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EFEITO DA ADIÇÃO DO POLÍMERO POLI(ÁLCOOL VINÍLICO) NAS

PROPRIEDADES DAS ARGAMASSAS


Alexandra Ancelmo Piscitelli Mansur (1); Otávio Luiz do Nascimento (2);
Herman Sander Mansur (3)
(1) Departamento de Engenharia Metalúrgica e Materiais da UFMG, aapiscitelli@uol.com.br
(2) Faculdade de Engenharia e Arquitetura-FUMEC, Otavio@consultare.eng.br
(3) Departamento de Engenharia Metalúrgica e Materiais da UFMG, hmansur@uol.com.br

RESUMO
Poli (álcool vinílico), PVA, é um polímero solúvel em água utilizado na modificação de pastas,
argamassas e concretos. O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da adição de PVA, com
diferentes graus de hidrólise e tamanhos de cadeia, em algumas propriedades das argamassas.
Argamassas com os aditivos e argamassa de controle (sem polímero) foram preparadas para o estudo
utilizando cimento CPII-F32 e areia quartzosa. As argamassas foram preparadas na proporção 1: 1,7
(cimento:areia), em peso, e relação água/cimento igual a 0,60. O aditivo foi incorporado em solução
aquosa nas quantidades de 0,5%, 1,0% e 2,0% em relação ao peso de cimento. As argamassas foram
caracterizadas quanto ao índice de consistência, retenção de água, teor de ar incorporado e resistência
à flexão. Os resultados mostraram que a adição de PVA altera significantemente as propriedades das
argamassas no estado fresco e endurecido.

ABSTRACT
Poly (vinyl alcohol), PVA, is a water-soluble polymer used in the modification of cement pastes,
mortars, and concrete. The purpose of this work was to evaluate the effect of the PVA addition, with
different hydrolysis degrees and sizes of chain, in some properties of mortars. Mortars with additives
and mortar of control (without polymer) were prepared for the study using cement CPII-F32 and
quartzous sand. Mortars were prepared in the 1:1.7 ratio (cement: sand), in weight, and 0.60 water to
cement ratio. The additive was incorporated in aqueous solution in the amounts of 0.5%, 1.0%, and
2.0% in relation to the weight of cement. Mortars were characterized as to the consistency, water
retention, air entrainment, and flexural strength. The results showed that the PVA addition
significantly modifies the properties of mortars in the fresh and hardened state.

Palavras-chave: argamassas modificadas com PVA, consistência, retenção de água, teor de ar


incorporado, resistência à flexão.

Keywords: mortars modified with PVA, consistency, water retention, air entrainment, flexural
strength.

1. INTRODUÇÃO
Poli(álcool vinílico), PVA ou PVOH, é um polímero solúvel em água utilizado na modificação de
pastas, argamassas e concretos (OHAMA, 1998). Uma vez que o monômero álcool vinílico não é uma
forma estável, o PVA é produzido a partir da polimerização do acetato de vinila formando o polímero
poli (acetato de vinila), PVAc, seguida da hidrólise alcalina do PVAc formando o PVA. Como a
reação não ocorre completamente, têm-se os PVAs com diferentes graus de hidrólise, em função da
extensão da reação de saponificação. Na essência, todo o PVA é na verdade um copolímero de PVA e
PVAc, apesar de ser chamado na literatura científica de PVA juntamente com a indicação do seu grau
de hidrólise (HASSAN e PEPPAS, 2000, KIM e ROBERTSON, 1998). O PVA é usualmente utilizado
em sistemas cimentícios em pequenas quantidades (até 3 %, em peso, em relação à massa de cimento),
após solubilização em água (OHAMA, 1998, KIM et al, 1999, SINGH e RAI, 2001, KIM e
ROBERTSON, 1998).
PVA também está presente nos polímeros na forma de látex como agente emulsificante e
redispersante. Atualmente, a maioria dos latexes usados em polímeros para argamassas são produzidos
com até 5% de surfactantes incluindo o PVA (ROTTSTEGGE et al, 2005, JENNI et al, 2005).
A adição de PVA em pastas, argamassas e concretos promove a melhoria da trabalhabilidade e da
retenção de água (OHAMA, 1998, KIM et al., 1999, KIM et al, 1998). Alguns autores observaram
uma redução das resistências à compressão devido ao aumento do teor de ar incorporado (KIM et al,
1999). Outros, no entanto, verificaram um aumento da resistência à compressão e redução da
porosidade como resultado da interação entre o PVA e cinzas volantes adicionadas ao cimento, pela
formação de novos compostos que preenchem os poros ou aumento da ligação entre os grãos de
cimento (SINGH et al, 2001).
O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da adição de PVA, com diferentes graus de hidrólise e
tamanhos de cadeia, em algumas propriedades das argamassas, a saber, índice de consistência,
retenção de água, teor de ar incorporado e resistência à flexão.

2. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

2.1 Materiais
Os estudos foram realizados em argamassas de cimento CPII-F32 (Tabela 1) e areia de quartzo
modificadas com polímeros poli (álcool vinílico) de diferentes graus de hidrólise (GH) e tamanhos de
cadeia conforme anotado na Tabela 2. O cimento foi gentilmente fornecido pela Cimento Tupi, a areia
pela Minerações Gerais S.A. e o PVA pela Celanese Chemicals.
Tabela 1 – Análise química e propriedades do cimento utilizado (informações fornecidas pelo fabricante).

Composição Química (%)


SiO2 Al2O3 Fe2O3 CaO MgO SO3 Na2O K2O CO2 RI PPC
17 5 3 60 6 3 <1 1 4 1 5
Propriedades Físicas
Tempo de Pega (min) # 200 Finura Blaine Resistência à Compressão (MPa)
Inicial Final (%) (m2/kg) 3 dias 7 dias 28 dias
275 345 3 3381 28 31 39

Tabela 2 – Nomes comerciais, graus de hidrólises, massas molares e identificação das amostras utilizadas
no estudo.

Grau de
Massa Molara Identificação da
Nome Comercial Hidrólisea
(g/mol) Amostra
(%)
Celvol 603 81,0 13.000-23.000 C81-13/23
Celvol 530 88,0 85.000-124.000 C88-85/124
Celvol 205 88,7 31.000-50.000 C88.7-31/50
Celvol 425 95,7 85.000-124.000 C95.7-85/124
Celvol 165SF 99,4 >186.000 C99.4-186
a
Valores fornecidos pelo fabricante.
2.2 Métodos
As argamassas foram preparadas e utilizadas em ambiente de laboratório, com temperatura e umidade
do ar de aproximadamente (23±3)°C e (60±10)%. A proporção cimento:areia empregada nas
argamassas foi 1:1.7 em massa, mantendo-se constante a relação água/cimento em 0,60.
Foram utilizados teores de polímero/cimento (p/c), em peso, de 0% (controle) e 0,5%, 1,0% e 2,0%. O
polímero foi introduzido nas pastas e argamassas em solução na água de amassamento da mistura.
Para tal, inicialmente, foi preparada a solução de PVA, em concentrações (p/p) de 5%, 7% ou 10% de
polímero em água deionizada. No preparo da solução, o PVA em pó é misturado intensamente em
agitador magnético, por 5 minutos, para molhagem das partículas do polímero em pó, seguida de
agitação mais lenta, sob aquecimento em banho-maria da ordem de (75±5)°C, até a completa
dissolução do polímero. Antes do preparo das misturas, foi feita a diluição da solução de PVA em
água na quantidade necessária para garantir os fatores a/c estipulados.
A mistura foi realizada em misturador mecânico, conforme NBR 7215, em velocidade de baixa
rotação. Inicialmente foi feita a mistura a seco do cimento e da areia. Em seguida, esta mistura seca foi
colocada sobre a água de modo contínuo, durante 30 s. Foi feita então mistura mecânica, seguida de
mistura manual com espátula e novamente mistura mecânica, cada uma destas etapas consumindo 60
s. Após este procedimento, a argamassa foi deixada em repouso por 15 min coberta com pano úmido,
sendo remisturada por 15 s antes do uso.
As argamassas foram caracterizadas quanto ao índice de consistência, retenção de água, densidade de
massa e teor de ar incorporado e resistência à flexão.
O índice de consistência foi realizado conforme proposto pela NBR 13276/2002 (Argamassa para
assentamento e revestimento de paredes e tetos – Preparo da mistura e determinação do índice de
consistência) A retenção de água (Ra) foi determinada seguindo os procedimentos da NBR
13277/1995 (Argamassa para assentamento de paredes e revestimento de paredes e tetos –
Determinação da retenção de água). O teor de ar incorporado (AI) foi obtido a partir da NBR
13278/1995 (Argamassa para assentamento de paredes e revestimento de paredes e tetos –
Determinação da retenção de água)..
Na determinação do teor de ar incorporado é necessário o valor da densidade de massa teórica da
argamassa anidra que foi determinada conforme os procedimentos da NM 23 (Cimento portland e
outros materiais em pó – Determinação da massa específica).
Para a determinação da resistência à flexão foi utilizada como referência a NBR 14992/03 (Argamassa
à base de cimento Portland para rejuntamento de placas cerâmicas – Requisitos e métodos de ensaio)
adaptada às condições de estudo (cp de seção transversal 25 mm x 25 mm e comprimento 300 mm;
desmoldagem após 48 horas com armazenagem em ambiente de câmara úmida até a ruptura; vão entre
apoios no ensaio igual a 230 mm).

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 Índice de consistência


Os resultados de consistência obtidos para os diferentes PVAs na condição de fator a/c = 0,60 estão
mostrados na Tabela 3.
Uma vez que o ensaio de consistência adotado mede o espalhamento da argamassa, pode-se observar
que a adição do polímero aumentou a consistência da argamassa reduzindo a fluidez do sistema, o que
aparece como uma redução do valor do índice de consistência. Os resultados indicam, ainda que,
menores valores do índice de consistência, isto é, um menor espalhamento da argamassa, foram
obtidos para os maiores tamanhos de cadeia do PVA.
Em geral, a adição de polímeros para a produção de argamassas modificadas com polímeros, promove
uma melhoria da fluidez das argamassas, tanto maior quanto a razão polímero/cimento (OHAMA,
1998), permitindo inclusive a redução da água necessária para obtenção de uma mesma consistência.
Para alguns polímeros, no entanto, esta melhoria de fluidez não é observada (WU et al, 2002). KIM et
al (1999) observou um aumento do abatimento do tronco de cone (quanto maior o abatimento, maior a
fluidez) em concretos modificados com PVA utilizando um polímero parcialmente hidrolisado (87-
89%) e com massa molar entre 31000-50000 g/mol, sendo tanto maior o abatimento quanto maior a
razão PVA/cimento. Os resultados obtidos nos ensaios de consistência da argamassa mostraram
tendência contrária destes reportados por KIM.
Tabela 3 – Medidas de consistência para as argamassas modificadas com PVA.
Polímero p/c Índice de consistência (n = 2)a
- 0 % (referência) (301±4) mm
C81-13/23 2,0% (288±7) mm
C88-85/124 2,0% (228±8) mm
C88.7-31/50 2,0% (284±6) mm
C95.7-85/124 2,0% (206±7) mm
0,5% (275±4) mm
C99.4-186 1,0% (232±4) mm
2,0 % (181±10) mm
a
Os resultados foram fornecidos pela média e pelo desvio padrão.
No caso em estudo, apesar do PVA adsorver na superfície dos grãos do cimento e produzir uma
individualização dos grãos de cimento, desfazendo os flocos capazes de reter água as interações
cimento-cimento, foram substituídas por interações polímero-polímero ou polímero-água-polímero
através de ligações de hidrogênio, ficando a água da pasta retida próximo das moléculas de PVA em
uma estrutura organizada (NGUYEN, 1996). Desta forma, o aumento da água livre, liberada da
superfície dos grãos e dos flocos, que poderia aumentar a fluidez não é verificada ficando a
consistência determinada pela afinidade do PVA pela água, o que na faixa estudada mostrou-se pouco
influenciada pelo grau de hidrólise, e definido pelo tamanho da cadeia, determinante da viscosidade da
solução que atua como água de amassamento da argamassa.
O efeito do tamanho da cadeia polimérica na viscosidade da solução de PVA, utilizada para o preparo
da argamassa, pode ser visto na Tabela 4. Considerando a viscosidade da água a 20°C, sendo igual a
1,005 cps, a introdução de polímeros resulta em uma viscosidade da solução polimérica (η) maior que
a viscosidade do solvente (η0), sendo tanto maior o aumento da viscosidade quanto maior o tamanho
da cadeia.
Este resultado é esperado considerando que a viscosidade pode ser vista como a resistência ao
deslocamento de um fluido. A introdução de polímeros em um solvente aumenta sensivelmente a
viscosidade da solução devido ao fato das espirais aleatórias incharem quando em contato com um
solvente adequado, dificultando o escoamento do fluido. Além disso, a cadeia polimérica sob a ação
de um fluido com gradiente de velocidade acaba sofrendo movimentos de rotação que consomem
energia do fluido em deslocamento. Quanto maior a cadeia polimérica, maior será este consumo de
energia, resultando em uma maior resistência ao escoamento do fluido.
Tabela 4 – Viscosidades para a água e para soluções de PVA fornecidas pelo fabricante.
Viscosidade – Brookfield viscosity (20°C
Polímero
em solução 4% de PVA) (cps)
C81-13/23 3,2 cps
C88-85/124 29,1 cps
C88.7-31/50 5,4 cps
C95.7-85/124 29,1 cps
C99.4-186 68,9 cps

Os dados da ficha técnica dos produtos anotados na Tabela 4 foram fornecidos para soluções a 4% em
água a 20°C, que é um valor muito próximo da concentração das soluções de PVA em água (3,4%)
para o teor de p/c igual a 2,0%, de modo que estes valores foram utilizados para verificação da relação
entre a viscosidade da solução de PVA e o índice de consistência, conforme mostrado na Figura 1. Foi
utilizado o valor de viscosidade da solução aquosa para esta análise devido ao fato do pH
praticamente não alterar a viscosidade de soluções de PVA (YINFENG et al, 1999) e devido ao
pequeno efeito na viscosidade dos íons dissolvidos do cimento, para a concentração de PVA e de íons
observada neste estudo e nos sistemas cimentícios em geral (TAYLOR, 2003; BRISCOE et al, 2000;
YINFENG et al, 1999).
A curva obtida (Figura 1) apresenta uma redução do índice de consistência com o aumento da
viscosidade da solução de PVA. O mesmo comportamento foi verificado para a relação entre o índice
de consistência e a razão polímero/cimento: um aumento no teor de polímero resultou em uma
argamassa menos fluída para o polímero C99.4-186 (Figura 2).

3.2 Retenção de água


Os resultados de retenção de água obtidos para as argamassas em estudo estão mostrados na Tabela 5.
Os resultados indicam um aumento da retenção de água da pasta com a adição de polímero, sendo o
aumento da retenção tanto maior quanto o maior o tamanho da cadeia de PVA e praticamente
independente do grau de hidrólise do PVA. Além disso, mostra um aumento da retenção de água com
o aumento do teor de polímero da pasta.

320

300
Índice de Consistência (mm)

280

260

240

220

200

180

0 10 20 30 40 50 60 70 80
Viscosidade da solução de PVA (cps)

Figura 1 – Curva obtida para Viscosidade x Consistência para o fator a/c constante igual a 0,60 e p/c = 2%
(barra de erro = desvio padrão).
320

300
Índice de Consistência (mm)

280

260

240

220

200

180

0.0 0.5 1.0 1.5 2.0


p/c (%)

Figura 2 – Curva obtida para a relação polímero/cimento em relação ao índice de consistência para o PVA
C99.4-186 com fator a/c constante igual a 0,60 (barra de erro = desvio padrão).
Tabela 5 – Medidas de retenção de água para as argamassas modificadas com PVA.
p/c Retenção de Água (n = 2)a
Polímero
(%) (%)
- 0 % (referência) (87±2) %
C81-13/23 2,0% (91±2) %
C88-85/124 2,0% (95±2) %
C88.7-31/50 2,0% (93±1) %
C95.7-85/124 2,0% (96±2) %
0,5% (91±2) %
C99.4-186 1,0% (94±2) %
2,0 % (98±2) %
a
Os resultados foram fornecidos pela média e pelo desvio padrão.
Este aumento da retenção de água com a adição do polímero é usualmente observado nas argamassas
modificadas com polímeros (OHAMA, 1998; CHANDRA e FLORIN, 1987 e AFRIDI et al, 1995). A
partir dos resultados obtidos, acredita-se que o valor final da retenção de água foi significantemente
afetado pelo aumento da viscosidade da fase líquida pela adição do polímero (solução aquosa de PVA
utilizada para o amassamento da argamassa). Outros efeitos capazes de promover aumento da retenção
de água em argamassas modificadas com polímeros, como formação de filme e selagem dos poros,
não foram avaliados neste estudo.
Considerando que o tamanho da cadeia pode ser avaliado indiretamente através da viscosidade da
solução, de forma similar ao realizado para o índice de consistência, foram utilizadas as viscosidades
das soluções a 4% em água a 20°C fornecidas pelo fabricante, para verificação da relação entre a
viscosidade da solução de PVA e a retenção de água, conforme mostrado na Figura 3.

100

98
Retenção de Água (%)

96

94

92

90

88

86

84

0 10 20 30 40 50 60 70
Viscosidade (cps)

Figura 3 – Curva de retenção de água em função da viscosidade para teores p/c = 2% para os diferentes
PVAs em estudo (barra de erro = desvio padrão).

3.3 Teor de ar incorporado


Na Figura 4 estão anotados os valores do teor de ar incorporado para cada uma das argamassas
preparadas neste estudo.
Na situação em que nenhum surfactante é adicionado à argamassa, os valores obtidos de ar
incorporado são, geralmente, muito baixos devido à instabilidade das bolhas formadas (POWERS,
1968). Na literatura, os valores de incorporação de ar observados para argamassas sem agentes
incorporadores e com composições similares às deste trabalho estão da ordem de grandeza observada
nos ensaios, tendo KIM e ROBERTSON (1997) obtido valor igual a 1,4%.
Ar incorporado sem contribuição do aditivo
Ar incorporado devido à ação do aditivo
30
(a)
25
25
Teor de Ar Incorporado (%)

Teor de Ar Incorporado (%)


20
(b)
20
15

15
10

10
5

5
0
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0
0 Relação polímero/cimento (%)
Referência C81-13/23 C88-85/124 C88.7-31/50C95.7-85/124 C99.4-186

Figura 4 – (a)Teor de ar incorporado para as argamassas com a/c =0,60 e p/c = 2,0%. (b) Teor de ar
incorporado em função do teor de polímero na argamassa para o C99.4-186 (barra de erro = desvio
padrão).
A adição do polímero promoveu uma incorporação de ar nas argamassas (Figura 4). Para as
argamassas modificadas com polímeros, o teor de ar incorporado final é o somatório do ar incorporado
sem qualquer contribuição de aditivo (área sólida, Figura 4a) mais o ar incorporado devido à ação do
aditivo (área hachurada nas colunas da Figura 4a).
A incorporação de ar promovida pela adição do poli(álcool vinílico) decorre do fato deste polímero ser
um surfactante. Surfactantes são moléculas que apresentam grande afinidade por interfaces por
apresentar regiões hidrofílicas e hidrofóbicas (SHAW, 1991). No caso do PVA, as hidroxilas (OH)
correspondem às regiões hidrofílicas e a cadeia carbônica e, especialmente, os grupos acetatos
(OCOCH3), são as regiões hidrofóbicas. Portanto, o ar incorporado é estabilizado pela formação de um
filme do polímero na interface bolha (ar)/água, com os grupos hidroxilas se posicionando em direção à
pasta, formando ligações de hidrogênio com a água, enquanto os grupos acetatos irão se rearranjar de
modo a atingir um mínimo de contato com a água (NGUYEN, 1996), conforme proposto no desenho
esquemático da Figura 5.

OH
OH
OCOCH3 OH Pasta
OH (cimento+água)
OCOCH3
OH
OCOCH3 OH
OH
OCOCH3 OH
OH
Bolha
ar (ar)
OH
OCOCH3 OH
OH
OCOCH OH
3
OH
pasta

Filme de PVA
Figura 5 – Representação esquemática da formação de filme na interface ar/pasta em bolhas incorporadas
na argamassa (sem escala).
O teor de ar incorporado de uma argamassa plástica depende de uma série de fatores, a saber, tipo de
misturador, tempo de mistura, fator a/c, granulometria do agregado, viscosidade, velocidade de
mistura, tamanho do recipiente de mistura em relação ao misturador e presença de aditivo incorporador
de ar (KIM e ROBERTSON, 1997, POWERS, 1968, SHAW, 1991). Nos casos em estudo, o valor de
ar incorporado deve ser analisado considerando, também, os efeitos do grau de hidrólise e tamanho da
cadeia na formação e estabilização das bolhas. Segundo NGUYEN (1996), a redução da energia
superficial em interfaces utilizando o poli(álcool vinílico) aumenta com o aumento do teor de acetato
como conseqüência da hidrofobicidade destes grupos. Além disso, observa-se uma maior adsorção de
PVA em interfaces quanto maior o tamanho da cadeia polimérica pelo favorecimento do aumento da
entropia. Nesta análise, considerando que, no intervalo de tempo entre o contato do cimento com a
água e a realização do ensaio, pequena extensão de saponificação é verificada, as análises serão
realizadas levando em conta o grau de hidrólise inicial do polímero.

A partir destas considerações, o polímero C81-13/23 apresenta como fator favorável à


formação/estabilização das bolhas o baixo grau de hidrólise. A menor viscosidade do sistema também
aumenta a taxa de circulação e garante uma maior quantidade de água livre disponível para a formação
de bolhas (apesar de também aumentar a velocidade de deslocamento das bolhas para escaparem na
superfície). O resultado global destes aspectos foi o maior teor de ar incorporado dentre todas as
argamassas modificadas com PVA.
Comparando-se os polímeros C88-85/124 e C95.7-85/124, pode-se verificar que estes possuem o
mesmo tamanho de cadeia (e viscosidade) com diferentes graus de hidrólise iniciais. Baseado neste
aspecto, esperar-se-ia um maior teor de ar incorporado para a argamassa modificada com C88-85/125,
o que não foi verificado, uma vez que ambas as argamassas apresentaram o mesmo valor de AI.
Baseado neste aspecto, identifica-se o tamanho da cadeia como sendo um parâmetro de bastante
influência no resultado final do ar incorporado devido ao seu efeito na viscosidade do sistema.
Já a comparação de argamassas produzidas com o C88-85/124 e o C88.7-31/50, permitiria supor,
termodinamicamente, um maior AI para a argamassa com o C88-85/124. Apesar disto ter sido
verificado, baseado na análise do valor obtido (17%) juntamente com resultados da literatura (KIM e
ROBERTSON 1997) e com imagem de microscopia eletrônica de varredura obtida (não mostrada)
acredita-se que este polímero apresente em sua composição um agente redutor de ar incorporado.
Finalmente, para o polímero C99.4-186 observou-se o menor valor de ar incorporado (21%) quando se
comparam argamassas sem anti-espumante. Baseado nos resultados anteriores e na literatura, este
resultado pode ser justificado, além da baixa concentração de íons acetato, pela elevada viscosidade da
água de amassamento da argamassa produzida com este polímero, reduzindo a taxa de circulação e a
quantidade de água disponível para a formação de bolhas.

3.4 Resistência à flexão


Os resultados de resistência à flexão obtidos para as argamassas em estudo estão na Figura 6.
6,0
6,0

5,0
(a) 5,0 (b)
Resistência à Flexão (MPa)

Resistência à Flexão (MPa)

4,0
4,0

3,0 3,0

2,0 2,0

1,0 1,0

0,0 0,0
Referência C81-13/23 C88-85/124 C88.7-31/50 C95.7-85/124 C99.4-186 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0
Relação Polímero/Cimento (%)
Figura 6 – (a) Valores de resistência à flexão para as argamassas modificadas com PVA. (b) Resultados de
resistência à flexão para diferentes teores de C99.4/186 (barra de erro = desvio padrão).
Pode-se observar que os valores obtidos para as argamassas modificadas com PVA foram, em geral,
inferiores aos da argamassa de referência. Testes de hipótese com grau de confiança 95%,
considerando as médias e os desvios padrões calculados, revelam que não existe diferença
significativa entre as resistências à flexão das argamassas modificadas com os diferentes polímeros
com p/c igual a 2% e que existe diferença significativa entre estas e a argamassa de referência. Em
todos os casos, os valores do coeficiente de variação estão similares aos obtidos por NAKAKURA e
BUCHER (1999), a saber, igual a 16% para as argamassas modificadas com polímero e da ordem de
26% para as argamassas sem polímero.
A redução de resistências mecânicas pela adição de PVA em pastas, argamassas e concretos
produzidos pelo método “tradicional” é especialmente atribuída à redução da seção transversal
resistente em função do ar incorporado na argamassa, devido à atividade superficial deste polímero
(Kim et al, 1999). Além disso, poros são falhas ou concentradores de tensões em materiais cerâmicos
tendo, portanto, um efeito diretamente deletério nas propriedades mecânicas segundo a equação de
Griffith. Assumindo poros esféricos, o maior poro é o mais crítico, embora poros não-esféricos
possam apresentar quinas concentradoras de tensões (PHIL e RAINFORTH et al, 1994).
Na tentativa de avaliar o efeito do teor de ar incorporado na resistência à flexão dos corpos-de-prova,
os valores obtidos nos ensaios (Figura 6) foram corrigidos considerando os valores de AI calculados
para cada argamassa (Figura 4). Para tal, obteve-se uma seção resistente teórica (h x b’), calculada a
partir de b’(equação 1), conforme esquema na Figura 7. Os valores de resistência à flexão foram então
recalculados substituindo o valor de b (25 mm) pelo valor de b’ para cada argamassa.
Os novos valores de resistência à flexão estão mostrados na Figura 8. Testes de hipótese realizados
com estes resultados mostram que as resistências corrigidas para cada uma das argamassas
modificadas não apresentam diferença significativa em relação à argamassa de referência com grau de
confiança de 95%. Estes resultados confirmam o efeito determinante dos poros de grandes dimensões
na resistência à flexão deste material, bem como mostra que a variação de coesão global da
pasta/argamassa pela adição do polímero nestas proporções não é significativa.
AI
b'= b 1− (equação 1)
100
Argamassa endurecida
Ar incorporado

Seção resistente teórica


desconsiderando o ar
h h h incorporado

b b b’
Figura 7 – Procedimento utilizado para estimativa da seção transversal resistente teórica sem AI.
6,0

5,0
Resistência à Flexão (MPa)

4,0

3,0

2,0

1,0

0,0
Referência C81-13/23 C88-85/124 C88.7-31/50 C95.7-85/124 C99.4-186

Figura 8 – Valores corrigidos de resistência à flexão em função do teor de ar incorporado.


4. CONCLUSÕES
A consistência e a retenção de água das argamassas foram dependentes, especialmente, da
viscosidade da solução de PVA utilizada para o preparo das argamassas;
Quanto maior o teor do polímero, maior o teor de ar incorporado, mas com uma redução crescente
da taxa de aumento da incorporação de ar. Além disso, o tamanho de cadeia mostrou ser um fator
muito importante, seja pelo seu efeito na redução da energia superficial seja pela sua direta
influência na viscosidade da água de amassamento da argamassa;
A redução de resistências à flexão das argamassas está relacionada com o aumento do ar
incorporado. A correção das resistências pelo ar incorporado elevou as resistências para valores
similares aos da referência indicando que variação na coesão global da argamassa pela adição do
polímero nestas proporções não é significativa.

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AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico – CNPq, Brasil.

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