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Revista Nacional de Direito de Família e Sucessões/Edições/20 - Set/Out 2017 - Revista Magister de Direito das

Famílias e Sucessões/Jurisprudência/Tutela Antecipada para Majoração de Pensão Alimentícia (TJMS, AI


1403176-02.2017.8.12.0000)

Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1403176-02.2017.8.12.0000

RELATOR: DESEMBARGADOR PAULO ALBERTO DE OLIVEIRA

Ação Revisional de Alimentos. Tutela Antecipada. Majoração


do Encargo Alimentar. Presença dos Requisitos para Concessão
da Tutela Antecipada de Urgência (Art. 300 do Código de Processo Civil/2015)

1. Questão centrada na presença dos requisitos para a concessão da tutela


antecipada no sentido de majorar os alimentos devidos pelo pai à sua filha.

2. Se o conjunto probatório até então produzido nos autos conduz à conclusão de


que houve uma modificação da situação financeira do alimentante ou das
necessidades do alimentando, comparando-se com a época em que foram
fixados os alimentos (art. 1.699 do CC/02), há o fumus boni iuris a justificar a
concessão da tutela antecipada (art. 300 do CPC/2015).

3. Agravo de instrumento conhecido e provido.

(TJMS; AI 1403176-02.2017.8.12.0000; 2ªC.Cív.; Rel. Des. Paulo Alberto de


Oliveira; DJMS 31/07/2017; p. 95)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da 2ª Câmara Cível do


Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos, por unanimidade, dar
provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, com o parecer.

Campo Grande, 26 de julho de 2017.

Desembargador Paulo Alberto de Oliveira - Relator

RELATÓRIO

O Sr. Desembargador Paulo Alberto de Oliveira.

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Ana Flávia Oliveira Soares,


representada por sua genitora Vanilza Aparecida de Oliveira Elebrok, contra decisão
prolatada pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Maracaju/MS.

Ação: Revisional de alimentos proposta pela agravante Ana Flávia Oliveira Soares,
representada por sua genitora Vanilza Aparecida de Oliveira Elebrok, contra o
agravado Wagner Soares da Silva, objetivando a majoração da pensão alimentícia devida
por seu genitor do valor de quarenta e seis por cento e vinte e três avos (46,23%) para
setenta e nove por cento e cinquenta e cinco avos (79,55%) do salário mínimo vigente no
país, considerando que a autora-recorrente desenvolveu uma série de problemas de
saúde - hipotireoidismo, vitiligo, diabetes, cranioestenose, alto grau de hipermetropia,
dificuldade de aprendizado -, necessitando de cuidados especiais, o que demanda muita
atenção de sua genitora, a qual não consegue se inserir no mercado de trabalho,
enquanto o recorrido é sócio da empresa 3P Transportes Ltda-ME, auferindo renda
mensal suficiente para contribuir com um valor maior no sustento da recorrente,
ostentando um ótimo padrão de vida, o que se comprova pelas fotos extraídas das redes
sociais (fls. 26-34).

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Decisão: indeferiu o pedido de tutela antecipada (fls. 90-91).

Agravo de instrumento: interposto por Ana Flávia Oliveira Soares, representada por sua
genitora Vanilza Aparecida de Oliveira Elebrok, sustentando que o Juízo a quo deixou de
considerar as mudanças das necessidades da agravante, sobretudo no tocante ao fato de
ela ter desenvolvido problemas de saúde, sendo que, "havendo alteração no binômio
necessidade/possibilidade, ainda que somente em relação à necessidade de quem
recebe os alimentos, o que não é o caso, a legislação civil já autoriza a revisional de
alimentos, pelo que não se sustenta a decisão proferida pelo juízo a quo". Prequestiona
os dispositivos legais mencionados nas razões recursais.

Requer, ao final, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, e da tutela antecipada


recursal, para o fim de majorar a pensão alimentícia devida por seu genitor-recorrido do
valor de quarenta e seis por cento e vinte e três avos (46,23%) para setenta e nove por
cento e cinquenta e cinco avos (79,55%) do salário mínimo vigente no país. Ao final,
pugna pela reforma da decisão agravada, para que seja concedida a tutela de urgência
pleiteada na inicial.

Decisão liminar: a) concedeu à recorrente os benefícios da justiça gratuita ao menos em


relação ao presente recurso de agravo de instrumento; e b) deferiu o pedido de tutela
antecipada para o fim de majorar a pensão alimentícia devida pelo recorrido à recorrente
para o percentual de setenta e nove por cento e cinquenta e cinco avos (79,55%) do valor
do salário mínimo vigente (fls. 100-107).

Informações do Juiz a quo (fls. 114-115).

Contrarrazões: ofertadas pelo recorrido Wagner Soares da Silva, pugnando pelo não
provimento do recurso (fls. 119-126).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: opinou pelo conhecimento e provimento do


agravo de instrumento (fls. 166/170).

VOTO

O Sr. Desembargador Paulo Alberto de Oliveira (Relator)

Discute-se no presente recurso o preenchimento dos requisitos para a concessão de


tutela antecipada de urgência para o fim de se majorar os alimentos a serem pagos pelo
agravado em favor de sua filha, ora agravante.

Alega a recorrente que "o juízo a quo não observou que os alimentos foram fixados em
favor da agravante no ano de 2009, isto é, há 8 (oito) anos" sendo que "depois do referido
acordo, a agravante desenvolveu diversos problemas de saúde, tais como
hipotireoidismo, vitiligo, dificuldades de aprendizado e problemas de visão, os quais foram
minuciosamente apontados na inicial e estão comprovados pelos documentos anexos" (fl.
05), ou seja, "tais enfermidades demandam elevados gastos com exames, consultas,
óculos, alimentação adequada e diversos medicamentos necessários ao tratamento de
saúde" (fl. 06).

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O Juiz a quo indeferiu o pleito de tutela antecipada, nos seguintes termos:

"Verifica-se que não estão caracterizados os requisitos para deferimento da tutela


antecipada pleiteada, sobretudo porque, a demora e/ou irreversibilidade do dano
milita em favor do requerido.

Pelos documentos carreados nos autos não é possível afirmar que o requerido
tenha aumentado seu padrão de vida e de que teria condições de pagar um valor
maior do que vem pagando.

Diante disso, a majoração de alimentos necessita de um exame mais acurado do


julgador, o que só será possível através da dilação probatória, motivo pelo qual
indefiro o pedido de tutela antecipada." (fl. 06)

Portanto, frente ao princípio da devolutividade, tem-se que o presente recurso limitar-se-á


à análise dos requisitos autorizadores da concessão da tutela antecipada, consistente na
fixação de pensão alimentícia no valor indicado na inicial.

É certo que "no intuito de abrandar os efeitos perniciosos do tempo do processo, o


legislador institui uma importante técnica processual: a antecipação provisória dos efeitos
finais da tutela definitiva, que permite o gozo antecipado e imediato dos efeitos próprios
da tutela definitiva pretendida (seja satisfativa, seja cautelar)" (DIDIER Jr., Fredie;
OLIVEIRA, Rafale Alexandria de; BRAGA, Paula Sarno. Curso de direito processual civil.
Salvador: Juspodivm, 2015. p. 567).

Estabelece o art. 300 do Código de Processo Civil/2015:

"Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que
evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado
útil do processo.

§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir


caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte
possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente
hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação


prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando


houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão."

O dispositivo legal em destaque trata da tutela provisória de urgência (satisfativa ou


cautelar), sendo certo que, para a sua concessão, deve existir, basicamente, a
demonstração dos seguintes requisitos: probabilidade de direito (fumus boni iuris) e
o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).

Insta salientar que o novel Código de Processo Civil, por cautela, preferiu falar em
"probabilidade" em vez de "plausibilidade" do direito. Acerca do tema, prelecionam Luiz
Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

"No direito anterior a antecipação da tutela estava condicionada à existência de


‘prova inequívoca’ capaz de convencer o juiz a respeito da verossimilhança da
alegação’, expressões que sempre foram alvo de acirrado debate na doutrina. O
legislador resolveu, contudo, abandoná-las, dando preferência ao conceito de
probabilidade do direito. Com isso, o legislador procurou autorizar o juiz a
conceder tutelas provisórias com base em cognição sumária, isto é, ouvindo
apenas uma das partes ou então fundado em quadros probatórios incompletos
(vale dizer, sem que tenham sido colhidas todas as provas disponíveis para o
esclarecimento das alegações de fato). A probabilidade que autoriza o emprego
da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica - que é
aquela que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos
disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau e
confirmação e menor grau de refutação nesses elementos. O juiz tem que se
convencer de que o direito é provável para conceder tutela provisória." (Novo
Código de Processo Civil comentado. 2. ed. São Paulo: RT, 2016. p. 382)
(grifamos)

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Por outro lado, por perigo da demora tem-se "a existência de elementos que evidenciam o
perigo que a demora no oferecimento da prestação jurisdicional (periculum in mora)
representa para a efetividade da jurisdição e a eficaz realização do direito" (DIDIER Jr.,
Fredie; OLIVEIRA, Rafale Alexandria de; BRAGA, Paula Sarno. Op. cit. p. 597).

Feitas tais considerações, e diante de toda argumentação desenvolvida pela recorrente


no intuito de infirmar a decisão recorrida, tem-se que a reforma do decisum é medida que
se impõe, como já sinalizei na decisão de fls. 100-107.

Com efeito, baseando-se em questões fáticas, sabe-se que é possível a alteração de


pensão alimentícia anteriormente fixada, considerando a flutuação econômica dos
envolvidos (alimentante e alimentado).

Portanto, se após arbitrados os alimentos sobrevier mudança na situação financeira de


quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz,
conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo (art. 1.699 do
Código Civil).

Logo, para fins de exoneração, redução ou majoração dos alimentos deve-se estar atento
à proporção das necessidades de quem os recebe e das possibilidades de quem os paga,
binômio este que mantém a proporcionalidade do encargo, afastando a possibilidade de
haver o enriquecimento sem causa ou a penúria de quaisquer das partes.

No caso em apreço, restou evidenciada a verossimilhança da alegação no sentido de


justificar a majoração dos alimentos para a quantia indicada na inicial - 79,55% do salário
mínimo.

Sobre as necessidades da agravada, são dispensáveis maiores argumentações, à


medida que as despesas envolvendo criança, que está em idade escolar, são
presumíveis (saúde, alimentação, educação, vestuário, lazer, entre outras).

Ademais, o caso enfocado guarda uma particularidade, qual seja, a menor recorrente,
desde à época da fixação dos alimentos (14.10.09 - fl. 41), teve uma série de problemas
de saúde diagnosticados até então (fls. 42-55 e 57-66), o que certamente reflete num
aumento de suas necessidades a ensejar o pleito de majoração da pensão.

Por sua vez, no tocante às possibilidades do agravante, há nos autos indícios de que ele
melhorou sua situação econômica, já que constituiu sociedade em uma empresa em
29.12.2014, fato por ele mesmo confirmado nas contrarrazões (fls. 119-126).

Observe que, ao contrário do que alega o recorrido nas contrarrazões, não se vislumbra
que ele "ostenta um ótimo padrão de vida" (fl. 121), tanto que a pensão está sendo
majorada apenas de 46,23% para 79,55% do salário mínimo, mas sim que houve uma
melhora na sua condição financeira.

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Ademais, a respeito do argumento de que teve um aumento de suas despesas pela


circunstância de ter mais dois filhos, como bem ressaltou o douto Procurador de
Justiça Olavo Monteiro Mascarenhas "a constituição de nova família não afeta a
obrigação alimentar, sendo possível a sua alteração desde que evidenciada a mudança
da condição econômica do alimentante, como ocorre no caso em apreço" (fl. 169).

Desse modo, restam presentes os requisitos essenciais para o deferimento da tutela


antecipada.

Diante do exposto e com o parecer, conheço o agravo de instrumento interposto por Ana
Flávia Oliveira Soares e dou-lhe provimento para o fim de conceder a tutela antecipada
requerida na exordial, majorando a pensão alimentícia devida pelo recorrido à recorrente
para a quantia de setenta e nove por cento e cinquenta e cinco avos (79,55%) do valor do
salário mínimo vigente.

DECISÃO

Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

Por unanimidade, deram provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, com o
parecer.

Presidência do Exmo. Sr. Desembargador Vilson Bertelli.

Relator, o Exmo. Sr. Desembargador Paulo Alberto de Oliveira.

Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargador Paulo Alberto de Oliveira,


Desembargador Alexandre Bastos e Desembargador Marcos José de Brito Rodrigues.

Campo Grande, 26 de julho de 2017.

Tutela Antecipada para Majoração de Pensão Alimentícia


(TJMS, AI 1403176-02.2017.8.12.0000)

Fernanda Tartuce
Doutora e Mestre em Direito Processual pela Universidade de
São Paulo; Professora do Programa de Mestrado e Doutorado da
Faculdade Autônoma de Direito (FADISP); Professora e
Coordenadora em Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu
em Direito Civil e Processual Civil na Escola Paulista de
Direito (EPD); Membro do IBDFAM, do IASP, do IBDP e
do CEAPRO; Advogada; Mediadora; Autora de
publicações jurídicas.

O acórdão em análise reformou uma decisão interlocutória proferida em demanda revisional de


alimentos que indeferiu o pleito liminar formulado na primeira instância. Pelo entendimento do
segundo grau de jurisdição, como era clara a probabilidade do direito da autora - menor
impúbere que passou a padecer de diversos problemas de saúde após o ajuste da pensão
alimentícia anos atrás -, conceder a majoração pleiteada configurava a iniciativa adequada.

O tema é relevante porque a concessão de medidas liminares não costuma ser fácil em
demandas familiares.

Diante da existência de situações sensíveis para os envolvidos, em grande parte das


demandas familiares há pleitos liminares para que, atuando logo no início do processamento, o
magistrado possa promover a mudança de certa situação em atendimento a uma ocorrência
reputada urgente pelo requerente 1.
O jurisdicionado, ao buscar o Poder Judiciário, sente que precisa da proteção jurisdicional em
sua modalidade mais expedita e eficiente. Sentindo-se necessitados da premente atuação
judicial, muitos clientes exigem de advogadas(os) máxima brevidade.

Na prática, contudo, percebe-se haver certa tendência de juízes de família em manter o status
quo até dispor de elementos probatórios adicionais reputados suficientes para promover a
alteração pleiteada. Assim, não costuma ser tão frequente (quanto apreciariam os advogados e
as partes) a concessão de medidas de urgência; alterar o que se reputa equivocadamente
configurado é uma árdua missão 2.

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Esse modo de atuar (no sentido de negar a medida de urgência por exigir maior dilação
probatória) foi percebida no caso em exame na apreciação em primeiro grau.

A criança, representada pela genitora, buscava em sede de tutela antecipada aumentar


imediatamente a pensão alimentícia do montante de 46,23% do salário mínimo para o
percentual de 79,55% deste. A pensão foi fixada consensualmente em 2009, mas depois da
celebração do acordo a menina desenvolveu diversos problemas de saúde (como
hipotireoidismo, vitiligo, dificuldades de aprendizado e problemas de visão). As enfermidades
ensejaram "elevados gastos com exames, consultas, óculos, alimentação adequada e diversos
medicamentos necessários ao tratamento de saúde".

Segundo consta na petição inicial, por necessitar de cuidados especiais, a menor demanda
muita atenção da genitora e esta não consegue se inserir no mercado de trabalho. O pai
demandado, por seu turno, seria sócio de uma empresa de transportes, auferindo "renda
mensal suficiente para contribuir com um valor maior no sustento da recorrente" e "ostentando
um ótimo padrão de vida" (demonstrado a partir de fotos extraídas de redes sociais).

O juiz de primeiro grau, não se convencendo das razões da autora, negou o pedido nos
seguintes termos:

"Verifica-se que não estão caracterizados os requisitos para deferimento da tutela antecipada
pleiteada, sobretudo porque a demora e/ou irreversibilidade do dano milita em favor do
requerido.

Pelos documentos carreados nos autos não é possível afirmar que o requerido tenha
aumentado seu padrão de vida e de que teria condições de pagar um valor maior do que vem
pagando.

Diante disso, a majoração de alimentos necessita de um exame mais acurado do julgador, o


que só será possível através da dilação probatória, motivo pelo qual indefiro o pedido de tutela
antecipada."

Chama a atenção o fato de que, ao invés de tratar da situação concreta da autora - que
apresentou diversos recibos de gastos por conta dos problemas de saúde -, o juiz de grau
preferiu enfocar a situação do réu que ainda nem havia se manifestado, pressupondo que a
majoração da pensão agravaria indevidamente sua situação.

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As suposições engendradas pelo julgador devem ser consideradas argumentos aptos a


infirmar as alegações trazidas nos autos acompanhadas de documentos? A resposta é
negativa.

Para piorar, ao afirmar que "pelos documentos carreados nos autos não é possível afirmar que
o requerido tenha aumentado seu padrão de vida e de que teria condições de pagar um valor
maior do que vem pagando", o magistrado acaba exigindo da menor impúbere uma prova
árdua de conseguir: a comprovação documental da evolução de ganhos financeiros do
demandado.

Vale lembrar que, nos termos do CPC/2015, não se considera fundamentada qualquer decisão
judicial que: a) invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; e b) não
enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a
conclusão adotada pelo julgador (art. 489, § 1º, III e IV).

A decisão de primeiro grau, quando afirma que a concessão de tutela de urgência milita em
desfavor do demandado, configura decisão genérica apta a fundamentar toda e qualquer
decisão sobre um pleito de urgência.

Tampouco houve o enfrentamento, pelo magistrado de primeiro grau, de todos os argumentos


deduzidos pela demandante.

Além de ter ignorado as necessidades da autora - que provou documentalmente os gastos e as


enfermidades -, o juiz também deixou de se manifestar sobre a ostentação de bom nível de
vida pelo réu em redes sociais.

Ao invés de apreciar os elementos que constavam nos autos, o magistrado preferiu cogitar
sobre a dificuldade hipoteticamente experimentada pelo demandado se a decisão concessiva
da liminar fosse eventualmente reputada errônea em um futuro incerto.

Esse entendimento, ao final, não prevaleceu.

A autora, ao interpor o recurso de agravo de instrumento, pleiteou tutela antecipada para ver
deferida imediatamente a majoração da pensão. Reconhecida a admissibilidade do recurso,
assim decidiu o Relator:

"Em uma análise superficial inerente a esta espécie de tutela provisória, verifica-se a
relevância da fundamentação articulada nas razões recursais (fumus boni iuris), pois a
menor recorrente, desde à época da fixação dos alimentos (14.10.09 - fl. 41),
demonstrou uma série de problemas de saúde diagnosticados até então (fls. 42-55 e
57-66), o que certamente reflete num aumento de suas necessidades. Ademais, para
compor o binômio necessidade-possibilidade (art. 1.694 do Código Civil), conclui-se,
mesmo que em um juízo de cognição sumária, que houve uma melhora na situação
econômica do seu genitor, o qual, inclusive, constituiu sociedade em uma empresa em
29.12.2014 (fls. 85-89). Por sua vez, o risco de lesão grave e de difícil reparação
(periculum in mora) é evidente, por se tratar de verba alimentar, agravado pela
circunstância de a recorrente padecer de sérios problemas de saúde, necessitando de
acompanhamento especial inclusive para o processo de aprendizagem (fls. 46/65).
Assim, visando resguardar os interesses da criança, até que sobrevenha decisão
definitiva neste recurso, afigura-se razoável se majorar a pensão alimentícia para
setenta e nove por cento e cinquenta e cinco avos (79,55%) do valor do salário mínimo
vigente."

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A decisão merece aplausos logo no início por reconhecer algo que, embora soe obvio, na
prática não costuma ser bem compreendido: em sede de tutela provisória, a cognição
engendrada pelo magistrado é superficial e sumária. Exigir provas cabais é conduta
desajustada em relação ao grau de apreciação inerente a tutelas provisórias.

Concedida a liminar, sobreveio o julgamento do mérito para confirmá-la. Merece destaque


trecho do acórdão que, após digressão doutrinária sobre a probabilidade do direito em tutela
provisória, afirma estar evidenciada a verossimilhança da alegação que justifica a majoração
pretendida:
"Sobre as necessidades da agravada, são dispensáveis maiores argumentações, à medida
que as despesas envolvendo criança, que está em idade escolar, são presumíveis (saúde,
alimentação, educação, vestuário, lazer, entre outras).

Ademais, o caso enfocado guarda uma particularidade, qual seja, a menor recorrente, desde à
época da fixação dos alimentos (14.10.09 - fl. 41), teve uma série de problemas de saúde
diagnosticados até então (fls. 42-55 e 57-66), o que certamente reflete num aumento de suas
necessidades a ensejar o pleito de majoração da pensão."

A decisão também tratou das possibilidades do réu, considerando o teor de suas


manifestações expostas nas contrarrazões:

"Por sua vez, no tocante às possibilidades do agravante, há nos autos indícios de que ele
melhorou sua situação econômica, já que constituiu sociedade em uma empresa em
29.12.2014, fato por ele mesmo confirmado nas contrarrazões (fls. 119-126).

Observe que, ao contrário do que alega o recorrido nas contrarrazões, não se vislumbra que
ele ‘ostenta um ótimo padrão de vida’ (fl. 121), tanto que a pensão está sendo majorada
apenas de 46,23% para 79,55% do salário mínimo, mas sim que houve uma melhora na sua
condição financeira.

Ademais, a respeito do argumento de que teve um aumento de suas despesas pela


circunstância de ter mais dois filhos, como bem ressaltou o douto Procurador de Justiça Olavo
Monteiro Mascarenhas ‘a constituição de nova família não afeta a obrigação alimentar, sendo
possível a sua alteração desde que evidenciada a mudança da condição econômica do
alimentante, como ocorre no caso em apreço’ (fl. 169). Desse modo, restam presentes os
requisitos essenciais para o deferimento da tutela antecipada."

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Como se nota, a decisão de segundo grau contempla uma apreciação mais completa da causa
de pedir ao aduzir especificamente os argumentos deduzidos pela autora na petição inicial e
expor, na motivação, sua pertinência. É esse tipo de conduta decisória que se espera dos
magistrados no sistema atual em que a fundamentação das decisões figura como garantia
constitucional. A relevância da motivação, aliás, tem sido potencializada nos últimos tempos -
notadamente pelo grande valor atribuído aos precedentes judiciais na atual configuração
processual civil.

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