobilização do movimento de massas, era predominantemente retórica. Os
atuais «boícotadores», partlcularmente os mais empedernidos, nada mais estão
fazendo do que se dem iti rem do que seriam suas verdadeiras funções nas tarefas de
construção da vanguarda, seestívessem efetlvamenteganhos paraela. Eles tomam
posições quase que para auto-satisfação, independente do que realmente esteja
ajudando ou não a impulsionar o movimento revolucionário à frente, particularmen-
os mais empedernidos (quechegam ao cúmulo de fabricarem uma «teoria»sobre a
tática, para justificarem suas absurdas posições de que é preferível, deixar o
movimento de massa, mesmo que incipiente, de lado, para nSo se «contaminar»
com suas impurezas e deformações).
8. Segurança I.
Chamamos a atenção de todos os militantes, simpatizantes e amigos para um
cuidado especial com os aspectos de segurança em nosso métodos de trabalho,
tendo clareza que nSo podemos expor e tornar vulnerável a estrutura clandestina de
nossa Organização. Hàqueselembrarqge arepressSo aproveita sistematicamente
esses períodos para aumentar seu grau de informação e controle sobre os
movimentos revolucionários. O que temo? que tornar amplamente conhecido pelas
massas sSo nossas posições políticas e não nossas vinculações orgânicas
9 Segurança II.
0 apoio a um candidato deve ser feito fundamentalmente sob a cobertura de um
disfarce qualquer, ae uma area de traoalho, duma entidade ou aigo semeinante. a
Organização não tratará diretamente com os candidatos de maneira explicita e não
permite a nenhum militante que se identifique. Nossa participação, como
organização, é clandestina, inclusive para o candidato apoiado, para o que
devemos fazer esforços para que este não identifique nossa Orgànizaç3o.
10. Desdobramento após as ele ides.
Precisamos estar atentos, desde jà, para ( i desdobramentos que podemos dar a
nossa participação na atual camnanha eleitoral. E fundamental oue est imulemos a
criação de organismos de massas, vinculados à camoanha e oue sirvam de oolo
agiutmaoor de posiçoes políticas earticuladordos mais avançados. Devemos ter
uma atenção especial para fazer da campanha um meio a mais de reforçarmos
nossa participação (ou nos introduzirmos) nos movimentos dos mais variados
tipos, existentes nos locais de trablho, moradia, etc. A campanha eleitora.) , bem
conduzida, deverá servir para reforçamento das organizações de massa jà
existentes, e sob nenhuma hipótese, para seu desmantelamento ou desarticula-
ção. O processo da atuai campanha deverá permitir que se estimule as lutas mais
sentidas e locais, mesmo que estas nao venham a se efetivar plenamente de
imediato. Para tanto, é preciso ir comprometendo o candidato apoiado, no esforço
detornar claro que ele nfio resolverá,no fundamental, nenhuma das questões mais
sentidas pelas massas, poiso quepoderáe deverá é principalmente contribuir para
organizá-las e mobilizâ-las para a luta em defesa de seus próprios interesses. A
campanha eleitoral poderá nos oferecer condições muito favoráveis para
interferência no movimento operário e popular e devemos estar atentos, desde Jâ,
para seus desdobramentos.
Síje estas, companheiros, as questões que consideramos mais importantes ao
termos em vistas estas eleições. Resolutamente devemos partir para uma
participação entusiasmada, tendo ciaro que ela poderá, inclusive, servir para
forjar-nos na preparação para o próximo ascenso do movimento de massas. Afinal,
junto com as massas, os revolucionários também estiveram, de alguma forma
hibernados. Vamos ao encontro do movimento real da luta de classe, vamos para a
batalha, que por ora é pequena, mas Jà prenuncia a grande guerra de classes neste
pais!

SECRETARIADO NACIONAL
AÇÃO POPULARMARXISTA-LENINISTA
Brasil, outubro de 1976.

33
debate

Notas críticas

para a discussão do P.S.B.


Henrique Lima

I. INTfíODUÇÃO
Os debates que se desenvolvem no interior da Tendência Proletária sobre
questóes programóticas e estratégicas,sobre tatica política e tatlea de construção
partidária, cujo meio de expressão principal é a revista Brasil Socialista, mostram
os enormes avanços conseguidos nos últimos tempos para a superação do
sectarismo, do dogmatisrno e do doutrinarismo no seio do nosso movimento
revolucionário. Mas, ao mesmo tempo, assinalam o longo caminho a ser percorrido
para lograra tão desejada uniãò dos marxistas revolucionários em torno das bases
para a construçBo do Partido da revolução socialista no Brasil. ••
Os problemas, reconheço, sSode monta. NSo è por acaso que alguns companhei-
ros, ao debater questões fundamentais de nossa revolução, encabeçam seus
artigos, reivindicando para o tema tratado o caráter de centro da dlscussSo, e
recomendando sua colocação na ordem do dia(1).
Os temas centrais do nosso debate sSo evidentemente os mencionados acima;
no entanto, para que as convergências ou divergências no piano da tática política e
da tática organlzativa se desenvolvam sobre bases sOlldas e nSo se transformem
apenas em aproximações ou rupturas conjunturais, é indispensável que a união
frutifique em primeiro lugar sobre as questões programfttlcaa e estratégicas, e para
tanto é necessário que tais questões sejam aprofundadas e esclarecidas pelo
debate.Evidentemente esta prática no plano da luta ideológica nBo esgota nossos
problemas nem exclui o debate das demais questões, e principalmente nBo deve
constituir um impecilho para o desenvolvimento de nossa prática política no
terreno concreto aa luta oe classes no Brasil. Ao contrário, é precisamente para que
essa prática encontre o verdadeiro caminho da revoluçBo socialista, que as

34
nuestões orogramâtlcas e estratégicas devam ser debatidas e aprofundadas.
O debate sobre o PSB (Programa Socialista para o Brasil). no interior da
Tendência Proletária, foi reaberto recentemente pela critica do companheiro
L.A.Tovar, publicada no n°2do BS. Trata-se de um esforço louvável no sentido de
aprofundar importantes questões programátlcas e estratégicas. Comparto em
grande medida a Intenção — explicita na parte introdutória da critica — com que
este companheiro enfrenta o problema. No entanto, o tratamento Incorreto
aplicado a várias questões do PSB, o que não Jnvalida as criticas acertadas, exige
que minhas considerações sobre o PSB, tenham como referencial secundário o
trabalho do companheiro Tovar.
2.
Depois de uma analise da luta de classes ao nível internacionaJ (2), o PSB passa a
considerar a luta de classes no Brasil.
Arranca com a caracterização do desenvolvimento capitalista brasileiro, afir-
mando : «0 Brasil hoje é um pais capitalista Industrial, cujo desenvolvimento se
encontra bloqueado». Tal bloqueio teriacomo causas a herança coloniai e agrária
(agrande propriedade territorial) que a burguesia não pode destruir radicalmente, e
a dominação imperialista. Na verdade, o PSB afirma que estes dois fatores
aceleram a crise capitalista, não necessariamente provocando-a. No entanto, nos
Itens explicativos dessa concepção, tais fatores aparecem como causas do
bloqueio.
Antes de passarmos ao exame da questão agrária e da Integração imperialista,
convêm fazer uma breve consideração sobre a afirmação inicial do PSB.
O «milagre econômico»que assolou o pais entre 1968/74 tomou evidente que a
afirmação inicial do PSB não resistiu à prova histórica. E verdade que os
corppanhelros que elaboraram o Programa já distinguiam no horizonte, deixando
isto explicito, os sintomas da recuperaçSo econômica, tanto desde o ponto de vista
de sua medida - crescimento do PNB - quanto de suas causas, basicamente a
intenslf IcaçSo da exploração sobre o proletariado e a centralização do capital. Mas
o simples reconhecimento da recuperação, carente de uma concepção global sobre
o processo de acumulação de capita), não é suficiente para evitar que predomine no
PSB, a concepção da estagnação edo bloqueio. A seguinte afirmação, encontrada
nos oaraarafos conclusivos desta primeira parte, ilustra bem tal predomínio:
«Vemos que o modo de produção (capitalista) no Brasil traz como consequên-
cia natural a inexistência de mercado interno...». É evidente que esta forma de
expressão do PSB nSo corresponde à Idela que Ilumina a concepção do capitalismo
bloqueado, a saber, a de mercado Interno estreito, e nSo de mercado interno
inexistente. Noutras palavras, no PSB, creio, não se nega que as mercadorias
circulem, embora possamos chegar á conclusão contraria tomando ao pé da letra a
afirmação sobre a inexistência de mercado Interno.Mas mesmo com essa ressalva,
a conclusão me parece incorreta, pois o desenvolvimento da produção capitalista
Implica o desenvolvimento da circulação do capital na forma mercadoria; se a
produção capitalista encontrou condições para desenvolver-se - e quem afirma ser
o modo de produção capitalista predominante em nossa formação social è
obrigado a ter tal desenvolvimento como suposto - tais condições englobam a
existência de um mercado interno correspondente. A circulação de mercadorias,
ou melhor, a circulação tjo capital na forma mercadoria è o imediatamente existente
na superfície da sociedade burguesa, mas só existe na medida em que possa ser
mantida(3). Para que o capital circule na forma mercadoria, se supõe que estas
39
sejam produzidas. A circulação mesma, não põe este suposto; ela se esgota uma
vez que o valor de troca se transfigura em dinheiro ou mercadoria. E portanto o
fenômeno de um processo que ocorre por traz dela. Por Isso a análise de uma crise
econômica Implica sempre o estudo das condições em que se desenvolve a
produção capitalista.
O desevolvlmento capitalista brasileiro dos últimos anos, mostrou em forma
contundente que o PSB estava equivocado. Mas os marxistas nôo se contentam
com essa mera constatação; buscam desentranhar a origem de tal erro. Nossa
Intervenção consciente no processo de luta de classes sempre se ilumina e
potência, por uma teoria sobre este mesmo processo, e se tal teoria mostra-se
Incapaz de dar conta, e portanto prever, em suas linhas mais Importantes o
desenvolvimento do capitalismo, não há outro remédio que reexaminar os
fundamentos dessa teoria. Reflro-me aqui basicamente ao método de análise
utilizado pelos companheiros que elaboraram o PSB.
Ao tratar os dois elementos responsáveis pela estagnação ou bloqueio do capita-
lismo no Brasil, a saber, a questão agrária e a integração Imperialista, os
fundamentos do modo de produção capltalistâ, suas relações de produção e de
distribuição, aparecem como elementos secundários ou mesmo marginais. A
ênfase centrai do PSB, gira em torno a constatações sobre o grau de concentra-
ção da propriedade territorial, os níveis de salário na agricultura e na Industria, a
monopolização, a penetração do capital Imperialista internacional, a «sangria de
capitais» (kdescapltaiizaçáo») e algumas considerações sobre a maturidade das
condições para a revolução socialista. Tal preferencla que não capta o essencial
para a compreensão do desenvolvimento do capitalismo, também nSo permite
adiantar previsões confiáveis a respeito deste.Vou procurar demonstra-lo anali-
sando o que diz o PSB sobre a questão agraria e a Integração imperialis-
ta (4).
III. A QUBSTÂO AGRARIA
O PSB identifica na «exploração latifundiária, herdada da economia colonial» um
dos grandes obstáculos a expansão capitalista. Ao explicar porque, não chega a
mencionar a renda da terra como um obstáculo à tal expansão.
O máximo que nos oferece quanto a isso é o seguinte: «{0 desenvolvimento
capitalista) pressupõe a utilização da terra por empresas capitalistas que
substituem os grandes proprietários que especulam com o valor da terra». Essa
formulação, deixa na sombra o prpblema central: quais as condições para que se
efetue essa «substituição»? .
Qualquer empresário capitalista^jue pretende inverter seu capital na agricultu-
ra, ou qualquer proprietário territorial que intencione ceder, temporal ou
definitivamente sua propriedade, sabem quais são estas condições.Para o
proprietário de terras a partir de determinado grau de desenvolvimento capitalis-
ta. a terra nío significa outra coisa que renda da terra, e lucros, na medida em que
além de proprietário territorial ele desempenha também a função de capitalista
agrícola, isto é, aplica capital na terra de sua propriedade. O capitalista agrícola,
nao-proprietário de terra, diante da Inescapável condição de sua produção, - dispor
de uma determinada porção do planeta, - se enfrenta com o proprietário territorial,
Istoè, com a renda da terra personificada. Este, como tal personificação, constitui
o verdadeiro obstáculo à penetração do capitalismo na agricultura. Como o preço
da terra não é outra coisa que a renda capitalizada, para que os capitalistas se
terrltorializem, passando a ser também proprietários territoriais, é necessário que
36
imobiltzem parte de seu capital na compra de terras, o que constitui a o utra face do
mesmo obstáculo.
^Na medida em que a renda, e portanto o preço da terra, sao elevados, o capitalista
nâo-propríetàrio territorial, encontra grandes obstáculos para dirigir seu capital à
agricultura, E, é precisamente essa «herança colonial» - o estabelecimento da
grande propriedade privada territorial e a constituição da classe dos latifundiários -
o que se opCe à penetração do capitalismo na esfera agrícola.
Uma vez aue o desenvolvimento de nossa formação social resultou na
manutenção da grande propriedade territorial, e na acomodação de Interesses entre
os proprietários de terra e capitalistas, e uma conciliação no plano da distribuição
entre a renda da terra e os lucros, descartando-se qualquer possibilidade de
redistribuiçSo radical da propriedade territorial através da nacionallzaçBo da terra,
nossa atençSo deve voltar-se precisamente para o carater desse desenvolvimento.
A via «prussiana» de desenvolvimento da agricultura, conservando a grande
propriedade territorial, transformando gradativamente os proprietários de terras
em empresários capitalistas, e territorlalizando estes últimos, é o ponto de partida
para o aprofundamento de nossos estudos no que se refere à questão agrária. A
afirmação do PSB, que a «herança colonial e agrária que a burguesia nSo pode
destruir radical mente... acelera a crise do capitalismo no Brasil» sugere que sem
essa «destruição radical» não è possível superar este obstáculo. Nesse caso
também, a afirmação não passa pela prova histórica, dado o considerável
crescimento da produção agrícola na forma capitalista nos últimos anos, a intensa
proletarização dos trabalhadores agrícolas - principalmente nas reglfles mais
desenvolvidas relativamente - e a presença neles de considerável penetração do
progresso técnico. O PSB, ô verdade, não se limita à afirmação transcrita por mim
mais acima: desenvolve alguns elementos sobre a acomodação de interesses entre
proprietários de terras e capitalistas:«...embora sem destrui-lo, a burguesia
industrial vem pressionando ao latifúndio para que se reforme e modernize, ou
seja, para que racionalize sua produção»; ou ent9o:«Mas se o confisco cambial
produziu recursos para a acumulação de capital na industria, este mecanismo foi
por sua vez necessário ao latifúndio porque lhe dava segurança na compra dos
excedentes, amparando-o nos momentos difíceis». A conclusão básica do PSB, no
entanto é a de que as heranças coloniais (a grande propriedade territorial)
permanecem como causas da estagnação.
Nessa parte final do tópico sobre a questão agrária, para acomodar asafirmaçOes
anteriores com o reconhecimento da maturidade das condiçOes para a revolução
socialista, o PSB é obrigado a violar as regras do jogo, por ele mesmo
estabelecidas. Se as heranças coloniais tem constituído um entrave para o
desenvolvimento capitalista, e se a burguesia Industrial não pode extirpá-las em
forma radical, devemos supor que pelo menos na agricultura o modo de produção
capitalista não se encontra tão generalizado quanto nos demais setores, e que as
formas prè-capitalistas tem aí um peso considerável. Isso determinaria uma
importância muito maior às tarefas democráticas da revolução socialista, e claros
impecilhos para o desenvolvimento da identificação de Interesses entre os
«trabalhadores da cidade e do campo».
0 PSB no entanto, atribui à aliança entre a burguesia e o latifúndio a condição
para a Identidade de interesses entre operários e camponeses. Apesar de
reconhecer a desigualdade das condiçCes existentes na agricultura brasileira, «a
base econômica da produção agrícola brasileira - latifúndio de café, açúcar,
algodão e cacau - peto grau de capitalização realizada (grifo meu) - já oferece as

37
condições para sua transformação em grandes unidades coletivas». E claro que se
a base econômica da produção já se dá em forma capitalista, seja pela
territoriaflzaçaodestes últimos, para onde se enviam as heranças coloniais? Para a
esfera das coisas secundárias? Mas nesse caso deixariam de constituir uma das
causas fundamentais da estagnação ou do bloqueio.
Do latifúndio improdutivo, da «especulação com o valor da terra», da pecuária
extensiva, das grandes faixas de terra entregues ao «abandono» em espera de
valorização, se passa, no espaço de poucas linhas, ao latifúndio - baae economica
da produção agrícola • cujo grau de capitalização «realizada» estabelece as
condições materiais para a coletlvizacão! (51.
IV. AINDA A QUESTÃO AGRARIA
No PSB, a questão agrária começa sendo ilustrada com dados do censo de 1960
sobre o grau de concentração da propriedade territorial. Um pouco mais de 2% dos
estabelecimentos agricoias compreendiam praticamente 60% das terras ocupa-
das: tal concentração, pressionaria os trabalhadores do campo a «oferecer seus
braços por salários baixíssimos, muitas vezez por um prato de comida».
O baixo preço da (orça de trabalho retardaria a Introdução do progresso técnico
na agricultura, poisnão seria compensadorsubstituirhomens por máquinas. Isto è
certo, mas constitui apenas uma meia verdade; as máquinas também podem
tornar-se mais baratas, e como o calculo para o capltafista e/ou proprietário de
terras é feito a partir do preço que paga por estas e o que deixa de pagar em salários
- ou outra forma de remuneração - pela força de trabalho desalojada, podemos ter
situações em que, embora a força de trabalho agricoia seja muito barata se
comparada com seu preço na Indústria, o progresso técnico penetra e desaloja o
trabalhador direto. Outros fatores, é verdade, podem influir nessa relação e
tornar-se em determinadas circunstâncias decisivos.
Por exemplo, a colheita manual do arroz, é multo mais demorada que a colheita
mecanice deste cereal; se o periodo de colheita for curto, devido à ameaça de
chuvas etc. pode ser mais compensador utilizar a colhedeira mecânica, ainda que
seja mais cara relativamente (6).
Por outro lado, apesar de retardar em determinados casos a introdução do
progresso técnico, o baixo preço da força de trabalho não significa necessaria-
mente um obstáculo à penetração do capitai na agricultura. Ao contrário, salários
baixos são um estimulo à acumulação de capital. A existência de instrumentos de
trabalho, que em certas fases do processo de trabalho agricoia, tornam mais
ren tável a substituição do trabalho vivo pelo t rabalho morto, indica simplesmente a
possibilidade do aumento da produtividade na agricultura, embora seja este o setor
onde os salários sao reiativamente mais baixos. Naquelas fa$69 do processo de
trabalho onde esta substituição ainda não ó rentável, se continua explorando o
trabalho seja na lorma de trabalho assalariado ou outra como, por exemplo, a
Pa
Supos’ta a apropriação privada aa terra, seus proprietários serão induzidos a
aluga-iaou vendè-lana medida em que as condições econômicas, políticas, legais
etc desestimulem a utilização produtiva pelo proprietário da terra ou tornem
onerosa sua mera propriedade. Entre as condições econômicas se destaca a
magnitude do capital necessário para desenvolver a produção em suas próprias
terras, nSo será induzido a alugá-las ou vendé-las; além da renda da terra, seus
ingressos serão acrescidos pelos lucros do capitai invertido, e evidentemente
salários baixos, contribuem para que tais ingressos aumentem ainda mais. Além

38
disso, baixos salários, ou formas pré-caplt alistas de exploração do trabalho,
podem reforçar a resistência dos proprietários territoriais às pcessbes do
caoltalista nSo-pfòprietàrio oara e9tender o raio de aç8o de seu capital à esfera
agrícola. Essa resistência contribuiu a perpetuar formas pre-capltallstae de
exploraçSo do trabalho, embora nSo necessariamente signifique o estancamento
da DroduçSo agrícola.
Quando o PSB afirma que «o latifúndio se beneficia do monopollo da terra e da
estagnaçSo econômica, para explorar mais cruel mente ao trabalhador do campo»
devemos entender que os latifundiários nSo o fazem pelo simples prazer de explorar
a um determinado número de trabalhadores, mas porque o resultado dessa
exploraçSo, lhes proporciona benefícios econômicos. Na medida am que se
intensifica e estende essa exploraçSo, devemos supor também que aumenta a
produçSo agrícola, ainda que em base a um nivel baixo de produtividade. O PSB
reconhece que se constituiu «um complemento entre a burguesia industrial e o
latifúndio» precisamente com base «nas altas taxas de exploração vigentes no
campo» as quais «serviram para auxiliar a acumulação de capitais para o
desenvolvimento industrial».
Mas nao só poraue se estabeleceu o confisco cambial sobre as exporta-
ções de produtos agrícolas, se impulsionou o desenvolvimento Industrial; os
proprietários territoriais também dirigiram - num processo que se inicia antes da
implantaçSo deste confisco - parte do dinheiro acumulado na exportação de
procjutos agrícolas, como capital, para o setor industrial. Esse movimento indica
que se os latilundiários puderam dispor de capitais para invertê-los na Indústria,
dispunham destes para inverter na própria agricultura. Essa via de desenvolvimento
n3o encontra portanto proprietários de terras carentes de capital, em cujo caso
seriam induzidos a alugar ou vender a terra para capitalistas nSo-proprletàrlos. As
pesquisas existentes sobre essa questão, nao permitem ainda uma resposta
definitiva; no entanto suspeito que o predominante no caso brasileiro, tem sido a
transformação do grande proprietário territorial em empresário capitalista agrícola
a territorializaçSo de capitalistas nSo-proprletários — possa também ser Identi-
ficada nas últimas duas décadas, principalmente a partir da aceleração da acumu-
laçao de capital na própria indústria.
partir da aceleraçSo da acumulação de capjtal na própria industria.
Uma últ íma observação sobre esse tópico. Para o PSB, os baixos salários $3o um
obstáculo para a introduçSo do progresso técnico na agricultura. No entanto Isso
parece ser um privilégio desse setor, pois na indústria tal nSo ocorrería. Por
exemplo, se diz que «a Indústria cresce Insuficientemente para o crescimento da
populaç&o; por outro lado, a monopolizaçSo precose da indústria Introduz
maquinaria e técnica que na economia capitalista cria desemprego».Se o
crescimento da indústria não é suficiente para absorver a expansSo demogrô-
f ica-migratória, devemos supor a existência de um exército de desempregados e
portanto um nivel baixo de salários; se nessas condlçOes se Incorpora o progresso
técnico, criando mais desemprêgo, devemos supor também que tal incorporaçSo é
insensível ao nivel de salários. Por que isso ocorreria na Indústria e nao na
agricultura?
V. A INTEGRAÇÃO IMPERIALISTA
O PSB é ambíguo quanto ao caráter de obstáculo representado pela integração
Imperialista ao desenvolvimento do capitalismo a nlval Interno. Se por um lado «os

aft
período d de maior crescimento industrial no Brasil, sâo os períodos de maior
penetraçflo decapitai imperialista - por outro, esta mesma integração provoca uma
monopolizaç&o «precoce» da economia «aumenta multo a desproporção entre a
capaciaaoe produtiva do monopólio e a capacidade aquisitiva do povo» e tem como
consequência, «as sangrias de capitais executadas na forma de remessas de
lucros».
Se a burguesia local se associa com capitais imperialistas, o resultado desse
casamento nSo pode ser outro que o desenvolvimento da produção capitalista:
essa associação dá a medidada carência de condiçoes da burguesia local (capitais,
tecnologia, etc) para ela mesma desenvolver, autonomamente, essa produção, O
PSB reconhece em forma correta portanto, que a penetração do capital imperialista
internacional coincide com cs períodos de maior desenvolvimento Industrial; os
mecanismos da estagnação tem portanto que originar-se de outra forma. Estes,
seriam para o PSB, a remessa («sangria») de lucros e a desproporção entre a
capacidade produtiva dos monopólios e a capacidade aquisitiva do povo (o
mercado estreito). Examinemos estes dois argumentos.
Sabemos que a verdadeira finalidade da produção capitalista, è a produçSo de
mais valia, mas suas formas de manifestaçSo, como por exemplo, os lucros, não
s3o imediatamente capital; dal não ter sentido falar em «sangria de capitais na
forma de remessas de lucros», como elemento para reforçar a tese do
estancamento ou do bloqueio pois para que essa mais valia seja apropriada, na
forma de lucro por exemplo, é indispensável que antes tenha sido produzida,Essa
condição, é independente do destino dado á mais valia: acumulada ou consumida
individ ualmente, no interior ou no exterior, não escapa à necessidade de ser antes
produzida. Ta! condição tem como suposto, que um determinado número de
trabalhadores seja explorado como assalariados pelo capital, o que significa a
extensão e Intensificação das relações de produçSo capitalistas, isto è, o
desenvolvimento capitalista no Intsrlor. E óbvio que se essa fração da mais valia
enviada ao exterior na forma de remessa de lucro, se acumulasse internamento, o
desenvolvimento capitalista seria maioralnda.Mas isso nSo significa que o capital
imperialista seja um entrava ao desenvolvimento capitalista: ao contrário, mesmo
remetendo lucros, «royalties», etc., ó um agente desse desenvolvimento; e como
qualquer desenvolvimento baseado na produção capitalista, dilapida recursos
naturais, enquanto existir, permanecerá exalando sangue e lama por todos os
poros.
Aqui o erro metodológico do PSB, aparece com toda clareza: sem atinar para a
essência do processo de acumulação de capital - a extensão e intensificação das
relações de produção capitalistas em toda a órbita da produçSo - deduz seu
estancamento, não da impossibilidade de repor seus supostos, mas da
distribuição entre capitalistas nacionais e estrangeiros de seu produto funda-
mental, a mais valia. Noutras palavras, a remessa de lucros é o fenômeno de um
processo que lhe está pressuposto, a produção de mais valia e portanto a produção
capitalista. Só pode ser mantida se esta última tiver condições de manter-se: o
desenvolvimento da primeira está determinado pelo desenvolvimento da segunda.
Assim, ao contrário de ser sintoma - e muito menos causa - de estancamento, a
remessa de lucros reflete tanto a Integração imperialista como o desenvolvimento
capitalista no Interior. Não é necessário mariscar muito as estatísticas para
constatar como nos últimos anos * aqueles do fnilagre - cresceram em forma
extraordinária as remessas de lucro, o pagamento de juros por uma divida externa
elevada e crescente, o que não refletiu outra coisa que o acelerado desenvolvimento

40
capitalista ocorrido no Brasil, depois de 1968.Lenin chamava efetlvamente o
imperialismo de «antesala da revolução mundial», mas afirmava também que a
exportação de capital para as«zonas limítrofes» ao invés de representar um grklhSo
para o desenvolvimento das forças produtivas, provocava, nestas zonas, um
extraordinário desenvolvimento destas forças na forma capitalista.
A desproporçSo entre a capacidade produtiva dos monopólios e a capacidade
aquisitiva do povo, causada segundo o PSB, pela introdução do progresso técnico,
coloca claramente a questão da estreiteza do mercado interno. Mas, que vem a ser
esse«iocus comunís»brandido por vários teóricos para fundamentar o bloqueio do
desenvolvimento capitalista? Basicamente a Impossibilidade de realizar Intema-
mente as mercadorias que poderíam ser produzidas com a capacidade instalada.
Suponhamos uma sltuaç&o em que de fato, o mercado Interno é «estreito» e não
seja possivel realizar as mercadorias produzlveis, com a capacidade já Instalada,e
uma parte considerável do capital fixo se mantenha Inativa. E evidente que uma
situação como essa não estimula novas inversões produtivas, seja de capitaiistas
locais ou estrangeiros, ou dos primeiros associados aos últimos. A partir de certo
ponto, inclusive, tal situação estimula a daslnversio, isto é, o fechamento de
empresas instaladas nessaeconom latão deprimida esua transferência para outras
áreas menos afetadas por tal desgraça. Por maior boa vontade que o govemo de um
pais semelhante mostrasse frente ao capital estrangeiro, dificilmente conseguiría
atrair, mesmo capitalistas desprevenidos (se é que isto existe nalguma parte) pois
ao capital embora seja indiferente em que tipo de mercadoria circule, ó
indispensável que circule na forma mercadoria: se o mercado estreito restringe
essa circulação, tal restrição atingiría o capital, e o resultado seria o rechaço de tais
propostas.
O PSB, no entanto, supõe uma situação completamente oposta, ao analisara
integração imperialista. Assinala, acertadamente que «as empresas estrangeiras
vieram para cá porque os lucros eram maiores que em seus países de origem...»,
Além disso,«Em 1960 o controle estrangeiro sobre a indústria automobilística era
de 90%, 82% sobre a Indústria de eletricidade, 70% sobre a farmacêutica, 70%
sobre a indústria de maquinarias etc. e tudo indica que os números hajam crescido
desde entfo até hoje» (grifo meu). O capital Imperialista é atraído pela
possibilidade de taxas de lucro maiores e se aloja ** no caso brasileiro -• em ramos
Industriais cujos produtos se vendem qtiase-excluslvameflte no mercado interno.
Para completar o quadro o PSB afirma que «tudo indica» que tal tendência se haja
acentuado, ou melhor que a expansão do capitar Imperialista em oada um dos
ramos mencionados foi mais que proporcional ao crescimento total de cada ramo,
pois nem os fatos, nem teoria alguma sustenta que houve decréscimo absoluto
destes ramos industriais no Brasli nos últimos anos. Como o próprio PSB
reconhece, ou melhor, os dados que proporciona indicam que o capital Imperialista
e as emprêsas monopólícas ao contrário de bloquear, impulsionam o desenvolví
mento capitalista.
O erro do PSB, consiste menos em reconhecer a existência de fenômenos que na
superfície da sociedade burguesa entram em aparente contradição (crescimento da
produção industrial e baixo poder aquisitivo das massas), que na oonsideração
destes fatores como elementos articulados de um todo, que é a produção
capitalista. O mercado interno não existe independentemente da produção interna,
e das relações de distribuição determinadas por esta: ou melhor, a determinação
entre produção e distribuição é reciproca; quem participa da produção como
proprietário territorial, aparece na distribuição como renda da terra, mas isto supõe
41
evidentemente uma distribuição prévia da terra, lato é a propriedade privada
territorial. Quem participa como trabalhador assalariado na produção e portanto
como salário na distribuição, se pCeeomo nSo-proorietâriode meios de produção,
salários barxos, determinam um mercado estreito, somente para aqueles
produtos, nos quais estes se materializam, Isto ô, os meios de vida dos
trabalhadores assalariados. A outra face dessa moeda, e uma mais valia alta, que
se distribui - dependendo da distribuição prévia dos meios de produção - entre
capitalistas e latifundiários. Mas, o capital não circula somente na forma de
mercadorias cujo valor de uso são meios de vida do proletariado; circula também
sob a forma de meios de vida de capitalistas e latifundiários, e evidentemente
também na forma de meios de produção. O mercado pode ser «estreito- por um
lado e «amplo»por outro, e sua magnitude global ser suficiente para permitir um
acelerado desenvolvimento capitalista.
Vt. A SUPEREXPLORAÇÃO DO TRABALHO E O EXPANSIONISMO
Ao criticar o PSB, contribuindo para o aprofundamento teórico da formação
social brasileira, o companheiro Tovar desenvolve dois temas que o Programa
pratlcamente omite. O primeiro se relaciona com o papel da superexploração do
trabalho assalariado no processo de acumulaçSo de capital no Brasil. Este
companheiro destaca, com razão, que «apesar do programa afirmar a existência de
exploração crescente das massas trabalhadoras, Isto é demasiada generalidade
para um programa». Busca evitá-la afirmando que «os marxistas, em oposição aos
revisionistas sempre demonstraram cientificamente que o capitalismo apresenta a
tendência a produzir miséria crescente das massas trabalhadoras ». No entanto não
e$clareceo que entendo por miséria crescente das massas trabalhadoras. Enfrentar
essa questão me parece indispensável não eó para resgatar o pensamento de Marx
de algumas Interpretações unilaterais, como também por suas implicações
relativas ao problema da superexploração do trabalho assalariado.
No primeiro tomo d6 O Capitsl (capitulo 23) Marx afirma que todos os métodos
encaminhados a intensificar a força produtiva social do trabalho se realizam às
custas do operário individual; que todos os meios destinados ao desenvolvimento
da produção se traduzem em meios de exploração e escravlzação do produtor,
mutilando-o e convertendo-o num homem fragmentado. Tais métodos rebaixam o
operário á categoria de apêndíceda máquina, destruindo com a tortura em que se
converteu o trabalho, o conteúdo deste e alienando as potências espirituais do
processo de trabalho na medida em que a este se Incorpora a ciência como potência
independente do produtor, corrompendo as condições sob as quais trabalha,
submetendo-o durante a execução de seu trabalho ao despotismo mais odioso e
mais mesquinho; convertendo todas as horas de sua vida em horas de trabalho e
lançando suas mulheres e filhos debaixo da roda trituradora do capital.
«Mas - prossegue Marx * todos os métodos de produção da mais valia são ao
mesmo tempo métodos de acumulação e todos os progressos da acumulação se
convertem por sua vez em métodos de desenvolví mento daqueles métodos». E isso
significa que «na medida que se acgmula capital, a situação do operário tem
necessariamente que piorar, qualquer que eeja sim retribuição, eeje esta alta ou
baixa». Por Isso, «o que num polo é acumulação de riqueza, no polo contrário, Isto
ó, na classe que cria seu próprio produto como capitai, acumulação de miséria, de
tormentos do trabalho; de escravidão de despotismo, de ignorância e de
degradação moral»(7).
Para Marx, portanto a miséria crescente não se assimila necessariamente a uma
42
participação relativa e absoluta cada vez menor por parte dos produtores diretos na
riqueza material, pois a miséria não depende de uma retribuição alta ou baixa ao
trabalhador mas sim da forma como »• produz essa riqueza material social.
O desenvolvimento do capitalismo nos países onde a capacidade produtiva do
trabalho mais se desenvolveu e portanto onde mais se desenvolveram os métodos
de produção de mais valia, mostrou que a participação dos trabalhadores na
riqueza material social, cresceu em termos absolutos mas decresceu em termos
relativos, ou seja que a situação individual dos trabalhadores melhorou em termos
absolutos (desde o ponto de vista da apropriação da riqueza material) mas sua
situação social, frente às demais classes se deteriorou em termos relativos; o
aumento da produtividade social do trabalho cresceu mais rapidamente que a
incorporação de novos meios de consumo à «cesta* do proletário.
Engels no prefácio à edição alemã de 1892 da «Situação da classe operária na
Inglaterra» transcrevendo um artigo de março de 1885, dizia que a situação de
certos trabalhadores adultos havia sem dúvida melhorado extraordinariamente
desde 1848, e considerava esta fração de trabalhadores como uma aristocracia
operária na Inglaterra. Ainda que não afirmasse a melhoria dessa situação a todo o
proletariado, não me parece controvertido sustentar que tal situação material
melhorou para o conjunto do proletariado dos paises capitalistas industrializados,
desde os tempos de Engels até nossos dias, isto é, que houve um incremento em
sua participação absoluta na riqueza material. No entanto, a condição para essa
melhora em termos absolutos, isto é, que tal proletariado se alimente melhor, se
vista melhor, e tenha uma moradia melhor do que seus irmãos do século passado, é
que a miséria (a fragmentação, escravização, alienação, exploração do trabalhador)
aumente em termos absolutos.
Em relação ao proletariado dos países capitalistas atrasados, a miséria
crescente das massas trabalhadoras - como conceituada por Marx - aumenta
também em termos absolutos na mesma medida do desenvolvimento do
capitalismo nestes países. 0 discutível é se a evolução da participação dos
trabalhadores assalariados na riqueza material social, ao contrário do ocorrido nos
países capitalistas desenvolvidos.dlmlnulu «m termo* absoluto*.Oa dados
relativos ao período de maior arrocho salarial mostram como o salário real médio
monetário, ao invés de diminuir, aumentou em taxa discreta, o mesmo acontecen-
do em escaia muito mais acentuadacom a produtividade do trabalho, especialmen-
te na indústria de transformação (8).
Ainda que tais dados se retiram ao salário médio, e deixem na sombra as
alterações ocorridas na forma em que os capitalistas consomem a força de trabalho
comprada, me parece apressado concluir pela diminuição da partlcipaçao absoluta
dos trabalhadores assalariados na riqueza material, tendo por base a redução
absoluta do salário mínimo real ocorrida depois de 1964 no Brasil.
Na verdade, o erro do companheiro Tovar consiste em identificar a miséria
crescente das massas trabalhadoras com a superexploração do trabalho. Essa
identificação é ilegítima - em termos marxistas - pois para Marx a miséria das
massas trabalhadoras é crescente mesmo que estas vendam sua força de trabalho
por seu valorou por cima deste valor, isto é mesmo que não haja superexploração
ou que durante certo tempo os salários invadam a màis valia. De resto a
Identificação dos dois termos implicaria que a superexploração fosse também
crescente, o que no limite significaria que um dos supostos do processo de
trabalho - o trabalhador mesmo - não poderia ser reposto, devido a um salário

43
insuficiente para proporcionara este o minimo necessário para garantir sua mera
s o brev I vèn çiâ
No entanto, para o companheiro Tovar, a superexploraçSo se manifestaria no
Brasil, em forma ainda mais aguda, por constituir um pais situado na periferia -
«zona limítrofe» - onde o capitalismo ao iniciar sua apariçSo tropeça com uma
ordem de coisas pré-capitalistas, e além disso estô marcado pela dominação
Lmneriaiista: .< ...essas características determinam aexistônçlade um processo de
acumulação de capitai com ba9ena superexploraçSo do trabalho assalariado». Isso
não constituiría um fenômeno «passageiro», mas «um elemento decisivo para o
próprio processo de acumulação de capital».
Se a superexploraçSo é determinada pelo choque do capitalismo com nossas
«heranças do passado» (sic.), e pela dominaçSo imperialista, devemos supor que
enquanto existam tais fenômenos, existirá a superexploraçSo: se se intensificam,
se intensificará tal superexploraçSo. Mas, o desenvolvimento do capitalismo,
comosabemos, tende-enão em forma linear certamente-a eliminar tais heranças,
e com ela um dos pilares da superexploraçSo. Portanto o desenvolvimento
capitalista, a partir de determinado ponto jâ nSo tropeçará em escala significativa
com as heranças coloniais, e a superexploraçSo baseada nela deverá desaparecer
também.
Tanto o PSB como o companheiro Tovar reconhecem - e nisso estamos de inteiro
acordo - que o modo de produçSo capitalista é predominante na formação social
brasileira. Assim nSo seria licito jogar sobre o tapete as heranças coloniais para
sustentar o caráter mais agudo da superexploraçSo no Brasil.
Sobraria a dominação imperialista. Estase intensifica nas últimas décadas, mas
o companheiro Tovar não apresenta nenhuma demonstração de como tal
dominação engendra uma crescente superexploraçSo. Além disso, o texto é
bastante ambiguo quanto à determinação do período no qual entra em cena o
fenômeno. Por exemplo, quando se dizque « O fenômeno da superexploraçSo nSo é
passageiro, mas um elemento decisivo para o próprio processo de acumulação de
capital...», devemos entender que a superexploraçSo ó permanente, esem a qual o
processo de acumulação de capital seempantanarla; isto â, seria um acompanhan-
te inseparável do capitalismo brasileiro desde o inicio de seu desenvolvimento. No
entanto, mais adiante, ao analisar a substituição da democracia parlamentar pela
ditadura militar, o companheiro assinala: «O capitalismo no Brasil, dependente e
de base nacional estreita, quando atinge determinada fase de seu desenvolvimen-
to repousa numa superex pio ração do trabalho assalariado». A partir de que fase
sobrevem a superexploraçSo? Se esta forma se impõe a partir de determinada fase,
que ocorre antes que seja atingida? 0 texto do companheiro parece indicar que
essa fase se Inaugura a partir de 1964, pois $ô uma ditadura aberta, permite
«aferrolhar as tensfles sociais engendradas pela superexploração».
As companheiras Teresa Mattos e Mariana Carvalho, em seu pioneiro estudo
sobre Os efeitos da superexploraçSo sobre a ciasse operária (BS n°3), 9e enfrentam
com a mesma dificuldade de periodização, pois embora aderindo à concepção de
que a superexploraçSo é «um fenômeno razoavelmente permanente, constituindo
uma forma especificada explóraçao, indispensável para a acumulação capitalista
nos países dependentes», em seguida afirmam,«Se é verdade que a superexplora-
çSo no Brasil nSo é um fenômeno recente - principalmente entre os trabalhadores
rurais - é a partir de 1964 que ela poderá converter-se na alavanca decisiva para a
acumulação capitalista no pais». E acertadamente explicam, «pois só então
quebrando o movimento operário e popular e organizando a ditadura militar a
burguesia criou as condições políticas para vencera resistência doa trabalhadores
contra a deterioração de seu nível de vida, aferroihando suas manifestações de luta
i e garantindo a ordem necessária para a acumulação em novas bases». Isto é, a
superexploraçSo aparece aqui corretamente associada a um período da luta de
classes, caracterizado por uma correlação de forças extraordinariamente desfavo-
rável ao proletariado. A formulaçSo de que a superexploraçSo é um fenômeno
permanente perde aqui seu caráter abatrato, para ganhar concretização atraváa de
sua determinação fundamental: a correlação de torças entre as classes. A
conclusão não pode ser outra: ou nSo existia superexploraçSo antes de 1964, pela
resistência que o proletariado soube opor à burguesia, ou essa superexploraçSo se
\ dava em menor escala, em relação ao que ocorreu depois dessa data.
Em qualquer caso deparamos com outra dificuldade: a superex pio ração
significa que os proletários vendem sua força de trabalho por debaixo de seu valor.
Portanto para identificar a superexploraçSo é necessário Ident if icar seu referencial,
Islo é o valor da força de trabalho. O valor da força de trabalho, definida como o
|* tempo de trabalho soclalmente necessário para a reprodução dessa força. Isto é á
produção dos meios de consumo operário habituai, depende da magnitude e
j qualidade destes meios. O problema, em outros termos é, o que deve ser
considerado normal para reproduzir a força de trabalho simples? Sem omitir, por
outro lado, que o problema se estende também para o que se deve considerar como
consumo normal da força de trabalho: qual ò a extensão da jornada, sua
intensidade, o número dedias trabalhados por semana, o tempo de transporte da
casa ao trabalho, a segurança e a contaminação dos processos de trabalho, que
devam ser considerados normais?
Sabemos que o salário real monetário não expressa as variações destes fatores,
de (al forma que podemos ter uma situação em que o salário real monetário cresce,
enquanto estas outras condições se degradam, ou o caso Inverso, embora os dois
fenômenos tendam a marchar no mesmo sentido, pois a falta de condições para
resistir à redução dos salários reais, possibilita também, geralmente, que a força
de trabalho seja consumida em forma mais desvantajosa para o proletariado.
O trabalho das companheiras Teresa Mattos e Mariana Carvalho, mostra bem
como as condições de trabalho se degradaram a partir de 1964. No entanto, o
salário mínimo real monetário segundos dados proporcionados por este mesmo
trabalho, se elevam ligeiramente para o Rio de Janeiro, entre 1964 e 1973 (usan-
do como deflator o índice de custo dé vida da Guanabara elaborado pela FGV, o
salário real passa de 2,98 em 1964 a 3,03 em 1973 - em cruzeiros de 1953 e se
reduzem em forma significativa para Sffo Paulo (2,69 e 1,91 respectivamente,
I tomando como deflator o índice de custo de vida calculado pelo DIEESE). No
entanto, nos dois casos - e apesar dos diferentes deflatorea pata o calculo do
salário real - a redução mais intensa do salário mínimo real monetário ocorre
(segundo o trabalho das companheiras) nos seis anos anteriores a 1964.0 salário
mínimo real se reduz a menos da metade tanto no Rio como em São Paulo. Isto é,
segundo estes dados a redução mais intensa do salário mínimo real ocorre antes do
golpe de 1964. No trabalho das companheiras não se especifica, se os dados se
referem às cidades do Rio de Janeiro e Sffo Paulo ou aos respectivos estados da
Guanabara e São Paulo. Utilizando dados proporcionados por Alberto Mello e
Souza (9), podemos observar um comportamento distinto.
(N/ôr quadro página seguinte .}
Segundo estes dados, podemos observar que num período de 25 anos, o salário
minlmo real sofre uma redução Intensa entre 1944 e1W1; a partir de 1952 cresce

46
mais ou menos contlnuamente até atingir seu máximo em 1961 na Guanabara
(itíi .01; em 58o Paulo neet* mesmo ano 0 Índice (146,2) só 6 superado pelos
índices de 1956 e 195/ (147,0 e 153,8 reepectivamente); a partir de 1961 o salário
mínimo real se reduz continuamente, senão sua reduç&o mais intensa entre 1961 e
1963 que nos trés anos posteriores ao golpe.

Evolução do Salário mínimo real nos estados da Guanabarae São Paulo


entre 1944e1968, índices - base, 1644= 100.
Ano Guanabara São Paulo Ano Guanabara São Paulo
1944 1 00,0 1 00,0 1956 1 50,9 1 47,0
1945 84,2 80,3 1957 159,8 153,8
1946 74,1 70.9 1958 106,3 1 01,7
1947 60,7 53,9 1960 140,2 130,8
1648 58,0 49,6 1961 161,6 146,2
1949 55,4 50,4 1962 1 37,5 1 23,9
1950 50,9 47,9 1963 128,6 114,5
1951 53,6 53,0 1964 124,9 116,3
1962 122,3 124,8 1965 119,6 112,8
1953 107,1 101,7 .966 107,1 97,4
1954 144,6 138,3 1967 1 04,5 95,7
1955 142,9 139,3 1968 103,6 94,0

O período compreendido entre 1954-1961 no quai o salário mínimo real


experimentou maior crescimento podería ser considerado um período de
superexp Io ração ? Ou tal superexploração ocorre naqueles períodos compreendi-
dos entre 1945-1951 e de 1966 em diante?
A ausência de dados mais ou menos conflável9 e sistemáticos sobre a forma
como variou o consumo da força de trabalho petos capitalistas, durante esse
período de 25 anos, nflo permite aprofundar mais as conclusOes sobre o
comportamento do salário mlnlmo real. Creio ser indispensável para avançar nesta
análise, prlnclpalmente para 0 período anterior a 1964 as condiçOes em que os
capital istas consumiam a força de trabalho comprada, e com parà-las com os dados
)á existentes sobre 0 período posterior a 1964—Por outro lado, ó necessário
considerar que os dados mencionados anteriormente se referem ao salário mínimo,
e embora a maioria dos trabalhadores assalariados urbanos receba menos ou até
um salário mlnlmo, os demais assalariados, também podem ser superexpiofados,
pois em determinadas circunstâncias poderíl ver-se obrigados a vender sua força de
trabalho (cujo valor depende de sua maior ou menor capacitaçSo) por debaixo de
seu vator.
O P$B, sen. mencionar a superexploração, aponta para o fenômeno geral da
superexploração quando diz: «A moderna indústria de base Implantada no pais
exige a desvalorização do salário real dos trabalhadores através dos mecanismos
da Inflação». E acrescenta que um operário comum recebia em 1952 um salário
equivalente anão mais de84% do aue recebia um companheiro seu em 1944, e que
mesmo no oenoao oe euione aesenvolvimenusta (entre 1955 e 1959), enquanto a
produtividade aumentou em 3/%, os lucros brutos doe empresários cresceram
76% e a elevação do salário real num 15%.. .

44

0
Tanto no PSB quanto no trabalho citado das companheiras, onda se busca
Ilustrar a superexploraçSo com dados estatísticos, Implícita ou expllcltamente se
reconhece que a elevação dos salários - mínimo e médio real - nlo empatanou a
acumulação de capital.Ao contrário, podemos encontrar períodos em que esta
última - como se reconhece no PSB para 1955/59 -é acompanhada da elevação do
salário real médio.
Por outro lado as dificuldades para estabelecer quando um salário determinado é
Interior ao valor da força de trabalho, não Impede evidentemente que se determine
as variações notempoe no espaço do salário mlnlmo e médio real monetário edas
condições em que se consome esta força de trabalho. Os que afirmam ser a
superexploraçSo um fenômeno «razoavelmente «permanente, reconhecem que a
intensidade dessa superexploraçSo não é constante: dependendo da conjuntura a
superexploraçSo pode ser mais ou menos intensa ou generalizada. Estas
flutuações não expressam outra coisa que a correlação de forças entre as classes
(como já asslnaletanterlormente); se por um lado os capitalistas tendem a comprar
a força de trabalho do proletário pelo menor preço possível, e tirar o maior proveito
possível de seu consumo, por outro encontra a este último agindo preclsamente no
sentido ini/erso: vendendo sua força de trabalho ao maior preço possível, e
evitando que o consumo desta lhe alcance a medula dos ossos. Neste
enfrentamento, dois aspectos principais determinam uma maior ou menor
expio ração do trabalho: as condições de luta polltlco-sindlcals do proletariado e a
fase do processo de acumulação de capital que se atravessa. Ainda que as lutas
politico-slndicais possam ter sido reduzidas à mínima expressão, pelas baionetas,
choques elétricos, terror e pelos pelegos, uma fase de expansão do processo de
acumulação de capital, pode ter como resultado a expansão da demanda de força
de trabalho de forma a criar tensões no mercado de trabalho, isto é, não encontrar
uma demanda que lhe corresponda.Nesse caéo a elevação dos preços de mercado
da força de trabalho (salários nominais) não pode ser evitada nem pela política
repressiva mais brutal. Os trabalhadores assalariados se encontram nas melhores
condições para tomar a iniciativa nas lutas econômicas. Penso que uma situação
como essa se apresentou no Brasil entre 1973/74.Apesar da intensa repressão, o
crescimento da demanda de força de trabalho, espelhada pelo crescimento do
emprego Industrial em São Paulo entre 1968/73, que se manifesta primeiro entre os
trabalhadores qualificados e semi-quallf içados - estendendo-se depois para os
trabalhadores « braçais »- permitiu a estes assalariados melhores condlçOes de luta
por maiores salários frente a seus patrões. Não é por acaso, que a maior parte das
greves, operações tartarugas, ameaças de renúncia coletiva, ocorreram nas
emprèsas grandes da região mais Industrializada do pais (S. Paulo), dos ramos
de maior crescimento relativo - tanto em pessoal ocupado como em valor da
produção - como a metalúrgica, mecanica, material elétrico, comunicações e
transporte, e toram desencadeadas pelos operários qualificados e semi-qualifica-
dos. Isto ó, os trabalhadores que tomaram a iniciat Iva por salários mais altos (ol pe-
lo menos, por reajustes mais altos de salários) foram aqueles que recebiam os salá-
rios mais altos no Interior das empresas. Iso nao se deveu fundamentalmente a um
maior nível de consciência política desses trabalhadores — embora geral mente seu
nível de consciência seja maior em comparação com o dos trabalhadores não qua-
lificados — mas sim porque suas condiçoes objetivas para reagir contra o arrocho e
a degradação das condições de trabalho — que também os afeta embora em grau
menos acentuado — sao muito melhores do que as existentes entre os trabalhado-
res nSo-quaiificados. Em primeiro lugar porque estas empresas industriais neces^
sltam uma quantidade relativamente maior de operários qualificados ou semi-qua-
lif Içados do que empresas de outros ramos e menor tamanho; se a demàhda cresce
por este tipo de trabalhador, a oferta pode nffo ser suficiente para supri-la, e as
empresas começam a disputar entre si determinado tipo de operário relativamente
escasso, o que resulta na tendência por parte desta de retê-lo», como na
possibilidade por parte daqueles de reivindicar melhores condições para nela
permanecer. Nesse caso, Inclusive a rotatividade dos trabalhadores que aumentou
significat ivamente depois da críaçSo do famigerado FGTS <10) é parclalmente
contrabalançada, nffo só porque esse tipo de trabalhador se tornou escasso
relativamente, sendo conveniente para a emprèsa «conservá-lo», como também
porque geralmente faz parte de umaequipe que uma vez desmantelada exige tempo
e custos adicionais para ser reconstituída.
Uma conjuntura de auge econômico, se por um lado contribui a coeslonar as
classes dominantes, por outro permite melhores condiçOes de luta para o
proletariado. UM período recessivo, provoca condiçOes adversas a esse tipo de luta
reivindícativa por melhores salários e condiçOes de trabalho: a ameaça de
desemprego ó maior, e mesmo os operários qualificados não encontram uma
demanda tflo intensa por sua força de trabalho.
No entanto, seja em período de auge ou de recessão, a exploração sobre
trabalhadores nto-quaiI»içados tem evidentemente um limite. Considerando a pior
conjuntura para o proletariado, isto ó, aquela caracterizada por uma repressão
aberta e por uma recessSo econômica, os salários nffo podem cair mais além do
ponto a partir do qual o trabalhador não tenha acesso ao consumo Indispensável
para sobreviver, o que significa ter condições físicas para retornar ao locai de
trabalho e realizá-lo com um mínimo de eficiência; nem o consumo de sua força de
trabalho ultrapassar o ponto de seu completo esgotamento. Salta aos olhos que o
processo de amputação das condições de reproduçBo da força de trabalho,e o
consumo desta mesma força, a partir de certo ponto de excluem mutuamente: a
extensSo e intensificação do consumo da força de trabalho, mais além de certo
ponto, exige que aumentem e melhorem as condições de reprodução da força de
trabalho, e a redução das condiçOes de reprodução da força de trabalho, mais aiêm
decerto limite, só pode existir com a redução do consumo da força de trabalho dos
proletários.
Alguém podería argumentar que a tendência ó chegar até tal limite e
ultrapassá-lo, poia o que o capitalista compra não é o trabalhador como tal, mas
sim sua força de trabalho durante um certo tempo, terminado o qual - isto é depois
de devidamente consumida a força de trabalho - o destino do trabalhador como
indivíduo é indiferente ao capitalista. Isto é certo como atitude individual dos
capltatlslas frente aos proletários. Mas para que os capitalistas como classe
manifestem essa tendência sem nenhum disfarce, é necessário que se cumpram
algumas condiç&es.Em primeiro lugar é Indispensável que a oferta de força de
trabalho seja superior à demanda em tal proporção que aqueles trabalhadores que
se extinguem rio processo de produção, possam ser facilmente substituídos por
outros que se encontram desempregados; em segundo lugar, ó necessário que a
extinção dos trabalhadores (por doença, incapacidade definitiva ou temporária,
morte) - ainda que exista quem os substitua - não se dê em ritmo tão acelerado que
obrigue ao capitalista repor, a cada dia de trabaiho, uma fração mais ou menos
significativa do conjunto dós trabalhadores sob seu mando, isto é. é necessário
que exista um mlnlmò de estabilidade na força de trabaiho empregada, para que a
produção demais valia não sofraalterações; em terceiro lugar é necessário que o
nível de desemprego, de miséria material, de degeneração física do proletariado
não ultrapasse o ponto, mais além do qual a reprodução futura da ciasse seja
comprometida ou que as consequências sociais, como a delinquência, as
explosões espontâneas das massas, as epidemias, etc, ameacem a estabilidade da
sociedade em seu conjunto.
«Depois de mim o dilúvio!». Essa é a palavra de ordem de cada capitalista
tomado individualmente. Não lhe importa se o proletário morre prematuramente»
ou se seus filhos sSo subnutridos, doentes e ignorantes, «a menos que a sociedade
lhe obrigue a levar lato em cenakleraçlow.O grifo de Marx, aponta precisamente
para o limite da exploração, que se manifesta quando entra em risco a existência
dessa mesma exploraçSo no futuro r a Intervenção da «sociedade » aqui se expressa
através da Intervenção do Estado, governado - no caso brasileiro- por militares em
nome de capitalistas e latifundiários, para garantir a estes condições de exploração
futura dos trabalhadores, ainda que para tanto os Interesses imediatos de alguns
exploradores tenham que -ser sacrificados.- • —
E claro que para nós nBo se trata simplesmente de eliminar a superexploraçSo,
mas sim de destruir o modo de-produção que possibilita seu exercício. No plano
imediato, no entanto, devemos estimular as lutas dos trabalhadores por melhores
condições de vida e de trabalho, por salários mais altos e menores jornadas,
embora deixando ciara que estas lutas , por si mesmas e seus resultados -
indispensáveis para melhorar a posição do proletariado na luta de classes — nSo
sSo suficientes para destruir o reglme de produção capitalista.
VU. O EXPANSIONISMO BRASILEIRO ■ -
O segundo'ponto do aprofundamento teórico do companheiro Tovar se refere à
questão do expanslonismo brasileiro na América Latina. Salienta que este tema
nSo foi Incluído no P$B, pois no tempo de sua elaboração o fenômeno ainda não se
delineava com toda clareza. Reconhece a Intervenção brasileira nos assuntos
Interno de países como a Bolívia, o Uruguai, o Chile, e fundamenta este
expanslonismo nas necessidades do «desenvolvimento capitalista brasileiro que o
estreito mercado interno não pode sustentar por sl só». No essencial este
companheiro adere às teses de Rui Mauro Marlni(lt) relacionadas com a estreltez
do mercado Interno, e a necessidade da conquista de mercados externos já
formados, como salda para a expansão capitalista brasileira; mas não se refere ao
subimperiafismo e sim ao expanslonismo. Já tive ocasião dedlscutir o problema do
desenvolvimento do mercado Interno, e de criticar a noção de mercado interno
estreito (12) e remito o leitor para aquele texto.
AH, sustento que o desenvolvimento capitalista brasileiro dos últimos anos, teve
por base a expansão do mercado Interno, mostrando que essa expansão è o
resultado das condições em que se desenvolve a produção capitalista.
A conquista de mercados externos pela intensificação da exportação de
mercadorias ou mesmo a exportação de capital, supõe o desenvolvimento interno
do capitalismo no pais que exercita esta política. Embora a exportação em escala
ampliada de mercado rias e de capitai contribua para desenvolver mais ainda a acu-
mulação decapitai no interior, o sublmperialismo-expansionismo, nãosfio remédi-
os para um capitalismo estancado ou bloqueado (ainda que uma política de estlm u-
lo às exportações possa ser adotada freneticamente durante certo período para
conjurar uma crise conjuntural) mas ao contrário consequência de um capitalismo
em expansão. Por exemplo, os contratos feitos pela Petrobras com alguns paisea
árabes para a prospecção de petróleo em territórios destes países (contratos que
ímpMcam investimento de capital e aportes de tecnologia) para garantir o forneci-
mento desse produto e melhores preços no futuro, reflete muito menos a estreitei
do mercado interno do que o extraordinário aumento do consumo interno, que a
produçSo nacional nSo é capaz de Suprir. O mesmo pode dizer-se dos acordos para
prospecçSo. produçBo e importagío do carvSo colombiano {13).
N3o nego o fenômeno do expansionismo-iniervencionismo. principal mente o e-
xercido sobre os países latinoamericanoa malsatrazados. como o Paraguay e a 8o-
iivia, e estou de inteiro acordo em rechaçar qualquer tentativa de intervenção brasi-
leira no plano econômico. politico, cultural, militar, etc. nospaises latinoamerica-
nos ou africanos. Mas sustento que esse expansionismo é produto do próprio de-
senvol vimento interno do capitalismo brasileiro, e podanto devemos esperar que o
expansionismo se intensifique na mesma medida de tal desenvolvimento. {14).
Por outro lado. na medida em que se considera o subimperialismo um produto -
no plano econômico - da estreitezdo mercado interno, exercendo-se fundamental-
mente sobre os paises talinoamericanos, deveriamos esperar uma iniensiflcaçSo
significativa do intercâmbio comercial com estes paises. Embora tal intercâmbio
haja crescido no último decênio em termos absolutos, pode-se observar facilmente
que em termos relativos n9o houve modificação significativa (15)
O companheiro Tovar finaliza os aprofundamentos teóricos sobre a base
econômica da sociedade brasileira, analisando uma questão omitida no PSB: a
dependência externa. No programa ela é vista como uma relação de dominaçSo que
se expressaria pela fuga de capitais, remessas de lucros, royalties etc.. Essa vlsâo
seria parcial pois deixa de «sublinhar Justamente aquele aspecto fundamental no
processo de descapilalizaçSo do pais, a saber, as condíçGes de troca ditadas peia
divisão internacional do trabalho».
Já assinalei como a remessa de lucros, royalties, juros. nSo significam
descapitalizaçSo da economia: s8o ao contrário um resultado da «capitalização»
desta. A de5capitalizaçab também nSo pode ser encontrada nas condiçOes de troca
diladas peia divisSo internacional do trabalho. Aqui o companheiro Tovar confunde
um processo de «descapitalizaçSo» com um processo de intercâmbio desigual;
mas. desigual ou nSo o intercâmbio pressupõe o objeto a ser intercambiado. a
mercadoria, e esta a produção de mercadorias na forma capitalista, e portanio o
desenvolvimento da produção capitalista. A «descapitalizaç3o», tanto no PSB
quanto na critica do companheiro Tovar é sinônimo de transferência de valor de um
pais a outro por intermédio de distintos mecanismos. NSo nego que um processo
semelhante possa ocorrer entre dois paises, no entanto sustento que: a) Tal
«descapitalizaç3o»*. nSo bloqueia o desenvolvimento capitalista, ao contrário o
expressa em forma direta, b) Tanto as condições de intercâmbio quanto a
participação cfe um pais na dlvisSo internacional do trabalho nSo sSo imutáveis, e c)
Considerando o conjunto dos paises exportadores de produtos primários. nSo se
pode afirmar categoricamente que houve uma deterioraçSo dos termos de
intercâmbio nas últimas décadas como sustentam os estudos de Prebisch e
Emmanuel. pois existem outros esiudos estatísticos mostrando a n9o existência
de tal deterioraçSo (16).

W». AS FORÇAb MOTRIZES DA REVOLUÇÃO


Apesar de indicar em forma geral quais sfio as forças motrizes da revoluç3o
brasileira, o PSB é bastante impreciso - e nisto endosso a critica do companheiro
Tovar - ô PSB define ós «trabalhadores do campo» como a grande massa dos
aliados da classe operária». Os primeiros estariam constituídos pelos, assalaria-
60
dos puros, parceiros, meeiros e pequenos-camponeses. Essa classificação evoca a
discussSo de quem é o proletariado no Brasil, pois entre os «trabalhadores do
campo» se incluem setores de trabalhadores n3o assalariados, como por exemplo
os camptneses pobres.
As contribuições do companheiro Tovar para deslindar essa intricada quest3o,
embora tenham o mérito de abrir a discussSo e fazer algumas preclsões positivas,
nffo estSo isentas de vários equívocos. Sua concepção centrai, ainda que n3o
explicita, consiste em identificar como protetariado àquele^ trabalhadores
assalariados produtivos. «Devemos deixar bem claro que a classe operária
industrial n3o é todo o proletariado agrícola, os mineiros, os trabalhadores do
transporte, da construçSo civil, etc.»>. Os demais trabalhadores assalariados r»3o
comporiam o proletariado mas conformariam o que o companheiro chama de
pequena burguesia assalariada. Discutirei esse ponto mais adiante.
Antes é riecessârlo retomar as criticas do companheiro ao PSB. sobre a
composição dos trabalhadores agrícolas. Parece-me correia a caracterização que
ele fa2 sobre o proletariado e o semi-proletariado agrícolas. No entanto quando
define o pequeno camponês aparecem algumas confusOes. 0 pequeno campesina-
to (bem como posseiros) assinala o companheiro « possuem a propriedade (sic.) ou
a posse da terra e instrumentos de trabalho. S3o explorados de forma diversa do
proletariado agrícola: ou através da renda da terra, ou da apropriaçSo direta dos
valores produzidos, ou na comercialização». Aqui devemos ter claro o seguinte: se
os pequenoscamponeses s3o proprietários de parcelas cujo produto lhes garante a
subsistência, nao necessitam pagar renda a ninguém: nem em dinheiro, espécie
ou trabalho. Isto n3o implica evidentemente, que os pequenos camponeses ao nSo
garantir sua subsistência por intermédio da terra que possuem, n8o sejam
explorados através das formas mencionadas anteriormente por um latifundiário,
por um empresário capitalista agrícola ou mesmo por um camponês rico (17), nesse
caso se aproximariam à categoria dos semi-proletàrios agrícolas. Isto é estariam
enlrentando-se com um patrSo como nao-proprietárfos, ou como proprietários de
terra insuficiente e de mâ qualidade. Por outro lado. «a apropriaçSo direta dos
valores produzidos» que significa? «Renda» em espécie arrancada na marra pelos
laiilundiários? Se estes pequenos camponeses tem a posse da terra na qualidade
de «posseiros» isto implica em que n3o paguem renda a nenhum proprietário
territorial: no entanto, se essa « posse » tem como raiz uma forma mais ou menos
disfarçada de aluguel, entSo n3o sSo pequenos proprietários, nem «posseiros»,
mas arrendatários em forma embrionária. Em qualquer caso podem ser espoliados,
na medida em que recebam um preço irrisório pelos produtos que estSo en*
condiçSes de comercializar.
As contradições do pequeno camponês poderiam desenvolver-se, portanto, com
o latifundiário, que o explora em-certos casos, através da renda em dinheiro, em
espécie ou em trabalho; com o «grileiro» que o expulsa da terra ocupada (no caso
em que o pequeno camponês é na verdade um «posseiro») e com o capitalista
comercial que impõe preços baixos aos produtos comprados àquele. <As
reinvidicaçdes dos pequenos camponeses seriam no fundamental distintas das do
proletariado agrícola. Estes últimos lutariam por melhores salários e melhores
condições de trabalho e de vida. os primeiros lutariam por conservar e ampliar a
propriedade da terra e a garantia de preços mínimos para desenvolver rentável men-
te a produçSo agrícola. Uma vez que estas reivindicações dos camponeses pobres
lem um caráter democrático que só a, revoluçSo socialista pode resolver, e que o
peso desses aliados do proletariado nSo só pode influir decisivamente, depois da
tomada do poder, no processo de colelivlzaçSo da agricultura, como também,
antes dessa tomada, no processo de formaçSo da força social revolucionária que
destruirá o poder hurouAs-i«tifund'*rin è indispensável oue no*sa «nalise
determine se o desenvolvimento da agricultura no Brasil provoca a rápida
proietarizaçSo destes camponeses pobres ou permite sua existência e reproduçSo,
avaliando sua importância atual e futura, regional e nacionalmente.
O PSB considera a pequena burguesia composta de camadas sociais diversas,
metendo num mesmo saco os pequenos industriais e comerciantes e os
assalariados de nível mais alto. A critica do companheiro Tovar sobre este ponto é
í-certada,. no sentido de que o PSB simplifica arbitrariamente. a questSo,
obscurecendo-a. No entanto quando propde uma nova classificação, cai. num
desvio«obreirista».Propde.uma divisflo da pequena burguesia entre os pequenos
proprietários (industriais, comerciantes, transportadores) e os assalariados
.* n3o-proleiàrios »(comerciârios, bancários, pessoal de administração e serviços
públicos etc.). Segundo e.ssa. classificação, um comerciârio seria um. pequeno
burguês assalariado e nSo um proletário.
Desde ponto de vista do capital,.um trabalhador assalariado do comércio, por
exemplo, é um trabalhador Improdutivo, porque embora se enfrente a um
capitalista vendendo força de trabalho, e seu trabalho proporciona a este polpudos,
lucros, nao produz mais valia. Marx reconhece que os trabalhadores assalariados
do comércio s8o improdutivos, mas ao mesmo tempo salienta que s8o explorados
pêlo capital, pois entregam sobretrabalho e.os chama de operários do comercio:
■Engeis se refere ao conjunto desses trabalhadores como constituindo o
■ proletariado comercial» (18). Aqui n3o se trata obviamente de pagar tributo às
c,naçOes dos grandes mestres e buscar em sua autoridade, apoio para. uma
alirmaçSo. e sim encontrar os verdadeiros critérios para a definição da classe cuja
mtssao histórica é criar a sociedade sem classes.
O companheiro Tovar reconhece que as reivindicações dessa «pequena
burguesia assalariada» s3o mais ou menos coincidentes comas dos «verdadeiros
proletários •: no entanto agrega que essa pequena burguesia é um aliado vacilante
do proletariado. Por quê? E nos brinda com a seguinte maravilha: « Na medida em
que nSo participam do processo de produçSo, em que r>3o sentem agudamente a
contradição Capital x Trabalho, que carecem de disciplina e concentração, e em
que vivem da parte da mais valia produzida pelo proletariado, s3o mais permeáveis
à influência burguesa».
E certo que os trabalhadores do comércio n3o participam do processo de
produção, ainda que este na maioria das vezes invada a esfera da circulaç3o. sendo
difícil encontrar alguma atividade comercial que n3o exija algum tipo de
i.ontmuaçBo do processo produtivo. Mas, que significa dizer, «não sentir
ujjudameiue a contradição Capital x Trabalho»? NSo sentir-se explorado, ou
sentir-se menos explorado que os verdadeiros proletários? Que n3o existe na
empresa algum representante do capital cuja única preocupação é extrair dele um
sobretrabalho?
Partindo da premissa de que todos esses trabalhadores sao explorados, o
máximo que se poderia dizer é que uns s3o mais explorados que outros, 0 que
exigiría em todo caso. a comparaçSo do nivel de salários e a forma de consumo da
foiça de trabalho entre cada setor, e nao a mera divisSo entre trabalhadores
produtivos e improdutivos (19)
Guanio à questão da disciplina, ó indispensável esclarecer, que tipo de
disciplina se trata, pois n3o cabe duvida que estes trabalhadores - embora
52
improdutivos - sofrdfn uma coação e -adquiram» uma disciplina proletária
necesbáfia ao capital, que è reforçada por todos os artifícios da persuasSo e a
difusão massiva de certos vaforese normas de comportamento. A necessidade que
o capitai tem dessa disciplina, nSo se reduz evidentemente aos trabalhadores
improdutivos, estendendo-se ao conjunto dos trabalhadores assalariados <?0) sem
a qual não podería garantir a produção de mais valia, uma eficaz circulação de
mercadorias, a redução dos custos de intermediação financeira, etc.
Se a referência vai endereçada à disciplina proletária revolucionária - carência de
- entãp é necessário incorporar outros elementos à discussão. E um fato que em
termos relativos reina maior dispersão entre os trabalhadores assalariados
improdutivos, embora Já se possam encontrar grandes concentrações de
comerciàrios e bancários (por exemplo, grandes supermercados, armazéns,
Bancos, etc.) num único sitio de trabalho (21).
Essa menor concentração, constitui evidentemente um obstáculo para atingir
um rlvel de consciência política que vá mais além da simples consciência da
necessidade de união para a defesa de seus interesses econômicos. Mas, se
observarmos o que ocorre na indústria manufatureira por exemplo, veremos uma
enorme quantidade de pequenas e médias emprèsas onde os trabalhadores
produtivos também estão pouco concentrados.
A expressão utilizada pelo companheiro Tovar no sentido de que esse
trabalhadores que constituem a pequena burguesia assalariada «vivem da mais
valia produzida pelo proletariado» ó de uma infelicidade única. Quem vive da mais
valia produzida pelo proletariado, sob distintas formas, sSo os capitalistas e
latifundiários. Esses trabalhadores vivem do salário que recebem, como produto da
venda de sua força de trabalho e não tem a mais mínima idéia de que este pode
constituir um recorte de parte da mais valia apropriada como iucro, juros ou renda,
por quem está comprando sua força de trabalho. Entra a mais valia e suas formas
aparenciais e a reproduçSo-consumo da força de trabalho do proletário se Interpõe
o capitalista, que não entrega a este parte da mais valia, mas sim com eia compra a
força de trabalho deste e a explora,como acontece na relação entre qualquer capital
produtivo e os trabalhadores que emprega; ao trabalhador produtivo ô também
completamenie indiferente que o capital variável utilizado para comprar sua força
de trabalho seja parte da mais valia acumulada (22).
Para o companheiro Tovar todas estas características dos trabalhadores
assalariados improdutivos os tornaria mais permeáveis ao discreto charme da
burguesia, e portanto seriam aliados vacilantes do «verdadeiro proletariado». Meu
desacordo em relação a essa tese não está em negar a existência da influência
burguesa sobre os explorados; ela existe, e certamente não existe com
exclusividade sobre os trabalhadores de colarinho e gravata (23). Mas sim sobre
quem ela pode fermentar com maior eficácia.
Creio quê a determinação fundamental aqui não se encontra no setor
(agricultura, indústria, comércio, iransportes, etc.) em que um trabafhador tem sua
força de trabalho consumida, mas pela poslçfo que ocupa nesse processo de
consumo. Tomemos o caso dos trabalhadores assalariados na indústria. Quanto
maior fór a emprèsa. mais facilmente se poderá identificar um número de
assalariados cuja missão è garantir - em nome do capital - que se arranque mais
valia ou sobretrabalho do conjunto dos trabalhadores. São os vigilantes do capital,
que se por um lado mantém contradições com este por serem trabalhadores
assalariados e lerem sua força de tralho consumida nessa forma, isto é,
vigiando, supervisionando e comandando aos demais e sendo, portanto, um
instrumento da exploração, condição para que permaneçam como trabalhadores de
n
cumieira. recebendo salários que lhes permite um nível de vida muito superior ao
dos trabalhadores de base, se opõem a estes últimos pois personificam no interior
da emprèsa a expioraçffo e a opressão. Essa diferenciaçffo que nffo existe com
exclusividade nas empresas Industriais, estendendo-se também às de outros
setores da economia, e pode ser identificada também nas empresas pequenas e
médias, éa base materiat que facilita a penetração da ideologia burgueáà no selo do
proletariado. Estes trabalhadores assalariados de cumieira, no entanto, n3o
constituem um setoraburguesado no sentido leniniata. pois o Brasil não é um pais
imperialista, cuja burguesia explore o proletariado a nível internacional, ou
necessite comprar - pelo menos no momento atuai - ou subornar setores do
proletariado, para que sirvam de vigilantes políticos da classe, pois Isso suporia
um movimento sindical bem mais desenvolvido e um nível de descongelamento da
luta de classes bem maior do que o existente atualmente. Essa fração do
proletariado se aproxima, mas nffo se assemelha ao que Engels (24) denominou
aristocracia operária, a qual linha pO' base a existência de um determinado grau de
monopólio exercido pelos trabalhadores industriais ingleses do século passado,
sobre seus ofícios: monopólio cujo limite estava constituído juslamente pela
possibilidade de substituí-los por máquinas (25). e não pelo aumento da oferta,
pofs a produção de novos trabalhadores dessa categoria dependia dos ensinamen-
tos administrados pelos trabalhadores já qualificados, frente à inexistência de uma
estrutura educativa independente como ocorre atualmente para a formação dí
técnicos e pessoal de nível universitário.
A posiçffo que esses trabalhadores ocupam no processo de trabalho (26), e que
se traduz por salários mais elevados e mais resistentes ao arrocho, e um consumo
de sua força de trabalho em forma menos drástica, embora facilite a penetração da
ideologia burguesa, não determina por si só uma consciência política mais ou
menos desenvolvida. Para determiná-la é necessário recorrer a outros elementos
como a experiência de luta, as origens rurais ou urbanas do proletariado e de suas
distintas frações, os exemplos de luta a nível internacional, a composiçSo por
sexos. etc.
No entanto, é necessário ler em mente que a partir do momento em que o
capitalista se encontra à cabeça de um exército industrial, necessita de oficiais
superiores (diretores, gerentes) e de oficiais inferiores (supervisores, inspetores,
contra-meslres) que durante o processo de trabalho, comandam em nome do
capital. Se por um lado estes trabalhadores tem um maior poder de barganha frente
aos capitalistas em suas reivindicações econômicas (as quais podem transfor-
mar-se e desdobrar-se em luta revolucionária) tomando a liderança nessas lutas
como tem acontecido no Brasil nas lutas operárias dos últimos anos, essa mesma
posiçffo favorável frente aos capitalistas, Involucra uma oposição com os
trabalhadores de base (27).
Atè um certo ponto as lulas por reivindicações econômicas podem ser comuns
entre os assalariados de base e de cumieira. Além disso, nffo existe uma
correspondência absoluta entre salários mais altos e posições de vigilância e
comando no processo de trabalho e valorizaçffo; pode dar-se o caso de
trabalhadores de aítos salários sem qualquer funçffo de vigilância, como também
funções de vigilância e supervisffo com salários relativamente baixos (por vezes
salários mais baixos que os dos próprios vigiados); mas em geral as funções
técnicas e de vigilância, ao superpor-se. dffo origem a salàrios mais altos, por exigir
maior capacitaçffo e «responsabilidade».
Uma vez ultrapassado este ponto, quando a luta por maiores salários se

64

.AVI
transforma em i uta do proletariado pelo controle da produção edas fabricas - o que
im pl iça controle operário de todas as f^ses do processo de trabalho - as f unçCes de
vigilância dos assalariados de cumieira tem necessariamente quedebllitar-se e, no
limite extinguir-se. e com ela os « privilégios » que esses trabalhadores gozam tanto
desde o ponto de vista de salarios como pelo tipo de trabalho realizado no interior
da fabrica. Isso significa que sua posição relativa tende a piorar -malsalèm de um
certo ponto de desenvolvimento das lutas do proletariado - o que torna essa fraç8o
de trabalhadores mais vulnerável aos chamamentos contrarevolucionârios das
classes dominantes. Até que ponto esse processo pode penetrar na estrutura
laborai das empresas, conquistando para a reação, ou neutralizando um número
maior ou menor de trabalhadores assalariados, é impossível determinar de
antemão; ,aqui, n3o podemos ir mais além de destacar essa tendência.
A inclusão dos trabalhadores do comércio, do ensino, dos bancos, etc. no
proletariado, se sustenta no fato de serem trabalhadores assalariados e explorados
(ou superexpiorados) pelo capital. Desde esse ponto de vista, como também de sua
crescente importância quantitativa (28) no conjunto dos trabalhadores assalaria-
dos. se equiparam com os assalariados fabris.
Aqueles que consideram estes trabalhadores como conformando uma pequena
burguesia assalariada, tendem a colocar num plano secundário suas lutas e o
trabalho político entre eles. reduzindo assim o campo de manobra da luta
revolucionária. E isso se aplica não sòmenteao periodo anterior è tom ada do poder
político, isto é, aquele em que. no calor da luta se constitui a força revolucionária
que arrebatará esse poder das mSos da burguesiae dos latifundiários, como aquele
em quese'começaa construira sociedade comunista, isto ó, a etapa socialista da
revolução. Nessa primeira lase, os trabalhadores anteriormente explorados pelo
capital comercial, por exemplo, tendem a desaparecer, mas só na medida em que
desaparece a circulação de mercadorias e portanto sua produção. Mas sabemos
que essa produçSo não desaparece de qma hora para outra, e tampouco se elimina a
distribuição dos produtos - sob outras regras- o que exige a atividade de certo
número de trabalhadores. Assim as furtçfles desempenhadas por estes trabalhado-
res ai nda.que inseridas noutras reiaçOes sociais, n3o desaparecem completam ente
mesmo numa sociedade onde o modo de produçSo capitalista se encontra em
processo de extinção.
Por outro lado. a inclusSo destes trabalhadores assalariados no proletariado está
articuladacom a seguinte questão: qual a principal fórça motriz da revoluç3o, isto
ê. aquela cuja ação é a mais importante na desarticulação do inimigo e na
articulação de todos os movimentos das demais fórças motrizes?
Para o c. Tovar. o PSB dà uma resposta correta a essa questão ao afirmar que a
classe operária industrial é não só a fórça hegemônica da Revolução Brasileira
como sua principal força motriz. NSo discordo dessa definição, no sentido em que
o .operariado industriai desempenha um papel fundamental na articulação dos
movimentos das demais forças motrizes; isso no entanto me parece mesmo
definitivo no que se refaciona com a desarticulação do inimigo. A desarticulação do
poaer aos latirunaiarios por exemplo, depende fundamentalmente - embora não em
forma exclusiva • da ação do proletariado, do semi-proletariado agrícolas 6 dos
camponeses pobres; sem contar com a ação destes setores para desarticular
eçonomica, política e militarmente aos latifundiários (assim como à burguesia
agrária e aos camponeses ricos) nfio podemos sequer pensar em destruir o regime
capitalista no Brasil. Se podería argumentar que essa não é a luta revolucionária
mais. importante, que estas âe travarSo nas cidades. Mas, mesmo neste piano, a

M
ação dos operários industriais,-para dessu-ticular por exemplo, economicamente a
burguesia, pode ser muito menos efetiva que a ação de outros tipos de
trabalhadores. Em determinadas circunstâncias uma greve dos funcionários do
ministério da fazenda Interrompendo o recebimento de impostos e a venda de
estampilhas e selos, sem o que grande parte das transações comerciais e
financeiras ficam bloqueadas, ou mesmo uma greve dos trabalhadores dos
principais bancos, empantanando acirculaçSo e o crédito, podem desarticular o
inimigo no piano econômico de forma muito mais contundente do que a greve de
todos os trabalhadores de um ramo Industrial como o tèxtll.
A capacidade de desarticulação do inimigo própria de cada fração do
proletariado, também pode ser Ilustrada pelo caso inverso, isto é, quando são os
patrões os provogadores de uma greve(«lock-out »)• A greve nacional de outubro de
1972 no Chile. não prosperou entre os operários Industriais, llmltando-se ao
comércio e ao transporte rodoviário, principalmente. As fábricas continuaram
funcionando de uma forma relativamente normal, mantendo o ritmo da produção.
No entanto como a distribuição se encontrava muito menos controlada pelos
trabalhadores do comércio, aconttnuidade da produção fabril, em grande medida-,
alimentava o capital comercial-especulativo (mercado negro) tornando mais díficii
ainda a situação econômica das massas, contribuindo portanto a desarticular as
forças revolucionárias.
IX. A NEUTRALIZAÇÃO DA « CLASSE MEDIA »
Combatera ditadura através da luta de classes «significa combater a soma dos
poderes concentrados nas máos dos grandes capitalistas e latifundiários »{PSB).
Para a destruição desse poder - condicSo para eliminar a exploração sobre os
trabalhadores e a opressão sobre o povo - «é necessário mobilizar as ciasses cujo
Interésse seja o de aniquilar os grandes exploradores» (PSB). Aqui surge uma
tjuestão realmente complexa: o papel da «classe média» ou da pequena burguesia
na luta revoluvionàrla. No PSB a pequena burguesia é caracterizada como
«vacilante por sua própria posição na sociedade...buscará sempre um caminho
próprio — irrealizável alongo prazo — entre o Imperialismo e o socialismo». Isto é,
no limite ess vaciiação cedería lugar à polarização, somando-se a pequena burgue-
sia o.u às forças da revolução ou àquelas da reaçao. Ao proletariado não cabe outra
política que atrai-la para o campo da revolução ou pelo menos neutralizá-la, isto é,
impedir que se passe ao inimigo, ou como enfatiza o companheiro Tovar, «O
proletariado deve buscar a forma mais favorável para o alargamento da base poiit íca
ca revolução, devendo portanto atrair as maiores parcelas possíveis desses
setóres». Até aqui, nenhuma novidade no plano doutrinário.
No entanto essa divisffo-atração-neutrallzação da pequena burguesia não
depende da simples vontade do proletariado em consegul-lo: é Indispensável
analisar se as condições desenvolvidas no processo de tuta de ciasses, permite a
materialização de tal política. O PSB não é explícito sobre essa questão. O
companheiro Tovar avança sobre o problema mas de uma forma um tanto ingênua.
Eis a solução proposta: «...o fundamental é por um lado deixar claro a estes
setóres que o programa socialista prevê a sua preservação, sob contrôle estatal,
durante certo tempo; e que todos aqueles que apoiarem a revolução, serão tratados
por ela como amigos; por outro lado, é concentrar todo o fogo possivel no grande
capital, de modo a diminuir sua capacidade de atração sobre estes setores».
Deixando de lado por enquanto a afirmação final, vejamos qual é a natureza da
«atração»exercida pelo grande capital e os grandes terratenentes sobre os médios

56
e os pequenos.
Se os pequenos e médios capitalistas e proprietários em geral tem clareza de que
sua preservaçSo - depois da conquista do poder pelo proletariado e o campesinato -
se dà sob o controle de um Estado agora goveft»ádo por operários e camponeses, e
além disso se trata de uma existência transitória enquanto proprietários e
capitalistas, nSo será necessária muita argúcia, para que percebam a IntençSo da
revolução socialista: sua elIminaçSo como proprietários de meios de produçSo e
exploradores do trabalho alheio, (e nao se faz revoluçSo socialista se este processo
-entre outros- nSo sedessenvolve mais ou menos rapidamente). A promessa de que
serSo tratados como amigos, essa pequena burguesia responde: amigos, amigos!
Negócios à parte!
Os representantes ideológicos do capital e da propriedade territorial no Chlie,
exploraram multo bem essa circunstância. Seo governo de Allendee os Partidos da
UPtudo fizeram para nSo « deixar claro» essa extinç3o futura (e estavam realmente
sinceros), buscando circunscrever sua açSo contra o grande capital e o latifúndio,
os epígonos desses últimos se encarregavam de assustar -e com base menos na
prática do governo ou dos partidos, e mais no deabordamento da luta de classes
dos marcos por estes delimitados- aos pequenos capitalistas e proprietários em
gera), para que nSo se deixassem iludir, pois as estatlzaçOes e expropriaçSes,
acompanhadas ou n3o do paredSo, Iriam alcança-los nalgum momento depois que
os maiores fossem liquidados.
Mas, na realidade, n3o era assim t3o necessário que esses «brilhantes
advogados» fossem à televIsSó vomitar qulromancla, para que esses capitalistas
aprendessem certas verdades sobrea lutada classes. O problema para eles n8o era
tanto, -e continu«\n5o sendo para seus irmáos em outros países capitalistas, c
temor de ser expropriados -amigavelmente- depois da tomada do poder pelas
fôrças da revoluçSo, mas sim, chegar á ruina, como consequência da agudizaçSo
da luta de classes, antes que isso ocorra. O desenvolvimento da luta de classes se
encarrega • a menos que o proletariado das pequenas e médias empresas n3o se
mobilize * de revelar que se eles nSo podem mais explorar intensiva e
exiensivamente seus trabalhadores num nível superior ao médio e pagar-lhes
salários inferiores aos vigentes na grandes empresas, que s3o as principais
condições para que permaneçam como pequenos e médios capitalistas, sua
existência enquanto proprietários de meiosde prqduçSo e exploradores do trabalho
atheio:'se encontra imediatamente ameaçada. A desorganlzaçSo da prodúçSo e
circulação de mercadorias, a inftaçSo, o «caos» na ordem capitalista que
^companha a agudizaçSo da luta de classes; completa o quadro da imperdoável
«culpa» dasforçaáda revoiuçflo. Nessas circunstâncias, suas contradições com o
grande capital e o Estado • tendência à monopoiizaçBo e política econômica -
assumem um caráter secundário inclinando a balança para o lado da reaçSo, Isto é
para a política que os preserve como capitalistas e proprietários exploradores em
geral.
Noutro estudo, «Notas sobre a fôrça de trabalho industrial na Grande S&o
Paulo ».(BS n° 1), o companheiro Tovar nos brinda com interessantes dados sobre a
distribuição do proletariado paulista segundo tamanho das empresas' industriais.
De acordo com este estudo, na regiSo mais industrializada do pais (regiSo do
Grande S3o Paulo) existiam em 1965, 19.291 estabelecimentos Industriais, e o
número de pessoal ocupado - em 1967 - somava 775.268 trabalhadores. Dos 19.291
estabelecimentos,93,1 %, istoé, 17.970eram considerados pequenos por possuir

87-
100 ou menos trabalhadores; 6,5% eram empresas médias (entre 100 e 1.000
trabalhadores) somando 1.248 estabelecimentos e os restantes 0,4% ( contando
mais de 1.000trabalhadores) somavam 73 empresas grandes. Estimando o número
de trabalhadores existentes em 1965, Isto é, retirando 25.268 dos existentes em
1967, e fazendo os cálculos sem analisar prèvlamente os critérios para a
classificação dos estabelecimentos entre grandes , médios e pequenos, obtemos
os seguintes resultados (os queobviamente nSo pretendem outra coisa que estimar
em forma aproxfmativa a quantidade de trabalhadores comandados pelos
pequenos capitalistas): considerando uma média de 30 empregados por
estabelecimento pequeno, para contrabalançar o limite superior elevado de 100
trabalhadores poremprèsa pequena, a pequena burguesia Industrial da ârea mais
industrializada do pais, comandaria cerca de 539.100 trabalhadores assalariados,
isto é, um pouco mais de 70% dos trabalhadoras empregado* na Indústria naasa
região.
Se considerarmos por outro lado que tanto um capitalista individual pode ser
proprietário de mais de um estabelecimento, s um estabelecimento ser propriedade
de mais de um capitalista - um fatór anulando o outro - e prescindindo pelo
momento de outras circunstâncias como o fato de que estas empresas ou um
conjunto delas possa encontrar-se baixo o jugo de um mesmo capital financeiro,
os pequenos capitalistas industriais superariam os 90% do total de capitalistas
industriais da RGSP. Come se observa - apesar do caráter precário e provisório
destas estatísticas - essa pequena burguesia industrial, nSo só é importante, do
ponto de vistada proporção de trabalhadores assalariados que comanda, como por
sua participação no conjunto dos capitalistas industriais.
0 companheiro Tovar salienta que a«média burguesia nBo deve ser o principal
a/vo dos golpes do proletariado». No entanto, na medida em que a principal fôrça
motriz revolucionária se mobiliza, devemos supor que pelo menos parte dos
operários industriais das pequenas e médias empresas engrossem essa mobiliza-
ção, combatendo não sómente pelos objetivos finais da revolução, mas
principalmente por suas reivindicações imediatas, isto é, contra as condições de
venda e consumo de sua fórça de trabalho impostas por estes capitalistas. NSo
existem Informações suficientes para afirmar de maneira categórica que os
operários das pequenas empresas sSo explorados, em média, no Brasil, em forma
mais brutal - intensiva e extensivamente - que os das grandes empresas. Mas
existem razões teóricas para suspeitar que sao precisamente os operários dessas
pequenas e médias indústrias, aqueles que no quadro geral da mais vandàlica e
descarada exploração (29), tanto no que se refere às condições em que se consume
sua força de trabalho como com respeito ao preço em que a vendem ao capitalista,
respeito ao preço em que a vendem ao capitalista.
Nessa condições e na medida em que as lutas do proletariado deixam de ser a
expressão das iniciativas de setóres mais conscientes e organizados • em geral os
operários das grandes empresas — e se generaliza, as reivindicações desses
trabalhadores explodem como um vulcão, constituindo uma ameaça mortal aos
pequenos e médios capitalistas industriais (p grande capital tem meihores
condições para resistir e/ou assimilar essas reivindicações). A neutralidade dessa
«média burguesia» não çe obtem no abstrato; afirmando simplesmente que ela
será preservada durante.certo tempo depois da.torpada do poder, ou mesmo que
será considerada como amiga, desde que apoie a revolução E uma ilusão, e
mesmo perigoso, continuar com essa formulação - que não passa da formulação de
um desejo - sem atinar para os fenômenos que se desencadeiam durante o

68
processo revolucionário, tornando problemática essa neutralização, e multo mais
sua adesao a política revolucionária. A experiência recente no Chile e em Portugal
rne parece ilustrativa. ,
Ainda.que os golpes mais contundentes sejam desfechados contra o grande
capital, n5o podemos esquecer que para golpear duro é preciso contar com uma
força social revolucionária correspondente, e sua organização passa necessaria-
mente pela mobilização de, pelo menos, a maior parte do proletariado.
X/.CONCLUSÕES.
As considerações anteriores, evidentemente n8o esgotam a discussão do PSB.
Isso n3o se deve simplesmente ao lato de que só considero dois tópicos do
Programa, a saber, o caráter da revoluçSo, mas a circunstância de que nao é possí-
vel num texto dessa natureza, realizar a critica das fontes que serviram de
apoio e inspiraçSo aos que elaboraram o PSB. 0 programa, na verdade, é uma
sintese das conquistas do pensamento marxlsta-revoluclonàrio brasileiro e
mundial e das lutas nacionais e internacionais do proletariado por sua
emancipaçSo, e suas deficiências sâo em grandq parte um reflexo das deficiências
do desenvolvimento dessas conquistas e lutas. Dentro da primeira perspectiva
cabe retomar criticamente as principais expressões e correntes de pensamento que,
serviram de base para a elaboração do PSfJ, aprofundando e estendendo as
pesquisas sobre a formaçSo social brasileira e seu desenvolvimento. Quanto à
segunda, contribuira reanimaras lutas do proletariado, formulando uma tática de
intervenção política e uma tática de construção partidária, articuladas com as
fórmulas programáticas e estratégicas.
N3o selrataevidentemeniede descartar de forma absoluta o PSB e recomeçar de
zero, mas sim reforçar suas bases teóricas no sentido mencionado mais acima e
dotar o proletariado brasileiro de um referencial teórico seguro que possa orientar
corretamente sua prática.
Creio haver apontado • nesta primeira aproximação - algumas falhas e carências
do PSB, assim como o$ principais equívocos de seu critico mais recente. Sm
futuros trabalhos buscarei estender minhas criticas sobre aspectos n5o tratados no
presente texto, e aprofundar a análise sobre os pontos já considerados.

Henrique Lima

Agosto 1976.
NOTAS
1. Por exemplo, em * Notas sobre a questão da tática», Raul Villa começa
dizendo: * A ouestSo da tática está no centro de nossas discussões hoje», (BSn°3)
L.A.Tovar encabeça sua «Crítica ao PS 8 »(BS no. 2) da seguinte forma: «O debate
das questões programàtícas e estratégicas da Revolução Brasileira está colocado
na ordem do dia e vem convertendo-se numa necessidade indispensável para o
avanço da esquerda proletária».
2. Esta análise sobre a conjuntura internacional merecería urna discussSo
especial, mas seria tema para um outro trabalho.
3. Marx, « Elementos Fundamentais para a critica da Economia Política ». Tomo
II, pg. 194 e seguintes, Êd. Siglo XXI.
4. Diga-sede passagem quea critica desfechada pelo companheiro Tovar sobre a
questão do bloqueio é inócua. Para ele, o erro do PSB consiste em confundir o
«freio» do capitalismo com a estagnaçSo. Como o freio do capitalismo se exerce
sobre o « livre desenvolvimento das forças produtivas», mas apesar disso não foi
suficiente para provocar a estagnaçSo, ô necessário admitir que o capitalismo
encontrou uma forma para desenvolver-se. A partir dessa conclusão - de resto
evidente - a critica perde seu impulso inicial, pois reconhece o acerto do PS6
quando identifica os fortes obstáculos ao desenvolvimento capitalista {o freio) na
estreitez do mercado interno, na baixa produtividade agrícola, na dependência
externa, e admite que apesar dos pesares, o capitalismo no Brasil «pode
expandir-se, apesar de defrontar-se com tais problemas e inclusive acirrando-os»
(grifo meu). Trata-se de um capitalismo feliz: quando mais se acirram os
obstáculos a seu desenvolvimento, mais cresce.
Apesar disso, é perfeitamenleendossâvel o chamamento que faz o companheiro
no sentido de «esforçamo-nos para compreender a forma concreta pela qual se
realiza o processo de acumulação capitalista no Brasil...», embora os pontos nos.
quais ele procura aprofundar teòricamente (o expansionismo brasileiro na América
Latina, a superexploraç3o do trabalho e a dependência externa), n3o superem as
limitações assinaladas por mim sobre o PSB e merecem um exame especifico, o
que farei no desenvolvimento deste trabalho.
5. Nesse como em outros pontos do PSB, fica claro que a simples negação do
reformismo, ou mais prectsamente, das teses do PCB, não é suficiente para
legitimar novas Interpretações sobre nossa formação social. Sobre o ponto em
discussSo, creio que tanto se equivocaram aqueles que atribuem à produção
agricota brasileira um caráter feudai ou seml-feudal, como aqueles que num
verdadeiro movimento pendular consideram que essa produção já se encontra
completamente assimilada ao capital produtivo. Embora tenha ocorrido intensa
proletarizaçSo dos trabalhadores agrícolas, aburguesamento dos grandes proprie-
tários territoriais e territorialização dos capitalistas nos últimos anos na regiões
mais desenvolvidas do pais, nao me parece correto despachar a questaõ agrária -
como parece fazer o PSB - sem antes estudar com maior profundidade as
características a nível nacional e regional do desenvolvimento da agricultura pela
via latifundiária ou camponesa, e da articulação entre as duas vias.
6. Veja-se a esse respeito, o trabalho de Maria Rita Loureiro, « A parceria em uma
empresa agrícola capitalista» (mimeo). Estudando uma fazenda no Estado de
Golas, ela mostra como é mais vantajoso economicamente para o fazendeiro
substituir acolheita manual de arroz, pela colheita mecânica. «A colhedeira
mecânica de arroz usada nesta fazenda, tipo Massey-Ferguson B1-16, faz os
seguintes gastos por hora, em cruzeiros de 1972:32,33 em custos fixos (incluindo
valor dispendidc com a máquina, furos, depreciaçBo e reparos); 6,4 em
combustível e lubrificantes e 3,67 em mBo de obra, o que perfaz um total de 42,44
por hora, Como ela colhe 19 sacos de arroz por hora. o custo por saco na colhedelra
mecânica é de 2,23, enquanto na colheita manual, em que um homem produz dois
sacos por dia com um salário de 8, OO, o preço da colheita sal a 4,00 por saco. Além
disso a colheita manual de aproximadamente 3.500 sacos como foi a da fazenda na
safra de 1972/1973, por ser mais demorada implica em riscos enormes devido ao
regime de chuvas. Assim pode dizer-se que a utffizaçSo da colhedelra mecânica de
arroz nesta lazenda represente padrão de comportamento racionai do proprietário»
7. Marx, El Cao/fa/,tomo I, pg. 546, ed, Fondo de Cultura Economlca.
8. Veja-se dados sistematizados por Paul Singer «O milagre economfco
brasileiro: causas e consequências». Cadernos Cebrap, n° 197.
9. Alberto MelloeSouza, « E/e//os econômicos do Salôrio Mínimo » APEC, Fonte
original dos dados, Anuário Estatístico do Brasil e Conjuntura Econômica - citado
por Francisco d Oliveira, Estudos Cebrap, n9 2, pg. 47
10. Alguns dados sobre o aumento da rotatividade dos trabalhadores podem ser
encontrados no trabalho de Francisco de Oliveira,-Economia brasileira: crítica à
razSo dualistau publicado em Estudos Cebrap n° 2, pg. 77.
11. Veja-se a respeito «Dialética da Dependência».
12. Veja-se «Acumulação de Capital, Progresso Técnico e Exploração»,
publicado no, Brasil Socialista n° 6.
13. O acordo assinado entre o Brasil e a Colômbia em iunho de 1976, para a
prospecçSo de carvSo deste último, prevê a criaçao de uma empresa mixta para
avaliaçSo das jazidas. Se os resultados lorem positivos, se constituirá uma
empresa também mixta para a produçSo, e o Brasil terá a primeira opçSo para a
importação de coque ou carv3o coquelficàvel. Dados da revista Veja de 23/6/76.
14. O projeto da Hidrelétrica de Italpu por exemplo, que exigiu pressões sobre o
Paraguay e neutralização das pretensCes argentinas. n8o visa outra coisa aue
aumentar a produção de energia elétrica para atender ao crescimento rtn consumo
interno brasileiro. Em certo sentido o Paraguay passará a ser futuramente
«exportador» de energia hidroelétrica para o Brasil.
15. Entre 1967 e 1973 em valor e porcentualmente as exporta
(FOB) paraos países da ALALC nSo sofreram alterações importantes, passando de
9,3% em 1967, a um máximo de 12,2% em 1971 eaum mtnimode9,0% em 1973.No
mesmo período, as exportações para o Oriente médio e Asia-Oceanla, cresceram
porcentualmente de 0,9% em 1967 para 2,8 em 1973 e de 4,4% para 11,1
respectivamente. As exportações paraos EEUU caíram de 33.2% em 1967 para 10,1
em 1973 e as destinadas ao MCE cresceram de 27,3% em 1967 para 37,1 em 1973.
16. Uma discussSo mais detalhada oesse tema pode ser encontrada em Angus
Hone « The Primary Commodities Boom », New Left Review, n°81.
17. E possível que o número de trabalhadores assalariados (proletários agrícolas)
empreoado oelo coniunto dos camponeses ricos seja superior àquele contratado
pelos arrendatários capitalistas ou mesmo petos iatidundiários tomados separa-
mente. Se isto for com provado oelas estatísticas. teremc&uroafíacSo considerável
do proleiarladoagricoladesenvolvendo sua luta direta contra os camponeses ricos
que os exploram e n3o diretamente contra os capitalistas agrícolas arrendatários
ou latifundiários. -
18. Veja-se Marx, «O Cap/faMomòlU, pg. 293, ed. Fondo de Cultura Economica.

61
Para uma discussão mais deialhada sobre os conceitos de trabalho produtivo e
improdutivo em Marx, concultar lan Gough, «Marx's theory on productlve and
unoroductive labovr». New Leít Revlew n° 73.
19. A utilização em escala crescente do trabalho teminino nessas atividades
improdutivas, me parece ter uma slgnlflcaçSo sintomática, pois algumas
pesquisas tem revelado como o saiàrio pago às mulheres <e isso vale também para a
indústria) é em geral inferior ao dos homens, e como ela està submetida a um
regimê de trabalho mais opressivo do que o do proletariado masculino.
20. E sempre bom lembrar que toda mercadoria é unidade de valore valor de uso.
No caso da força de trabalho que o proletariado vende ao capitalista, a relaçao que
se estabelece nato é simplesmente econômica como a forma salário podería deixar
transparecer. A força de trabaiho enquanto trabalho a vir a ser, é inseparável do
t rabal hador mesmo e para consumi-la - depois de comprada - em forma apropriada,
além das condições materiais do processo de trabalho - a existência de meios de
produção, de circulação, etc. - é Indispensável que existam as condições para
arrancar do trabalhador em forma adequada, sua atividade vital e orientá-la no
sentido de produzir mais valia ou trabalho. Isso significa que a relaçSo entre o
trabalhador assalariado e o capitalista que compra sua mercadoria, é também
política, pois supõe um sistema de poder no Interior da empresa, que permita
arrancar-lhe - de acordo com os designos do capital - sua fôrça de trabalho.
21. Talvez o exemplo extremo de dispersão, seja o das empregadas domésticas
ainda que n3o se possa falar de uma relaçBo capitalista entre eias e seus patrões.
Estas trabalhadoras vivem nas piores condições possíveis para a aquisiçSo de
consciência de classe, pois além da dispersão, origem agrária recente, etc., talvez
representem nas atividades urbanas um dos poucos casos em que, num
deierml nado sitio de trabalho, os trabalhadores explorados eslflo em minoria frente
a seus exploradores.
22 A consciência dessa mediações por parte do proletariado, supõe certamente
um desenvolvimento extraordinário de sua consciência política e uma compreen-
são verdadeiramente cientifica do modo de produção capitalista, e portanto da
necessidade da destrulçSo desse modo para alcançar sua verdadeira emancipação
como classe.
23. Não devemos esquecer que a forma como se apresenta um trabalhador
assalariado no seu local de trabalho não se determina exclusivamente pelos
costumes, extração de classe, etc., mas também pela exigência do capital que o
emprega. Essa forma de apresentação exigida pelo capital a seus empregados em
algumas atividades, como por exemplo no comércio e nos bancos, deve ser
considerada como um custo adicional de reprodução da força de trabalho, ainda
que os trabalhadores submetidos a esse regime considerem «norman tal
exigência, e se «diferenciem» através dela dos demais trabalhadores.
24. Ver Engels, o.c.
25. Para uma análise de como foi quebrado este monopólio dos trabalhadores da
indústria siderúrgicanorteamericana no final do século passado, veja-se Katherine
Stone, « Ths origlns 0 Jçt> Structures in the Stoe/ índustry», The revlew of Radical
Political Economics. vok. e- 1,974
26. Em meu trabalho já citado, destaque! a importância dessa fração de
trabalhadores na indústria moderna; a tendência de seu crescimento relativo e n
papel desempenhado por estes no desenvolvimento do mercado interno. Ali supus
que tais trabalhadores recebiam altos salários riflo sòmente por sua qualificação,
adquirida formal ou informalmente, mas também pela tendência da acumulação de

62
capita) de provocar durante certo tempo uma deijianda superior à oferta deste tipo
de trabalhador e portanto determinar preços de mercado superiores ao valor desta
forca de trabalho. Nada impede no entanto, que a estrutura educativa do pais se
adapte e responda de forma ceda vez mais imediata As pressões da demanda, e
aue nessa medida. og~sarsrtqa cesta rraç«o de trabalhadorna tendem a diminuir.
27. O companheiro Paulo Torres no seu conhecido trabalho «t/ma experiência
junto ao proletariado» publicado no BS n°3, menciona em diversas ocasiões a luta
contra o sistema de opressão dentro da fAbrtca. Tal alstema - que nao deve ser
confundido com o de repressão aberta, guardas, agentes, dedos-duro, Oops.etc. -
tem sua origem, segundo o relato do companheiro na relaçSo chefe-subordlnado.
Eis aqui àlguns apartes: «E a luta contra o sistema de opress9o na fábrica teve
alguns resultados, como deslocamentos de chefes de uma seção para outra, como
também melhor trato por parte deles; inclusive alguns passaram a ter medo do
nosso trabalho...»; e « Outra coisa que notamos 6 que em todas as fábricas tivemos
problemas com relação a chefes carrascos. Não soubemos aproveitar com
profundidade uma experiência espontânea de um companheiro que «deu um pau»
no chefe e este se tornou uma «seda».
28. Em 1969, para uma População Economicamente Ativa estimada em
29.091.000. a indústria de tiansíormação participava com 3.743.000 (12,8%), a
agricultura comí 2.533.000 (43,0) o comércio de mercadorias com 2.592.000 (8,9), a
industria de construção 1.339.000(4,6), os transportes, comunicaçCes e armazena-
gem 1.199.000 (4,1) e o restante dividido entre os serviços públicos, serviços
privados, profissionais liberais, forças armadas, etc... Veja-se Paul Singer,
«Emprego e Fôrça de Trabalho no Brasil», cadernos cebrap, n°3.
29. Chamo a atenção outra vez para o trabalho das companheiras Mattos e
Carvalho, publicado no BS n° 3, onde se pode encontrar boa quant idade de dados a
respeito - principalmente depois do golpe de 1964 - embora estes dados sobre os
trabalhadores assalariados não se encontrem separados por tamanho de
estabelecimento industrial.
dibnt

Socialismo

e liberdades democráticas
Daniel Terra

I. INTRODUÇÃO.
Jà há algum tempo, a Esquerda Revolucionária (ER) brasileira vem sustentando
que o movimento de massas em nosso pais se reorganizará em torno
principalmente das lutas de resistência democrática e de defesa das condfçOes de
vida da classe operária e do povo. De nossa parte - que defendemos uma estratégia
e um programa socialista para a revolução brasileira - acreditamos que são essas as
lutas de massa que no atual momento tem melhores condições de favorecer o
desenvolvimento do nivel de consciência e organisaçSo do proletariado, servindo
de base para a sua experiência e para o trabalho da vanguarda revolucionária no
sentido de fortalecer essa organizaçSo e de esclarecer cada vez mais o caráter e os
interesses de classe do atual regime e as tarefas que o proletariado e o povo
precisarSo cumprir para alcançar sua emancipação. Por outro lado, acreditamos
também que essas lutas, desde que consequentemente direcionadas pela
vanguarda, permitirão desde jà o debllitamento da burguesia e de seu regime
militar.
Entretanto, certos setores, que tem da prática revolucionária uma concepçSo
extremamente deformada pelo propagandlsmo, consideram que a luta pelas
liberdades democráticas, ainda no terreno do capitalismo, é necessariamente uma
luta burguesa ou pequeno-burguesa. A partir dai, avaliam que a orientação que
acabamos de apresentar representa um abandono ou um enfraquecimento da
estratégia socialista, caracterizando o que consideram um desvio «democratisla».
Tais setores procuram assumir hoje a postura de defensores dos importantes
avanços teóricos realizados pela esquerda revolucionária brasileira no decorrer da
década de 60 - critica do conceito de « burguesia nacional» da política de alianças.

84
da dominação «feudal» no campo. definiç8o do caráter socialista da revoluç&o,
necessidade da luta armada, da ditadura do proletariado, etc. - avanços estes que
estariam sendo ameaçados por aquele desvio «democratista».
Ocorre que, ao laao oesses importantes acertos, a ER incorreu naquela época,
quase que invariavelmente, em acentuados desvios esquerdistas no plano da
tática, que impediram o seu crescimento político no seio das massas. NSo só o
militarismo e o Houtrinarismo mas até mesmo correntes que ao nivel da estratégia
iiavtam reito uma crítica mais atrasada do reformlsmo - como o populismo
revolucionário ao nivel da tática acompanharam e às vezes excederam os desvios
esquerdistas da «Esquerda socialista>
Recusando-se a avançar os passos teóricos e ideológicos que a realidade exige
hoje da E.R, tais setores nSo apenas se negam a autocritlcar-se dos desvios que
nos levaram a esses erros, no plano da tática, mas, inclusive, como veremos,
mantem e aprofundam certos desvios de caráter direitista que incorriam, na forma
particular como concebiam a estratégia socialista naquela época.
Hoje trata-se de corrigir esses erros,tarefa a que vimos nos dedicando já há
algum tempo.
Neste trabalho, procuraremos demonstrar que a pretendida «defesa» de certas
questões gerais do socialismo, quando dirigidas contra nossa tática, encobre na
realidade essa resistência à autocrítica. Veremos também qüe essas « defesas » nSo
vSo além de jogarem uma parte da teoria revolucionária contra a outra, e
frequentemente incorrem em deformações ainda mais graves.
Sem dúvida, desde que assumimos — ao lado de outras Organizações, como a
APML - a luta contra o doutrinarismo , este teve que recuar para posições cada vez
mais secundárias no conjunto da Esquerda. Mas é incorreto acreditar aue a luta
teórica contra o doutrinarismo jà está esgotada. O doutrinarismo continua senão o
principal desvio intemo que impede a Tendência proletária da assumir consequen-
temente a luta contra seus principais oponentes no selo da Esquerda, o reformlsmo
eo populismo. Enquanto não se depurar do doutrinarismo, aTP não conseguirá ser
uma alternativa consequente ao reformismo e ao populismo.
As expressões mais primitivas do doutrinarismo-de queéum exemplo a Política
Operária (PO) - encontram-se hoje bastante desgastadas. Mas elas não deixaram de
influenciar novas formas de manifestação desse mesmo desvio. Este é o caso do
Movimento de Emancipação do Proletariado - MEP-(Ex-FraçSo), que, apesar de ter
realizado uma crítica parcial do doutrinarismo, continua, quanto ao essecial,
dentro desse mesmo campo, constituindo-se hoje, por Isso mesmo, na sua
principal suâtentaçap. Assim sendo, nós daremos neste trabalho, uma atenção
especial às colocações destes companheiros.
Por último, adiantamos que não pretendemos aqui discutir todos os aspectos da
tállca^ o que está sendo feito em outros materiais - mas sim colocar em destaque
questões de fundo, tais como: liberdades democráticas, luta política, luta
sindical, relação entre vanguarda e massa, hoje. E, em particular destacaremos a
questão da partlcipação^no processo eleitoral que se aproxima, em vista da
importância dás discussões que essa questão tem suscitado.
II DEMOCRACIA,DEMOCRACIA BURGUESA E DEMOCRACIA PROLETÁRIA.
Á necessidade e a possibilidade de transformações democráticas radicais como
parte da luta pelo socialismo foi assim definida por Lênin:
«A redução da remuneração dos altos funcionário do Estado aparece

66
« simplesmente» como a reivindicação de um democratismo Ingênuo, primitivo.
Um dos«fundadoras •> do oportunismo moderno, o ex-social-democrata Bernsteín,
repetia muitas veies as vulgares somDarias burguesas contra o democratismo.
Como todos os oportunistas, como todos os kauisklstas de nossos dias, ele não
compreendeu de modo algum, em primeiro lugar, que 6 impossível passar do
capitalismo ao socialismo sem um certo « retomo » ao tf<*moeraf/smo «primitivo »
(porque como agir de outro modo pera que as funções do Estado selam exercidas
pela maioria, pela totalidade da população?) e, em segundo lugar, que o
a democratismo primitivo» baseado no capitalismo e na cultura capitafista nSo i o
democratismo primitivo das épocas antigas ou pré-capItalistas.Acultura capitalis-
ta criou a grande produção, as fábricas, as ferrovias, os correios, o telefone, etc. E,
sobre esta base, a /mansa maioria das funções do velho «poder estatal« são
extremamente simplificadas, e podem ser reduzidas a simples operações de
registro, de inscrição, de controle, que estarão perfeitamente ao alcance de
qualquer pessoa que tenha instrução primária, que poderão ser perfeitamente
exercidas com a retribuição de um simples «salário operário»; assim pode-se (è
deve-se) r^irar dessas funções todo caráter privilegiado,«hierárquico »(O Estado e
a 8evolução, ed. Dialogo, pag.64. grilos de Lènin).
*Nao se pode aniquilar o capitalismo e o Imperialismo com nenhuma
transformaçao democrática, por mais «ideal» que seja, mas apenas com a
revolução econômica: mas o proletariado, se não fôr educado na luta pela
democracia, é incapaz de realizar uma revolução econômica». (Resposta a
P.Kievsky em Contra o Dogmatismo no Movimento Operário, pag.101).
Sobre o caminho que leva à «realização tSo plena e tão metódica quanto
possível» dessas transformações, LÔnin esclareceu que:
« Nós todos estamos persuadidos de que a emancipação dos operários só pode
ser obra deles mesmos. Sem a consciência a a organização das massas, sem sua
preparação e sua educação por melo da luta de classes aberta contra toda a
burguesia, não se pode falar am revolução socialista... Quem quiser ir ao
socialismo por outro caminho que não safa o do democratismo político, chegará
infalivelmente 6 conclusões absurdas e reacionárias, tanto no sentido eccrriômico
como no político... Organizai a canfanas da milhares de operários em toda a
Rússia, difundi entre milhões a simpatia pelo vosso programa/ Tentai fazer isto,
não vos limitando e frases anárquicas sonoras, porém ôcas, e vereis Imediatamente
que levara cabo esta organização, que esta difusão da educação socialista depende
da realização mais completa possível das transformações democráticas » (Duas
táticas, em Obras Escolhidas I, Moscou, pag. 510).
«Através do aproveitamento da democracia burguesa caminhar-se-à para a
organização socialista s consequentemente democrática do proletariado contra a
burguesia e contra o oportunismo. Não-há outro caminho. Qualquer outra * salda»
nlo será uma salda. O marxismo não conhece outra salda, do mesmo modo que
não a conhece a vida real», (Resposta a P. Kíevsky, obra citada, pag. 104).
Lônln deixa ciaro que nffo se pode chegar ô ditadura do proletariado senSo
através de determinados avanços Que a principio se colocam ainda no terreno do
capitalismo e da democracia burguesa. Terão estas teses fundamentais de Lénln
perdido a sua validade?

«&i/
A PO e o MEP - e, em geral todos os doutrlnarlstas - consideram que sim.
Vejamos por exemplo o que diz a PO em «Marxismo Militante» n» 2:
«A perspectiva do governo de transição, o governo dos trabalhadores da cidade e
do campo. nSo é portanto otijetlvo reservado aos documentos e aos arquivos,
trata-se de uma palavra de ordem que lançamos em alternativa ò ditadura,
considerando a falência histórica da democracia burguesa. Aqui nos disf/ngu/mos
de todòs os que se batem petas «liberdades democráticas».
0 GRTé a nossa alternativa à ditadura militar. Sòmente um governo susteniado
política e militarmente pela frente dos fraáaíbadores da cidade e do campo poderá
garantir as conquistas políticas parciais na luta do proletariado. A luta paio governo
dos trabalhadores enfeixa as lutas políticas parciais contra a Lei de greve, sindicato
atrelado e arrocho salarial, e apenas os que acreditam no teor revolucionário para
uma eventual democracia burguesa no Brasil podem relegar o governo dos
trabalhadores para o rururo. Mas a oemocrada burguesa faliu históricamente no
Brasil, e a possibilidade de seu retorno só pode ser prevista como um recurso da
burguesia para conter as massas e recuperar condições para nova ofensiva; por
isto, fora da perspecf/va do governo dos trabalhadores, só colocarão palavras de
ordem Reformistas e objetivos políticos capazes de coexistir pacificamente com as
bases sociais e políticas do Ésfado burguês», (pag.66)
«£ sempre em nome da«política», os oportunistas consideram que não levan tar
bandeiras democráticas é abstenção diante da realidade, é ficar no propagandis-
mo». (pag.32)
«Os operários (■..) que por outro lado reconhecem as ■ lutas democráticas » como
palavra de ordem dos patrões, esaea $So oa operários mais conscientes e
avançados- (!!) (pag. 26)
Assim, como na época do imperialismo e da super-exploração, a «democracia
burguesa faliu históricamente », entSo a luta democrática ainda dentro do terreno
do capitalismo ó coisa da qual só devem se ocupar patrSes e oportunistas, e a
«alternativa-* proletária à luta pela® liberdades democráticas é o Governo
Revolucionário dos Trabalhadores.
E curioso que a PO pretenda que o GRT seja uma alternativa à luta pelas
liberdades democráticas. Pois eleótSosômenteurn momento e um objetivo parcial
dessa luta. Aqui já vemos um exemplo da contraposição que se procura fazer entre
uma parte e outra da teoria, Mas mais curioso ainda é que PO, tao ciosa da
importènciada ditadura do proletariado, pretendaqueoGRT-que nSo ó ainda essa
ditadura - seja uma alternativa à democracia burguesa. A democracia proletária -
única alternativa real à democracia burguesa - implica no poder para a classe operá-
ria e esse poder só ó possível através da ditadura do proletariado. O GRT é um
instrumento de luta que visa aceierar o debHitarnento da burguesia, mas através
dele o proletariado ainda nao conquistou o poder. 0 GRT real Iza-se assim ainda sob
a dominaçSo do poder burguês e portanto da democracia burguesa. Caracterizando
um período de crise e de transiçSo, o GRT • instrumento tático que nSo
necessariamente será (ou poderá ser) utilizado pelo proletariado - n8o ô ainda, nem
pode ser, uma alternativa á democracia burguesa; é, pelo contrário, a situaçdo
mais favorável ao proletariado ainda no terreno do capitalismo e da democracia
burguesa. O período de transiçHo (e estamos falando de um tipo determinado de
t ran siçSo) nSo substitui a dialética, o conceito de polo dominante « polo dominado,

•7
e o proletariado só se constitui em polo dominante da sociedade através da sua
ditadura de ciasse. (Adiante voltaremos mais detalhadamente à questão do GRT.)
Começamosa ver quem reaimente dilui os limites entre a democracia burguesa e
a proletária. Mas a questüo de fundo aqui é a concepção de que se «a democracia
burguesa faliu históricamente», entSo as lutas democráticas no terreno do
capitalismo são necessariamente reformistas e inconsequentes. E desta forma que
os doutrinaristas concebem a sua «< atualização« da teoria. Não percebem que esse
raciocínio é a capitulação mais completa em reiaç8o è luta revolucionária, e que
nada tem de « atual »•. Pois trata-se de uma muito ant iga racionalizaçSo da qual já foi
dito:
«O capitalismo em geral e o imperialismo em particular transformam a
democracia numa ilusão; mas ao mesmo tempo o capitalismo engendra as
tendências democráticas nas massas; gera as instituições democráticas, exacerba
o antagonismo entre o imperialismo, que nega a democracia, e as massas, que
tendem para eia... »
«A soluçBo marxista do problema da democracia consiste em que o proletariado
que trava a sua luta de c/asse. utilize todas as instituições e asp/'raç8es
democráticas contra a burguesia, a fim de preparar o triunfo do proletariado sobre a
burguesia, e aniquilá-la, Esta utilização nao é coisa fácil, e aos«economistas >*, aos
to Istoianos e a outros parece-lhe amiúde uma concessão a todos os « burgueses» e
oportunistas, tão ilegítima como parece a P. Krevsky uma concessão ilegítima aos
burgueses a defesa da autodeterminação da nações «na época do capitalismo
financeiro ». Ora. o marxismo ensina que «lutar contra o oportunismo», recusando
utilizaras instituições democráticas de determinada sociedade capitalista, criadas
pela burguesia e por ela deformadas, é claudlcar inteiramente perante o
oportunismo!...»
«O imperialismo ô o capitalismo altamente desenvolvido, o imperialismo é
progressivo: o imperialismo é negação da democracia. Portanto a democracia è
«irrealizàvei» no capitalismo! A guerra Imperialista é uma c/amorosa violação de
toda democracia, tanto nas monarquias atrasadas como nas repúblicas avança-
das; «portanto » não há motivos para falar dos «direitos», ou seja da democracia!
A guerra imperialista sô se pode«contrapor» o socialismo; a «salda » está apenas
no socialismo. «Portanto» propugnar consignas democráticas no programa
mínimo, quer dizer, já no capitalismo, è erro ou ifusão, ou obscurecimento.
afastamento; e/c. da consigna da revolução socialista!.., >■
«As práticas en torno dos «direitos» parecem ridfcuíos durante a guerra, pois
toda guerra substitui o direito pela violência franca e direita; todavia isto não nos
deve lazer esquecer'que no passado houve íe deve haver no futuro) guerras
(democráticas erevolucionárias)que embora substituindo durante a contenda todo
o ■< direito ». roda a democracia pela violência, serviram, pelo seu conteúdo social e
pelas suas consequências, á causa da democracia e. por conseguinte, do
socialismo...»
«A guerra, como qualquer crise na vida do /■fome/n ou na História dos povos,
aturde e enfraquece uns. tempera e esclarece outros.
Esta verdade também se faz sentir no pensamento social-democrata acerca da
guerra é em consequência da guerra. Uma coisa é aprofundar a$ causas e o
significado da guerra Imperialista na base do capitalismo attàmente desenvolvido,
as tarefas da tática da sociat-democracia em conséquênciada guerra, as causas da
crise da sociat-democracia, etc; e outra multo diferénle é permitir que a guerra
asm agua o próprio pensamento, 6 d&xw de radocinar a analisar debaixo do
peio das Improsatles horríveis a das dolorosas consequências ou propriedades da
guerra.
Uma das formas de esmagem ento ou opresalo do pensamento humano peta
guerra ê o menosprezo da democracia peio «economidsmo imperialista». P.
Kievsky não rapara que em todas as suas contradiçOes saliente como 0/0 da
ligação essa esmagamento, a intimidação, 0 renúncia à anèlise em consequência
da guerra... De que autodeterminação e «independência» das nações w pode fatar
quando temos à vista o que se faz com a «independente» Qràcia? Para que, em
geral, talar de «direitos» epensar neles quando todos os direitos sêo espezinhados
por toda a parte em proveito do militarismo?...»
«A verdadeira origem de todos os seus curiosos erros lógicos, da toda a sua
confusão - não só no que se refere à autodeterminação, mas também aos
problemas da defesa da pátria, do divórdo e dos «direitos» em geral - reside no
fato de que seu pensamento se encontra «tmigado pela guerra, e em consequên-
da deste esmagamento se adultera na raiz a atitude do marxismo perante a
democracia em gerai» (Lênirt, Resposta a P.Kfevsky, obra citada, grifos cie Lénln).

Ai está: se ocorrem situaçCes históricas em que à burguesia Interessa negar


todo e qualquer tipo de direito, toda democracia, e em que a única «salda» estã
no sociallsno, isto não significa que o proletariado deva se deixar intimidar e
arriar as bandeiras democráticas desde o terreno do capitalismo, indiepenaéveie
à sua luta peio socialismo.
O outro argumento antl-lutas democráticas apresentado pela PO - «a possibili-
dade de retorno da democracia burguesa só pode ser prevista como um recurso
da burguesia para oonfer as massas» - também serve apenas para confundir o
problema. Em primeiro lugar porque não se pode falar a rigor de «retorno» da
democracia burguesa, pois como vimos - e ó verdade - 0 capitalismo, mesmo na
faae .imperialista, gera inevitavelmente Instituições democráticas (o caráter
social de sua produçSo não pode vir sem elas) e ainda que a democracia
(burguesa) esteja dominada pela ditadura burguesa propriamente dita, tal demo-
cracia sempre existirá, ainda que em posição secundária, sob 0 capitalismo. Em
proletariado ImpOe realmente certos avanços democráticos, se ocupa as poalçSes
certas, entSo ele estará em melhores e não piores condlçOes para resistir ao
contra-ataque. Manter as mesmas posições quando o Inimigo 4 forçado a recuar
é atitude de quem teme a radicalização da luta, e oom Iseo só 9e expõe ainda
mais ao inimigo. Tudo dependerá entSo do proletariado, no caso de recuo da
burguesia, saber ocupar as posições oorretas, não se deixar Iludir pelos avanços
fqrmais, pelo legallsmo e peio parlamentarismo - ainda que utilizando na medida
do possível as formas legais e'parlamentares. Mas ocorre que PO., Intoxlcada peia
democracia burguesa, só consegue conceber os avanços formate, legais e Ilusórios
*e pão os avanços democráticos real», Isto é, as mudanças objetivas na correlação
de forças entre a burguesia e o proletariado, que poderão inclusive, mesmo no
terreno do capitalismo, ser conquistados pela via armada e insurreleional.
. Vejamos por exemplo, o caso recente do Chile no governo de «Unidade
Popular». Há quem pretenda que o golpe de 73 é uma demonstração da
Inconsequèncla da conquista de determinadas liberdades democráticas. .. -
0 .que ocorre é. que^ nesle casov essas riiberdades; não totam conquistadas
basicamente pela efetiva mobilização das massas, mas por um acordo parlamen-
tar. Isto n8o quer dlrer que «portanto» esse avanço fosse desprezível, pois mesmo
nessas condlçdes ele permitia melhores condições para o desenvolvimento do
movimento de massas. Mas se impunha que os dirigentes do proletariado nio u
iludissem com o alcance das liberdades conquistadas * principal mente nas
condiçCes em que o foram - e preparassem o movimento de massas com vistas a
que este resistisse de forma a obter o melhor saldo possível quando a burguesia -
Imprensada pelo avanço do movimento - tentasse o contra-ataque. Tal preparaçSo
Incluiría o desenvolvimento mais intenso possivei de organismos populares nos
quais o governo se apoiasse dlretamente, sob a alegaçSo de que «já havia um
governo».
E iniciou o seu «caminho pacifico para o socialismo», promovendo reformas
que prejudicavam - e muito - os interesses da burguesia e do imperial lano,
apoiada quase que exclusivamente nos organismos do Estado burguês - e seus
militares «profissionais» e «democratas» - negando qualquer tipo de organizaçSo
operária de massas diferente da de tipo sindicai. Em resumo, a UP nâo levou em
conta que :
kUm governo desse tipo (operário) $6 é possivei se surge da luta de massas, se
se apoia em organismos operários aptos para o combate e criados peios mais
vastos setores das massas operárias oprimidas. Um governo operário surgido de
uma combinaçBo parlamentar também pode proporcionar a ocasiSo de
revitalizar o movimento revolucionário. Mas é evidente que o surgimento de um
governo verdadeiramente operário e a existência de um governo que reaüze uma
política revolucionária deve conduzir a mais encarniçada luta, e, eventuaimente ò
guerra civil contra a burguesia». (ResoiuçOes sobre a tática, IV Congresso da
Internacional Comunista • 1922).
Por outro lado, os companheiros do MEP afirmam que, ao falarmos em
«liberdades democráticas», estamos defendendo a democracia «em geral».
Na verdade a ambiguidade nflo é nossa, mas da acusaçffo que nos fazem esses
companheiros. Em primeiro lugar, porque se o nosso objetivo final, estratégico,
pelo qual lutamos desde hoje. é a democracia proletária, nòs não temos qualquer
dúvida em afirmar que todo avanço democrático parcial, conquistado antes da
tomada do poder, coloca-ae ainda dentro do terreno da democracia burguesa,
ainda que a ela se oponha e vise a sua destruiçSo.
Em segundo lugar porque confundem duas ordens de problemas: uma ô n8o
assumir que os princípios democráticos gerais aó se concretizam plenamente
através da ditadura do proletariado; outra coisa multo diferente 6 nflo assumir
esses prinol pi os gerais, pretender que eles estejam em oontradiçSo com a ditadura
do proletariado, ndo perceber que a ditadura do proletariado é a concretização
mais perfeita dos princípios democráticos gerais.
Os princípios democráticos gerais nada tem a ver com a Idéia de, ainda
durante a existência da elaaaas antagônica* na sociedade, garantir a
liberdade em «geral» (no sentido da liberdade para todos, Indistinta man-
to), pois esses princípios implicam também (a nscsssa riam ente, como vere-
mos), na idòia de submlselo o dom inaçlo. Essa defórmaçffo liberal dos
princípios democráticos gerais atende aos Interesses da burguesia, que necessitan-
do eneubrlr os antagonismos de ctasse, pretende que a Ma democracia, isto é, a
democracia burguesa, represente indistinta e imparclalmente os interesses de
toda a sociedade.
Em o Renegado Kautsky, Lenin combate o dirigente da II Internacional
porque este, pretensamente em nome dos prtndpios democráticos gerais, mas sim
70
em funçSo de uma deformação liberai desses princípios, defendia, objet ívamente,
a democracia burguesa contra a ditadura do proletariado. Pretensamente, porque
po ponto de visla democrático geral, a ditadura do proletariado é multo mais
democrática do que a democracia burguesa! Dessa forma, Kautsky, ao renegar o
marxismo, recusa-se a.ir além da democracia burguesa,e, exatamente como ds
liberais, identifica a democracia em geral com a democracia burguesa:
«... Kautsky é levado a opscurecer, a enredar o problema, pois poe o problema
como liberal éo frafarda democracia em geral, e rjao dà democracia burguesa. Evita
mesmo o conceito preciso, de classe, e esmera-se em falar da democracia
«prè-socialista». (pag. 16)
Se os comunistas não podem restrlngir-se às questões democráticas gerais, Isto
não significa que estejam dispensados destas questões. Entre outras coisas, para
pão agir como o MEP, para não. ajudar os liberais a confundir os princípios
democráticos gerais com a deformação que fazem deles.
Quem se recusa a conhecer os princípios democráticos gerais, como poderá falar
em«democracia » para os operários? O que vem a ser essa«democracia «que deve
haver para os operários e n3o pode haver para os burgueses? Que sentido terà a
afirmaçffo de q ue a democracia proletária é«mais democrática» do que a burguesa?
Por outro lado Marxismo Militante afirma (pag.47) que 6 impossível falar da
liberdade em geral, e que tal tipo de preocupação cabe apenas a «pensadores
iluministas como Thomas Je/ferson ou Qeorge Washington Esta é uma
afirmaçSo oscurantista que Implica em negar a possibilidade de superação da
«pré-história» da sociedade. Os comunistas nSo se distinguem dos liberais porque
duvidem da possibilidade de que a Humanidade atinjaum orau de desenvolvimento
em que todos os homens sejam livres, mas porque afirmam que essa liberdade só é
possível através da supressão das classes, Os socialistas s3'o os mais legítimos
defensores da liberdade, porque defendem o seu desenvolvimento pelo , único
caminho possivel; através da ditadura do proletariado, eles garantem a liberdade
da grande maioria, reprimem a liberdade de uma pequena minoria, Injçlam a
supressão das classes e assim imprimem um grande avanço no sentido das
liberdade piena: o comunismo, a que Marx se.referiu como o « reino da Uberdade»:
A liberdade é a essência do homem, a tal ponto que mesmo os seus adversários a
pratica, embora na realidade a combatam; desejam apropriar-se dela como o
enleite mais precioso que rejeitaram como condiçSo da natureza humana.
N3o se trata de saber.se a liberdade de imprensa deve existir, porque ela existe
sempre. Trata-se de saber antes, se a liberdade de Imprensa é privilégio de alguns
Indivíduos ou privilégio do espirito humano. (Notas sobre a censura prussiana)
«Neste, plano, a liberdade pode consistir apenas nisto; o homem socializado, os
produtores associados regulam de maneira racional esse processo de assimIlaçSo
que os liga a natureza e submetem-se ao seu controle çomum, em vez de se
deixarem dominar por ele como uma força obstinada, cumprindo com o mínimo
eslorço possível e nas condições mais conformes ô sua dignidade e d sua natureza
humanas»{O Capital, I) ' ,
voltemos aos princípios democráticos gerais. Temos visto como em várias
óportiinidades Uônin se refere à democracia em geral. E de fatp, ele Jamais se

71
esqueceu de conceltuà*la. Em O Estado e a Revolução encontramos:
«A democracia e a submissão da minoria à maioria nSo slo a mesma coisa. A
democracia * um Eatado que reoonrtec* • Mibmlcalo da minoria a maioria, isto a, a
organização da violência sistemática exercida por uma classe contra outra, por uma
parte da população contra outra parte.»(pag. 164)
A democracia é uma formada Eatado, umada euaa variedade*. £ portanto, como
todo Estado, a aplicação organizada, sistemática, dacoerçãoaoshomena. tsto.por
um lado; mas, por outro lado, ala significa o reconhecimento oticial da Igualdade
entre os cidadãos, do direito igual para todos de determinar a forma do Estado e de
adminfstrà-to.»tpag. 125)
o Democracia guer dizer igualdade. Percebe-se o significado imenso Que reveste
a luta do proletariado pela igualdade e a palavra de ordem da igualdade, sob a
condição de compreendê-fa exatamente no sentido de supressão das ciastes»
(pag. 124)
Ai estão, portanto, os princípios garals òa democracia: 1 °) Ela 6 um Estado. 2°)
Onde a minoria se submete à maioria. E ao determinar a submissão da minoria à
maioria, ela pressupde oficialmente a igualdade entre os cidadãos. Por outro lado,
o reconhecimento oficial do direito igual dos cidadaos de determinar a forma de
Estado implica necessariamente na existência de certos canais de expressão e
organização, isto ê, nas liberdades democráticas.
Mas 6 preciso enfatizar que o conceito geral da democracia afirma que ela 6 uma
forma de Eatado, Isto ó, uma forma de violência organizada de uma classe sobre
outra. Assim, a igualdade de direitos reconhecida em principio não poderá
significara Hbecdade de todos, mas sim que a dominação cabeè maioria. Portanto
o próprio conceito geral de democracia Jè Implica na existência de uma parcela de
população submetida pela violência, eassim, concretamente destituída de direitos
e liberdades.
Resgatamos esse conceito geral ienlnista de democracia para iniciar a critica de
uma interpretação metafísica que vê a democracia burguesa e a democracia
proletária como duas realidades estanques, que não percebe que a democracia
proletária è o desdobramento dialético da democracia burguesa, que a ditadura
proletária não é o inicio processo de democratização da sociedade, mas ao
contrário, representa um salto de qualidade nesse processo, e que esse salto de
qualidade é Impossível sem anteriores saltos de quantidade.
Senão vejamos: a democracia será burguesa ou proletária conforme o poder, o
Estado, que a define seja burguês ou proletário. Entretanto, a democracia burguesa
nSo é ainda uma verdadeira democracia. Pois ela 6 uma forma de poder da
burguesia, e esta é sempre uma classe minoritária da população. Assim, as
maiorias da democracia burguesa são meramente formais, pois elas representam
na verdade os interesses da minoria. Para conseguir que os interesses objetivos da
maioria explorada nSo se explicitem na democracia burguesa, os capitalistas, alèm
de jogarem com o possível atraso da consciência política do proletariados do povo,
lançam mão, como sabemos, de uma série de manobras e artifícios:
• Se se considera mais de perto o mecanismo da democracia capitalista, ver-se-á
por toda parte, no * miúdo», nos chamados detalhes miúdos da legislação eleitoral
72
condições de residência, exclusão das mulheres, etc), no funcionamento das
instituições representativas, nos obstáculos efetivos ao direito de reunião (os
edifícios públicos nSo o são pare os « miseráveis»!), na organização puramente
capitaliste da imprense diária, etc, etc., ver-se-6 acumuiarem-se aa restrições ao
democratismo. Estas restrições, eliminações, exclusões, obstáculos pare os
pobres, parece*" Inslonificantes. sohretndn aos alhna deaneín« /»t/e temeis
conheceram a necessidade e jamais se aproximaram das ciasses oprimidas e o«
vida das massas que as compõem (eéo caso de nove décimos, sen9o de noventa c
nove centésimos dos publicistas e dos políticos burgueses) - mas totalizadas,
éstas restrições excluem, rejeitam os pobrès da política, da participação ativa na
democracia
»Assim pois, na sociedade capitalista, teinoa únicamehte uma democracia
truncada, miserável, falsificada, uma democracia exclpãlvamentá para os ricos,
pára a -minoria». (O Estado e a Revolução,paga 110, 1 ft « 113)
Entretanto, oà pobres nBt> se submetem passIvamente ao esforço dst burguesia
paraexClul-los dá política, resistem, acumulam forças e preparam-se politicamen-
te para fazer sua «revolução econômica». Nessa processo o proletariado e o povo
aumentam seu nivel de consciência s organizado, ImpSem è burguesia uma
participação política cada vez maior, obrtgam-na crescentemente a atender suas
relvindlcaçGes políticas e econômicas, ampliam gradatIvamente seu espaço
político e reduzem o da burguesia; tudo isso significa avanços democráticos que
se nSo superam de imediato a democracia burguesa, representam um acúmulo de
torças indispensável para que. o proletariado possa constituir-se em força
revolucionária e passará ofensiva, Isto 4,por abaixo o obstáculo que Impede o seu
avanço democrático e a realização da revoiuçXo econômica. Tal obstáculo Ó a
máquina de repreeslo da burguesia; o Ratado. Chegou o momento do salto de
qualidade. Para quebrar esse Estado e derrotar a posterior resistência da
burguesia, o proletariado precisará agir com violência, ditatorial mente.« A ditadura
é um poder que se apoia diretamente na violência e não está prêse por nenhuma lei»
(Renegado Kautsky, pag. 22). O proletariado terá que agir ditatorialmente contra a
burguesia porque, ante a perspectiva de perder seus seculares privilégios, os
capitalistas opQem uma resistência desesperada e obstinada, que não é possível
vencer com bons modos. Mas essa ditadura sobre • burgt esfa nSo reduzirá o nfvel
democrático geral da sociedade, e sim significará um salto de qualidade à frente,
pois a quebra do aparelho de repressão da burguesia permite emergir um nivel de
participação e expressão das massas como nunca foi possível na democracia
capitalista.«Apenas do ponto de vista burguês vuloar o conceito de ditadora e o
conceito oe democracia se exoiuem um ao outrp»(Duas táticas), a existência de
Igualdade entre os cidadãos, do direito igual para todos de determinar a forma da
dominadas, e às vezes, na democracia para os dominadores. Mas através da
ditadura do proletariado, pela primeira vez existe democracia reafmente para a
maioria, para os explorados, e ditadura apenas para a minoria, para os
exploradores. Por isso, a democracia aumentou, e não diminuiu.
vimos que a principio a democracia burguesa garantia apenas os «direitos» da
burguesia, e pràticamente nenhum direito para o proletariado. Assim, o nivel
democrático geral da sociedade é aqui muito baixo. Entretanto, com sua luta, o
proletariado ampliou os seus direitos, conquistou na prática algum espaço
político. Então o nível democrático geral da sociedade avançou, ainda que
permaneça dentro dos marcos da democracia falsificada, fato é. burguesa. Depois.

n
o proletariado passa para a ofensiva, derruba o Estado burguês e constrói o seu
próprio poder. E assim o nível democrático geral passa por um salto de qualidade, e
a sociedade atinge a verdadeira democracia, a proletária. Esta idéia foi exposta por
Lenln da seguinte forma:
«A democracia é uma forma de Estado, uma de suas variedades. E, portanto,
como todo Estado, a aplicaçSo organizada, sistemática, da coerçào aos homens.
Isto por um lado, mas por outro lado, ela significa o reconhecimento oficiai da
igualdade entre os cidadSes, do direito igual para todos de determinar a forma de
Estado ? de administrá-lo. Segue-se, pois, que a um certo grau de seu
dese olvimento, a democracia de inicio une o proletariado, a classe revoiucionó-
rla anti-capitalista, e que lhe permite quebrar, reduzir a migalhas, fazer desaparecer
da faca da Terra a máquina estatal burguesa, seja burguesia republicana, exército
permanente, policia, burocracia, e substitui-la por uma máquina estatal mala
democrática (mas que nem por isso deixa de ser uma máquina de Estado) sob a
formadas massas operárias e, depois, por todo o povo, participando maciçamente
das miffeias.
Àqui, «a quantidade se transforma em qualidade•: chegando a esta grau, s
democracia sal do marco, da sociedade burguesa, e começa a evoluir para o
socialismo. Se todos cart ideam de fato da gestSo dn Estado, o capitalismo nSo se
pode mais manter». (pag 126).
E mais:

* Al está exatamente um caso de «transformação de quantidade em qualidaae»,


realizada deste modo, tSo plenemente e tSo metodicamente quanto possível, a
democracia, de burguesa, ae toma proletária... » {pag. 63)
Eia portanto, como estão profundamente equivocados aqueles que pretendem
dar salto de qualidade omitindo-se de preparar o terreno para ele, isto é, entre
outras coisas, sem levantar «consignas democráticas ainda no capitalismo».
A « conquista da democracia», levar a luta democrática até o fim, nBo é portanto
uma questão periférica da luta pelo socialismo. Pelo contrário, eka constitui a
auestSo potfttea essencial e decisiva da revolução social. Pelo que substituir o
Estado ourguèa? Lènfn aurma:
«.. .pela « organização do proletariado em ciasse dominante», pela«conquista da
democracia», tal é a resposta do Manifesto Comunista». (Estado o RevoluçSo, pag.
61)
Muito bem. Veiamos agora o período final do desenvolvimento democrático: o
período que vai da destruição do Estado burguês até o advento do comunismo. Ao
destruir a máquina de repressão dos capitalistas, o proletariado precisará montar
uma outra, agora para reprimir os burgueses, os parasitas. Entretanto, este novo
Estado é fundamentalmente diferente do anterior, já « é a maioria da população que
te dito*. Pois ele nlo é mais um«poder especial * de repressão, montado à margem
das massas, nSo reprime a maioria, mad a minoria, «é a maioria da população que
reprime, ela mesma, seus opressores», diretamente. Assim, «o Estado começa a
se ektlngutr», pois « a própria maioria pode cumprir diretamente estas tarefas, e
auanto mala as funçSes do poder estatal safam exercidas pelo povo em seu

74
conjunto, menos esse poúer se torne necessário. • (Estado e fíevo/uçio, paçdüf
Eis portanto como estão profundaménte equivocados aqueles que pretendem
dar o salto de qualidade omitindo-se de preparar o terreno para ele, isto é, entre
outras coisas, sem levantar «consignas democráticas ainda no capitalismo».
A « conquista da democracia *, levar a luta democrática até o fim, nSo é portanto
uma questão periférica da luta pelo socialismo. Pelo contrário, ela constitui a
questão poHtlce essencial e decisiva da revolução social. Pelo que substituir o
Estado burguês? lenln afirma *,..pela organlzaçío do proletariado em classe
dominante» , pela conquista da democracia, tal é a resposta do Manifesto
Comunista* (Estado e Revolução, pag. 61)
Multo bepi. Vejamos agora o período final do desenvolvimento democrático: o
período que vai da destrução do Estado burguês até o advento do comunismo. Ao
destruira máquina de repressão dos capitalista, o proletariado precisará montar
uma outra, agora para reprimir os burgueses, os parasitas. Entretanto, este noéo
Estado i fundamentalmente diferente do anterior, já «nSo é mais um Estado
propriamente dito». Pois ele n5o é mais um «poder especial» de repressão,
montado à margem das massas, nSo reprime a maioria, mas a minoria, «é a maioria
da população que reprime, ela mesma, seus opressores», diretamente. Assim, «o
Estado começa a se extinguir», pois «a própria maioria pode cumprir diretamente
estas tarefas, e quanto mais as funç5es de poder estatal sejam exercidas pelo povo
em seu conjunto, menos esse poder se torna necessário *. ( Eefí, 03)
Entretanto, apesar de tardado um salto à frente, a democracia nSo é ainda total,
hío só poroue as antigas classes dominantes sSb excluídas delas, como também
porque a totalidade das masaas só assumem toda» as tarefas ae tetaao apos um
ceno período de desenvolvimento oa democracia sob o Estado Proletário. Mas, à
medida que a resistência política, eco nó moca e Ideológica dos capitalistas vá
sendo definltivamente quebrada, à medida que os capitalistas desapareçam a não
hata mais classes. entflo o respeito aos princípios democráticos aerais será cada
vez mais cumpieto e total na sociedade, pois serão cada vez menores os setores da
sociedade Draslfeira uesntuidos ue> uireitos e será cada vez mais ampra a
participação das massas em todas as questões de Estado. Na meaida em que as
classes se extkiguam, isto é, na medida em que se avance para o comunismo,
entSo a democracia se toma cada vez mais geral, e exatamente por Isso, começa a
nffo haver mais necessidade dela. Pois como vimos, a democracia é uma forma de
Estado, de dominaçAo pela violência de uma classe por outra, e na medida em que
as classes se extlnguam, nSo há mais necessidade de Estado.
«Só o comunismo 6 capaz de oferecer uma democracia realmente completa e,
quanto mais ela se torna completa, mais depressa se fornsró supérflua e se
extinguirà por si mesma». ( Estado e Revolução, 113)
«Nós nSo esperamos o advento de uma ordem social em que o principio da
submissSo da minoria à maioria nSo seja observado. Mas aspirando ao socialismo*
estamos convencidos de que, em sua evoiuçSo, e/e terminará pelo comunismo e
que por conseguinte, desaparecerá roda necessidade de recorrer em geral â
violência contra os homens, à submissão de um homem a outro, do uma parte da
poputaçSo a outra, pois os homens se habituarão a observar as condiçOes
elementares da vida em sociedade, sem violência e ssm submissão» ( Estado e
Revolução. 105)

ra
Vejamos assim o respeito cada vez mais amplo e efetivo aos princípios
democráticos gerais, a igualdade entre todos os cidadffes, avança na medida em
que a burguesia seja afastada e suprimida e em que a sociedade avance para o
comunismo; e mais, que essa igualdade e essa democracia aó podem avançar na
medida em que se avance o comunismo. E por isso que quando os liberais, os
ex-socialistas como Kautsky e os doutrinarístas pretendem que a exclusSo dos
burgueses da democracia seja uma negaçlo dos princípios democráticos gerais,
eles estSo completamente equivocados pois o respeito a esses princípios
e a íncorporaçSo de parcelas cada vez maiores da populacflo nas tarefas de Estado,
só pode avançar justamente na medida em que a burguesia seja reprimida e
destruída enquanto elaaae.
Se a liberdade da burquesia 6 «também» respeitada, isso evidentemente nflò
acarreta o aumento do nivei aemocrâtico geral da sociadaoe, masa sua diminuição,
pois do antagonismo dos interésses de classe resulta que o respeito à liberdade
dessa minoria implica necessariamente no desrespeito à liberdades aos direitos da
maioria.
Assim, a palavra de ordem geral «pelas liberdades democráticas» tem que ser
levantada pelo proletariado justameme porque rtlo se refere apenas a esta ou
àquela lasa da luta, mas poque representa uma poslç2o de principio do proletariado
lutar pulo avanço da democracia seja na sociedade burguesa, seja na proierária
pois «O proletariaao se nSo for educado na luta peta democracia proletária,
i Incapaz de realizar uma revoluçSo econômica ». Lutar pela democracia proletária
pela ditadura do proletariado implica também, e necessariamente, em lutar oor
avanços democráticos ainda no terreno da sociedade burguesa. O sentido exato
que damos a essa luta,, a sua dislinçSo das deformaçOes com que as demais
classes a concebem (ou combatem), evidentemente nSo ficará facilitado se
abrimos mSo da expre88Bo« democracia *,ou através do «método «doutrinarlsta. O
sentido exato dessa palavra de ordem geral se tornará cada vez mais claro para as
massas porque ela n8o será encaminhada isoladamente, mas em combinaçSo com
todas as palavras de ordem táticas especificas que apontam o caminho concreto
que leva o movimento a avançar no sentido que interessa ao prolelariado e nSo a
outro, em combinação com o esclarecimento de «rodas as manifestações da vida
Intelectual, moral e política da cada uma das classes sociais» (Que Fazer?), em
combinaçSo com a defesa e a propaganda de todas as demais questSes gerais e
especificas do socialismo. Como disse Lènin:
n Desenvolver a democracia até o fim, procurar as formas desse desenvolvlmen-
to. submetê-lo à prova da prática, etc, nisto consiste umadas tarefas essenciais da
luta pela revoluçSo soera/. Tomado à parte, o democratismo, qualquer que seja. nBo
dará o socialismo; mas na vida real o democratismo nSo serà«tomado a parte», ele
será •tomado no conjunto», exercerá igualmente uma influência sobre a
economia, estimulara sua transformação; sotreraa influência sobre a economia,
econômico, etc. Tal è a dialética da história vrva»( Estado e RevoluçSo, 101)
Além disso, colocar na ordem do dia o problema democrático geral é
particularmente importante quanoo vivemos sob a mais descarada ditadura
burguesa, justamente para desgastar a burguesia, favorecer a penetraçSo das
idéias socialistas e a vitória das lutas parciais nesse sentido.
Assumir a democracia é compreender que a revoluçSo sociai nSo pode ser obra
de um punhado de intelectuais, mas sòmente poderá ser levado a cabo se for
re
assumida pelas massas; significa de nossa parte assumir o mais completo
compromisso com as massas. Mas o Individualismo pequeno-burguês doa
doutrinaristas nSo lhes permite assumir esse compromisso. Por Isso, quanao
colocados diante do problema da democracia, os doutrinaristas Infelizmente
preferem fafsear a discussSo, aferrar-sea mais obstinada ignorância do assunto e
reagir com escapismos deste gênero:
- Em nome das «lutas políticas» tais setores acharam por bem lutar pela
democracia burguesa (...). E sempre em nome da «política os oportunistas
consideram que n3o levantar bandeiras democráticas è abstençBo diante da
realidade, é ficar no propagandísmo. » ( Marxismo Militante, 32)
« O MR8 e a APML mastigam muito mal os textos de Lênin, de onde querem
forçosamente extrair argumentos para a postura graduatista de lutar agora peia
democracia e sô cfepors lutar pelas metas mais avançadas.» ( MM, pag. 49)
• Daniel Terra, cujo idealismo é capai da chegar (momentaneamente, é claro) à$
culminAncias da autoconsclência, (1) afirmou em aeu documento: • ainda que
façamos entre as massas a mais persistente propaganda do socialismo, ainda
assim as liberdades políticas conquistadas agora s 8o basicamente burguesas». Al
esfá a política dos democratistas: no plano da luta real, liberdades burguesas,
quanto ao socialismo. ..uma persistente propaganda». (MM, pag. 55)
E esta tao formidável conclusão custou aos doutrinaristas apenas duas
pequenas operações: «esquecer» que a luta pelo socialismo, no plano «político*,
éatuta pela «conquista da democracia»; e confundira luta «por» um detarminado
objetivo com o atingimento desse objetivo.
Reafmenie. o proletariado precisa conquistar a democracia, a ditadura do
proletariado, para através dela proceder è sua revolução econômica, isto é, à
abolição da propriedade privada dos meios de produção. Portanto, se a luta pela
democracia, na qual segundo MM, temos desperdiçado nossa «energia da
combatentes*, é apartada da luta oolttica pelo socialiamo. entlo realmente se
conseguirá ver pouca coisa em nossa política além da propaganda... Por outro
lado, é evidente (para os comunistas) que não se conquistará socialismo algum
antes da tomada do poder, que toda liberdade política conquistada sob o período
dedominação do Estado burguêsôuma liberdade burguesa. Isto não significa què
a conquista deste ou daquele direito seja o obletivo principal da luta democrática e
socialista, pois quando participam oe qualquer luta parcial, a preocupação central
dos comunistasé sempre fazer avançar o nível de consciência e organização revolu
cionêria das massas. Nesse sentido eles organizam uma série de lutas e
manifestações de protesto contra as medidas de opreêsão do Estado burguês - no
caso a D.M» - que nBo conduzem de Imediato a conquista do poder direto, mas que
cumprem um papel fundamentai no desenvolviníento dessa consciência e dessa
organização, além de colocarem um obstáculo a determinado avanço da reaçSo.
Para projetar sobre nós o seu propagandísmo e encobrir que nossa referência a
propaganda entra af como um aspecto entre outros do trabalho revolucionário, os
doutrinaristas tiveram o cuidado de mutilà-la em vários trechos e omitir a parle
Inicial da frase que dizia:
«Por isso, ainda que a perspectiva s**undo a qual denunciamos e lutamos contra
a ditadura se/a uma perspectiva proletária, a/ncfa façamos entre as massasá nia/a
n
persistente propaganda de socialismo, ainda assim, as liberdades políticas que
elas eletiva mente ampliarão e conquistarão agora (imprensa, organjzaçào, etc),
são liberdades políticas limitadas e bàsicamente bnrauosas. lá qua nao coexistem
com • dominação burguesa. NBo se trata pois que o nlvai político da * luta real» dos
comunistas a cada momento se reduza â conquista de «liberdades» (direitos),
trata-se de deixar claro que qualquer liberdade ampliada ou conquistada hoie é
burguesa, por maior que seia a consciência socialista atingida pelas massas e por
mais avançadas, independentes ou ilegais que sejam as formas de luta e
organização assumidas pelo seu movimento.
Mas é soflsma dos mais tristes e infelizes pretender que pelo fato da luta não ter
ainda atinoido seu objetivo final, o socialismo, ela nSo vise nbietivos. D*is a
finalidade dos passos que damos agora aos obletivos finais pode ser avauaaa « n8o
de forma retórica, petas palavras «de ordem » sorras no tempo e no espaço, pelo
proselitismo vazio, mas pela escolha acertada de alvos e objetivos, pelo caráter da»
denúncias e direcionamento concreto que imprimimos ao movimento»(Contra o
Doutrinari9mo)
E tund.amentalmenteoAia escolha dos alvos ©objetivos a serem atingidos a cada
momento, peias reivindicações e denúncias concretas «baseada* «m rato* *
acontecimentos políticos concretos, e ademais, atuais» relativas a todas as
classes da populaçao, pelo direcionamento, pelas formas de lutae organização que
orooõe a carta momento, é pelo cumprimento o1* nSo destes princípios aue os
revolucionários ^demonstram coerôncta ou mcoerencia com seus objetivos
estratégicos. Não há outro critério.
Mas os doutrlnaristas, ao Invés de assumir claramente tudo Isto, preferem
colocar dúvidas em que toda liberdade política que se avançe agora, por mais danos
que traga á burguesia, seja uma liberdade burguesa. Até hoje, encobrir esse fato
era exclusividade e características dos oportunistas. Mas graças à «atualizaçao»
da teoria promovida à moda doa doutrlnaristas, Isso passou a ser a essência do seu
«combate ao oportunismo»! Certamente, todos os oportunistas aguardarão
ansiosos o desenvolvimento de tao providencial «teoria»...
Já que as « bandeiras democráticas * devem ser proacrltas, quais serão então as
bandeiras táticas que devemos levantar hoj*? Nit página 50 de Marxismo Militante
encontramos sua «alternativa»;
« Uma plataforma de lutas hoje tem que conter a palavra de ordem contra o arrocho
salarial, pelo direito de greve, peto sindicato Hvro.e peta liberdade de organizaçao e
manifestação para a c/asse operária*.

Evidentementel Mas perguntamos: Que tipo de liberdades são estas? Ainda que
os doutrlnaristas repitam deavêzes «para 09 operários» depq is de cada uma delas,
qualquer aprendiz de comunismo, lhes explicará que Isso é muito pouco para que
elas deixem de ser liberdades, democráticas burguesas.
Finalmente, se todos os avanços democráticos conquistados agora só podem
estar dentro dos marcos burgueses, Isso nao significa que estejamos lutando«pela
democracia burguesa». Incapazes de esclarecer, os, doutrlnaristas preferem fazer
uma afirmação suficientemente ambígua que lhes permita embrulhar a questão.
Em primeiro lugar, porque a democracia burguesa, ainda que submetida à
ditadura burguesa, já está presente em nosso pais. Em spgundo lugar, vejamos; a
democracia burauesaó, por pm lado, um Estado, é a dominação da burguesia: onr
outro lado, ela implica em determinado nível de direitos e liberdades democráticas.
A burguesia interessa manter essas liberdades dentro de limites que nãó ameacem
sua dominação; ao proletariado interessa ampliar essas liberdades até um nível
que justa.mente ameace e ajude a destruir o Estado burguês. Ao proletariado nSo
pode portanto interessar lutar pelos dois apectos da democracia burguesa;
interessa ampliar um dos aspectos da democracia burguesa, Isto é, as suas
liberdades democráticas para «aproveitar» este aspecto contra o outro, contra a
dominação burguesa. «Ampliar» essas liberdades no sentido efetivamente
democrático, isto é, aumentando os direitos das massas e dificultando a livre
movimentação da burguesia.

A base da «rejeição» da democracia pela PO e por outros doutrinaristas 6 a na


insegurança diante da democracia burguesa. Essa insegurança os leva a se
refugiarem na propaganda dos princípios gerais e na luta econômica, e a se
absterem de colocar quaisquer palavras de ordem políticas que não representem a
superação Imediata da democracia burguesa. Com isso, atuam no sentido de
emperrar e boicotar o desenvolvimento da consciência e da organizaçao do
proletariado, pois este não pode atingir a consciência de ciasse únicamente através
da luta econômica e da propaganda geral, tsso os leva frequentemente a uma
posição reacionana sempre que o movimento ameaça sair dos marcos econômicos
e avançar no político, mas avançar comjtodaa as limitações de quem até à pouco
travava apenas as I utas econôm Icas ou não travava Iuta nenhuma. Os doutrinaristas
imediatamente rotulam esses movimentos expontâneos de «populistas», «burgue-
ses», etceapontam contra eles as pequeninas lanças do pedantismo pseudo-inte-
lectual. Assim, Incapazes de compreender que as massas só ganham consciência
de classe através de sua própria experiência - direcionada peta vanguarda - os
doutrinaristas concebem um tipo de refação entre «vanguarda» e massas que é
prolundamente equivocado, professoral e anti-democrático.
Eles evidentemente não gostam de reconhecer essas coisas e asseguram que
combatem apenas a democracia burguesa- Para demonstrá-lo, se apoiam em uma
colocação de Lenin em que ele ironiza Kautsky, porque este, como todo liberal, a
pretexto de defender os princípios democráticos gerais, na verdade, defendia a
demçcracla burguesa contra a ditadura do proletariado:
«Porque só um sorriso 6 o que provoca o afã de Kautsky de apresentar as coisas
como se houvesse gentes que predicassem «o desprezo à democracia», etc.
Kautsky se vê obrigado a obscurecer e embrulhar o problema com asneiras como
esta, porque o coloca de modo liberal, sobre a democracia em gerei e não sobre a
democracia burguesa».
ftealmente, quando o ex-sociallsta Kautsky «vê».em Lenin desprezo pela
democracia, ele está apenas^obscurecendo a questão. Mas quando Lenfnvê em
certas pessoas a capitulação da defesa da democracia, em geral, ele epta
apontando exatamente o mesmo tipo de problema que nós apontamos nos
,'iqui4Kçion1etas;. .... . , .

4*
« P. Kievsky fica multo aborrecido quando se observa que se deixou intimidar,
que se deixou levar até a negação da democracia em geral. Zanga-se e repJIca:«não
estou de modo algum contra a democracia, mas apenas contra uma reivindicação
democrática que considero má*. Mas por multo que P. Kievsky se zangue, por
muito que nos garanta (e talvez o garanta a si mesmo) as suas considerações - ou
mais concretamente os seus erros constantes nas considerações - demonstram o
contrário. (Resposta a P. Kievsky)
A mesma coisa se ô obrigado a_pensar de quem, vivendo sob a mais famigerada
ditadura burguesa, consegue não perceber a importância da luta democrática da
classe operária, dos trabalhadores e do povo.
III. 0 GOVERNO REVOLUCIONÁRIO DOS TRABALHADORES E AS LIBERDA-
DES DEMOCRÁTICAS
Pode acontecer que no desenvolvimento de sua luta, o proletariado modifique a
correlação de forças em um nível tal que a burguesia não consiga rrrais organizar um
governo que se imponha ao conjunto da socledadjB. E, entretanto, o proletariado
poderá não ter ainda superado todas as concepções burguesas e principalmente
pequeno burguesas que tenham sido difundidas em seu seio. Neste caso, apesar
da burguesia não conseguir organizar um governo seu, o proletariado poderá
também nao conseguir organizar de Imediato sua ditadura de classe. E essa
necessârlamente toda uma situação de crise e instabilidade, que mais cedo ou
mais tarde se resolverá em favor de uma ou outra das classes antagônicas. A III
Internacional, ainda em vida de Lenln, considerou que em situações como essa
seria útil a constituição de um o governo operário» que, apesar de nao ser ainda a
ditadura do proletariado, seria um importante Instrumento que impulsionasse e
radicalizasse a luta de classes, criando melhores condições para a conquista desse
objetivo.
Nao é possível, com multa antecedência, prevêr quais seriam exatamente cada
uma das formas de lutae organização que em combinação com outros aspectos de
conjuntura, provocariam uma situaçao assim e Inclusive, prevêr se ela efetivam ente
se colocará em cada caso concreto; mas, em geral «um governo dásse tipo só ê
possível se surge da lula de massas, se se apoia em organizações operárias sptas
para o combate e criados pelos mais vastos setores das massas operárias
oprimidas ». Seu«programa mais elementar deve consistirem armar o proletariado,
em desarmar as organizações burguesas contra-revolucionàrlas, em instaurar o
controle da produção, em fazer recair sôbre os ricos o peso maior dos Impostos e
em destruir a resistência da burguesia contra-revolucionària*.
A ffl Internacional definia também que o Governo Operário deveria ser empregado
«e
«em fodas as partes com palavra de ordpm de propaganda geral», mas que «como
palavra de ordem de polltlcs atualL o governo operário adquire uma maior
importância nos países onde a situação da sociedade burguesa é particularmente
insegura, onde a relação de forças entre os partidos operários e a burguesia coloca
a solução do problema do governo operário na ordem do d/a como uma necessidade
política» (ResotuçCes do IV Congresso)
Será que a aflrmaçao de que o governo operário é uma palavra de ordem de
propaganda geral válida em todas as partes terfa deixado de ser correta para o Brasil
de hoje? Há companheiros_que tèm essa opinião, o em particular alguns
consideram que essa afirmação teria validade quando as contradições In ter Impe-
rialistas, sendo mais intensas, criavam brechas mais importantes, mas que hoje a
integração imperialista já não permite um recurso tático como o governo operário.
E uma discussão. Entretanto, nossa posição dentro dela ó de que o imperialismo
está muito mais debilitado hoje do que há 50 anos atrás, e que suas contradições
continuam não sendo tao desprezíveis assim. E de qualquer forma, o governo
operário depende fundamental mente da correlação de forças entre o proletariado e
a burguesia dentro de cada pala. Assim sendo, não encontramos razões que
justifiquem o abandono da idéia do governo operário.
Mas é fuhdamental deixar claro que o governo revolucionário dos trabalhadores
não deve ser confundido com o objetivo estratégico da atual etapa da revolução. O
objetivo estratégico se refere à questão fundamental que caracteriza a superação
das relaçSes estruturais de classe que predominam em cada etapa da revolução.
A revolução brasileiraé socialista, logo seu objetivo político estratégico só pode
ser a ditadura do proletariado. O governo operário será ainda um recurso tático
quepoderàiou não) ser utilizado em uma conjuntura mais avançada para acelerar a
lutade classes. Isso quer dizer que o alvo de nossa direção estratégica é desde já a
ditadura do proletariado, e, se no caminho, colocar-se uma situaçao que permita a
utilização do governo operário, nós o empregaremos como um recurso a mais para
o atlngimento do nosso objetivo. Deslocar o alvo estratégico para o governo
operário significa desde hoje modlllcar a dlreçfo estratégica e, portanto, as
prioridades táticas que estabeleceremos em cada conjuntura, comprometendo
assim o atingimento da ditadura do proletariado, inclusive porque o caminho
estratégico não necessâriamente passa pelo governo operário. Como afirmava a
Internacional ao distinguir governos operários revolucionários de governos
reformistas:
«Os outros dois tipos de governos operários (com par/icipaçSo dos comunistas
ou «encarnado por um partido comunista»- parêntese nosso) nos quais podem
participas os comunistas, tampouco s8o a ditadura do proletariado, nem
constituem uma forma de tranelçffo necessária para a ditadura, mas podem ser um
ponto de partida para a conquista dessa ditadura»
Analisemos agora a seguinte passagem do MEP, que, entra outras, nos è
dedicada em sua Tese sobre a Tática:
•íOufros companheiros da esquerda proletária consideram a luta por uma
alternativa revolucionária á ditadura como radical demais para o momento. £
passam a acreditar que é do Interesse dos trabalhadores opor à ditadura um
programa democrático ou a tute petas liberdades democráticas h
Exatamente como a PO, o MEP pretende que as liberdades democráticas estejam
em contradição com a ditadura do proletariado ou com o QRT. NSo compreende
qué b objetivo da ditadura proletária ó garantir a mais ampla participação
democrática para os operários e para o povo, e que do ponto de vista geral as
liberdades democráticas sob a ditadura do. proletariado sSo multo'«mais
democráticas» e muito mais amplas do que as existentes sob a democracia.
burguesa, isto é, sob à ditadura da minoria. E que o Governo Revolucionário dos
Trabalhadores é também um passo importante nesse sentido. Mas concentremos

81
nos por enquanto na primeira frase do trecho citado. O que se faz af ê embaralhar
duas ordens distintas de problemas, obscurecendo e Invertendo nossas reais
posiçCes a respeito da luta contra a ditadura. O que realmente afirmamos que nâo
estâ na ordem do dia é a derrubada pròpriamente dita da ditadura, cabendo no
momento acumular forças na luta contra ela, para que possamos no momento
oportuno jogâ-la por terra. Isto é, como Já vimos, o GRT é hoje uma palavra de
ordem de propaganda geral», e n9o «de política atual» no sentido de uma
«necessidade política» imediata. E inclusive, o MEP nffo pode estar discordando
de nós a esse respeito, pois afirma - e disso somos nós que divergimos totalmente -
que «não há condlçSes para a luta política das massas contra a ditadura» {Tese
sobre a Tática, pag 47). Portanto, o MEP só podería considerara luta pelo GRT
como uma «palavra de ordem de política atual» se nfio considerasse sua
constituição uma questSo política e que depende do seu assumimento pelas
massas - hipótese que nos parece bem pouco provável... Mas se nSo temos
nenhuma pretensSo de considerara derrubada da ditadura e a.constituiçSode uma
alternativa revolucionária à ela enquanto questCes políticas Imediatas, por outro
(ado, enquanto comunistas lutamos desde (á por esses objetivos quando
denunciamos a ditadura, o caráter de classe dos Interesses que ela defende,
quando estimulamos as massas a resistirem a esse regime e quando difundimos a
perspectiva da ditadura do proletariado e do governo revolucionário dos
trabalhadores. Embaralhando estas duas ordens de problemas, o MEP a partir dai
esforça-se em apresentar de forma Invertida nossas respectivas posições a respeito
da lula contra a ditadura, pois quem tem se caracterizado por negá-la,
amesquinhá-la, reduzi-la aos limites mais estreitos, restringindo o trabalho às
«parcelas avançadas * e à luta econômica sflo exatamente os que nSo conseguiram
superar seu doutrinarismo, e que hoje em funçSo disto incapacitam-se para o
trabalho de massas e concluem Que hoie « nSo há condições para a luta política de
massas». Para quem parte desta ultima premissa, a «Juta por uma alternativa
proletária à ditadura» se restringirá inevitavelmente, no plano político, á propagan-
da e à organlzaçSo junto aos setores avançados. Ora, esse nível da nossa
luta por uma alternativa revolucionária é possível sempre. O que se trate é
Ju eta mente de nVo noe restringirmos e ets. Trata-se de além da luta econômica e da
propaganda nSo só do Governo Revolucionário dos Trabalhadores, mas também,
da ditadura do proletariado e do socialismo, sabermos organizar também a nível
ilegal e legal, denúncias políticas do regime, denúncias que, com base em fatos
atuais, coloquem em evidência para as massas, cada vez mais, todos os
desrespeitos aos seus interesses e direitos, de forma a estimulâ-las a resitirem a
cada manifestaçflo concreta dessas arbitrariedades (legais ou Ilegais), desenvol-
vendo sua consciência eorganlzaçflo, acumulando forças no sentido da alternativa
à ditadura. Mas è evidente que nem todo o conjunto da massa que participa em cada
caso concreto dessa resistência terá, desde o inicio, clareza a respeito do desfêcho
dessa luta, por mais que nos esforcemos nesse sentido.
Quanto a considerà-los «muito radicais» o MEP estâ enganado. Como se acaba
de ver, nós consideramos que seu «radicalismo» 6 meramente formal, considera-
mos que sua política - que elege o «trabalho de oposição sindical» como sua tarefa
principal e levanta uma plataforma de lutas quase que exclusivamente sindical - é
economicista, atrasando e entravando o desenvolvimento político dos setores sob
sua Influência. Nós voltaremos a isso mais A frente; retomemos agora o trecho da
Tese sobre a Tática:
«Sem dúvida que os trabalhadoras aspiram por «liberdades democráticas», que
a pequena burguesia também deseja«liberdades democráticas » e que também os
setores descontentes da burguesia querem «liberdades democráticas» e que
mesmo a ditadura se diz defensora da «democracia * e das «liberdades
democráf/cas». Todo o problema reside em definira democracia que Interessa a
cada classe ou a cada setor da sociedade. Na sociedade brasileira, que já passou
pela experiência da democracia burguesa e passa agora pela experiência da
ditadura aberta, falar de «liberdades democráticas * como se fosse urna palavra
mágica, tão radicai, agradável ao ou v/do de todos, é querer ocultar o caráter da
atual etapa da luta de classes, 6 querer transportar para o proletariado os ideais
democráticos da pequena burguesia, Ideais que vem da revolução burguesa e que
na fase do capital monopolista passam a servir òs ilusões da pequena burguesia.
Todos podem então concordar com a$ « liberdades democráticas»e nõo devemos
ter nenhum preconceito em relação a elas. A questão é então política. Ao ocultar o
ponto de vista das diversas classes, classes opressoras e classes oprimidas, seu
significado permanecerá vazio. £ na sociedade burguesa, na fase da revolução
socialista, da luta pela derrubada do poder burguês, e da conquista pêlo
pro/efar/ado pela completa liberdade política, mesmo frente à fraqueza do
proletariado e mesmo frente ao regime ditatorial, a reivindicação de • liberdades
democrôticas» por ser uma reivindicação vazia, agradàvei a todos, ela terà um
sentido burguês, ela cobertarà os Interesses da burguesia ou os ideais de classe da
pequena burguesia...»
«Devemos nos opor ás alternativas que ligam reivindicações particulares do
movimento operário e do movimento estudantil, como melhorias salariais, direito
de greve, fim do 477. etc, a reivindicações de política geral como liberdades
democráticas, revogação do Al-5, eleições tivres, anistia geral, etc. Mesmo que
uma destas reivindicações de política geral possa ser encampada pela luta dos
trabalhadores, em seu conjunto não representam os interesses da classe do
proletariado e as necessidades do desenvolvimento social».
O MEP tem a inacreditável pretensão de que defendemos as liberdades
democráticas porque as consideramos uma palavra de ordem «agradável a todos os
ouvidos». Está equivocado. O proletariado é sempre a classe mais radicalmente
democrática porque isto lhe interessa o é indispensável ao seu desenvolvimento
político. Masquem não chegou ainda a umaconclusSoscbreseademocraciaáou
não uma «palavra vazia e agradável a todos» é o próprio MEP. Quando faz a
aflrmaçSo acima, critica nossa suposta intensflo de «falar de «liberdades
democráticas» como se tosse uma palavra agradável ao ouvido de todos».
Conclui-se então que para o MEP a expressão nfio tem essa propriedade mágica.
Entretanto, algumas linhas mais abaixo, condena a reivindicação por«liberdades
democráticas»já porque ela «é» uma reivindicação «agradável a todos ».., Como se
vé, os camaradas não discutem senão consigo mesmo.
LenIn combatia os oportunistas porque estes, sob pretexto de defenderem a
democracia, na verdade defendiam democracia para a burguesia, isto ô, na verdade
combatjam a democracia. Ele demonstrou que a democracia só seria verdadeira se
defendida para os explorados, para os oprimidos, para a maioria. Demonstrou que
as demais classes • e ainda mais « na atual etapa da revolução» - nõo faziam senão
demagogia sobre a democracia. Eie Jamais pretendeu que por Isso os comunistas -

at
hH
seja em que fase da Juta estiverem - abandonassem a bandeira da democracia, o
que seria uma ajuda aos oportunistas e à burguesia, mas que a defendessem em
seu sentido verdadeiro.
Alèm disso ele deixou claro que os comunistas nSo lutam pela democracia
apenas no aentido estratégico, isto é, pelo socialismo, mas que, no interesse de
•atingir eB$e objetivo, eles defendem também a máxima ampliaçSo das liberdades
democráticas burguesas, de forma a favorecer o desenvolvimento da consciência e
da organlzaçSo socialistas do proletariado. Essa luta, ainda que nSo conduza dt
imediato à democracia proletária, é verdadeiramente democrática porque amplia a
margem de liberdade para o proletariado e o povo existente na sociedade burguesa
e favorece o atinglmento da democracia proletária.
Uma verdadelia luta pelo desenvolvimento das liberdades democràt icas tem esse
significado preciso, nSo pode ter nenhum outro, e é sempre uma questSo de
principio para o proletariado, tanto no capitalismo como no socialismo.
NSo há dúvida que a Idéia da democracia ô de uma legitimidade tSo elementar que
todos querem passar por democratas, por vaidadtlroa democratas. Curioso é que o
MEP, a partir dal, ao invés de concluir que deve denunciar o caráter falsificado ou
conciliador de qualquer defesa nSo proletária da democracia, demonstrando cada
vez mais que o proletariado é a única cl asse democrática até o f Im, prefere abrir m8o
das bándeíras democráticas, entregá-las graciosamente à burguesia e a ajudar a
aumentara confusSo que todas as classes nSo revolucionárias tem interesse em
fazer sobre a democracia. E claro que todos querem «democracia» para si,
liberdades e direitos para si, mas já vimos que isto nSo é luta verdadeiramente
democrática, isso é domlnaçSo da minoria (burguesia); é conciilaçSo de classes
(pequena burguesia), e nSo favorece a luta pela eletiva domlnaçlo da maioria.
Nossa obrigação de comunistas é esclarecer o sentido objetivo da luta democrática
e não ajudar a reaçBo a obscurecer a questSo.
Nós jà vlmõs que as expressões «liberdades democráticas», «lutas democràtl-
caa» embora tenham um significado objetivo, nSo são capazes por sl só de
expilcltá-lo ao nível da massa. Mas já vimos também que eias n9o serflo defendidas
por sl só, mas em combinação com todas as denúncias e reivindicações concretas
das quais a bandeira das liberdades democráticas serve como pano de fundo.
O que ocorre n8o é que nós deixemos de explicitar a cada momento o ponto de
vfsta operário sobre aa lutas democráticas - nem muito menos que «deixemos de
levantar as bandeiras conçretas e especificas que Interessam ao proletariado» •
mas exatamentè que o MEP se recusa a fazê-lo, se recusa a assumir as denúncias
políticas a nível de massa («nSo há condições»), preferindo repetir as «vulgares
zombarias burguesas a respeito da democracia». «Todas as classes falam em
democracia, entSo de que adianta falar nela?» E esta a essência dos desvios
iiquldaclonlstas dos companheiros do MEP, a essência de sua fuga à luta
democrática.
Se a recusa á defesa das iutaa democráticas è incorreta quando se baseia no
«argumento»de que as liberdades democráticas sBo Mima palavra vazia», ela será
entretanto duplamente Incorreta quando através dessa recusa se pretender negar a
validade de reivindicar hoje liberdades democráticas burguesas. Jà vimos que a
democracia não deixa de avançar pelo fato de continuar ainda nos marcos
burgueses. O MEP repete aqui todos os lamentáveis equívocos da PO. A defesa de
liberdades democráticas «na fase do capital monopolista passam a Servir às
ilusões da pequena-burguesia»... «na sociedade burguesa na fase da révóluçSo
socialista...a reivindicação de liberdades democráticas.., terá um sentido burguês,
ela acobertará os Interesses da burguesia». Al está: na fase do capital
monopolista, da revolução socialista, não Interessa ao proletariado lutar por
direitos democráticos desde a sociedade burguesa.
Essa fuga ás lutas democráticas ainda nos marcos do capitalismo fica clara
quando se nega a ligação de reivindicações particulares como direito de greve, 1 Im
do 477, etc, a «reivindicações de política geral como liberdades democráticas,
revogação do AI-5, e/erções livres, anistia geral, etc». O MEP considera que «ainda
que uma delas (qual?) possa sar encampada pela luta doa trabalhadores elas em
seu conjunto não representam o interesse de classe do proletariado».
A formulação que o MEP usa é suficientemente ambígua para parecer que ele
defende apenas o óbvio, isto ô, que aquelas reivindicações de política geral não
representam o conjunto dos interesses táticos do proletariado, o que é evidente,
pois além destas existem outras gerais e especificas, comb as que defendemos em
nossa Plataforma de Resistência; e além disso, os interesses táticos do
proletariado nunca se restringem a um programa de reivindicações, qualquer que
seja. Mas o que o MEP está explicitamente afirmando é o inverso, Isto é, o conjunto
daquelas reivindicações gerais não interessa ao proletariado. Em outra passagem,
o MEP afirma que elas «podem ou não interessar à luta do proletariado, -
dependendo da interpretação que se faça delas ». E engano. Todas elas interesstyn ,
objetivamente ao proletariado. Essas reivindicações interessarão também parcial-
mente outras classes, e é também inevitável que elas façam demagogia e
abandonem as lutas. Abandonar, por exemplo, a luta contra o AI-5 e pelas
liberdades democráticas, além de significar renunciar à denúncia e à luta contra
Instrumentos que são absolutamente contrários aos Interesses dos trabalhadores,
slonlflca também deixar o campo livre às o posições burguesas e petiuen o-burgue-
sas para que envolvam o proletariado e o povo em sua política e nas concepções
que têm dessas lutas. Por outro lado, a experiência tem demonstrado que atuando
corretamente, a Esquerda Revolucionária pode arrebatar dos oportunistas, nessas
lutas, as parcelas mais importantes dos setores avançados que delas participam.
Há uma questão de fundo que merece ser vista aqui. Depois de ter se colocado
contràrloâ toda referènciaà democracia em geral, o MEP afirma que no Movimento
Estudantil eles defenderão determinadas reivindicações «que expressam a
natureza democrática de sua luta de resistência á ditadura» (Teses sobre a Tática,
pag46). Para quem negou com tanta insistência qualquer significado ao conceito
democrático geral, que sentido tem falar em natureza «democrática» de
determinada luta? Já que a democracia é uma palavra «vazia a o que é esse caráter
«democrático » da lutados estudantes? Porque justamente a lutados estudantes é
considerada «democrática»? Essa fragiantecontradição tem apenas uma explica-
ção: Na verdade, o MEP considera que o conceito «democracia» tem um
significado definido, que é identificado com o conceito pequeno-burguéa da
democracia. Pois nada justifica que uma natureza«democrática»seja atribuída em
especial á luta dos estudantes (em conjunto),, visto que a luta do proletariado é
democrática com multo mais razão. Essa Identificação da democracia com a
concepção pequeno-burguesa de democracia vê-se também no trecho;
«O fato de a natureza das lutas de resistência dos estudantes ser democrática,
em virtude de serem lutas de resistência política de um setor da pequena
burguesia...»
Mas a concepçSo pequeno burguesa da democracia também nSo realiza
efetivamente os princípios democráticos gerais, pois ela não defende a efetiva
dominação da maioria, mas a conciliação entre a maioria e a minoria, entre
explorados e exploradores, conciliação que corresponde a sua posição intermediá-
ria entre as classes que polarizam a sociedade e que em última instância Interessa à
burguesia, visto que implica na manutenção das clasaes. A pequena burguesia
(quando não é ganha pela perspectiva proletária) fantasia essa conciliação na forma
da democracia «em gerai»(no sentido de democracia para todos), desvinculada da
idéia de dominação, fantasias que, como temos visto, nada tem a ver com os
princípios democráticos gerais e que jamais se concretlzarSo enquanto a sociedade
estiver dividida em ciasses antagônicas. Vemos assim que quem identifica a
democracia com a democracia «em geral» no sentido pequeno burguês e liberal é
exatamente o MEP, e é por isso que ele considera que as liberdades democráticas
estejam em contradição com a «atual etapa da revolução», com a revolução
socialista, é por isso que não compreende que a ditadura do proletariado se
caracteriza justamente por garantir as liberdades democráticas mais amplas que a
sociedade jamais conheceu até então (e é exatamente para cumprir esse objetivo
que exerce a mais implacável ditadura sobre a minoria parasita).
A «democracia» burguesa, por que é na verdade a ditadura sobre a grande
maioria, tem a necessidade de mascarar esse fato através de uma série de ritos e
encenações que visam dar a impressão de que todos tem efetivamente os mesmos
direitos. A ditadura do proletariado, porque é efetivamente a dominação da
maioria, não tem nenhuma necessidade de mascarar a repressão exercida sobre a
minoria de exploradores. Pelo contrário, ela precisa ganhar as massas para a
compreensão da necessidade dessa repressão, pois no interesse de suprimir as
clasaes e o Estado, cada vez mais caberá exatamente às massas exercer essa
repressão. '
Essas caraterlsticas da«democracia » burguesae da democracia proletária levam
a que muitos considerem a aberta supressão da democracia para a burguesia na
ditadura do proletariado uma certa desfiguração, redução da democracia,
revelando uma compreensão pequeno-burguesa da democracia e não percebendo
que a «democracia» para todos nunca existiu, senão na hipocrisia burguesa e nas
fantasias pequeno-burguesas. E que quando a democracia tiver evoluído até a
liberdade para todos, então não precisaremos mais de nenhuma democracia, isto
é, de nenhuma dominação.
Não compreendendo que não1 há contradição entre definir determinados
objetivos estratégicos e levantar objetivos táticos que ainda não os realizam de
imediato, não Compreendendo que a ampliação das liberdades democráticas
burguesas não está em contradição com o atingí mento da ditadura do proletariado,
mas favorece esse atingimento - e que por isso devemos reivindicar essas
liberdades ac mesmo tempo que denunciamos suas ilmitaçfles, exatamente como
fazemos com qualquer objetivo tático - os doutrlnaristas se recusam a assumir as
«consignas democráticas ainda no capitalismo», tarefa indispensável na luta pelo
socialismo. Com isso minam o fôlego de sua política, e acabam rebaixando os
próprios objetivos estratégicos. Já vimos como a PO pretende que o Governo
Revolucionário dos Trabalhadores seja uma alternativa às liberdades democráticas
burguesas. Vejamos agora como o MEP assume explicitamente esse rebaixamen-
to:
« Para cada eiapa da revolução bè uma estratégia. Consequentemente, o objetivo
esfrarég/co trata da questão fundamental que caracteriza a superação ou a
desarticulação das relações que predominam na atual etapa da revolução.
0 nosso objetivo estratégico é alcançado quando a luta dos trabalhadores
conseguir derrubar a ditadura que serve à burguesia Impondo um governo
provisório revolucionário, capaz de assegurar antes de tudo a completa liberdade
política das c/asses trabalhadoras» (Resolução sobre o programa, pag 8}
Assim, segundo o MEP. o objetivo estratégico de uma revolução que ele
reconhece socialista, é o governo de translç8o e não a ditadura do proletariado, e o
governo de transiç3o, que não é ainda essa ditadura «abre o caminho para a
ditadura do proletariado » (pag 8) «assegura» a «completa» liberdade pollticadas
classes trabalhadoras!
Oobje^ ivo estratégico caracteriza o deslocamento da ciasse dominante, o que na
revoluçSo socialista sò se alcança pela ditadura do proletariado. Definir etapas
<isocialistas» alcançáveis por um governo provisório é incorrer exatamente no
populismoque os doutrinaristas tanto pretendem combater. Assim, recusando-se
a assumir elementos indispensáveis da tática, o MEP acaba comprometendo
lambem a estratégia, e a rigor nSo define nem uma coisa nem outra, mas um
«meio-termo» entre as duas; isto é, a sua vortio do Governo Revolucionário dos
Trabalhadores.
IV. LUTA POUTICA E LUTA ECONOMICA
Em sua Tese sobre a tática, o MEP faz as seguintes considerações;
«Para oufros o fator decisivo que atua para modificara correlação de /orças es/á no
/or/a/ec/menfo do se/or de «oposição» que representa a pequena burguesia
democrática» (...)
«Essa alternativa pequeno-burguesa, que consiste em tomar a democracia
geral como objetivo frente à ditadura, expressa a vontade da pequena burguesia
como classe em modificara correlação de /orças a seu favor, em se colocar acima
das classes paraconcifiar o proletariado com a burguês ia... Procura então canalizar
o descontentamento dos trabalhadores e de setores da pequena burguesia para o
fortalecimento da «oposição liberal» e mais particularmente para a sua ala
chamada «autêntica». o que na prática significa fomar os «autênticos» como a
vanguarda da luta de classes e o parlamento como o principal local de luta e
principal v/a de chegada ao poder.»
«Essa perspectiva pequeno-burguesa influencia até mesmo ietores da esquerda
proletária. Sob o pretexto de que a tuta democrática é o «centro tático », de que um
programa democrático (democrático em geraI) cuja expressão são as reivindica-
ções defendidas pelo grupo «autêntico » do MDB, é um objetivo rá//co. de que os
representantes políticos da pequena burguesia são a//ados do proletariado e que o
inimigo principal é a ditadura, etc, organizações como o MR8 e a AP por exemplo
deixam de lado um programa e alternativas que interessam ao proletariado na luta
contra a ditadura, para fortalecer as a/fernaf/vas e a unidade com os setores que
representam a pequena burguesia na «oposição liberal».
0 MEP quer dar a impressão de que sua divergência conosco se deve ao fato de

07
que deixaríamos «de fora» alguma reivindicação defendida por eles. Procura assim
inverter os fatos e escamotear nossa verdadeira divergência. Pois não se trata de
que nós deixemos de foraqualquer reivindicação assumida por eles, trata-se de que
eles se recusam a assumir toda e qualquer luta política a nível de massas e
restringem sua ação únicamente às lutas econômicas e à propaganda. E_ para
«justificar» sua omissão na defesa dos direitos democráticos, procuram então dar
a entender que essa defesa implica na adoção das desastrosas políticas de alianças
praticadas tradlclonalmente pelo reformlsmo em nosso pais. Há aqui também uma
inversão: N5o ocorre que nós defendamos uma política de alianças que
secundariza os interesses do proletariado, ocorre que o MEP ainda não conseguiu
«negar» esse tipo de aliança a não ser recusando-se a qualquer acordo com forças
políticas não proletárias. O queaexperiênciatem demonstrado, entretanto, é que o
oportunismo «de esquerda» não é um bom remédio contra o oportunismo de
direita.
Em relação às lutas democráticas, o MEP na verdade não faz mais do que
procurar nos atribuir a sua própria concepção dessas lutas. Pois os que
demonstram estar«influenciados» pela ideologia pequeno-burguesa que confun-
de democracia com conciliação de classes são exatamente aqueles que pretendem
- como pretende o MEP - que o desenvolvimento das lutas democráticas implique
necessàriamente, e em caráter «decisivo», no fortalecimento da pequena
burguesia. Pois apenas quem não consegue conceber uma ut ilização das eleições e
do parlamento diferente da burguesa e da oportunista pode pretender que essa
utilização implique necessariamente em considerar o parlamento como a
«principal via de chegada ao poder», E apenas quem tem uma visão reboqulsta das
frentes, acordos e.alianças pode pretender que um acordo relativo a aspectos
específicos da tática seja uma aliança sobre o conjunto da tática; e mais: que tal
acordo Implique em um endosso ao conjunto de proposições, perspectivas e
programas de cada participante dele.
Nós nSo discutiremos aqui a oportunidade ou nSo do voto em representantes
da pequena burguesia, pois para isso reservamos o capitulo 4. Apenas adianta-
remos que exatamente porque o parlamento nio á palco principal - nem tam-
pouco desprezível - da luta de classes, temos uma razão a mais para conside-
rar que os operários avançados, na medida que ainda n8o tenham conseguido
ter representantes seus nessa instituição, poderSo, sob certas condições e em
caráter acessório à sua luta extra-parlamentar, estabelecer acordos com os re-
presentantes da pequena burguesia, sem com isso comprometer seu esforço
por assumir o papei principal e dirigente da luta, mas pelo contrário, favore-
cendo esse esforço. Ao contrário do que afirma o MEP, apenas quem conside-
ra o parlamento como palco principal da luta de classes poderia pretender que
o voto nos autênticos Implique necessariamente em considerá-los os mais a-
vançados, nSo apenas de determinadas câmaras parlamentares, mas do con-
junto da luta de classes. Pois o voto nio representa necessariamente uma con-
cordância a um compromisso com o conjunto da política de quem •• elege, e
é perfeitamente compatível com a denúncia e o esclarecimento das ilusões e li-
mitações pequeno-burguesas do candidato.
Ainda que um certo crescimento da oposição pequeno-burguesa durante os
primeiros momentos da reanimação do movimento de massas seja Inevitável -
n3o porque tal movimento é democrático, mas porque ele não nasce «puro»
como desejariam os doutrlnaristas - esta nossa posIçHo, além de não reconhe-
cer nenhm papel «decisivo» na oposição pequeno-burguesa, nSo significa um

88
esforço no sentido de fortalecè-la perante o movimento de massas, mas sim.
no interesse deste, conceder a eia certo apoio perante e ditadura e perante a o-
posiçBo burguesa. Em relaçSo ao movimento de massas, consideramos que a
nossa posiçSo é a que permite neutralizar, mais amplamente o fortalecimento
conjuntural da o posição pequeno-burguesa e também, a que permite aos co-
munistas fortalecerem-se mala rapidamente do que ela. Pois, reconhecendo as
contribuiçOes que a oposlçSo peq.ueno-burguesa eventualmente possa dar à lu-
ta contra a ditadura e o poder burguês, os comunistas terão melhores condi-
ções de'aproximarem-se das massas e levá-las a perceber, entre outras coleas,
também.as vacilaçCes e conciliaçOes dessa oposição, as limitações da luta
parlamentar, e a necessidade de se concentrar esforços ns luta extra-parlamen-
tar, na atividade principal dos operários conscientes. Para evitar que o descon-
tentamento das massas seja «canalizado» para a oposlçSo burguesa, isto ó,
para evitar que esse descontentamento assuma uma perspectiva pequeno-bur-
guesa, nSo é necessário, nem possivel, negar a eia todo papel hoje, ó necessá-
rio demonstrar que esse papel, assim como o do parlamento, é secundário e
contraditório. (Como jâ afirmamos, retomaremos esta discussSo no capitulo 4).
O que'queremos enfatizar agora é que ainda que as alianças - determinadas
alianças - tenham sempre um papel, mesmo que secundário, na luta de clas-
ses, a defesa das lutas democráticas, entretanto, nlo decorre fundamental men-
te da necessidade de ae estabelecer alianças - e isto seja de que tipo forem es-
sas alianças. As lutas democráticas decorrem fundamental mente da própria ne-
cessidade do proletariado de quebrar o monoiitismo do poder burguês, de am-
pliar crescentemente sua capacidade úe expressão e organização, de conquis-
tar uma margem de manobras cada vez mais ampla para poder passar ao assal-
to final ao poder burguês.
Portanto, mesmo que não houvesse uma única parcela da burguesia ou da
pequena burguesia interessada em qualquer tipo de acordo tatlco com o
proletariado em sus resistência democrática, ainda aeslm e com mais razlo essa
resistência seria Indispensável á nosse luta pelo socialismo.
Entretanto, quando ouve falar em lutas democráticas, o MEP se ocupa em
«demonstrar» que a « oposição liberai... não pode alterar a ordem política que se
assenta na hegemonia do grande capital e na manutenção da superexpforação».
que <i nos esquecemos»de que«o proieto da pequena burguesia chegar ao poder é
inviável» (!), (Tese sobre a Tática, pag 35/36)
Essa relação de dependência atribuída pelo MEP entre as lutas democráticas e as
alianças e projetos da burguesia e da pequena burguesia apenas confirma que ele
só conseguiu alcançar as concepções burguesas e pequeno-burguesas dessas
lutas, isto é, a democracia enquanto um ilusório consenso e conciliação entre
classes antagônicas. Pois nSo se trata de que nós « nos esquecemos » dessas suas
considerações; trata-se de que nós - ao contrário do MEP - nSo subordinamos a
defesa dos direitos democráticos do proletariado aos interesses e projetos da
burguesia ou da pequena burguesia. Nós partimos do principio que esses direitos
nos interessam e nos são Indispensáveis, e portanto nós os conquistaremos na
prática, nós imporemos cada vez mais à burguesia o respeito aos direitos do
proletariado, qualquer que seja a facção burguesa politicamente hegemônica:
liberal, ditatorial, média, grande, pequena, etc... E quem achar que isso é multo
«difícil »ou incerto terá então menos razão ainda para se sentir capaz de defender a
viabilidade do socialismo e da revolução.
Poderemos agora observar como essas concepções do MEP sSo intelramente da

69
mesma natureza das que PO revela nas criticas que nos dirige:
o Uma plataforma de lutas hoje tem que conter as palavras de ordem contra o
arrôcho salarial, pelo direito de greve, pelo sindicato livre e pela liberdade de
organlzagSo e manifestação para a ciasse operária. Para o movimento estudantil, a
plataforma precisa conterás bandeiras de luta contra a PEG (política educacional
do governo), contra a po//f/ca repressiva contra o movimento estudantil, contra o
477, e pelas entidades llvres(...) Confronte-se com isso a alternativa lançada pelo
MR-8 e pela APML, que a titulo de responder aos problemas supostamente
caracterizadores do « aspecto mais indefensável do regime », assumem o ponto de
vista pequeno-burguês. Procurando um mínimo denominador comum capaz de
trazer o capital médio e adjacências para o bloco revolucionário, sSo eles que
trocam o bloco revolucionário pelas suas adlacèncias, indo assim assumir as
reivindicações pequeno burguesas típicas. Assim são as palavras de ordem contra
o A1-5, contra as torturas, pelo uhabeas corpus», pelo livre funcionamento das
organizações e partidos políticos, por eleições diretas (!!), por igual acesso de
todos o partidos poli ticos aos meios de comunicação de massas(IU) etc. «(Marxis-
mo Militante, pag 50/51)
Procurando ganhar espaço para uma plataforma economicista que se restringe
basicamente às lutas sindicais contra o arrôcho, pelo direito de greve e pelo
sindicato livre, os doutrlnarlstas esforçam-se em fazer crer que nós é que nos
limitamos (e a determinadas reivindicações democráticas mais gerais). Assim,
para se sentirem em condiçSes de promoverem esses supostos «confrontos»,
encobrem de forma oportunista que exatamente todas aquelas lutas constam, e
minuciosamente desenvolvidas, de nossa plataforma, ao lado de mais outras
econômicas e políticas. Alguns itens de nossa plataforma, que visa orientar nosso
trabalho junto às massas são: Luta pola derrubada do arrocho salarial, contra o
desemprègo, pela estabilidade, pela diminuição do grau de insalubridade e risco de
acidentes nas emprôsas, contra a corrupção, burocracia e desaparelhamento do
INPS, contra a política de abandono dos bairros operários, contra a carestla que
consome o salário dos trabalhadores; pela total ilbardadesindical, paio dlralto de
grave, pela liberdade da manifestação a Imprensa para os trabalhadores, contra o
AI-5, Lei de Segurança Nacional, contra as arbitrariedades policiais, torturas e
assassinatos de presos políticos, punição’ para os torturadores, liberdade de
filiação partidária; contra a censura, por eleições diretas e livres do controle
policial, apoio ã luta dos assalariados rurais, camponeses e estudantes, e outras.
Realmente, nós somos de opinião que uma organização revolucionária deve
procurar Ir um pouco mala além de onde vai uma organização sindical ou uma
entidade estudantil... Aliás, nós já procuramos fazer ver Isso à PO, e entSo eles
resolveram adicionar mais uma «palavra de ordem» à sua plataforma (que
anteriormente chegou a se reduzir explicitam ente aos três Itens citados): trata-se
agora da «luta pela liberdade de organizaçao e manífestaçao para a classe
operária».
Muito bem, nós não discutiremos aqui - pois isso já foi feito em outros lugares - a
inércia politica de quem pretende estimular o desenvolvimento do nível de
consciência dos operários e dos estudantes referindo-se apenas aos seus
respectivos interesses mais específicos, contribuindo para voltá-los apenas para si
mesmos e para afastá-los da compreensão do comportamento político, social e
ideológico de todas as classes da sociedade. Não discutiremos também • embora

90
nSo tenhamos conseguido entender * porque Justamente os estudantes foram
agraciados com tSo honrosaexcessão (o único setor alèm dos operários a constar
da plataforma) quando nem mesmo ao proletariado rural foi concedido esse
privilégio... Todos esses desvios dos doutrinaristas Já sSo bastante conhecidos, e
acreditamos que já não se torna necessário nos determos neles.
Discutamos, pois, o seguinte: Como é possível «lutar pela liberdade de
organização e expressão da classe operária» e ao mesmo tempo recusar-se a
denunciar e lutar contra as principais práticas repressivas que Impedem esea
liberdade? Como é possível lutar pela liberdade dos operário se ao mesmo tempo se
omitir da denúncia e luta contra as arbitrariedades policiais {cada vez mais
masslvas), contra as torturas, contra o A1-5, contra toda a legislação que tolhe a
participação po l it ica do s t ra bal ha dores? Co moé possível lutar «pelo socialismo»,
e portanto contra o Estado burguês, mas não contra o AI-5, um de seus
instrumentos mais abertamente repressivos? Contra quem está voltada, em última
instância, toda esta drástica Intensificação das medidas repressivas em nosso
pais? Não é exatamente contra as massas que o regime oprime e explora, e que
exatamente por isso ele teme mais do que tudo?
E evidente que faz parte da luta «pela liberdade dos operários» denunciara lutar
contra todos esses instrumentos de repressão, estimular a Indignação das massas
contra eles, criar obstáculos à sua utilização peto regime. E iiutlo acreditar que
estas questões possam ser evitadas atê que a luta econômica cresça em certa
medida, pois tam bèm o desenvolvimento das |utas econômicas é condicionado por
esses instrumentos. E, por outro lado, é raformlsmo acreditar que a «luta política
só se torna possível depois de certo desenvolvimento das lutas econômicas» etc.
Sem dúvida, espontâneamente sao as lutas econômicas que são mais facilmente
assumidas pelas massas, em particular hoje, e ó exatamente por Isto que a
nsiftcar seu trabalho político entre elas. (VoJtaremos a este
Omltir-se dessas lutas, a pretexto de que elas necessáriamente implicam em
tentar «trazer o capital médio para o bloco revolucionário» ou na adoção de um
«ponto de vista pequeno-burguês» significa Justamente - como vimos no caso do
MEP - não ter conseguido ainda superar a forma reboquista como o reformismo
coloca o problema.
Se a pequena burguesia assume determinadas lutas contra a Intensificação da
repressão burguesa, nem por causa disso essas lutas se tomam « pequeno-burgue-
sas típicas»... Em primeiro lugar, porque essa lutaóainda mais Indispensável para
o proletariado do que para a pequena burguesia. Em segundo lugar, porque a
experiência tem demonstrado que a pequena burguesia oscila, vacita e se divide
diante delas,
O que é tipico na pequena burguesia 6 que eia separa a luta contra as
manifestações mais repressivas do Estado burguês da luta contra o conjunto desse
Estado. E que ela tende a encampar as reivindicações democráticas mala gerais
que interessam ao proletariado levantar, em determinado momento - porque,
nesses determinados casos, isso se aproximará da sua «democracia para todos
e tende a rejeitar as reivindicações democráticas que, dentro ainda da sociedade
capitalista, significarem um prejuízo mais frontal aos interesses da burguesia. ,
A este respeito, é interessante lembrar ainda que enquanto existirem classes
antagônicas será impossível que a democracia seja geral em todos os seus
aspectos, o que não significa entretanto que determinados direitos democráticos
não possam ser gerais. Por exemplo, em 0 Renegado Kautsky, Lenln demonstra
que «áo necessária mente a ditadura do proletariado precisa suprimir o direito de
voto da burguesia; que essaé uma questão que cabe decidir politicamente em cada
caso concreto:
«... seria um erro afirmar de antemão que as luturas revoluções proletárias na
Europa, todas ou grande parte delas, porão com certeza restrições aos direitos
eleitorais da burguesia. Pode ser que seja assim. Depois da guerra e da experiência
da revolução russa éplausível que assim sela; mas isso nSo è imprescindível para a
aplicação da ditadura; isso não é um indicio necessário do conceito lógico de
ditadura; para a ditadura isso n3o constitui um aspecto necessário da sua
realização histórica e de c/asse».
Quanto à sociedade burguesa, a tendência é que interesse ao proletariado que
direitos democráticos (como os de expressão, reunião, etc) sejam tão gerais
quanto possível, visto que isso significará que eles, em parte, existam também
para si, já que para a burguesia costuma ocorrer que eles sempre existem..,
(Porém, quando deixarem de existir para a burguesia, eles serão ainda mais gorais)
Para reduzirmos a pó todo o aparato de tstaao aa Durguesia temos de construir a
força social revolucionária capaz de levar a cabo esta tarefa. E ilusão acreditar que
essa força se constitui de forma totalmente ilegal e clandestina. 0 que é ilegal e
clandestino é o núcleo que coesiona toda essa força social, é a parcela mais
avançadado movimento. As amplas massas que constituirão essa força social nSo
se organizam de forma totalmente clandestina. Então minar o Estado burguês,
colocar obstáculos à sua livre prática repressiva, enfraquscer sua capacidade
operativa é medida Indispensável à constituição da força social revolucionária. 0
proletariado e o povo iniciarão esse enfraquecimento do Estado burguês
removendo, a cada momento e na prática, os obstáculos que mais entravam o
crescimento de sua organização e expressão. E evidente que a opressão mais
encoberta, tradicional e sutil, só é plenamente identificável pelas msssas- embora
seja desde o principio fustigadas por nós - a partir de um periodo de lutas e
experiências, que vâ desmascarando cada vez mais o inimigo.
Dissemos que a pequena burguesia separa a tuta contra as medidas mais
repressivas do Estado burguês da luta contra o conjunto desse Estado. Os
comunistas entretanto, quando centram suas denúncias nessas medidas, o fazem
não apenas porque elas constituem o entrave mais Imediato ao crescimento do
movimento de massas, mas também e justamente’para desgastar o conjunto do
Estado burguês, colocando a nú para a9 massas todo o comprometimento da
burguesia com essas práticas, mostrando que elas servem aos seus interesses,
desmaacarando-ae isolando-a cada vez mais, favorecendo assim a penetração das
denúncias contra a opressão e a exploração mais acobertadas pelo costume e pela
tradição.
Para os comunistas, a luta contra a arbitrariedade policiai e as torturas, por
exemplo, é parta de sua luta contra o Estado burguês (uma luta, hoje, ainda de
resistência, de desgaste, de acúmulo de forças). E quem, sob o pretexto de não se
restringir apenas a uma das formas possíveis de serem assumidas pelo Estado
burguês, se nega a assumir a luta contra todas as manifestações políticas
concretas desse Estado hoje (Af-5, tortura, LSN, sindicatos sob controle, etc.) não
faz mais do que substituir a política concreta pela propaganda - e pelas tutas
sindicais - revelando-se a nível político ainda mala atrasado do que quem,
assumindo essas lutas, não as vincula explicita e conscientemente à destruição de
todo e qualquer tipo de Estado burguês. Ainda mais, porque, como vimos, a luta
pela «conquista da democracia» {a ditadura do proletariado) tem que começar,
entre outras coisas, pelo antravamento das pr&ticas mala antl-democrátlcas das
classes dominantes (e pelo desgaste das demais).
A luta pela democracia não tem por eixo a ampliação dos direitos democráticos
burgueses, poisa Instância legal não é capaz de refletir exatamente a evolução real
da correlação de forças entre as classes, ea questão da democracia implica sempre
na questão do poder. A ampliação dos direitos democráticos burgueses é pois hoje
uma Importante e Indispensável consequência e complementaçio da luta pela
democracia e contra o Estado burguês. Quando nossas denúncias centram fogo no
caráter claro e abertamente anti-democrático - Isto é, clara e abertamente
anti-popular e antí-operàrlo - que assume hoje esse Estado em nosso pais, nosso
objetivo fundamental não ó conquistar esta ou aquela reforma.
Faíemos isso exatamente porque a nivel político essa é, no momento, a melhor
forma de desgastar, desmascarar e Isolar o conjunto da burguesia, seu Estado e
sua política - e em particular a ditadura militar - favorecendo assim o
desenvolvimento do nivel de consciência e organização das massas. A ditadura
militar - e suas bases sociais - constitui hoje o inimigo principal - o que não quer
dizer único ou exclusivo - e é concentrando fogo sobre ela, sem esquecer contudo
os inimigos secundários, que o proletariado debilita todo o conjunto do bloco
dominante e avança na sua luta pela conquista de democracia proletária.
Observemos ainda que:
O habeascorpus éuma mísera garantia contra a arbitrariedade policial. Mas, se
eie nSo possui o significado mágico que lhe atribuem a pequena burguesia e os
liberais, nem por isso o proletariado deve aceitar passlvamente a sua supressão. O
proletariado deve ter sua própria interpretação do habeas corpus, e perceber que ele
pode ser utilizado em sua defesa contra a violência repressiva da sociedade
burguesa. Istoé, utilizá-lo não contra a «violência» em geral, mas contra a violência
cometida contra os trabalhadores e o povo. Pòrtanto, ao mesmo tempo que
lutamos pela conquista de garantias para as massas muito mais amplas e plenas
sob a ditadura do proletariado, - onde cada vez mais •• próprias massas exercerão a
justiça, lutamos contra os esforços da burguesia de restringir ainda mais os
recursos de que o proletariado pode lançar mão na sociedade burguesa.
Por outro lado, quando combatemos as torturas não estamos nos referindo a
questões abstratas, estamos lutando contra uma determinada forma de repressão
que a burguesia está utilizando contra os trabalhadores e o povo. Entretanto,
parece-nos que não tem nada a ver com o socialismo quem não compreende que a
prática generalizada da tortura é hoje sintoma de estados decadentes e
anti-históricos que não podem manter de outra forma-sem correrem graves riscos -
a sua dominação. Um Estado que se baseia na mobilização das massas, e não na
sua repressão, não tem nenhuma necessidade de fazer da tortura uma instituição
nacional.
Quanto ao AI-5, lembremos mais que ele expressa poderes através dos quais o
regime se coloca acima de toda e qualquer forma de controle por parte das massas.
Alirmar que a luta por um governo revolucionário «nSo é uma palavra de ordem
dest inada aos documentos e arquivos» eao mesmo tempo recusar-se a denunciar a
combater um poder que se coloca manlféstamente acima das massas é proeza que
real mente nôs escapa à compreensão.
Vejamos agora os (tens que mais escandalizaram nossos cri ticos: eleições
diretas, livre funcionamento dos partidos, e igual acesso de todos os partidos aos
meios de comunicação de massa (nos períodos eleitorais). Deveremos, em
particular, abrir mão de alguns deles?
Eleições diretas: Na ditadura do proletariado, a submissão Impostaà burguesia
possibilitará que as eleições indiretas permitam uma participação, um debate e
uma democracia efetivamente amplos para as massas; mas nas eleições
burguesas, o método direto permite menos manobras à burguesia do que o método
indireto. Os doutrinaristas, corno em matéria de política pouco conseguem
conceber além da propaganda das alternativas estratégicas (e com Isso acabam
amesqulnhando os objetivos estratégicos, como já vimos no caso do GRT), não
conseguem distinguir uma posição tátlcade uma proposta estratégica. As massas,
entretanto, compreenderão perfeltamente que para uma determinada situaç3o
concreta, os comunistas apresentem uma posição, visando Inclusive o desgaste do
Inimigo, e que para uma situação diferente, eles proponham uma solução
igualmente diferente, baseada porém no mesmo principio: melhorar ao mèximo a
correlação de forças em favor do proletariado, o que expressará sempre, por isso
mesmo, a posição mais democrática. E, ao mesmo tempo que marcam uma
posição para o momento presente, os comunistas demonstram suas limitações e
preparam as massas para as alternativas a longo prazo.
Livre funcionamento dos partidos políticos: realmente, interessa ao proletariado
o levantamento em geral das restrições legais à organização partidária colocadas
pelo Estado burguês, pois essas restrições, quando são de iniciativa de tal Estado,
evidentemente não são feitas no Interesse do proletariado, mas da burguesia. Isso
não Impede que se a correlação de forças e o desgaste político de determinadas
organizações políticas o permitirem, o proletariado defenda o imediato fechamento
dessas organizações, em nome exatamente dos direitos de expressão e
organização das massas, por elas ameaçados mais frontaf e abertamente. Mas ô
claro que o esforço maior no combate às organizações burguesas terá que caber ao
partido, organizações e associações do proletariado e do povo, e não ao Estado
burguês. Como desmantelamento do Estado e dos partidos burgueses, a liberdade
de atividade partidária nSp diminuirá, mas aumentará Imensamente, pois então
serão milhões os que poderão se organizar no partido revolucionário da classe
operária para levar até o fim a revolução proletária, enquanto na sociedade
burguesa apenas um punhado de burgueses e pequeno-burgueses e uma parcela
muito reduzida do proletariado, tem acesso à atividade partidária. A liberdade de
atividade partidária não se,mede pela existência de vários partidos burgueses
essencialmente igual# (enquanto os comunistas são reprimidos de mil maneiras
direrentes) mas pelo acesso de amplos setores de massa a essa atividade.
Igual acesso de todos os partidos aos meios de comunicação de massa: Para
fazer crer que acreditamos na possibilidade de uma igualdade generalizada das
condições de funcionamento dos partidos políticos, os doutrinaristas omitiram
que este é um Item Incluído no ponto sobre eleições, e se refere, portanto, a esta
questão especifica e determinada. Além disso, reivindicar o igual acesso de todos
os partidos que participam de uma eleição aos meios de comunicação de massa
nSo Implica em negar que se defenda, por outro lado, que determinados partidos
(do tipo já visto) sejam excluídos dessas eleições.
O marxismo nSo afirma que nenhum direito democrático gerai - no sentido de
estendido a todos os cidadãos - seja possível. Ele afirma que esse3 direitos -

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embora possam ser importantes para o proletariado - nSo poaem Impedir que a
democracia seja efetIvamente a dominação de uma determinada classe;
A reivindicação de determinado nível de Igualdade de condições é inerente a todo
e qualquer tipo de votação. Ao lembrá-la (pois nos interessa fazê-lo), não temos
portanto nenhuma pretensão de que isso contrabalance o fato de que a burguesia
goza durante o ano inteiro de virtual controle sobre a imprensa. Ao participarmos de
uma eleição podemos, como vimos, defender a excluafco de determinada corrente
política, mas não teria sentido propor a desigualdade de condições para um
determinado participante. Particularmente, não terla sentido cobrar do Estado
burguês uma desigualdade em favor do proletariado... Na sociedade burguesa,
interessa pois defender o máximo de iguatdade de condições, pois evidentemente
toda desigualdade ta fará em favor da burguesia. Se em uma determinada eleição
burguesa reivindicamos que um acesso igual se estenda a todos os partidos,
certamente rvão será porque acreditemos que sejam os partidos burgueses que
estejam sendo ameaçados de serem preteridos em favor do proletariado. E, à
proporção que o conjunto das massas, sob orlenlaçao dos comunistas, percebam
que qualquer «acesso igual» nSo é senão uma medida multo parcial eifl relação a
toda a vantagem que a burguesia goza nas eleições e em qualqueroutra instituição
burguesa; na medida em que o proletariado peroeba - e se 'disponha a ficar
conclusões práticas disso - de que o Estado e os partidos burgueses, e %ey$
aliados, são inimigos inatos e irredutíveis da ampliação da igualdade, eles enfio
farão avançar a democracia depurando-a desses entraves.
Multo bem. Todas estas questões nSo têm um caráter estratégico, pois nSo
implicam em substituição da classe no poder. Enquanto questões táticas, não
estão em contradição com o GRT, nem desempenham atualmente um papel
central. Entretanto, devem ser hoje levantadas * ao mesmo tempo que
denunciamos o caráter anti-operário e anti-popular dò regime e apontamos a
perspectiva do GRT e da ditadura do proletariado - pois favorecem a neutralização
das perspectivas pequeno-burguesasv alènt de oferecerem uma referência a mais
ao trabalho de isolamento e desgaste dá ditadura militar, pois são óbjetivamente
aspirações democráticas das massas que no momento favorecem à revolução,
(évídentemente, quando deixarem de favorecé*ta, deixarão de ser também
aspirações democráticas): Por isso são levantadas hoje, mas nSÓ precisam
necessârlamente preceder nem ao GRT nem mesmo à ditadura do proletariado.
Aqueles que vêm contradição em defender o GRT, a lutá armadas a insurreição, e
ao mesmo tempo exigir «eleições livres è diretas» recomendamos uma pequena
reflexão em torno das razões que terlamlevado os bolcheviques a partir de abril de
1917 e Inclusive depois da revolução socialista de outubro, a defender a passagem
de « todó o poder aos sovlets» ao mesmo tem po que exlg Iam a imediata convocação
de uma Assembléia Constituinte...
Níò vemos, portanto, porque abrir mão dessas reivindicações, embora a
conquistada cada uma delas não seja indispenàável para que a luta passe às fases
rfiáís avançadas e de ofensiva.
:
Recusando-se não apenas a essa, mas a tódà e qualquer luta democrática, só
restará então à PO afirmar que as lutas1 pollticas rião são possivels no momento
atual, ou que as lutas políticas «são» as próprias lutas sindicais (báslcarnente
econômicas). Por via das dúvidas, PO prefere não optar por uma ou outra
racionalização, que apesar de excludehtêsv éãò abraçadas em conjunto.
«A final de contas considerar uma luta isolada de seção como uma luta política da

98
lasse seria situar-se com o mesmo ponto de vista dos defensores da « açSo direta »
como forma de futapolítica. Mas a revista«Brasil Socialista», em seu editorial, diz
que se propSe a unificar as lutas políticas do proletariado. Onde estão elas?
Al está, sem rebuços: não existem hoje lutas políticas. E Isto porque a luta ainda
stà «isolada» nas seções de fábrica.
Em primeiro lugar, esse quadro não corresponde à realidade. Já em 1973 a
olkswagen, com 30000 operários, parailzava a maior parte da produção. Em 1975,
assembléia salarial dos metarlúgicos, em S. Paulo, reunia mais de 3000
,'perários. O movimento nao deve ser avaliado apenas por suas manifestações mais
1 rasadas.
Jeiti segundo lugar, da mesma forma como os doutrinarlstas n8o tem dificuldade
m compreendera importância das pequenas resistências econômicas em «uma
ação de fábrica», apesar delas não serem ainda uma luta de classes no sentido
atrito, isto ó, a luta de toda a classe operária contra toda a burguesia, da mesma
orma deveriam percebera importância da resistência política - por exemplo, uma
nanifestaçãooperâriacontraumaarbitrarledadepolícial- apesar de não termos ai,
Jnda, a luta politlca plenamente desenvolvida da classe operária, isto é, a luta de
odosos operários contra todo o Estado burguês. Evidentemente, ó exatamente
.itravès de um trabalho de agitação, propaganda e organização no sentido de
?stlmular, generalizar, radicalizar «unificar essas lutas, tanto econômicas, quanto
políticas, que podemos contribuir para que o movimento atinja um nível poiltico
plenamente desenvolvido.
Todas as lutas de massas, hoje, tanto políticas quanto econômicas, não
conduzem de i mediato senão a resultados lim itados. Argumentar com o fato de que
não são travadas ainda pelo conjunto da classe para dl2er que não existem, é clara
manifestação de liquidação do movimento, 6 o retorno à lamentável concepção de
que primeiro é preciso desenvolver a luta econômica, para depois passar à luta
política, é argumentar com o atraso das massas para «justificar» a fuga à
responsabilidade da vanguarda. Vejamos:
«Porque o operário manifesta ainda, pouca atividade revolucionária frente ao
trato bestial que a policia exerce contra o povo, frente ás perseguições dê grupos
religiosos, frente aos castigos corporais Impostos aos camponeses, f/ente aos
abusos da censura, aos maus tratos de que sSo objetos os soldados, as
oerseouicôes A* intclstivas culturais mais inofensivas, etc?...
Devemos imputar a culpa a nós meamos, ao nosso atraso com respeito ao
movimento de massas, pois nio temos sabido ainda organizar denúnc/as
suffcientemente amplas, rápidas, contra todas essas arbitrariedades. Sa chega-
mos a raze-to (oevemoa e yvuvwos raze-iu/, o operar/o mais airasuuo compreende-
rá ou sentirá que o estudante e o membro dos grupos religiosos, o camponês a o
escritor são esmagados e atropelados por esta mesma força tenebrosa, que tanto o
oprime e o subjuga a cada passo da sua vida; e, ao sentl-lo, vai querer reagir,
desejará reagir com uma (orça incontlval, e saberá enfio organizar hoje um protesto
contra a censtíra, desfilar amanha em uma manifestaçao diante da oasa do
governador,..»!LenIn, Que Fazer?)
Por outro lado, a crença d* .que primeiro deve «e travar a luta econômica para
depois travar a luta política foi assim criticada por Lenin:
« Ecerto que a luta econômica i, em geral, «o melo mais amplamente aplicável»

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para se Incorporar as massas à luta política? Completamente (atoo. Meios não
menos « amplamente aplicáveis *para tal incorporação são todas as manifestações
de opressão política e dos desmandos da autocraciaj e de nenhum modo tão
sômente as ligadas à luta econômica. Por que os castigos corporais, aplicados aos
camponeses, as arbitrariedades dos funcionários e o trato da polícia com a
«plebe o das cidades, a luta contra os mendigos e a perseguição aos dese}os de
conhecimento e cultura que sente o povo, 0 excesso de impostos, o duro
adestramento aplicado aos soldados e o trato da caserna que recebem os
estudantes e os intelectuais liberais; por que todas estas manifestações de
opressão, assim como milhares de manifestações análogas, que não estão
diretamente ligadas á luta econômica, tem de representar em geral meios e motivos
menos « amplamente aplicáveis»para a agitação política, para incorporara massa à
luta política? Exatamente o contrário: na soma total de casos cotidianos em que o
operário sofre (ele mesmo e as pessoas ligadas a ele) a falta de direitos,
arbitrariedades e violência, é Indubitável que constituem sômente uma paquana
minoria os casos de opressão poiiclai no terreno sindicai» (lãem). Ou:
u ...fíabochele Dleto dizia: «As reivindicações políticas imadlatas se fazem
acessíveis às massas depois de uma greve, ou, em suma. de várias greves»,
«quando o governo emprega a policia e a genaarmena». Agora, esta reona
oportunista das fases foi rechaçada pela União. (Idem). E ainda: *A fórmula de
Martinov nos é preciosa, não como prova de confusão do seu autor, e sim porque
expressa com relevo o erro fundamentai de todos os economicistas, a saber: a
convicção de que se pode desenvolver a consciência política da classe operária
desde dentro, por dizé-io assim, de sua luta econômica, ou se/a, tomando sô (ou
quando menos, principalmente) esta luta como ponto de partida, baseando-se só
(ou, quando menos, prlcipaimente) nesta luta. Esta opinião é falsa de ponta a
ponta. (Idem).
Vejamos agora como, depois de terem afirmado que as lutas políticas nfto
existam, PO afirma que elas existam e são exatamente as lutas sindicais:
«A luta contra a ditadura só pode colocar-se para um movimento capaz de
subordinar tal luta a objetivos de classe explícitos. Em que isso ó diferente da iuta
contra o arrocho, lei de greve, afre/amenfo sindical, etc?» (M.M.)
Não resta duvida, para a PO està sendo um pouco difícil perceber. Q que nós
temos aqui 6 exatamente a «pequena minoria de çasos de opreãsSo no terreno da
lutasindícal». Todas essas lutas sindicais — que conforme veremos mais adiante,
não são realmente assumidas pela PO — são multo importante, são as lutas que
mais atraem aatençSo dos operários hoje, exatamente porque eles foratm relegados
ao espontaneismo pelas «vanguardas»; essas lutas tem ImplicaçOes políticas,
mas estão longe de constituírem o corpo principal das lutas políticas.,
Para justificar sua abstenção das lutas pòlltica3 — edas lutas de massa am gerpl,
— a PO formulou uma curiosa «análise de conjuntura». Segundo essa «anâjisé»,
as lutas são necessariamente « Isoladas» — Isolamento tanto da vanguarda em
relação, às massas, quanto de um setor de massa em relação a outro — enquanto®
«crJse .cíclica)* não enfraquecer o aparelhe de Estado . ..
Pretender existir, isto é, pretender Influir nessa mudança de conj^nji^á sonho e
subjetlvlamo: « Devemos combater no entanto o subfetivismo aue eoarentemente
querendo precisar a mudança, pretende na verdade projetar o aonho d* Influir na
própria mudança» (!!!) (M.M., pag 30).
Essa relação mecânica entre economia e política foi assim exposta:
As crises tem causas em fatores de ordem infreestrutura!, que se encontram fora
do controle de qualquer forma de Estado capitalista. E de se prever, portanto, que
na emergência de ume crise cíclica, sua globallzaçao se efetiva de imediato,
abalando diretamente a organização política da burguesia»...
«... com o advento da crise cíclica, é de se esperar a ruptura do ponto de coesão
no caso, a própria ditadura...» (Conjuntura e Tática, pag 10),
Assim, como a própria crise econômica encarrega-se de efetivar «de Imediato e
diretamente» a «ruptura» da ditadura, os revolucionários podem abster-se desta
incômoda tarefa.
Em Contra o Doutrinarlsmoeo Economlcismo vimos o economlclsmo mecânico
deste tipo de concepção. PO, ao invés de se autocritlcar, preferiu se desdizer:
«Os democratlstas dizem que a nossa anóllse de conjuntura é economicista;
precisam para Isso deturpar a tese. Lá falamos em«crise nacional» e quando nos
referimos ò crise econômica, deixamos claro que estamos trabalhando de«deter*
m/nação em última Instância».
Os «fatores de ordem fnfraootrvitural» (econômicos), a«emergência de uma crise
dcllca (econômica) se globaliza de Imodiato, «abalando diretamente a organização
política» e provocando «a ruptura do ponto de coesão», a ditadura.
Onde está a «deturpação»? Como se vê, nao se fala aqui de «determinação em
última instância»; fala-se aqui de determinação em primeira, Imediata, direta e
catastrófica Instância. «Marxismo» vulgar, que é repetido quando se enuncia a
incrível pretensão de que influir na mudança de conjuntura seja «sonho» ou
«subjetlvismo». Isto é, toda Influência cabe aos «fatores de ordem infraestrutu-
ral».
Vejamos ainda:
x Alguns camaradas perdem a perspectiva quando colocam o problema da mu-
dança da conjuntura como um mar da dúvidas, onde querem a todo custo encontrar
a repousante fórmula — alguma coisa temos que fazer para Isso, para qua a conjun-
tura mude, como interferímos na mudança, como faremos para não ficar para
trás ».
At está o «método» de projeção, que caracteriza os doutrinaristas: os que se
deitam em «repousantes fórmulas» não são oa que deixam por conta dos fatores
economicos todo o desgaste polftico do regime, são os que não se contentam com
essa racionalização!
O movimento demassas nfioestáatomizado — ou «isolado», como prefere a PO
— porque não exista uma crise cíclica, mas porque incorreu em erros políticos, a
principio de direita, e depois de esquerda, que permitiram à burguesia golpeá-lo
duramente. O período de ascenso econômico pode enfraquecer o movimento, mas
por si só não determina sua atomlzaçao.
Rara demonstrar como são Inconvenientes as lutaa democráticas, PO agregou
mais uma tese à sua «análise de conjuntura»:

* <5tV
«Para a burguesia, portanto, trato-se de retomar cenas perpspectlvas. Rei em -
bra-se a perspectiva de Jango de uma reforma agrária «lenta, gradual a segura»,
que nâo afetasse as exportações, com isso pegando a Integração imperialista a
possibilitando o crescimento Industriai, tudo isso ò base do congelamento salarial,
Essa pofftica interessava à burguesia na medida em que pudesse manter o aspec-
to básico (congelamento salarial) combinado com um controle do movimento de
massas; teria assim uma interessante combinação da superexptoração com * Jus-
tiça social», com participação democrática ... »
«... no plano da «reforma agrária» Isto nâo esteve Inclusive totalmente ausente
nos planos da burguesia nos últimos anos; as investidas de Módici com o
INCfíA e o Funrural sSo arremedos que ai se enquadram ». (M.M., pag. 10/11)
PO ouviu falar em algum iugar que a reforma agrária 6 uma medida que vem de
encontro às aspirações de massa e que corresponde a algum nível de « participação
democrática)». Ocorre porém que, como sabemos, a reforma agrária que. traz tais
implicações é a que se costuma denominar «de tipo americano* (divisão da
propriedade); a reforma agrária que efetivamente se produz no Brasil é de «tipo
prussiano* (capitalização da grande propriedade) que nada tem a ver com a
melhoria das condições de vida das massas, e, pelo contrário, implica na mais
violenta e desumana miséria para os trabalhadores rurais, como é o caso dos
« boias-frias». Quanto ao proletariado urbano, se se afirma que a reforma agrária,
q ualquer que sçja, nSo é suficiente para fazer caducar o reg Ime de superexpl oração,
entSo porque as consequentes «justiça social» e «participação democrática»,
mesmo aceitando-se a relação economicista da tese? Portanto, o queó realmente
uma«interessante combinação» é que os doutrinaristas afirmem que transforma-
ções democráticas são Inteíramente Impossíveis no Brasil e, ao mesmo tempo, que
a burguesia já se encontra prestes a efetivá-las ...
E em cima de tais «análises» que PO pretende ter entrado no terreno da
conjuntura concreta, eque ela se permite admitir que Lenln falou «algum dia» em
lutas democráticas (M M., pag. 52), mas que agora tais coisas, naturalmente, estão
suoeradas.
Infellzmente, PO não entrou em nenhuma analise da conjuntura; o que tez foi
uma Incorreta consideração de caráter geral — sua relação mecânica entre
«ruptura» política e crise econômica. E é na verdade com base nessa consideração
geral e incorreta — e não na conjuntura — que «teoriza» o abandono da luta
política.Pois a análise da conjuntura atual demonstra justamente a necessidade
dos revolucionários«Influírem»na mudança de conjuntura no sentido de estimular
as massas a assumir a resistência contra a repressão, demonstrar que o movimento
de massas n£o furará o bloqueio político da ditadura - por mais catastrófica que se-
ja a situaç9o econômica • se não combina sua luta econômica com sualuta política,
pois hoje é impossível travar a luta econômica sem se haver, desde os primeiros
passos, com a política repressiva da ditadura, e mantendo-se apenas no terreno
sindical.
Vejamos agora como também o MEP, ao se recusar a assumir as lutas
democráticas, desvia-se para o economicismo e para o propagandismò. Em sua
Tese sobre a Tática, capitulo VI-4, encontramos a seguinte concepção da «luta
contra a ditadura»;
«Acumular torças para a luta contra a ditadura levando para dentro da c/asse opa-
riria a consciência polaca significa fortalecera unidade contri ò sindicato pelego
significa disputar dentro dessa unidade uma prática sindicai combativa, significa
oporá in fluência populista e reformista a prática sindical combativa o a agitação re-
volucionaria contra a ditadura, baseada nos interesses dos trabalhadores frente à
luta sindical e frente à luta política pelo poder. Essa acumulação de /orças concen-
trada nas atividades das camadas que se destacam no movimento operário visa for-
talecer, de um lado, a possibilidade de crescimento das lutes de resistência econô-
mica e, de outro, a luta pelo surgimento de setores conscientes no meio dos
trabalhadores unidos por uma perspectiva revolucionária frente à luta contra a dita-
dura ».
Então, além da luta sindical, o acúmulo de forças contra a ditadura Inclui «a
agitação revolucionária contra a ditadura baseada nos interesses dos trabalhadores
frente à luta política pelo poder».
Em primeiro lugar, nSo se trata apenas de agitação. E preciso também organizar
a luta contra- a ditadura. Essa luta nSo se faz apenas por essa ou aquela
reivindicação, mas inclusive contra toda e qualquer manifestação de opressão por
parte do regime, mesmo que nSo conduzam a um resultado concreto imediato.
Essas últimas lutas tem um significado especial, nao só porque colocam um certo
obstáculo ao avanço da repressão, mas prlncipalmente porque representam um
protesto mais amplo e geral contra a opressão de classe. Condenando os que
consideravam que a classe operária só é capa2 de se mobilizar com o objetivo de
conquistar algum «resultado tangível», Lenin observou que esses expressam-se
«como se a massa operária não fosse capaz (e como se nâo houvesse demonstrado
sua capacidade, apesar de todos os que carregam sobre ela o seu fllisteismo) de a-
poiar ativamente todo protesto contra a autocracia, inclusive o quanSO promete ab-
solutamente nenhum resultado tangível». EntSo, todo protesto contra manifesta-
ções de opressão sobre a classeoperárla ou sobre outros setores, como a violência
policial, aplicação de leis repressivas, censura, prisões, taxas exorbitantes,
mattratos nas repartições e INPS, cassaçÕes de parlamentares combativos, etc,
são de grande importancfa no desenvolvimento do nivel de consciência,
organização e combatividade da classe operária e do povo.
Em segundo lugar, me3mo a «agitação» prometida pelo MEP fica desfigurada,
pois, j6 no item 2 o MEP afirma que: «a nossa tática não pode estar voltada para
moíx/ízar o proletariado para a lute política contra a ditadura», ...«nSo há condi-
ções para a luta política de massas contra a ditadura».
A agítaçfio é uma prática voltada para as massas, nSo existe agltaçSo para as
«camadas que se destacam no movimento operário». 0 trabalho político nessas
camadas é a propaganda e a organizaçSo. A agltaçSo política visa a mobilização
política; e dizer que esta n8o é possível deixa claro que nSo se pretende fazer
agitaçSo, mas propaganda.
Que a luta «por uma alternativa revolucionária à ditadura» do MEP se reduz a
nivel de massas às lutas sindicais, fica claro quando mais adiante ele desenvolve o
conceito de «luta contra a ditadura» que vimos no trecho anterior;
«Lutamos então por uma alternativa revolucionária à ditadura quando, por a-
xemplo, conseguimos em grupos da oposição influenciados por perspectivas bur-
guesas e vacilantes em relação ao sindicato pelego um acordo, ainda que pouco
expressivo, mas que fortalece o lado contra o pefegulsmo, quando organizamos u-
ma delegação sindical de fábrica ligada ò prática de oposição sindical, quando
atuamos no sindicato contra as manobras dos pefegos e pelas reivindicações de
uma fábrica ou de uma categoria, quando passamos boletins e fornais nas fábricas,
quando organizamos grupos de oposição sindicai, sob nossa influencia, quando
falamos no sindicato em defesa das reivindicações dos operóríos, quando denuncí-
amos as traições dospelegos, quando conseguimos numa fébrica, usando o sindi-
cato ou nSo, organizar uma pequena luta por uma pequena reivindicação, etc. Se
em todas essas ações, que expressam nossa penetraçSo no proletariado, estamos
ultrapassando as traições dospelegos e dos politiqueiros que só pensam em votos
estamos contribuindo para o desenvolvimento de uma unidade sindicai de oposi-
ção, ou estamos atuando independentemente para organizar uma atividade sindi-
cal combativa, estamos ampliando o campo para nossa agitação revolucionária,
estamos criando círculos para nossa propaganda, estamos antio desenvolvendo
a luta por uma alternativa revolucionária á ditadura».
Assim, Quando o MEPae propõe a falar da luta contra a ditadura, ele se refere, de
forma concreta, unlca eexclsulvamente à lute sindical. A ampliação do campo para
«a agitação»política é feita exclusivamente, ou quase, pela luta sindical, o que e a-
penas uma nova edição da velha fórmula de que a «luta econômica é a mais
amplamente aplicável■», etc, etc.
Todas as questões políticas, exatamente porque não se assume a necessidade
de «estimular todas as aspirações democráticas das massas», são deixadas no
terreno geral e abstrato (em sua plataforma de luta, Inclul-se a luta pela livre
organização política dos trabalhadores e pelo fim da máquina repressiva) servindo
tão sòmenteà propaganda; lutas e mesmo denúncias concretas, apenas no plano
econômico e sindical. (Registramos como excessão, pelo menos a nível de ser
citado na sua plataforma, a luta contra as torturas e pela liberdade dos presos
políticos).
Esse econom icismo também se evidencia quando se afirma q ue«ofato decisivo
que age então para alterar a correlação de forças atuai ó o crescimento das lutas de
resistência econômica do proletariado».
Porque apenas as econômicas? Porque não também a resistência política? As
lutas econômicas no Brasil podem avançar de lorma decisiva sem entrar no campo
político?
Depois de tanto apreço pelas lutas econômicas — o que é louvável — e de tanto
desapreço pelas lutas políticas — o que nfio merece louvor algum —, não è de
admirar que o MEP chegue à conclusão de que sua «tarafa principal» ó a
intensificação e fortalecimento do trabalho de oposição sindical.
A tarefa principal de uma organizaçao é o trabalho de oposição sindical! O MEP
não afirma que sua tarefa central ô a denúncia e organização política no seio das
oposições sindicais, afirma que é o próprio trabalho sindical a sua tarefa central.
Pois, a oposição sindical, que se opõe ao sindicalismo pelego, é uma organização
de tipo sindical, Isto é, destinada a travar prJnclpalmente a iuta econômica. Assim,
é o próprio MEP quem assume abertamente a sua total confusão entre política
comunista e política sindical. . y*;.
O MEP tem da luta contra a ditadura uma visão propagandisfa, istoé. formar
mais e mais setores que aceitem a «alternativa revolucionária á ditadura», o QRT.
Se não vê a luta política senão como propaganda, trazer os « setores avnçados »
para a iuta política será capacitá-los para assumirem, também eles, a propaganda,
jà que nada mais ó oferecido. Mas ocorre que quem tem clareza dos
desdobramentos mais a longo prazo das lutas políticas hoje, a nível de massft^é a
vanguarda e os setores próximos a ela. A massa, quando inicia a luta política, não o
101
faz com base em projetos políticos definidos — como o GRT — mas em função de
manifestações políticas concretas que a prejudicam e a levam à resistência. Assim,
quando as massas protestam contra uma arbitrariedade, corrupção, censura,
perseguição, etc, elas não o fazem porque jâ persigam um projeto definido — o
GRT — mas porque já foram capazes de compreender que essas medidas as
prejudicam. Cabe à vanguarda direcionar essas lutas para fazè-las convergir para
os objetivos estratégicos, e utilizar tais lutas para Impusilonar a consciência das
massas a respeito desses objetivos; mostrar a atitude que cada classe diante dela,
vinculando essa atitude à sua posição na estrutura social; mostrar os limites das
conquistas obtidas ou propostas, o caminho a seguir, etc; enfim, utilizâ-las como
base para a agitação e a propaganda revolucionárias.
O MEP, ao considerar que a luta política a nível de massa só interessa quando
esta Jà tem consciência da alternativa revolucionária que se persegue, terá então
necessariamente de restringir a «agitação* (propaganda) política a pequenos
círculos. E preciso, entretanto, assumir que existem determinadas tarefas que, em
certo momenlo, são nossas, da vanguarda, e de nada adianta querer dividir o peso
com as massas ...
Quanto às lutas sindicais, a concepção que o MEP tem de seu desenvolvimento,
como aqui vimos, se aproxima bastante daquilo que consideramos correto
(conforme expomos em nossas « Resoluções do Ativo sobre Sindicatos»). A PO,
entretanto, se não assume as lutas políticas, nSo assume sequer as lutas sindicais.
Vejamos:
a Os movimentos 16 existentes devem ser considerados apenas na medida em
que são referencia política para os operários combativos, e a nossa atuação dentro
deles deve visar e$vazi6-los politicamente, na medida em que efetivemente se
criem as oposições proletárias» (MM., pag. 20)
As oposições sindicais são movimentos espontâneos que surgem dentro dos
sindicatos, organizados por operários que não aceitam o peieguismo Imperante. E
evidentemente a partir dessas manifestações espontâneas que o trabalho legal
dentro dos slndicatosse inicia. O trabalho nas fábricas — que ó o principal —
tenderá a fortalecer n?o apenas quantitatlvamente, mas Ideologicamente, esses
núcleos de oposição já existentes. A PO, ao invés de contribuir para desenvolver e
transformar as oposições sindicais existentes, considera que deve «esvaziá-las»
— enquanto forma suas «oposiçoes» de Incubadeira, à margem do movimento.
Ironicamente, esta posJção de IfquidaçSo do movimento revela ao mesmo tempo
exatamente a concepção voiuntarisla que a PO pretende combater:- pretensão
de «criar» o movimento, ao invés de organizá-lo, generalIzá-lo e dar-le um
caráter consciente.
E mais
«isso pressupòe 16, como fica claro, que tal vitória nSo custou qualquer
concessão rta sua linha de atuaçao. Considerando como tendencia mais pro-
vável qua as propostas da oposição (a sua «oposição») não seiam acaitas pela
maioria, ficando então restrito o objetivo atingido a uma parcela mais reduzida,
mesmo assim nao se deve lutar pela sua aceitação.»(M.M.)
Movimento sindical em que a minoria não se submete á maioria, onde nSo se
deve lutar pela aceitação das propostas que se faz... '
Ultimamente, o Índice de aumento salarial proposto pela PO (o «Índice
proletário») é de 200%. Isto deixa claro, além do que |à foi dito, que nSo se pre-
tende organizar luta sindical alguma, atuando-se tão sômente como um grupo
de propagandistas Inibido demais para falar em política diante das massas e
que pretende que um Índice salarial suficiententente elevado pode «substftuír»
o trabalho político.
Concluindo, podemos dizer que toda a fundamentação das posições políticas
do MEP é essencialmente a mesma da PO. Exatamente como estes, o MEP nao
compreende o papei da luta peia conquista de democracia na revolução pro-
letária; não compreende que a luta política do proletariado tem caráter
democrático, que, prlnclpalmente hoje, cabe assumir abertamerte e não es-
conder; e que a luta pelo enfraquecimento e destruição do poder burguês não
conduz hoje, de imediato, a nenhuma transformação democrática, por menor que
seja que não esteja dentro dos marcos burgueses — mas que essa luta pode ser
utilizada para fortalecer e desenvolver a consciência e a organização revolucio-
naria e socialista nas massas. No nivel político, tudo Isso, combinado com uma
visão propagandista e doutrinarista do trabalho de massas, conduz a uma com-
pleta recusa à luta e denúncia política de massas, nivel da luta econômica
esindical, enquanto a PO assume uma posluraabertamente liquidacíonlsta, o MEP
apresenta uma posição bastante diferente, que ainda não pode ser suficiente-
mente testada pela prática conjunta, mas que apresenta pontos importarYfãs de
afinidade.
ELEIÇÕES
Qual è o principio geral em que os comunistas se baseiam para definir a validade
ou não de sua participação nas eleições e no parlamento burguês?
No « Esquerdlsmo», Lenin define com clareza esse principio;
Ainda que nBo fossem «milhões» e * legiões». e sim uma minoria bastante
considerável de operários industriais que seguisse o ciero católico — e uma
minoria similar de trabalha dores rurais que seguisse o$ proprietários e os
camponeses ricos — isso significaria indubitavelmente que o parlamentarismo na
Alemanha ainda nSo caducou politicamente, que a participação nas eleições
parlamentares e a luta na tribuna parlamentar è obrigatória para o partido do
proletariado revolucionário, preclsamentepara educar os setores atrasados de sua
classe e para despertar e esclareceras massas rurais nao desenvolvidas, oprimidas
e Ignorantes.
Enquanto n5o se tenha (orça para suprimir os parlamentos burgueses e todo
outro tipo de instituições reacionárias, se deve atuar dentro delas porque é alf que
se encontram ainda operários iludidos pelo clero e embrutecidos pelas condições
de vida no campo; do contrário, corre-se o risco de se converter em simples
charlatões•*. . .... ..
Lenin condiciona, portanto, o boicote ao parlamento burgues à nSo sxlstencla de
mais nenhum setor considerável das massas que apoie, desta ou daqueja maneira,
essa instituição; e condena os que«Ingenuamente tomam a «t negação» subjetiva
de uma determinada instituição reacionária por sua efetiva destruição mediante o
conjunto de forças de uma série de fatores objetivos?. Ele dá então um exemplo
acertado de boicote eletivo do Parlamento: •

103
«A expt a russa nos brinda um exemplo feliz e acertado (1905) e outro
lulvocad< 5) da utUizeçBo do boicote pelos boicheviques. Ao analisar o
Imelro ct p
m provamos que conseguimos impedir que um governo reacionário
:>nvoca*$ arlamento reacionário em momento em que a açBo revolucionária
xtra-parla ar das massas (em particular as greves) crescia com grande
ipldez, em nem um só setor do proletariado e do campesinato podia apoiar de
rodo algw oderreacionário e em que, através da luta grevista e do movimento
?rár/o, cr • a influência do proletariado revolucionário sobre as massas
trasadas. >dente que esta experiência nBo ê aplicável ás condições européias
toais»,
Estes sã fs princípios gerais sobre nossa participação nos parlamentos
urgueses j loutrlnaristas nao pretendem estar em contradição com eles,quan-
o negam q quer participaçao nos atuais processos eleitorais em nosso pais. Pe-
) contrário nsideram que sua posição ó a adeouaçao desses princípios A nossa
ealldade c< eta. Segundo eles, nossa participação nas aluais eleições, longe de
avorecer u r i maior consciência política às massas, * contribui para o seu
lretamente •$ perspectivas burguesas» (MEP, Tese). Entretanto, a análise
sos argum> ss que apreseniam em defesa de sua posição nSo revela essa
/retendlda ihor compreensão de nossa realidade concreta. E demonstra, ao
ontrârio, q os doutrlnaristas realmente não foram capazes de assimilar aqueles
irinclpios g■ -jís. Passemos, então, à análise de seus argumentos:
) O primeiro rgumento nega que o nível de envolvimento do proletariado brasileiro
om os prec? iceitos parlamentaristas ju&liliquem nosss participação nessa trente
fe luta:
« A h opos/çõo liberal»nffo recebe Ao/e o apoio nem de um movimento de massas
operário, nem de bases operárias organizadas. 0 apoio a essa « oposiçBo» em
rermos eleitorais é um apoio passivo, baseado na Influência do populismo
tradicional que se expressa pela retaçBo paternalista dos que estBo em cima com o
conjunto da massa» (MEP, Teses..., pag. 42).
«...nos países europeus, á época do llt Internacional, ocorria um processo
especifico: partidos operários degeneravam abertamente..., atrelando o movimen-
to operário ao governo burguês, atrelando náo ideologicamente ou momenta-
neamente, nBo como no Brasil, mas organizadamente, politicamente, um
movimento diretamente vo/fado para o problema do poder, em luta aberta pela
hegemonia no governo burguês, porque sua consciência era politicamente
reformista...»(PO, Contra o Democratismo).

«... pois o parlamentarismo é um método reformista e só podem os comunistas


usar o parlamento para mostrar a classe o caminho revolucionário, quando a classe
jã está no caminho reformista ... « (idem).
Como vimos, Lenin defende a participação nas eleições e no parlamento burguês
sempre que ainda existam setores importantes de massa que lhe deem algum tipo
de sustentação. A degeneraçSo dos partidos operários em partidos reformistas
burgueses é tío somente um caso concreto de como esse envolvimento pode se
dar. Pretender que este seja o único caso possível è nSo entender (ou adulterar) os

104
5 tr\l
princípios gerais sobre o parlamentarismo. Pois, quando Lenin fala de «operários
industriais que seguem o clero católico», quando fala de «trabalhadores rurais que
seguem os proprietários « os camponeses ricos v ele nSo está se referindo a
nenhum partido operário em processo de degeneração, ou a um «partido operário
formado dentro da classe». Como também não está se referindo a nenhum partido
desse tipo quando fala em «despertar e esclarecer as mateis rurais nSo
desenvolvidas, oprimidas e Ignorantes»; quando fala em «educar os setores
atrasados» daclasseoperèria. Em todos os casos, è igualmente necessáriae útil a
participação no parlamento burguês, para «despertar» esses setores de massa e
combater a ipfluencia da política burguesa e pequeno burguesa sobre eles.
Portanto, quando o doutrinarlsmo pretende que o único prejuízo a combater é o
reformismo «trabalhista», se «esquece» de que existem, como vimos, formas de
envolvimento do proletariado pelos políticos burgueses ou pequeno burgueses que
servem de sustentação ao parlamento - e que, muitas vezes, $So ainda mais diretas,
atrasadas e radicalmente alienantes do que o reformismo «trabalhista».
Afi(ma*se que a massa assume hoje uma atitude passiva e está submetida ao
«paternalismo dos que estão por cima». Ocorre que esta passividade nSo se
relaciona apenas à política burguesa, mas à política em geral, da qual'aquela
passividade ê apenas uma manifestaç8o. Pois, ê evidente que se o proletariado
assume uma posição política própria, ele nSo è passivo em relação aos políticos
burgueses, ele ê contra esses políticos. Mas, os doutrinaristas acreditam que o
paternalismo e a passividade, istoé. a submissão mais total á política burguesa (da
qual o parlamento è em nosso pais um instrumento secundário, mas não
desprezível) de massas já submetidas durante décadas ao populismo e iludidas,
não apenas pelo clero reacionário, mas por outros tipos de oportunistas burgueses
e pequeno-burgueses é indicação segura de que os comunistas encontrarão uma
resistência menor ao assumimento duma aç§o Independente (que nSo excluí a
atuaçSo no parlamento) por parte das massasI Pois, a atuação no parlamento não
visa combater apenas «o caminho reformista», mas também todas as outras
formas de envolvimento do proletariado por ideologias e políticas burguesas, não
reformistas e abertamente reacionárias.
Entretanto, os doutrinarisras julgam necessário «avaliar se já se formou no
nosso movimento operário uma«ideologia política», uma unidade que ultrapasse a
mobilização economica para assumir uma perspectiva política — seja ela
sindicalista, como na Argentina, reformista, como na Europa, etc. »(M.M., pag 44)
A pretexto de analisara conjuntura põe-se em dúvida as concepções gerais mais
elementares do marxismo. Para minimizar a necessidade do trabalho político da
vanguarda, resolve-se colocar em questão se a massa possui uma ideologia,
qualquer que ela sejal E para isso joga-se com palavras de forma a confundir a
questão de formatão completa quanto possível. Eclaro que a ideologia política do
proletariado brasileiro não è uma «unidade», não é uniforme, multo menos nâo ê
independente, não abre «perspectivas»; é uma ideologia burggecA.. çom© não
podería delxardeseraideologiade um proletariado dominado que não possui uma
consciência revolucionária. Mas, o que tem isso a-ver com discutir so existe
ou não uma ideologia?! O que tem a ver a existencla de uma ideologia qualquer (e
hào desta ou daquela ideologia) com «mobilizações» seja de que tipo for? Se não
houver mobilizações, a Ideologia do proletariado será tanto mais alienada, mais
fantasista, mais inconsciente, mais burguesa. Mas, existirá, pois o homem precisa
de uma ideologia, qualquer que seja — e determinada historicamente — que lhe

a 105
permita referenciar-se perante a sociedade — e isto inevitavelmente também a nivet
político. E isto que ensina o marxismo. Mas a «etapa» das lutas econômicas
precisa anteceder não apenas a ideologia revolucionária, mas inclusive a toda e
qualquer ideologia political
Teorizar sobre o «vazio ideológico», a isto levou a fuga dos doutrinaristas à
denúncia política do regime.
Nesse mesmo estifo é a afirmação de que «o parlamentarismo é um método
reformista » quando feita no sentido de dizer que toda participação no parlamento é
reformista, e que só se justifica — emboai continue a ser reformista — em
determinadas situações. Pois se a atuação no parlamento ê sempre um método
reformista, os revolucionários não poderiam utilizá-lo nunca.
As reformas, são Indispensáveis á revolução, mas isto nada tem a ver com
considerar que o método revolucionário pode ser conciliado com o método
reformista.Pois o reformista utiliza as reformas para decompor o acúmulo
revolucionário das massas, enquanto o revolucionário usa as reformas para
decompor e enfraquecer a resistência da burguesia e da reação. Assim, a atuação
parlamentar será reformíjta ou não na dependencia de saber como 6 exercida.
Portanto, dar a entender que a atuação parlamentar è um método reformista que
pode ser utilizado em determinadas condições é uma forma de contrabandear a
idéia de que a atuação parlamentar è sempre reformista. Essa afirmação é também
uma demonstração de que os doutrinaristas só conseguem conceber a forma
burguesa de atuação parlamentar, e revela uma significativa predisposição à
Complacência com oreformismo, apesar de todo o alarido «anti-reformista» atrás
do qual gostam de se esconder.
2)- O pais vive sob uma ditadura, e o parlamento é uma mera fachada».
Nesta tipo de argumento está patente a <ruetraçao de uma Huaio liberal, pole do
ponto de vlslada rapresentatlvkJade o parlamento burguês á aeinpra uma «mora Ia-
chada». Por outro lado, os revolucionários não condicionam sua atuação no
parlamento burguês em função do podar que efetivamente ele detenha, pois a
questão do poder entre o proletariado e a burguesia nunca se decide dentro do
parlamento. Se a atuação dos revolucionários dentro do parlamento visa«despertar
e educar» os setores atrasados da massa, se não ae tem liusCes sobre tomar o
poder através do parlamento, então essa instituição pode ser utilizada com proveito
mesmo quando detem muito pouco poder real.
n Wo Brasil, o parlamento está politicamente superado, iustamenta porque a
democracia também está superada e falida. Justamente porque é precisamente na
crise que a«democracia «ao* reforço ao parlamento » (que até entSo não passou de
um ornamento) vottam i tona; isso pelas mesmas razoes que nSo temos aqui as
condições da luta de ciasses referida porLen/n, nio é o nosso o parlamento inglês,
alemSo e Italiano, pois nesses países a luta de o lasses permitia a democracia como
alternativa (o que implicava em sua estabilidade)burguesa» {Contra o Democratis-
mo).
Temos aqui um exemplo de esmagamento ideológico trevestido de «radicalis-
mo»: «A democracia (em geral) está superada a falida». Mas Isso jà to) visto...
Avancemos. Quanto à democracia burguesa, ela está subordinada hoje à ditadura
burguesa, mas ê ingenuidade acreditar que ela esteja falida ou que não pese mais
nos acontecimentos e na consciência da massa. Além do mais, nós já vimos que a

,#e
OÔII
PO considera a possibilidade de uma reforma agrária que gere participação
democrática, portanto sua afirmação de que a democracia burguesa só è possível
em um momento de crise não ê para ser levada a sério (grifamos a sua afirmação,
porque outros — e Inclusive nós — tem coerentemente esta posição).
A afirmação de caráter gerai de que a atuação parlamentar só cabe quando o
parlamento exerce o poder (democracia burguesa) ou quando essa è uma
«alternativa estável», alèm de subestimar o fato de que o poder entre classes
antagônicas nunca é disputado ceniralmente através dos parlamentos, nao assume
que extamente por Isto a atuação dos revolucionários não é determinada pelo papel
objetivo do parlamento, mas pela situaçao subjetiva de parcelas consideráveis da
massa. Neste sentido, o parlamento, mesmo com uma reduzida parcela de poder,
pode permitir aos políticos burgueses uma considerável Influencia sobre a massa e
a atuação revolucionária no parlamento pode ajudar a neutralizar essa influencia.
E por isso que não são indispensáveis as condições «do parlamento inglês,
alemão ou italiano»;é por isso que a Duma russa, um «ornamento», que reunia
uma parcela de poder ainda mais reduzida que o nosso Congresso, permitiu aos
bolcheviques uma atuação extremamente proveitosa, ainda que a democracia
burguesa e parlamentar na Rússia tenha se revelado uma alternativa muito poiico
« estável». Como se sabe, a Assembléia Constituinte russa foi fechada praticam en-
te no mesmo ato de sua Instalação. (E tudo isto, para desespero dos espíritos
simplistas, após a tomada do poder pelo proletaraido, através dos Sovlets).
Por outro lado, a afirmação de «Contra o Democratismo»deque«não temos aqui
as condições de tuta de classes referidas por Lenln»ò feita logo após terem trans-
crito um trecho em que este lembra que os acordos com partidos oportunistas só
podem ser feitos-se«conservamos completa liberdade de agitação, propaganda a
de açSo política. Sem essa última condição, naturalmente, nõo podemos aceitar
formar um bloco, pois seria uma tralçio».
Portanto, as «as condições referidas porLenln», que segundo os douUinariataa
não existem no Brasil, devem ser esta «completa liberdade de agitação,
propaganda e de ação». Ora, Lenin não se refere aqui à liberdade permitida
pelo regime, que nunca è completa, mesmo em qualquer democracia burguesa —
como também não era na autocracia tzarlsta — ainda mais a liberdade de açlo —
mas evidentemente faia de conservar sua liberdade em relação aos partidos
oportunistas com quem se estabelece o acordo. Isto é, o fato particular de se
assumir um acordo não pode limitar de nenhuma forma a denúncia revolucionária
desses partidos.
3)«Nflo existem no Brasil, partidos s organizações operárias voltadas para o
parlamento ■*.
Essa afirmação pretende, por um lado, que a atuação junto ao parlamento 6
desnecessária, e por outro lado, que ela é impossível.
Os que assim pensam, passam por alto o fato de que se não existem partidos
operários voltados para o parlamento, isto não se dá porque as massas não estejam
sob influencia da política e da ideologia burguesa — e, portanto, dispensem a
atuação parlamentar; mas simplesmente porque esses partidos tem sido
impedidos de participar do parlamento. Por isso, o envolvimento na política
burguesa se dá diretamente através dos partidos burgueses. Por outro lado, a
perseguição movida contra o socialismo não é um obstáculo Intransponível para

. m ô€
que uma política proletária atinja o parlamento. Pois, as dificuldades que ela terá
de vencer sffo exatamente as mesmas — ainda que mais acentuadas aqui — que
encontra para se expressar em qualquer instituição legal. Len in afirma que quando
hão é possível uma atuação abertamente revolucionária no parlamento, ê também
útil a existência de uma «oposição simpatizante da revolução» nesse órgão :
«Mas os autores da tese í« renunciar a toda açh parlamentar») confundiram-se
totalmente e esqueceram a experlencla de uma série de revoluções, talvez até de
todas, experlencla que confirma a singular utilidade que representa (até mesmo
porocasISo da revoluçSo)combinara açlo de massas fora do parlamento reacioná-
rio com uma oposIçSo simpatizante da revoluçSo (ou melhor ainda, que a apoie a-
bertamente) dentro desse parlamento», (Bsquerdismo ...)
Essa condição por vezes apenas simpatizante da oposição parlamentar não
impede sua atuação, exatamente porque os operários conscientes não tem ilusães
de que o principal e mais profundo trabalho de agltaçSo, propaganda e organização
seja executado por ela, e compreendem que essa oposição parlamentar, multas
vezes indispensável, é entretanto apenas um instrumento auxiliar do movimento.
No Brasil, não existe nem mesmo uma oposição parlamentar simpatizante da
revôluçâò^masnSo se pode afirmar, a priorl, que sua constituição seja Impossível.
Sobre a possibilidade dos operários conscientes conseguirem espaço no MDB
para realizarem a denúncia combativa do regime e do próprio MDB, co-
mo medida Inicial para a futura constituição de uma frente parlamentar operária,
lembremos que o MDB representa multo mais o espaço legal resultante da
mediação entre o que os militares quiseram, puderam e/ou tiveram que aceitar
como oposição à sua política, do que um partido potltlco que se constltue a partir
da defesa de determinados interesses de classe. Assim, foram desembocar nesse
espaço legar os mais diversos setores de classe e frações de classe. E, ainda que
setores do medio capital tenham se constituído geralmente na principal dessas
forças, tal supremacia nunca foi tao marcante que as demais forças não
conseguissem autonomia em relação a ale, o medio capital (e, evidentemente,
pouca «autonomia» em relação aos limites Impostos pela ditadura). E o caso do
chaguismo, dos autênticos, etc. Assim, uma atuação dos operários conscientes
dentro do parlamento, mesmo enquanto continuarem havendo duas legendas (o
que não slgn If ica apenas dois partidos) não terá de se restflng ir aos limites a q ue se
imponham as demais ciasses e frações de classes.'
Por outro lado, a participação dos operários conscientes num processo eleitoral
não fica necessariamente impedida, mesmo quando eles não conseguirem atuar
dentro do parlamento.
Pois, se o proletariado nflo pode ter ilusões sobre a possibilidade de alcançar sua
emancipação principalmente através do parlamento, isto nSo significa que
necessariamente ele não possa usar essa instituição para colocar problemas e
obstáculos à livre movimentação do grande capital e da ditadura.
Se o proletariado — sem prejuízo de seus objetivos centrais: organização e luta
extra-parlamentares — consegue favorecer uma situação em que o grande capital e
a ditadura — que coesionam o bloco dominante — encontrem resistências ao
referendo no parlamento de sua polftlca, Isso contribuirá para minar mais ainda a
coesão do bloco burguês, o que è útil ao avanço.do movimento operário e popular.
Diante de tais impasses, a ditadura poderá spr levada a limitar sua ação, ou, pelo
contrário, poderá cometer novos agravos contra o parlamento, a depender da
conjuntura. A primeira possibilidade poderá ser melhor aproveitada, na luta de

10* 56 \/
massas, paia vanguarda revolucionária, mas a segunda possibilidade, em. um
momento de alguma mobilização, também favoreça o avanço da consciência da*
massas, pois desmascara a «fachada parlamentar» e pseudo-democrática
do regime e demonstra a necessidade do fortalecimento das formas de luta mais
avançadas do movimento.
Os revolucionários tem condições de favorecer situações desse tipo, mesmó
quando os operários conscientes nSo consigam disputar um lugar no parlamento,
pois a recomendação de voto em candidatos nao proletários nlo significa o
endosso e o compromisso com as posições políticas desses candidatos. Peto
contrarkj, a aceitação do voto em determinados políticos poderá ser • melhor forma
de permitir uma denúncia mais ampla e mai» completa de suas vacllações e
traições:
« Os comunistas ingleses consideram hoje, com muita frequência, que lhes re-
sulta difícil inclusive acercar-se das massas, e inclusive lograr que estas lhes es-
cutem. Se eu me apresentar como comunista e as convidar a votar por Handerson
contra Lloyd Qeorge, mehSo de ouvir seguramente. E poderei exp//car de forma
acasslvel, n3o só por que os sovlets sSo melhores do que um parlamento e por que
a ditadura do proletariado 6 melhor do que a ditadura de Churchíil{oculta sob o ró-
tulo da »democracia» burguesa), e também que, com meu voto quoro sustentar
Handerson do mesmo modo que a corda sustenta o enforcado,1 que a Iminente Ins-
tauração de um governo dos Handersons demonstrará que tenho razão, atrairá as
massas para o meu tado e acelerará a morte política dos Handersons e dos
Snowdens, tal como ocorreu na Rússia e na Alemanha.»(Esquerdismo,...)
Os doutrinar! st as argumentam que no Brasil não há liberdade política, que nSo
será possível difundira perspectiva do GRT. Em primeiro lugar, nós discordamos
dessa «impossibilidade». Nós consideramos que um ativista raalmente Identifica-
do com as massas saberá, com toda a repressão, fazer se entender Inclusive nas
questões mais avançadas. Em segundo lugar, o GRT, hoje, é ainda principalmente
uma palavra de ordem de propaganda geral. A questão política que cabe centrar
(sem exclusi vlzar) nossa agitação hoje á a denúncia classista das man ifestações de
opressão e exploração que se abatem sobre os trabalhadores eo apoio á resistência
nas fábricas, bairros, sindicatos, escolas, fazendas, etc.
Acreditar, pois, que o voto em eleições burguesas represente necessariamente
um endosso e um compromisso com as posJçõea políticas de em quem se vota, é
revelar uma concepção burguesa das eleições parlamentares. Isto ô, è ver o voto
como garantia de uma efetiva repreaentatividade — o que, entretanto, nSo
corresponde à realidade. No Brasil, por mais «passiva» e menos «orgânica» que
seja a tendencia da massa de votarem candidatos não proletários, essa tendencia
existe com enorme força em importantes parcelas da massa. Não foi átoa que, em
74, a PO e outros consideraram que «nlo havia condlçoes» para nenhum trabalho
entre as massas durante as eleições ...
Portanto, nós nos convencemos pela própria experlencia que, em muitos casos,
a aceitação do voto em candidatos não proletários permite uma denúncia multo
maior e muito mais ampla desses candidatos; e, por isso (e também exatamente
porque o parlamento é um palco secundário da luta de classes), tal tática não
prejudica o esforço no sentido de levar a classe operária a ocupar o centro e a
vanguarda da luta política, mas pelo contrário, em muitos casos, poderá ser a
melhor forma de utilizares períodos eleitorais para fortalecera luta e a organização
extra-par lamentares dos trabalhadores e do povo.
4) Não 6 aceitável nenhum tipo de acordo com partidos burgueses.
Ao contrário do que, inacreditável manto, pretendem os doutrlnaristas, Lenln
jamais afirmou que «alianças, acordos e compromissos» só se justificam com
partidos formados dentro da classe operária. Acordos e compromissos s5o muitas
vezes necessários, n3o só dentro do movimento operário, como também com a
burguesiaea pequena burguesia. No «Esquerdismo ...», Lenincita, não só o caso
de acordos com partidos operários em degeneraçio, como tambrh acordos com a
burguesia nos casos de greves, da «Paz de Brest-Litovsky », concertada conr os
imperialistas alemães inclusive após a tomada do poder pelo proletariado, etc.
Nas Resoluções da VI Conferências do POSDR (Obras Escolhidas HJ), falando
sobre a segunda etapa das eleições para a IV Duma, Lenln escreve;
«(Va segunda etapa das eleições (nas assembléias de delegados dos distritos ru-
rais, nas províncias de votantes, etc.}, sempre que o imponha a necessidade de fa-
zer fracassar a lista centurionogrlsta-outubrista. ou a lista do governo em geral, se
concertarão acordos para distribuição de bancas, em primeiro lugar com a demo-
cracia burguesa (trudoviques, socialistas populares, etc.), e togo a seguir com os
liberais (kadetes), sem-partidos, progressistas,,etc. r>
5) « Na ausência de uma força política que repr
do proletariado, os compromissos com o movimento de «««democratização» só
poderão se efetivar se abrímos mão do carAler de classe de nossas perspectivas, se
abrimos mão de lutar desde agora por uma alternativa proletária á ditadura, por
formas de lutas próprias do movimento operário, pelo desenvolvimento da
consciência politica de seus setores avançados» (MEP, Teses..., pag.40).
O argumento de que os setores avançados da classe só devem estabelecer
acordos com outras posições de classe, a respeito de questões determinadas,
depois de terem construído uma força politica que os represente em conjunto, è
uma tese liquidacionista. Ela implicaria na negação de toda a qualquer atividade
legal até que existisse essa «torça politica», já que toda atuação legai implica em
um determinado nível de compromisso com o Estado burguês.
-Esta tese liquidacionista é.realmente a únioa a que-se poderá chegar, se se
considera que as formas de lutalegaise ilegais se confundem mutuamente; se se
pretende agitar as formas de lutas ilegais e clandestinas através do trabalho legal;
se se reduz a « luta desde agora por uma alternativa proletária» ao proselitismo a
respeito dos objetivos estratégicos; se se pretende colocar em discussão em
acordos com outras posições de classe, referentes a aspectos da vida legal,
questões que são dé competência untca e exclusiva do movimento operário e
popular, se se confunde-acordos com alianças, etc. •“ ^
Mas, compreendendo-se que o compromisso com o proletariado-— ainda mais
no trabalho legai não se demonstra principalmente pel o proselitismo a respeito
dos objetivos estratégicos, mas peladenCmolade tódos os fatos atuais em que o
proletariado é lesado em seus interesses, 'efeonomicos e políticos, e$timulando-se
dessa forma a lutaextra-partamentar, etc'; percebendo-sev que o trabalho legal nio
pode pretender também esgotar o trabalho ilegal, mas preparar o terreno a ser
complementado e aprofundado pelo ttabalho Ilegal; percebendo-se que acordos-
relativos a aspectos do trabalho parlamentar não podem ném preolsam entrar nas
no
questões relativas á luta extra-parlamentar das massas, então se compreenderá
que è perfeitamente possível promover uma açSo unitária dos setores mais
avançados, que nem sempre a burguesia terá condições políticas de impedir que
atinja uma Instancia parlamentar e ai apoie e fortaleça o movimento extra-parlã-
mentar.
Além disso, a crença de que o trabalho parlamentar só possa ser assumido
consequentemente apoiado desdeo inicio nas massas está muito mais próxima da
perspectiva reformista de utilizar o movimento de massas como sustentação da
luta partamentar por esta ou aquela reforma, subordinandoo movimento de massas
á atuaçSo parlamentar, do que da perspectiva revolucionária dec estimular o
movimento através da atuaçSo parlamentar, isto è, subordinando es a atuaçSo ao
movimento de massas. E inclusive a partir de sua própria atuaçSo que o
parlamentar consequente vai ganhando representatlvldade para radicalizar cada vez
mais suas denuncias e conclamações.
Lenin mostra como Karl Uebknecht na Alemanha e Z. Hoglund na Suécia
puderam, inclusive sem apoio de massa? desde baixo, dar exemplos de utilização
verdadeiramente revolucionária do parlamento. (Esquerdismo,...).
Se as idéias socialistas ainda são muito pouco desenvolvidas classe operária,
daí concluímos que devemos atribuir prioridade absoluta á nossa atuação seio
dela. Mas, para isso, temos de combinara? formas Ilegais com a's legais; e,
portanto, essa atuaçSo, ainda que concentrada na classe operária, implicará no
estabelecimento de acordos com outras posições de classe. O que 'a experiencia
tem demonstrado è que os operários conscientes, e todos os qge lhes assumem a
perspectiva, n3o só tem conseguido estabelecer acordos que lhes tem permitido
levar mais íónge suas denuncias e agitações legais, criando melhores condições
para a atuação legal, como também tem conseguido, através desses acordos, atrair
para suas posições setores antes sob a influência da democracia pequènó-burgue-
sa. , ...
6) « A atividade parlamentar Junto aos liberais ... está também contribuindo para
que, numa ftova escalada repressiva, a ditadura facilmente domine pela força os
avanços dados petas lutas. Basta atemorizar os liberais, oú cassar alguns deles, ou
até mesmo corrompè-los com algumas migalhas, e atacar com a repressão as suas
llgãçóes com a massa avançada, tática já utilizada pelà repressão, para que ae des-
truam os «acúmulos de forças» voltado? para a luta parlamentar» (MEP, Teses,
pag. *1).
Em primeiro lugar, não se trata de acúmulo de forças «voltado para a luta parla-
mentar». Trata-se dò contrário, de estabelecer uma prática pâr/arftèntar yoltàdg
para fortalecer o acúmulo de forças fora do párlamentp. Quanto às cassações,
entre as pioras hipóteses, è sempre melhor que a ditadura seja obrigada a se
desmascarar, cassando mandátos. do que goze exatamente dos mesmos poderes
mantendo incólume sua fachada parlamentar. ' ", , .. ...
Quanto a «atacar com a repressão» qs ligações da massa avançada CÓrrí o
parlamento, e??e è um risco exatamente domesmo tipo qúe se corre em qüálquèr
trabâlho legal, que sempre permIte certa identificação dos setores mais avançados.
7) « Tèmos de fazer ume ressalva;: .à intenção doMR-8 não é levado proletariado
para os parlamentos burgueses, é.tlré-lo de 1*. Entretanto, a Intenção naate caso
já reflete uma falsificação da História concreta, pois o proletariado niò está lá . ..»

111
v £
O que temos de admitir no entanto é que a palavra de ordem lançada por várias
organizações de esquerda pelo voto nos autênticos contribuiu — lato sim — para
levar setores da classe para o parlamento, contribuiu para forjarem certos setores
uma crença politlca no MDB. Setores restritos, certamente, limitados aos círculos
que foram organizados nos comiles de apoioa este ou aquele autentico» (M.M.,
pag. 54).
Ai está a«história concreta», segundo PO. Como o proletariado tem sido Impedi-
do de participar fisicae diretamenle do parlamento, conclui-se que o parlamenta-
rismo burguês è coisa superada a nível de consciência da massa. E multo
interessante, por outro lado, que os doutrinaristas considerem necessariamente
q ue o voto critico nos autênticos significa <■ levar setores para o parlamento », mas
que o voto inconsciente nas outras correntes do MDB e da Arena não signifique aue
o proletariado «está lá». Os doutrinaristas, que enxergam «populismo» em todo e
qualquer movimento espontâneo das massas, sempre que Isto lhes ajuda a
«justificar» sua omissão na luta política, tornam-se entretanto totalmente cegos
diante de sua presença, quando se trata realmente de combatè-lo.
Se parcelas consideráveis das massas apoiam hoje, ainda que passivamente, a
politlca parlamentar burguesa, ó evidente que é Impossível utilizar consequente-
mente os processos eleitorais sem «levar» até esse trabalho «setores restritos»,
isto è. conscientes, que aprendem cada vez mais a assumi-lo, justamente para
ajudar a afastar as massas”dòs diversos tipos de Ideologias burguesas e n3o ape-
nas das ilusões parlamentares. E, através de sua prática, esses setores mais
conscientes assimilam uma compreensão das limitações do parlamento, principal-
mente no nosso pais, bem mais concreta do que a de quem oscila entre considerá-
lo «falido» e como alternativa mágica, prestes a ser utilizado pela burguesia.
8) «A recomendação da voto subestima a Importando doo operários avançados
a privilegia o atlnglmento da massa mais atrasada.»
Aqueles que são realmente avançados, se são capazes de compreender que o
parlamento náo pode resolver seus problemas, serão também capazes de
compreender que. não obstante ele pode ser utilizado para fortalecer sua luta.

• *
A defesa exclusiva do volo nulo não è hoje senão uma fuga às inúmeras
dificuldades que os operários conscientes enfrentarão para se expressarem
também atravôsjJo parlamento; è a atitude de quem se recusa a exploraras brechas
legais, em função do pavor de naufragar dentro delas. Assim, oqueos absentelstas
temem é. antesdetudo.asua própria debilidade de princípios. Os «fundamentos»
que apresentam em defesa de sua posição não passam de racionalizações com que
procuram mascarar esse temor e essa debilidade.
Realmente, a experlencia demonstra que é necessário grande firmeza para atuar
nos parlamentos reacionários de forma verdadeiramente proveitosa para o
proletariado, sem se deixar envolver pelas manobras e artimanhas da burguesia,
sem cair nos desvios parlamentaristas e pacifistas.
Mas o que os operários conscientes e seus aliados vão sé dando conta é que
torna-se contudo indispensável disputar o espaço iégal no parlamento e nas

112
eleições burguesas, para também dal estimular a resistência das massas e
combater as diversas manifestações da ideologia burguesa e pequeno-burguesa —
centrando fogo no inimigo principal, a ditadura militar.
Além disso,em muitos casos, que caberá analisar concretamente, em que n&o
existam candidatos comprometidos com o proletariado, a denuncia dás opsolções
burguesas e pequeno-burguesas poderá nSo excluir o voto em candidatos seus.
«E se se contesta que esta tètica è demasiado«sutif» ou demasiado complicada
para que as massas possam compreendê-la (...), respondera/ aos impugnadores de
«esquerda»: nSo atribuam às massas o doutrlnarismo de vocês!» (2)

NOTAS
1) Para chegar a esta conclusSo, nâo há necessidade de nenhuma «autoconscien-
cia» excepcional. Pelo contrário, para um comunista esta ê uma conclusSo das
mais simples e elementares. Mas è verdadeiramente notável que os doutrinaristas
considerem que a autoconsclencia, um dos aspectos do conhecimento, prlnclpal-
mente em suas «cuimínanclas», è assunto da alçada dos «Idealistas»! Mas o
objetivo è claro: desencorajar qualquertendenciade seus seguidores no sentido de
se enxergarem um pouco melhor e perceberem o erro de suas concepções e o
caráter de classe delas.
2) Lenin, hEsquerdismo, Obras Escolhidas, VI, Ed. Cartago, pag. 80.

setembro de 1976
Daniel Terra

i:
Internacional

O processo da revolução democrática

popular em Moçambique
Samora Moisés M achei

NOTA DO COMITÊ DE AEDAÇXO:


O texto que publicamos a seguir revolucionário moçambicano e da
ó um dos capítulos de um livro de FRELIMO, discute e aprofunda a
Samora M achei, Intitulado «O pro- questSo da luta pela unidade revo-
cesso da revolução democrática po- lucionária. IntelIzmente, por moti-
pular em Moçambique». Ainda que vos de espaço, nSo pudemos —
o lexto nSo seja recente, oontinua como era nossa IntençSo — publi-
atual, na medida em que, ao lado car também textos mais recentes da
de fornecer elementos para a com- FRELIMO, o que esperamos fazer
preensão da história do movimento no futuro.

A NATUREZA SOCIAL OA FRENTE E A SUA LINHA POLÍTICA

1. A unlflcaçlo do movimento naclonallala


A natureza da luta, uma luta peta independência nacional, que destról a
dominação estrangeira que se op5e aos interesses de todae as camadas sociais
moçambícanas, explica a preocupação pela unidade que dominou desde o inicio o
movimento patriótico moçamblcano.

W
As experiências das guerras de resistência à conquista colonial — ainda frescas
nas memórias das populações —, a revolta do Báruè terminada em 1918,
demonstraram claramente que a causa essencial da vitória colonialista se encontra
no caráter'desunido e disperso da resistência.
Mas estes dados objetivos não eram automaticamente apreendidos e uma longa
luta foi necessária para fazer triunfar a unidade.
A partir dos fins dos anos 50, organizam-se fora de Moçambique movimentos '
patrióticos entre grupos compostos essencialmente de exilados econômicos
;
...
instalados nos paises vizinhos. .\ ' **
A UDENAMO (União Democrática Nacional de Moçambique) cria-se na Rodèsia
do Sul, recrutando os seus membros entre os trabalhadores e emigrados vindos
sobretudo das províncias de Manica e Sofala, Gaza a Lourenço Marques.
A UNAMI (União Nacional Africana de Moçambique Independente) constitui-se
no Malawi, buscando os seus membros especialmente entre os originários das
provincias de Tete, Zambèzia e Niassa.
A MANU, primeiramente denominada Maconde Afrlcan National flnlon e depois
Mozambique African National Union, forma-se em Mombaça, agrupando particu-
larmente os elementos de origem maconde da provinçla de Cabo Delgadoi
Esta ação, como se verifica, nSo se consegue libertar intelramentedo t ri bali amo
e do regionalismo. Ela não consegue unir vastas massas para as tarefas de
libertação nacional. Diversos fatores o explicam. 0 atiçamento pelo colonialismo
das rivalidades tribais, religiósas e outras, a falta de experiência e de cultura
política dos militantes, na maioria dos casos muito jovens, são os tatores
essenciais. \
\
No entanto, a existência de várias organizações não corresponde real mente a
uma divagem política e social. Elas constituiram-se entre grupos de emigrados e
exilados, consoante os lugares em que viviam, frequentemente desconhecendo a
sua mútua existencla. O fato é que a multiplicação das organizações não é de
natureza a mobilizar as massas.
Os acontecimentos do Congo, o desencadeamento da luta de libertação em
Angola, a Independencla da Tanganica vêm eáfimufar os sentimentos patrióticos,
Mas, ê sobretudo o processo de evolução no interior de Moçambique que yjaf ,
desencadear o movimento uniflcaoor.
Paralelamente à agitação patriótica no exterior, no interior de Moçambique, em
especial nós centros urbanos de Beira e Loürenço Marques e nas' zdnás onde sé ^
encontram embriões de cooperativas agrícolas como em Gazá, Cabo Delgado 6
Manicae Sofola desenvolve-se uma ação patriótica. Simultaneamente, pequenos
grupos, utilizando frequentemente organizações culturais, recreativas e organiza-
ções de socorro mutuo, lançam um debate de Idéias. E o caso do Núcleo dos
Estudantes Secundários Africanos de Moçambique (NESAM), do Centro Associa-
tivo dos Negros de Moçambique, etc.
Embora numôricamentô fracos e sujeitos a uma repressão constante, estes
grupos aparecem como a expressão do sentimento patriótico que anima sobretudo
as massas urbanas. A Fraqueza numérica, na realidade, não corresponde ao papel
importante e dlnamfzador que desempenham junto da opinião.
A visita a Moçambique, em 1961, do camarada Eduardo Ctilvambo Mondlane,
então funcionário das Nações Unidas, cristaliza e acelera o processo da
consciência' unitária e a aspiração à libertação nacional. Os contatos que
estabelece durante a sua visita, a plataforma simples, clara e justa que propõe ás
diversas forças-dispersas, vão desencadear um processo que levará á formação do
movimento de libertação nacional.
A ação do camarada Eduardo Chivambo Mondiane e dos outros camaradas,
apoiados pelos grupos do interior, consegue final mente em 25 de maio de 1962
reyrçira MANU e a UDENAMO, com o objetivo de discutirem a unificação do
movimento nacionalista. Um protocolo de unificação é assinado entre as duas
organizações. A UNAMI, sentindo a pressão a favor da gnidade, é torçada a apor a
sua assinatura ao protocolo de unificação.
<1
Em 25 de julho de 1962, de acordo com o prçtocolo, as tres organizações
dissolvem-se e consfitui-se a FRELIMO — Frente de Libertação de Moçambique.
Uma direção provisória, encabeçada pelo camarada Eduardo Chivambo Mondlane,
é encarregada de organizar o I Congresso da Frelimo, que se realizou de 23 a 28 de
setembro de 1962.
A Frelimo ao constituir-se, define-se como uma organização de massas que
recebe no seu seio todos os moçámbicanos, sem distinção de sexp, origem étnica,
crença religiosa ou lugar de domicilio, que aprovem os estatutos e o programada
Frelimo, e se comprometam a aplicar a linha política da Frelimo.
O l Congresso precisa que são objetivos da Frelimo: a liquidação, total da
dominação estrangeira, de todos os vestígios do colonialismo e do imperai ismo; a
conquista da independência imediata e completa; a construção de um Moçambi-
que desenvolvido, moderno, próspero e forte. Para leyaf a cabo a sua ação, a
Frelimo define os objetivos prioritários de trabalho.
Trata-se primeirámente de mobiiizar e organizar as vastas massas populares,
cujos Interesses objetivos e aspirações $e concretizam no programa da Frente.
Levar as massas a comprender qual a estratégia e tática da libertação nacional.
O então recente massacre de Mueda, a ferocidade da repressão desencadeada
em Angola, o reforço das forças mil itares colonialistas, a instalação da PI DE, que
desencaeia uma campanha terrorista de intimidação, tornam evidente que a
libertação nacional exigirá o recurso á luta armada Assim, o segundo objetivo é de

116
preparar o desencadeamento da luta armada de libertação nacional, nomeadamen-
te formando os quadros polltlco-mllltares necessários para o empreendimento.
Em terceiro lugar,é indispensável lançar-se uma campanha no exterior que
desmascare o colonialismo português e mobilize a favor do Povo Moçamblcano a
solidariedade internacional.
Finalmente, tendo em conta o caráter particularmente obscurantista do
colonialismo português, impãe-se a necessidade da rápida do ntoel de conhecí.
mentos científicos: a educação cientifica e literária aparece como uma prioridade,
uma necessidade para o desenvolvimento posterior da luta armada e de
reconstrução nacional.
Os temas simples e claros que a Frelimo propõe encontram um eco positivo e
quase que Instantâneo em todas as camadas sociais, em todas as regiões do pais.
A missão dos primeiros organizadores que a Frelimo enviou para o trabalho
clandestino, na prática não consiste em convenceras populações da justeza da
causa ou da necessidade da luta, mas sim em organlzè-las, isto 6, dlstrlbuir-lhes
tarefas concretas que preparam o desencadeamento da luta. No entanto o sucesso
que a Frelimo encontra, a adesão massiva das populações, o entusiasmo
despertado, não significam de maneira nenhuma que a questão essencial da
unidade se encontrava definitivamente resolvida,
Com efeito, a unidade aparece como um processo continuo de satisfação das
reivindicações e no curso desse processo opera-se uma ação de refeição e de
assimilação.
2. A unidade no processo continuo de defesa dos Interesses das massas
Em muitos textos da Frelimo, nas reuniões e discussões entre militantes, o
processo de unidade aparece definido em 3 etapas que se sucedem continuamen*
te: unidade, critica, unidade.
A uma fase da unidade atingida, segue-ae a experiência da prática, no curso da
qual se revelam os pontos fracos e fortes da unidade atingida e se manifestam as
exigências das novas situações criadas pelo desenvolvimento da futa e da
consciência. Sucede-se então uma fase de critica, no curso da qual são rejeitadas
as idéias, as forças e os comportamentos que não correspondem à etapa atlngldae,
por consequência, minam a unidade, porque introduzem em nosso seio valores
ultrapassados. Uma forma superior de unidade é assim atingida.
A iinhacondutorado processo, a pedra de toqueque permite detectar os desvios,
é o interesse objetivo das massas trabalhadorase, por consequência, o progresso
da revolução. A quem serve esta idéia, esta forma, este comportamento, a "due
zona, nossa ou do inimigo, corresponde essa manifestação, óa pergunta queôürge
continuamente durante o processo da critica. • "*< ! ’•:' •-
A unidade não é pois uma forma estática, um valor sobrenatural e absoluto que
colocamos num pedestal para contemplar em èxtase. ;c 'í u-.-
No processo da luta pela unidade, dizemos sempre: devemos saber com quem
nos unir e para que.
Vivemos continuamente esse processo desde a criação da Frelimo e, como o
definiu o Comitê Central na sessão de abril de 1969, a revoiuçSo aparece como um
rio, que a med ida em que progride e se torna mais forte, Incorporando novas forças,
também rejeita progressivamente para as margens as cargas Impuras que
transporta.
Em 1962, quando a Frelimo se constituiu, o objetivo era apresentar às massas
uma alternativa è submissão.
Praticamente a totalidade do povo moçambicano rejeita a dominação colonial,
no entanto, a consciência das massas é baixa, a experiência organizai iva quase
nula, a repressão forte. Trata-se pois dentro deste contexto, de mostrar que é
possível a vitória através de um combate unido contra o Inimigo comum, o
colonialismo português.
Sobre este ponto pode-se, em 1962, realizara unidade, é ela pois que serve de
plataforma de partida da freilmo. Mas, a seguir surge a questão de saber como
liquidar o colonialismo em nossa pátria. Os massacres deXinavane(1947) e Mueda
(1960), as repressões sangrentas e brutais das greves da estiva e dos Caminhos de
Ferro da Beira e de Lourenço Marques (1963), o desprezo manifestado por Portugal
em relação à resolução 1514eoutras da ONU, a ferocidade colonialista em Angola,
o aumento continuo das forças armadas e policiais em Moçambique, as repetidas e
claras declarações do colonialismo português, mostram claramente que a única vja
de libertação passa pela luta armada.
A situação exige pois de cada um, uma tomada de posição em relação à questão
crucial da luta armada. Uma divagem vai, pois, operar-se. Em especial no selo da
d i ração jda Frelimo existem numerosos elementos vindos das direções de MANU,
UNAMIeUDENA MQ. Esses elementos vivemhàmuitoiempo fora de Moçambique,
sem contato direto ou conhecimento real da situação existente. A sua experlencia
política foi adquirida na convivência com as organizações nacionalistas da
flodàsia, MalawJ,, Zambia. Tanganloa, .Quenia,. 'organizações cuja estratégia
consiste em organizar vestas massas que, « através de-manifestações , greves e
outras ações, nao violentas,« .c.riam;;Uma situaçSo-íjue leva a potência colonial a
negociações que conduzem nu ma primeira fase â autonomia interna e mais tarde
à. independêgqia-i .•*;«. \
Esses elementos confundem a situação de uma potência colonial desenvolvida,
industrializada e imperialista, como a Gra-Bretanha, com a situação de Portugal,
pais subdesenvolvido, nãoindustrializado e vivendoem situação de semi-colonia.
Esses elementosignoram a dlst I nção entreum pais.de democracia burguesa, onde
a opinião pública nacional e internacional desempenha um papel, apesar de tudo,
relevante, e um pels fascjeta, em qua arcensura e a repressão policia* impedem
qualquer manifestação de desacordo., : <- •. .v.:
Dai a sua oposição àyia aFmada. Estoconcepção errada e nociva ao progresso da
luta, contrária aos interesaes objetivos das massas^ opõe-se ao grau de

118
consciência atingido pelas próprias massas. A oposiçSo À luta armada bloqueia o
processo libertador. A contradição para ser resolvida no interesse das massas
exige a liquidação das concepções errôneas. O principio da luta armada triunfa e
por isso suscita oposição.
Um primeiro grupo com Baltazar Chakonga e outros ant Igos dirigentes da UNA Ml
eMANU afastam-se da Frellmo, porque se opõem ao principio da luta armada. Um
outro grupo com Gumane eantlgos dirigentes da UDENAMO e M ANU, subestima a
força real do Inimigo, porque nâo o conhece e pensa que bastam algumas ações
violentas et erro ri atas para levar o inimigo a capitular. Trata-se na realidade de uma
oposição ao principio da luta armada popular, pois que se preconiza que esta seja
desencadeada imediatamente, sem nenhuma mobilização prévia das massas, sem
nenhuma preparação de quadros que orientem e dirijam o processo. Esses
elementos separam-se também da Frellmo, quando a Frell.tno define métodos
objetivos e científicos que levarão ao deçencadeamento da luta armada popular. A
fase atingida exigia uma clarificação que, liquidando os òpoç|uplstas e
aventureiros, permitisse um progresso na luta, e um reforço da un.i0£de ao servjçp
das massas e seus objetivos.
Graças à unidade atingida com o processo político, em 25 de setembro de 1964, a
luta armada é desencadeada com sucesso em diferentes pontos do território
nacional.
As vitórias alcançadas, em particular nas províncias de Cabo Delgado e Nlassa,
conduzem a novos desenvolvimentos da situação.
Apartirdos fins de 65 começam a surgir zonas de ondea administração regional
se retira, as populações abandonam suas povoações para escapar à repressão e
viver sob a proteção da Frellmo. Progressivamente este processo desenvolve-se,
surgem as zonas libertadas e semi-llbertads, isto ó, íonas onde a totalidade das
vidas das massas depende da orientação da Freiimo, onde no cotidiano se aplicam
as nossas palavras de ordem. Uma nova situação qualitativa ó criada, com novas
exigências.
Como organizar a produção, como administrar as populações, que tipos de
relações sociais de produção devem existir nas zonas rurais, quais as relações a
estabelecer entre a$ populações e as estruturas da direção da Frellmo, entre o
exército e as populações, são problemas que aparecem como imediatos e requerem
resoluções concretas e claras.
A sociedade tradicional possui também formas opressivas e discriminatórias,
nomeadamente em relação à mulher e à juventude. Era necess&rio pois que o
processo libertador atingisse também a sociedade tradicional.
O aumento de populações nas nossas zonas resultou num crescimento
importante dos efetivos do exército. Este jé não era constituído porduas centenas e
meia de elementos, mas sim por: milhares de combatentes e punha^se por
consequência a questão de saber que exército construir, quais as relações a existir

Ui
<tre este, ar asas e a FRELfMO.
As queslõc a organização da produção e do comércio, do tipo de relações
jcíais de prc ;So a estabelecer, a questão da natureza do exército e do poder
velam-se ct • questôes-chave donde depende a solução do conjunto dos
obiemas.
De novo dua linhas surgem no nosso seio: uma respondendo aos interesses
js elementos que vêem na luta um melo de se substituir enquanto classes
<ploradoras às classes colonialistas, e outra correspondendo aos Interesses
ojetivos das massas que lutam para abolir a exploração do homem pelo homem.
Nas zonas libertadas, desaparecida a presença colonial, os embriões da
jrguesia e as sobrevivèncias feudais sentem o terreno fértil para o seu
asenvolvj mento enquanto classes exploradoras.
- O controle do poder nascente e do exército que se cria aparece como condição
ssencial para a realização destas ambições.
6 evidente que as reivindicações da nova classe de exploradores não são
>rrhuladas duma maneira tão crua. Dir-se-á que se é contra a exploração mas que
staè feita exclusivamente pelos colonialistas, ou ainda que as questões do poder,
a organização, da produção e comércio, do novo tipo de relações sociais de
redução, etc., são questões que devem aguardar a independência. No entanto os
oblemas exigiam uma solução imediata. Saber se devíamos instalar uma
iministraçao popular, um Poder Popular, ou simplesmente manter o sistema
nterlor de administraçao afrlcanizando-o, se devíamos organizar um comércio ao
srviço do povo que controlasse o mercado Interno e externo, lançar o movimento
as cooperativas agrícolas, ou permitir em contrapartida que antigos règulos e
utros elementos explorassem os trabalhadores agrícolas ou instalassem um
omércio fundado sobre a especulação, nao eram questões teóricas, discussões e
Ipóteses acadêmicas; Tratavam-se de questões reais e Imediatas .existentes em
ada povoaçâo libertada, em cada reglao, em cada zona sob o nosso controle.
Que á questão dividia a direção da FRELIMO era evidente. Mas importava saber
.e, para salvaguardar a unidade com um punhado de elementos que se encontrava
:ta direção, deviamos sacrificar os Interesses das vastas massas populares,
jermitindo assim quéo sangue vertido e os sacrifícios consentidos, fertilizassem o
oresclmento duma nova classe exploradora e opressora.
Uma batalha politica travou-seho nosso selo, uma luta que refletia interesses
opostos, um combate duró em que os elementos* reacionários multas vezes
recorrem à violência, como testemunham os assassinato»dós camaradas Mateus
Sansão Muthemba, membro do Comitê Central, e Paulo Samuel Khankomba,
membro do Estado-Maior o*chefe adjunto das operações.
A partir mesmo dum certo momento, quando as forças reacionárias sentiram a
batalha perdida, devido à consciência das massas; elas áhãram-secom 0 próprio
colonialista português, ora designando a este os aivos a abater no nosso seio, co-
mo foi o caso do assassinato do Camarada Presidente Mondlane, ora mesmo
desertando para se juntar abertamente aos colonialistas. ou lançando campanhas
públicas e caluniosas no exterior para denegrir a organização.
Todavia, o processo de rejeição destas forças reacionárias reforçou ainda mais a
organizaçao, pois permitiu que as massas sentissèm plenamente que os seus
interesses exigiam a defesa da linha revolucionária e que a defesa desta se
identificava com a realização das reivindicações populares.
A batalha que se travou entre 1907 e a segunda metade de 1Ô69, permitiu-nos
atingira presente fase de unidade, a fase em que a nossa unidade serve o combate
anticoloniallsta e anti-imperialista, destrói as estruturas políticas e econômicas,
sociais e culturais de exploração, para que se instale na nossa pátria uma
sociedade nova, um regime social popular.
Certamente que a fasede unidade que atingimos hoje não é de maneira nenhuma
a última. Novas contradições deverão surgir entre nôs, criadas pelo desenvolvi-
mento e exigências da situaçao. £ possível que elas não atinjam o grau critico do
passado, na medida em que duma maneira geral adquirimos por um lado uma maior
experiência para detectar e resolver as contradições quando ainda embrionárias e,
por outro lado, as forças que representavam os Interesses das camadas
exploradoras afastaram-se da luta. desmascarando-se e aliando-se aberta e
claramente com o próprio colonialismo.
De toda a maneira as contradições surgirão, a oposição à revolução, a
contra-revoluçao continuará a existir. Esta é a experiência histórica de todas as
revoluções, uma necessidade do processo do progresso.
3. A questão ideológica no seio duma frente larga
O conjunto destas questões levanta-nos o problema do papel e da necessidade
da ideologia para o desenvolvimento revolucionário. A afirmação já clássica de que
sem teoria revolucionária não hà prática revolucionária, encontra uma ampla
justificação na nossa experiência.
Contudo, a nossa prática apresenta algumas originalidades neste capitulo, em
particular na relação entre a existência de uma frente larga sem partido de
vanguarda constituído e a ideologia revolucionária.
Seja dito para evitar qualquer ambiguidade, que a inexistência do partido de
vanguarda no seio da frente larga, não resulta nem dum postulado da nossa análise
nem dum objetivo ou mesmo estratégia nossa. Trata-se sim-dum conjunto de
circunstâncias históricas que vivemos-, caracterizadas entre outros aspectos,
essencialmente, pela inexistência duma classe operária organizada e com'
tradições e concepções reacionárias imoostas ao povo pela dominação feudal e-
colonial, o isolamento das comunidades, especialmente as rurais,- até-à
constituição do movimento nacionalista, o que nos privou de experiências teóricas
e práticas do movimento revolucionário mundial.
A necessidade de uma Ideologia revolucionária não surge como uma exigência
livresca, assim como a ideologia naoé constituída pela simples leitura dos mestres
do pensamento revolucionário.
Ainda que a elaboraçSo Ideológica deva imenso à contribuição teórica e prática
do movimento revolucionário dos outros povos, a ideologia é sempre uma criação
da lula concreta dum povo e das suas classes revolucionárias, ela só se torna real
quando assumida e vivida pelas largas massas, quando a teoria renasce e se
materializa na prática quotidiana da luta. Só assim ela se transforma na força
material imensa que conduz o povo a derrubar a velha ordem e a construir a nova
sociedade.
A linha política, a ideologia surgem como orlentaçSes aos problemas concretos
suscitados pelo desenvolvimento da luta e exigidos para o progresso do processo.
Substituiras solidarledades ultrapassadas deordem tribal, linguística, religiosa
e cultural pela unidade nacional, pela consciência de pertencer a uma imensa
classe trabalhadora e explorada, definir claramente o Inimigo e fazer assumir pelas
massas a sua natureza exploradora, demarcar por consequência sem ambiguida-
des as nossas idéias e valores, objetivos, método e comportamento daqueles do i-
nímigo, foram e sSo necessidades concretas que vivemos.
A unidade nacional e de classe são Instrumentos Indispensáveis para
destruirmos a máquina poderosa do inimigo, são a nossa força essencial, são o
nosso principal ponto forte. A definição do alvo para as nossas armas não pode
tolerar nenhuma ambiguidade, tanto mais que nas circunstâncias históricas da
nossa luta, em que afrontamos sobretudo forças econômicas, políticas e militares
duma Nação diferente, é multo fácil Identificar-se o inimigo com uma raça,
desnaturando assim o sentido da luta, permitindo que forças reacionárias
fortifiquem no nosso seio e percamos a sensibilidade política necessária para
nunca confundir o amigo e o inimigo.
Por isso mesmo se exige ainda de cada um de nós o combate interno que leva a
eliminar tudo o que nas nossas idéias, critérios de valores e comportamento, não
corresponde àquilo que pertence â nossa zona e onde uma sociedade nova se
constrói.
A transformação de um raciocínio metafísico, próprio á nossa sociedade
tradicional, num raciocínio cientifico e materialista, único capaz de analisar e
transformar a sociedade e de mobilizar as leis da natureza a nosso favor, a
libertação da energia criadora das massas, asfixiadas pelo conservantismo e
Imobilismo da sociedade passada, a emancipação da mulher e da juventude
dominadas pelas tradições reacionárias, constituem exigências presentes do
desenvolvimento da guerra e da reconstrução nacional.
A solução destes problemas requer de nós a formulação duma linha clara e
precisa que oriente os quadros e militantes.
A destruição das estruturas dos poderes colonialista e feudalísta para a
mstâlaçSo do Poder Popular, a HquídaçSo da propriedade exploradora e a evolução
das formas individualistas de produção para formas coletivas, necessitam que a
direção forneça princípios e orientações concretas e claras.
A diversidade social do nosso pais é acentuada pela diversidade étnica e racial. A
nossa vitória resulta da nossa capacidade em engajar na luta anticoJonialista e
antifascista todas as forças e camadas sociais de Moçambique, com exceção
evidente da Ínfima minoria que controla e dirige o grande capital explorador e o
aparelho de repressão. Mas fazô-lo sem por em causa os interesses da maioria
constituída pelas massas laboriosas exploradas, requer clareza e firmeza de
princípios.
Por outras palavras, a questão central é a da conciliação entre a frente larga
destinada a derrubar a dominação colonial e imperialista por um lado e por outro as
exigências duma ideologia capaz de levar a revolução a seu termo, o que
efetivamente corresponde jô à reivindicação das largas massas trabalhadoras.
Trata-se pois, e esta tem sido a nossa experiência, de salvaguardar e ampliar
continuamente a frente pela Inclusão de novas forças e de, simultaneamente,
elevar o nível geral de consciência das massas e o rigor ideológico dos militantes,
de maneira a aprofundar o conteúdo das reivindicações populares e traduzi-las no
processo de transformação da sociedade.
Assim se compreende a importância primordial que damos ao trabalho
ideológico no nosso seio e no seio das massas e a prioridade que estamos a dar a
favor da formação de quadros, que são o fator decisivo para a aplicação criadora da
nossa linha política.
E através deste processo ainda, em que o trabalho ideológico está intimamente
associado à pratica revolucionária, que, progressivamente, criamos as condições
para que no seio da frente cada ve2 mais larga constitua-se, organizada, a
vanguarda revolucionária das massas trabalhadoras moçamblcanas.
O contexto da reconstrução nacional e da implantação das novas estruturas de
poder numa situação de guerra apresenta exigências concretas e imediatas que as
largas massas estão em condições de aprender e assumir, desde que levemos a
cabo o trabalho necessário de explicação política.
E este conjunto de circunstancias, fatores e objetivos que permitiram o
desenvolvimento do conteúdo da luta de libertação nacional, levando-a teórica e
praticamente à fase da revolução democràtlco-popuiar. Esta fase caracteriza-se
pela destruição do Estado colonial-fascista e da dominação Imperialista e pela
instauração do poder da aliança entre as amplas massas trabalhadoras, com o
objetivo deedificar as bases duma Sociedade Nova, duma sociedade fundada nos
interesses das massas laboriosas.
O processo de guerra popular de libertação e de edificação do exército popular
contribui poderosamente para acelerar o processo geral de aprofundamento da
Ideologia e transformação das menta!idades, base Indispensável à construção da
Sociedade Nova.

123
ERRATA:
Na página 74, parágrafo último, onde está escrito:
...Entretanto, este novo Estado é funda menta Imente diferente do anterior, jà «é
a maioria da população que tedito». Pois ele nSo é mais um «poder especial»...
Lè-se:
...Entretanto, este novo Estado é tundamentalmenle diferente do anterior, jà
«nSo ó mais um Estado própriamente
1
dito». Pois ele nSo é mais um «poder
especial»...
*3

AINDA ERRATA:
Na página 9. as colunas esi3o trocadas.
Na pàgma 69. no 4o parágrafo, aonde está escrito:
..ainda que em posição secundária, sob o capitalismo. Em proletariado...
Lcia-se:
..ainda que em posiçSo secundária, sob o capitalismo. Em segundo lugar, porque
se a burguesia recua visando o contra-ataque, e o proletariado...
Na página 75. os très primeiros parágratos s3o repetição dos parágrafos
anteriores.

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