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Resumo: Este artigo tem como objetivo discutir as proposições pertinentes à filosofia política
de Mikhail Bakunin e extrair possíveis implicações de seu desenvolvimento na Escola Moderna
de Barcelona, célebre instituição escolar de caráter libertário, cujo fundador e mentor, Francisco
Ferrer y Guardia, foi importante militante anarquista. Por meio desta análise, poder-se-á
encontrar uma chave de compreensão para o papel fundamental das escolas libertárias na
estratégia anarquista. Partindo da análise da concepção do dualismo organizacional
desenvolvida por Bakunin, e examinando o eixo central da organização escolar pode-se notar
que existe uma preocupação comum de não determinar um caráter direta e conscientemente
anarquista, a fim de evitar possíveis perseguições por parte do Estado, ou mesmo uma restrição
do público que visava atingir. Essa característica, presente nas proposições organizativas
bakunianas e na proposta da Escola Moderna sugerem um caráter específico às escolas
libertárias dentro da estratégia de transformação social do anarquismo.
Abstract: This article aims to discuss revelant proposals of Mikhail Bakunin's political
philosophy and extract implications of its development in the Escola Moderna de Barcelona,
celebrated school institution of libertarian character, whose founder and mentor, Francisco
Ferrer y Guardia, was important militant anarchist. Through this analysis, we can find a key to
understanding the fundamental role of libertarian schools in the anarchist strategy. From the
understanding of organizational dualism design developed by Bakunin, and analyzing the
central axis of the school organization it may be noted that there is a common concern to do not
determinate a direct and consciously anarchist character, in order to avoid possible persecution
by the State, or even a restriction on the public it was intended to achieve. Such feature present
in Bakunin’s organizational propositions and on proposal of the Escola Moderna suggests a
specific character to libertarian schools within the strategy of social transformation of
anarchism.
***
Introdução
1
Graduando em Ciências Sociais na Universidade Estadual Paulista, UNESP, Campus de Marília.
Bolsista: PIBIC/CNPq. Orientador: Marcos Tadeu Del Roio. E-mail: ivan.oliveiracs@gmail.com
A filosofia política de Bakunin e a pedagogia libertária: reflexões acerca da Educação Integral
e da Escola Moderna de Barcelona
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Neste artigo não iremos explorar exatamente as proposições de Bakunin a cerca da educação integral,
defesa embasada nas proposições de Robin, ao invés disso buscaremos estabelecer uma conexão entre as
concepções estratégicas desenvolvidas dentro de sua filosofia política e suas possíveis implicações na
elaboração posterior da experiência pedagógica idealizada e concretizada por Francisco Ferrer y Guardia,
a Escola Moderna.
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Para um desenvolvimento detalhado da teoria das esferas, consultar (Schmidt; van der Walt, 2009) e
(Correa, 2012).
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de autores como Correa (2012) e Schmidt e van der Walt (2009) é possível iniciar um
trabalho de alicerçamento das análises acerca da pedagogia libertária em critérios
rigorosamente estabelecidos sobre o anarquismo, seu desenvolvimento histórico, teórico
e estratégico.
Dessa maneira, tomando a análise do desenvolvimento histórico das proposições
organizacionais bakunianas e da elaboração e aplicação da educação integral e da
pedagogia racionalista pode-se apreender uma continuidade clara entre o projeto
estabelecido na AIT por Bakunin e Robin para a atuação no nível de massas, no que diz
respeito à educação, e o posterior desenvolvimento da Escola Moderna de Barcelona e
seus desdobramentos. O conteúdo comum das experiências é a expressão de um
segmento da pedagogia libertária que possui uma vinculação clara com a estratégia de
transformação social anarquista, que abarca a ação nas três esferas da sociedade:
econômica; política/jurídica/militar; e cultural/ideológica, sendo esta última a esfera de
atuação das escolas libertárias no intento de fomentar uma cultura autogestionária, cuja
importância para o objetivo final do anarquismo é central. Nesse sentido a preocupação
presente nas proposições organizacionais de Bakunin, dividindo os níveis de atuação em
um nível social e um nível político, pensando a relação entre a AIT e a ADS, pode ser
apreendido em experiências da pedagogia libertária na preocupação de não caracteriza-
las enquanto escolas anarquistas, garantindo assim a abertura para que as classes
oprimidas tivessem a possibilidade de ter acesso a educação formal. Ao mesmo tempo,
desenvolviam espirito crítico e tomavam parte de uma cultura autogestionária
constituindo-se enquanto sujeitos autônomos, aptos a tomarem o papel de protagonistas
na história e realizar as transformações sociais aspiradas.
Analisaremos nesse artigo as proposições do pedagogo francês Paul Robin
acerca da Educação Integral e da elaboração de um programa educacional para a AIT
em suas linhas gerais. Em seguida, passaremos para uma contextualização histórica do
movimento operário europeu em que se desenvolve esta proposta, analisando
sumariamente a concepção desenvolvida por Bakunin para a atuação na AIT, por meio
da organização conhecida como Aliança da Democracia Socialista. Posto isso, é
possível apresentar a Escola Moderna de Barcelona, expondo seus elementos centrais no
sentido de auferir as conexões e continuidades com as proposições desenvolvidas por
Bakunin e Robin. Com isso, será possível perceber fundamentos da relação entre
anarquismo e pedagogia libertária, sua articulação enquanto ações transformadoras de
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ideia que um jornaleiro, por exemplo, não precisa conhecer as especulações filosóficas
ou as belas artes, em suma ter contato com o conhecimento humano produzido. Isto
porque, uma vez de posse destes conhecimentos, esse sujeito irá desejar abandonar a sua
importante, porém, desgastante função para exercer outra menos cansativa e se mesmo
assim a miséria mantê-lo em seu posto sentir-se-á mais desgraçado que seu
companheiro de trabalho. A isso Robin responde com maestria:
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Mikhail Bakunin (1814 – 1876) nasceu na Rússia, estudou em Moscou, onde foi
influenciado fortemente por Hegel. Sua filosofia política esta fortemente calcada em
Proudhon4, embora rejeite parte de suas proposições, posição que o distinguiu dos
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(Dicionário Oxford de Filosofia, p.37, 1997)
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Para uma compreensão da relação das correntes mutualista e coletivista como parte de uma tradição
federalista e antiautoritária na AIT, consultar Correa (2012) e Samis (2011).
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Para maiores detalhes acerca do surgimento e desenvolvimento desta organização, Guillaume (1884-
1916), militante anarquista membro da AIT, apresenta um compendio muito rico de informações acerca
da Internacional em quatro volumes sob o titulo “L’Internacional: documents et souvenirs”, obra que não
possui tradução em português. É possível encontrar um fragmento publicado em Textos
Anarquistas/Michael Alexandrovich Bakunin (p.13-35, 2010).
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E o seguinte trecho que ilustra com muita lucidez no que consiste a divisão e a
função de cada nível:
A aliança é o necessário complemento da Internacional. Mas a
Internacional e a Aliança, ainda quando têm a mesma finalidade, ao
mesmo tempo perseguem objetivos diferentes. Uma tem a missão de
agrupar as massas operárias, os milhões de trabalhadores, através dos
diferentes países e nações, através das fronteiras de todos os estados; a
outra, a Aliança, - tem a missão de dar a estas massas uma orientação
realmente revolucionária. Os programas de uma e de outra, sem que
de modo algum sejam opostos, são diferentes pelo grau de seu
respectivo desenvolvimento. O da Internacional, se o tomamos com
toda a serenidade que exige o caso, convém o germe, mas solo em
germe, todo o programa da Aliança, O programa da Aliança é a
explicação última do programa da Internacional. (BAKUNIN, no
prelo).
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Safón (2003) atenta para o caráter combativo de Ferrer, mais do que a figura do
pedagogo. Sustenta que, antes de tudo, o educador anarquista foi um homem de ação
“fundador de realidades e realizador de ideias”, não um pedagogo em teoria, mas “um
combatente em educação social”. Buscou com a sua militância por meio da Escola
Moderna “Ativar o senso humano ao ponto que ninguém possa mais aceitar a opressão e
a iniquidade como norma de vida e possa, ao contrário, rejeitá-las pela revolta.”.
O autor sustenta ainda que Ferrer mantinha relações estreitas com os anarquistas,
sem, no entanto, adotar as táticas que utilizavam a violência. Sua esfera de atuação era a
cultural/ideológica: “(...) ele propunha-se em principio a atacar pacificamente a base da
sociedade de então pelos meios que essa empregava: a educação.” (Ibid., p.11-12)
A discussão de pacifismo adotada por Ferrer deve ser colocada em seu contexto.
O período de 1880 e 1890 foi marcado pelo insurrecionalismo, corrente anarquista que
defende a propaganda pelo fato, contrária às conquistas de curto prazo e acredita que a
utilização da violência é um gatilho disparador de movimentos de massa. Teve muita
expressividade na Itália e na França, este último, país onde Ferrer permaneceu durante
seu exílio no final do século XIX. Dessa forma, aqueles que adotavam uma postura
crítica a essa corrente do anarquismo opuseram criticas em distintos graus e em distintas
esferas, defendendo ações prévias que preparassem as classes dominadas para o
processo revolucionário, seja por meio da educação seja pelas conquistas de curto prazo,
que seriam a “ginástica revolucionária” que prepararia para a revolução. Ainda sobre a
questão da violência, o anarquismo de massas defende a utilização da violência como
forma de acumular forças para os movimentos já existentes. Nesse contexto é que se
insere a posição dita pacifista de Ferrer7.
Havia uma preocupação por parte de Ferrer com o distanciamento da Escola
Moderna de qualquer possibilidade de associação com o anarquismo. O risco de
perseguição por parte do Estado espanhol - absolutamente justificado, haja vista a
execução de Ferrer após um julgamento a portas fechadas e uma condenação sem
provas em 1909 – e a resistência de setores das classes populares a aproximarem-se das
iniciativas anarquistas seja por preconceito, seja pela falta de identificação ideológica
7
Para mais detalhes acerca desta classificação das correntes anarquistas, consultar (CORREA, 2012)
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Conclusão
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Referências
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