Você está na página 1de 27

5.

Anéis de Polinômios

Neste capı́tulo vamos introduzir o conceito de polinômio em uma


variável e fazer uma analogia com o capı́tulo dos números inteiros.

5.1 Definição e exemplos

Definição 5.1.1. Seja K um corpo. Chamamos de um polinômio sobre


K em uma variável x a expressão formal

p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn + · · ·

onde ai ∈ K para todo i ∈ N e existe n ∈ N tal que aj = 0 para todo


j > n.

Definição 5.1.2. Dizemos que dois poliômios p(x) = a0 + a1 x + · · · +


an xn + · · · e q(x) = b0 + b1 x + · · · + bn xn + · · · são iguais sobre K se,
e somente se, ai = bi para todo i ∈ N.

Definição 5.1.3. Se p(x) = 0 + 0x + · · · + 0xn + · · · indicaremos p(x)


por 0 e chamamos de polinômio nulo sobre K.

Assim p(x) é nulo se, e somente se, ai = 0 para todo i ∈ N.

Definição 5.1.4. Seja a ∈ K. Indicaremos por a o polinômio

p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn + · · ·

onde a0 = a, ai = 0 para todo i ≥ 1. E chamamos de polinômio


constante p(x) = a.

138
139

Exemplo 5.1.1. Sejam os polinômios p(x) e q(x) sobre R, dados por:

p(x) = a + 2x + (a − b)x2 + cx3 + · · · e q(x) = c + 1 + 2x + 3x2 − 2x3 + · · · .

Encontre os valores de a, b, c ∈ R tais que p(x) = q(x).


Para que p(x) = q(x) é necessário que:



 a = c+1

a−b = 3


 c = −2

Sendo c = −2 =⇒ a = −1 e daı́, b = −4.


Saiba Mais: Para
mais detalhes Vamos denotar por K[x] o conjunto de todos os polinômios sobre
da teoria de K, na variável x.
polinômios ver
Definição 5.1.5. Se p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn + · · · é tal que an 6= 0
referência [5].
e aj = 0 para todo j > n, dizemos que n é o grau de p(x), e nesse
caso indicamos:

p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn e o grau de p(x) por gr[p(x)] = n.

Observação 5.1.1. Um polinômio nulo não possui grau.

Observação 5.1.2. O grau de um polinômio pode ser interpretado


como uma função do conjunto K[x] − {0} em N, isto é,

gr : K[x] − {0} −→ N
p(x) 7−→ gr[p(x)] = grau de p(x).

Vamos definir duas operações em K[x].


Sejam os polinômios p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn + · · · e
q(x) = b0 + b1 x + · · · + bn xn + · · · sobre K. Definimos as operações
“soma” e “ multiplicação” dadas por:

Soma: p(x) + q(x) = c0 + c1 x + · · · + cn xn + · · · onde

c0 = a0 + b0 , c1 = a1 + b1 , · · · , cn = an + bn ∀ n ∈ N.

Multiplicação: p(x) · q(x) = c0 + c1 x + · · · + cn xn + · · · onde


n
X
c0 = a0 · b0 , c1 = a0 · b1 + a1 · b0 , · · · , cn = ai · bn−i , ∀ n ∈ N.
i=0
140

Exemplo 5.1.2. Considere em Q[x] os polinômios p(x) = 1 − x + 2x2


e q(x) = x + 3. Assim,

a0 = 1, a1 = −1, a2 = 2, b0 = 3, b1 = 1 e b2 = 0.

Logo:

Soma:

p(x) + q(x) = (1 + 3) + (−1 + 1)x + (2 + 0)x2 + = 4 + 2x2

Multiplicação:

p(x) · q(x) = (1 · 3) + [1 · 1 + (−1) · 3]x + [1 · 0 + (−1) · 1 + 2 · 3]x2

+ [1 · 0 + (−1) · 1 + 2 · 1 + 0 · 3]x3

= 3 − 2x + 5x2 + 2x3 .

Proposição 5.1.6. Sejam p(x), q(x) ∈ K[x] − {0}. Então

a) gr[p(x) + q(x)] ≤ max {gr[p(x)], gr[q(x)]} desde que p(x) + q(x) 6= 0.

b) gr[p(x) · q(x)] = gr[p(x)] + gr[q(x)].

Prova. Sejam gr[p(x)] = m e gr[q(x)] = n.


Vamos considerar a soma de p(x) e q(x). Suponha que m ≤ n,
logo max {gr[p(x)], gr[q(x)]} = n. Como cn = an + bn , temos que
cn+j = an+j + bn+j = 0 + 0 = 0 para todo j ≥ 1. Agora, temos duas
possibilidades para cn :

a) Se cn 6= 0 então gr[p(x)+q(x)] = gr[q(x)] = n = max {gr[p(x)], gr[q(x)]}.

b) Se cn = 0 então gr[p(x)+q(x)] ≤ gr[q(x)] = n = max {gr[p(x)], gr[q(x)]}.

Agora, vamos considerar a multiplicação de p(x) e q(x). Temos que,


para todo j ≥ 1

cm+n+j = am+n+j · b0 + am+n+j−1 · b1 + · · · + a1 · bm+n+j−1 + a0 · bm+n+j .

Como am+k = 0 e bn+k = 0 para todo k ≥ 1, segue-se que cn+m+j = 0


para todo j ≥ 1.
141

Por outro lado,

cn+m = am+n · b0 + am+n−1 · b1 + · · · + am · bn + · · · + a1 · bm+n−1 + a0 · bm+n

= 0 · b0 + 0 · b1 + · · · + an · bm + · · · + a1 · 0 + a0 · 0 = an bm .

Como an 6= 0 e bm 6= 0, logo an bm 6= 0. Portanto,

gr[p(x) · q(x)] = gr[p(x)] + gr[q(x)].

A proposição 5.1.6 nos garante que se K é um corpo, então K[x]


é fechado em relação a soma e a multiplicação de polinômios sobre
K.

Teorema 5.1.7. Se K é um corpo, então (K[x], +, ·) é um anel de


integridade.

Prova. Segue-se diretamente do fato de K ser um corpo, donde


0K[x] = 0 (polinômio nulo) e 1K[x] = 1 (polinômio constante igual a 1).

Observação 5.1.3. Se A é um anel (anel de integridade), então (A[x], +, ·)


é um anel (anel de integridade).

Observação 5.1.4. (K[x], +, ·) não é corpo. De fato: Sejam

p(x), q(x) ∈ K[x] − {0} tal que p(x) · q(x) = 1.

Assim, pela proposição 5.1.6, segue-se que gr[p(x)] = gr[p(x)] = 0.


Portanto, os únicos polinômios inversı́veis em K[x] são os polinômios
constantes não nulo.

Observação 5.1.5. Dado K um corpo, de modo análogo, podemos


definir polinômio sobre K em mais de uma variável.

Seja K um corpo e K[x] um anel de integridade, vamos mostrar


que dados dois polinômios em K[x] é possı́vel efetuar a divisão entre
eles.
142

Teorema 5.1.8 (Algoritmo da Divisão). Dados f (x), d(x) ∈ K[x] com


d(x) 6= 0. Então existem únicos q(x), r(x) ∈ K[x] tais que:

f (x) = q(x)d(x) + r(x) com r(x) = 0 ou gr[r(x)] < gr[d(x)].

Prova. Sejam

f (x) = a0 +a1 x+· · ·+an xn e d(x) = b0 +b1 x+· · ·+bm xm , sendo m = gr[d(x)].

(Existência:) Se f (x) = 0 bastar tomar q(x) = r(x) = 0, donde temos


que 0 = 0 · d(x) + 0.

Se f (x) 6= 0 e sendo n = gr[f (x)], vamos analisar as possibili-


dades entre m e n.

1. Se n < m, bastar tomar q(x) = 0 e r(x) = f (x), donde


f (x) = 0 · d(x) + r(x).

2. Se n ≥ m, considere o polinômio:

f1 (x) = f (x)−an (bm )−1 xn−m d(x) =⇒ f (x) = f1 (x)+an (bm )−1 xn−m d(x).

Pelas a propriedades do grau de polinômios, é fácil ver que:

gr[f1 (x)] < gr[f (x)] ou f1 (x) = 0.

Agora, provaremos por indução sobre n = gr[f (x)]. Para


n = 0 =⇒ m = 0, pois n ≥ m ≥ 0. Assim, bastar tomar
q(x) = a0 (b0 )−1 e r(x) = 0, donde f (x) = a0 (b0 )−1 ·b0 +0 = a0 .
Suponhamos que seja válido para todo k natural tal que
0 ≤ k < n, isto é, existem q1 (x), r1 (x) ∈ K[x] tais que

f1 (x) = q1 (x)d(x)+r1 (x) com r1 (x) = 0 ou gr[r1 (x)] < gr[d(x)] (H.I).

Agora, mostraremos que é válido para n. Com efeito: da


equação anterior, temos que:

f (x) = f1 (x)+an (bm )−1 xn−m d(x) = [q1 (x)+an (bm )−1 xn−m ]d(x)+r1 (x).

Assim, bastar tomar:

q(x) = q1 (x) + an (bm )−1 xn−m e r(x) = r1 (x).

donde r(x) = 0 ou gr[r(x)] < gr[d(x)].


143

(Unicidade:) Suponhamos que existam r1 (x), r2 (x), q1 (x), q2 (x) ∈ K[x]


tais que:

f (x) = q1 (x)d(x) + r1 (x) com r1 (x) = 0 ou gr[r1(x)] < gr[d(x)]

f (x) = q2 (x)d(x) + r2 (x) com r2 (x) = 0 ou gr[r2 (x)] < gr[d(x)].

Das duas equações anteriores, obtemos a equação

r2 (x) − r1 (x) = [q1 (x) − q2 (x)]d(x). (5.1.1)

Supondo r2 (x)−r1 (x) 6= 0, temos que q1 (x) 6= q2 (x). Por hipótese,


segue-se que

gr[r2(x) − r1 (x)] = max{gr[r1(x)], gr[r2 (x)]} < gr[d(x)].

Por outro lado, da equação (5.1.1) temos que:

gr[r2(x) − r1 (x)] = gr[(q1(x) − q2 (x))d(x)] ≥ gr[d(x)],

o qual gera uma contradição. Assim r1 (x) = r2 (x), e daı́ segue-


se que q1 (x) = q2 (x).

Os polinômios r(x) e q(x) são chamados de “resto” e “quociente” ,


respectivamente. Quando r(x) = 0 , temos que d(x) divide f (x).

Exemplo 5.1.3. Considere em R[x] os polinômios f (x) = 1 − x + x2 e


d(x) = x + 3. Assim, pelo algoritmo da divisão, temos que:

q(x) = x − 4 e r(x) = 13, pois x2 − x + 1 = (x − 4)(x + 3) + 13.

Definição 5.1.9. Seja α ∈ K e p(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn ∈ K[x].


Dizemos que α é raiz ou zero de p(x) se

p(α) = a0 + a1 α + · · · + an αn = 0.

Exemplo 5.1.4. Considere em R[x] o polinômio p(x) = 1 + x3 , então


−1 é raiz de p(x), pois p(−1) = 1 + (−1)3 = 1 − 1 = 0.
144

Exemplo 5.1.5. Considere em Z3 [x] o polinômio p(x) = 1 + 2x2 então


1 e 2 são zeros de p(x), pois

2 2
p(1) = 1 + 2 · 1 = 3 = 0 e p(2) = 1 + 2 · 2 = 9 = 0.

Vamos provar um resultado que limita o número de raı́zes de um


polinômios sobre um corpo K.

Proposição 5.1.10. Sejam K um corpo e f (x) = a0 +a1 x+· · ·+an xn ∈


K[x] um polinômio não nulo de grau n. Então o número de raı́zes de
f (x) em K é no máximo igual gr[f (x)] = n.

Prova. Se f (x) não possui raı́zes em K, então segue-se o resul-


tado.
Se α é raiz de f (x), temos d(x) = x − α ∈ K[x]. Assim, pelo
algoritmo da divisão, existem q(x), r(x) ∈ K[x] tais que

f (x) = q(x)(x − α) + r(x) com r(x) = 0 ou gr[r(x)] < gr[d(x)] = 1.

Logo r(x) = r0 constante. Assim

0 = f (α) = q(α)(α − α) + r0 =⇒ r0 = 0.

Portanto f (x) = q(x)(x − α) donde gr[q(x)] = n − 1.


Agora seja β uma raiz qualquer de f (x). Sendo K um corpo, temos

f (β) = q(β)(β − α) = 0 ⇒ β = α ou q(β) = 0.

Assim as raı́zes de f (x) são α e as raı́zes de q(x).


Agora, provaremos por indução sobre n = gr[f (x)]. Para n = 0,
temos f (x) é constante, portanto não existe raiz, logo como já vimos,
segue-se o resultado.
Suponhamos que seja válido para n − 1. Assim, q(x) possui no
máximo n − 1 raı́zes em K, daı́ segue que f (x) possui máximo n
raı́zes em K, como querı́amos demonstrar.

Seja K um corpo. Se L ⊃ K é um corpo dizemos que L é uma


extensão de K. O corpo C é extensão de R.
145

Observação 5.1.6. O polinômio p(x) = 1+x2 não possui raiz no corpo


R, mas possui duas raı́zes no corpo C, a saber ±i.

Corolário 5.1.1. Sejam K um corpo e f (x) = a0 + a1 x + · · · + an xn ∈


K[x] um polinômio não nulo de grau n. Então f (x) em K possui no
máximo n raı́zes em qualquer extensão L de K.

Prova. Como K ⊂ L e f (x) ∈ K[x], então f (x) ∈ L[x]. Logo pela


proposição anterior, segue-se o resultado.

5.1.1 Exercı́cios

1. Encontre a, b, c ∈ Q a fim de que os polinômios

f (x) = x3 + (c + a)x − 1 e g(x) = b + 1 + x − (c − 2a)x3

sejam iguais sobre Q.

2. Sejam f (x) = x3 + x2 −2x−1 e g(x) = 1 + x−x2 sobre R. Calcule


a soma e multiplicação destes polinômios.

3. Sejam f (x) = x2 − 3x + 2 e g(x) = 4 + x + 3x2 sobre Z5 . Calcule


a soma e multiplicação destes polinômios.

4. Dados f (x), d(x) ∈ R[x]. Determine q(x) e r(x) nos casos abaixo,
tais que:

f (x) = q(x)d(x) + r(x) com r(x) = 0 ou gr[r(x)] < gr[d(x)] .

(a) f (x) = x3 − 1 e d(x) = x − x2 ;

(b) f (x) = x3 − 1 e d(x) = −1 − x − x4 ;

(c) f (x) = x4 − 1 e d(x) = x − 1;



(d) f (x) = x3 − 2 e d(x) = x − 3 2.

5. Dados f (x), d(x) ∈ Z[x] com d(x) = b0 + b1 x + · · · + bm xm onde


bm = 1. Então existem únicos q(x), r(x) ∈ Z[x] tais que

f (x) = q(x)d(x) + r(x) com r(x) = 0 ou gr[r(x)] < gr[d(x)].


146

6. Calcule todas as raı́zes do polinômio x2 − 1 no anel Z12 . Calcule


também as raı́zes do polinômio x2 + x no anel Z6 .

7. Sejam f (x) ∈ K[x] − {0}, K corpo e L ⊃ K uma extensão de K.


Se α ∈ L é raiz de f (x), então existe q(x) ∈ L[x] tal que

f (x) = q(x)(x − α).

8. Um corpo K é algebricamente fechado se para todo f (x) ∈


K[x] − K existe α ∈ K tal que f (α) = 0 ( o corpo C é algebrica-
mente fechado). Mostre que R não é algebricamente fechado.

9. Sejam f (x) ∈ K[x], K corpo e α ∈ K. Mostre que o resto da


divisão de f (x) por x − α é f (α).

10. Fatore o polinômio x3 − 1 no corpo C.

11. Mostre que todo polinômio de grau ı́mpar sobre o corpo dos
números reais possui uma raiz real.

12. Dados f (x) = a0 + a1 x + · · · + an xn ∈ Z[x] com an = 1 e α ∈ Q.


Se f (α) = 0 então:

(a) α ∈ Z;

(b) α|a0 .

5.1.2 Algumas respostas, sugestões e soluções


2 1
1. a = , b = −2 e c = .
3 3
2. f (x) + g(x) = x3 − x e f (x)g(x) = −x5 + 4x3 − 3x − 1;

3. Sejam f (x) + g(x) = 4x2 − 2x + 1 e f (x)g(x) = 3x4 − 3x3 + 2x2 + 3.

4. (a) q(x) = −x − 1 e r(x) = x − 1;

(b) q(x) = 0 e r(x) = −1 − x − x4

(c) q(x) = x3 + x2 + x + 1 e r(x) = 0;


√ √
(d) q(x) = x2 + 3 2x + 3 4 e r(x) = 0.
147

5.

6. As raı́zes do polinômio x2 − 1 no anel Z12 são 1, 5, 7 e 11. As


raı́zes do polinômio x2 + x no anel Z6 são 0, 2, 3 e 5.

7.

8.

9. Sugestão: Use o polinômio x2 + 1.

10.
√ √
3 1 3 1 3
11. x − 1 = (x − 1)[x − (− − i )][x − (− + i )].
2 2 2 2

12. Sugestão: Calcule o limx→±∞ p(x) e use o Teorema do Valor In-


termediário.

13.

5.2 Ideais e os Máximos Divisores Comuns


(m.d.c.)

Nesta seção iremos provar a existência do máximo divisor comum


(m.d.c.) em K[x], através da noção de “ideal” no domı́nio de integri-
dade K[x].
Um ideal principal em K[x] é o conjunto dos múltiplos de um ele-
mento p(x) ∈ K[x], isto é, tem a forma:

I = p(x) · K[x] = {p(x) · f (x) | f (x) ∈ K[x] }.

Teorema 5.2.1 (K[x] é um domı́nio principal). Todo ideal de K[x] é


principal.

Prova. Seja I um ideal de K[x].

1. Se I = {0} então I é principal, pois I = 0 · K[x], ou seja, o ideal


gerado pelo 0.
148

2. Se I 6= {0} podemos escolher um elemento d(x) ∈ I com d(x) 6=


0 tal que o gr[d(x)] seja o menor possı́vel.

(a) Se gr[d(x)] = 0 =⇒ p(x) = a 6= 0. Assim:

1 = a · a−1 ∈ I =⇒ I = K[x].

Logo I é gerado pelo 1, e portanto principal.

(b) Se gr[d(x)] > 0. Vamos mostrar que I = d(x) · K[x], ou seja,

d(x) · K[x] ⊂ I e I ⊂ d(x) · K[x].

Seja p(x) ∈ d(x) · K[x] ,então existe g(x) ∈ K[x] tal que
p(x) = d(x) · g(x). Como d(x) ∈ I, temos que p(x) ∈ I, logo
d(x) · K[x] ⊂ I.

Seja f (x) ∈ I, aplicando o Algoritmo da Divisão, existem


q(x), r(x) ∈ K[x] tal que

f (x) = q(x)·d(x)+r(x) com r(x) = 0 ou gr[r(x)] < gr[d(x)].

Temos que r(x) = f (x)−q(x)·d(x) ∈ I. Assim, pela minimal-


idade de gr[d(x)] temos que r(x) = 0 , daı́ f (x) ∈ d(x) · K[x],
e com isto, conclui-se que I ⊂ d(x) · K[x].

Sejam p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x) ∈ K[x]. Sabemos que:

I = p1 (x)K[x] + p2 (x)K[x] + · · · + pk K[x]

é ideal em K[x], gerado por p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x).

Teorema 5.2.2 (Existência do m.d.c). Seja p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x) ∈


K[x] não nulos. Seja o ideal

I = p1 (x)K[x] + p2 (x)K[x] + · · · + pk K[x].

Se existe d(x) ∈ K[x] tal que d(x) · K[x] = I então são válidas as
seguintes afirmações:
149

(a) Existem n1 (x), n2 (x), · · · , nk (x) ∈ K[x] tal que

d(x) = n1 (x)p1 (x) + n2 (x)p2 (x) + · · · + nk (x)pk (x).

(b) d(x) é divisor comum de p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x).

(c) Se existe d′(x) divisor comum de p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x) então


d′ (x)|d(x).

Prova. Similar a demonstração do Teorema 2.3.3 do capı́tulo 2 e


parágrafo 2.

Definição 5.2.3. Um número d(x) que satisfaz as condições (b) e (c)


do Teorema (2.3.3) diz-se m.d.c. de p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x) em K[x], e
denotaremos por:

m.d.c. = (p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x)).

Um polinômio f (x) = a0 + a1 (x) + · · · + an xn ∈ K[x] é dito mônico


se an = 1

Observação 5.2.1. Sejam p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x) em K[x] − {0}, então


existe um único d(x) = (p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x)) mônico.

Logo se d(x) = (p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x)), existem n1 (x), n2 (x), · · · , nk (x) ∈
K[x] tal que:

d(x) = n1 (x)p1 (x) + n2 (x)p2 (x) + · · · + nk (x)pk (x).

No caso em d = 1 dizemos que p1 (x), p2 (x), · · · , pk (x) são primos


entre si e existem n1 (x), n2 (x), · · · , nk (x) ∈ K[x] tais que

1 = n1 (x)p1 (x) + n2 (x)p2 (x) + · · · + nk (x)pk (x).

5.2.1 Exercı́cios

1. Calcule o (f (x), g(x)) em C para os seguintes pares de polinômios:

(a) f (x) = (x2 + 1)(x − 1)2 (x − i) e g(x) = (x + i)2 (x2 − 1)2 .


150

(b) f (x) = (x2 + 1)2 (x3 − 1) e g(x) = (x2 + x + 1)(x − 1)2 .

2. Calcule o (f (x), g(x)) em Q para os seguintes pares de polinômios:

(a) f (x) = (x2 − 1)(x2 − 2) e g(x) = x4 − 1.

(b) f (x) = x4 − 10x + 6 e g(x) = (x2 − 4)(x − 1).

3. Mostre que existem f (x), g(x) ∈ Z[x] com gr[f (x)] = gr[g(x)] = 2
tais que
f (x) · g(x) = x4 + 4.

4. Seja f (x), g(x) ∈ K[x] − {0} e a ∈ K − {0}. Mostre que:

d(x) = (f (x), g(x)) ⇐⇒ a · d(x) = (f (x), g(x)).

5. Quais dos conjuntos I ⊂ Q[x] são ideias em Q[x]? Caso positivo,


encontre d(x) mônico tal que I = d(x) · Q[x].

(a) I = {f (x) ∈ Q | f (1) = f (3) = 0 }.

(b) I = {f (x) ∈ Q | f (2) = 0; f (4) 6= 0 }.



(c) I = {f (x) ∈ Q | f ( 2) = 0 }.

6. Mostre que Z[x] é um subanel de Q[x]. Z[x] é um ideal de Q[x]?

5.2.2 Algumas respostas, sugestões e soluções

1. (a) (f (x), g(x)) = a(x − 1)2 (x + i) com a ∈ C∗ ;

(b) (f (x), g(x)) = a(x3 − 1) com a ∈ C∗ .

2. (a) (f (x), g(x)) = a(x2 − 1) com a ∈ Q∗ ;

(b) (f (x), g(x)) = a com a ∈ Q∗ .

3. Sugestão: Encontre a, b, c, d ∈ Z tais que

(x2 + ax + b) · (x2 + cx + a) = x4 + 4.

4.
151

5. (a) Sim e d(x) = (x − 1)(x − 3);

(b) Não.

(c) Sim e d(x) = (x2 − 2).

6.

5.3 Polinômios irredutı́veis e ideais maximais

Nesta seção introduziremos um tipo de polinômio em K[x], que


dentro da analogia de K[x] com Z fazem o papel dos números primos.
Esse polinômios serão chamados de polinômios irredutı́veis sobre K.

Definição 5.3.1. Seja p(x) ∈ K[x] tal que gr[p(x)] ≥ 1. Dizemos que
p(x) é irredutı́vel sobre K sempre que

p(x) = f (x) · g(x) com f (x), g(x) ∈ K[x] =⇒ f (x) = a ou g(x) = b,

sendo a, b ∈ K, ou seja, a e b são constantes. Se f (x) não for irre-


dutı́vel sobre K, dizemos que p(x) é redutı́vel sobre K.

Observação 5.3.1. Todo polinômio de grau 1 sobre um corpo K é


irredutı́vel sobre K.

Observação 5.3.2. O polinômio x2 + 1 é irredutı́vel sobre R porém


redutı́vel sobre C.

Proposição 5.3.2. Seja p(x) ∈ K[x] irredutı́vel sobre K.

(a) Se p(x)|f (x)g(x) então p(x)|f (x) ou p(x)|g(x);

(b) Se p(x)|f1 (x)f2 (x) · · · fk (x) com k ≥ 2 então p(x)|fi (x) para algum
i ∈ {1, 2, · · · , k}.

Prova. (a): Suponha que p(x)|f (x), então sendo p(x) irredutı́vel,
temos (p(x), f (x)) = 1. Assim existem r(x), s(x) ∈ K[x] tais que:

r(x)f (x) + p(x)s(x) = 1


152

e multiplicando por g(x) a última equação, temos que

r(x)f (x)g(x) + p(x)s(x)g(x) = g(x).

Como p(x)|f (x)g(x), segue-se que p(x)|g(x).


(b): A cargo do prezado leitor (Sugestão: Use indução sobre k e o
item (a)).

Teorema 5.3.3. Seja p(x) ∈ K[x] e I = p(x) · K[x]. Então as seguintes


afirmações são equivalentes:

(a) p(x) é irredutı́vel sobre K.

(b) I é um ideal maximal de K[x].

Prova.(a) ⇒ (b): Sendo p(x) irredutı́vel sobre K, segue-se da


definição que gr[p(x)] ≥ 1 , daı́:

I = p(x) · K[x] 6= K[x].

Seja J um ideal de K[x] tal que I ⊂ J ⊂ K[x]. Pelo Teorema 5.2.1


existe f (x) tal que J = f (x) · K[x], assim

p(x) ∈ I = p(x) · K[x] ⊂ J = f (x) · K[x].

Da inclusão acima, existe g(x) ∈ K[x] tal que p(x) = f (x) · g(x), então
temos duas possibilidades:

f (x) = a =⇒ 1 = a · a−1 = f (x).f (x)−1 ∈ J =⇒ J = K[x]

ou
g(x) = b =⇒ f (x) = b−1 p(x) =⇒ J = I.

Portanto I é maximal.
(b) ⇒ (a): Suponhamos que I = p(x) · K[x] seja um ideal maximal em
K[x], daı́ temos que I 6= K[x], logo gr[p(x)] ≥ 1.
Sejam f (x), g(x) ∈ K[x] tais que de p(x) = f (x) · g(x). Defina o
ideal J = f (x) · K[x], usando de novo a maximalidade de I, temos
que:

J = f (x) · K[x] = p(x) · K[x] = I ou J = f (x) · K[x] = K[x].


153

No primeiro caso, ou seja, J = I temos que f (x) = p(x)r(x) assim


p(x) = p(x)r(x)g(x). Sendo K[x] um anel de integridade, temos que
1 = r(x)g(x), pois p(x) 6= 0. Assim g(x) = b 6= 0 é polinômio constante.
No segundo caso, ou seja, J = f (x) · K[x] = K[x], daı́ temos que
1 = f (x).r(x) . Assim f (x) = a 6= 0 é polinômio constante. Acabamos
de mostrar p(x) é irredutı́vel sobre K, como querı́amos mostrar.

Vamos mostrar agora, que dado um polinômio p(x) ∈ K[x] com


gr[p(x)] ≥ 1, ele se decompôe em fatores de polinômios irredutı́veis.

Teorema 5.3.4. Sejam K um corpo e um polinômio p(x) ∈ K[x] com


gr[p(x)] ≥ 1. Então existem polinômios irredutı́veis p1 (x), p2 (x), · · · , pr (x)
tais que
p(x) = ap1 (x)p2 (x) · · · pr (x) com a ∈ K − {0}.

Além disso, se tivermos também

p(x) = bq1 (x)q2 (x) · · · qs (x),

onde qj (x) são polinômios irredutı́veis, então r = s e cada pi (x) é igual


a um dos bj qj (x) com bj ∈ K − {0}.

Prova. (Existência:) Usaremos o “segundo princı́pio de indução”sobre


gr[p(x)] = n para provar a afirmação.
Se n = 1 , então a afirmação é verdadeira, pois todo polinômio de
grau 1 é irredutı́vel.
Se n > 1, suponhamos pelo segundo princı́pio de indução que seja
válido para todo f (x) ∈ K[x] tal que:

1 ≤ gr[f (x)] < gr[p(x)] = n [Hipótese de Indução (H.I)].

Se p(x) for irredutı́vel, então temos p(x) = ap1 (x) com p1 (x) irre-
dutı́vel. Do contrario, p(x) é composto, isto é p(x) = f (x)g(x) com
0 < gr[f (x)], gr[g(x)] < gr[p(x)] = n. Assim, aplicando a hipótese de
indução (H.I), temos que

f (x) = a1 p1 (x)p2 (x) · · · pr (x) onde pi (x) são irredutı́veis


154

g(x) = b1 pr+1 (x)pr+2 (x) · · · ps (x) onde pr+i (x) são irredutı́veis.

Logo
p(x) = ap1 (x)p2 (x) · · · ps (x).

Portanto, pelo segundo princı́pio de indução a afirmação é válida


todo p(x) ∈ K[x] com gr[p(x)] ≥ 1.
(Unicidade:). Suponha que ocorra duas formas de decomposição,
isto é,

p(x) = ap1 (x)p2 (x) · · · pr (x) = bq1 (x)q2 (x) · · · qs (x). (5.3.2)

Então p1 (x)|a−1 bq1 (x)q2 (x) · · · qs (x), assim pela Proposição 5.3.2 temos
que p1 (x)|qj (x) para algum j ∈ {1, 2, · · · , s}. Assim p1 (x) = bj qj (x),
cancelando p1 (x) e bj qj (x) na equação (5.3.2) e prosseguindo com o
raciocı́nio, chega-se r = s e cada pi (x) é igual a um dos bj qj (x), ou
seja, a unicidade da decomposição.

5.3.1 Exercı́cios

1. Verifique em cada item se f (x) ∈ K[x] é irredutı́vel sobre K:

(a) f (x) = x3 + 4x + 2 sobre Q;

(b) f (x) = x4 + 8 sobre Q;

(c) f (x) = x7 − x + 1 sobre R;

(d) f (x) = x2 + x + 1 sobre R.

2. Fatore o polinômio f (x) = x4 − 4 ∈ K[x] nos seguintes casos:

(a) K = Q;

(b) K = R;

(c) K = C.

3. Seja K um corpo e f (x) ∈ K[x]−{0}. Mostre que se gr[f (x)] ≥ 2


e f (x) possui uma raiz então f (x) é redutı́vel.
155

4. Seja K um corpo e f (x) ∈ K[x] tal que 1 ≤ gr[f (x)] ≤ 3. Prove


que f (x) possui uma raiz sobre K ou f (x) é irredutı́vel.

5. Encontre todos os polinômios de grau 2 que seja irredutı́veis em


Z3

6. Mostre que o polinômio x3 + x + 1 ∈ Z5 [x] é irredutı́vel em Z5 .

7. Quais dos conjuntos I ⊂ Q[x] são ideais maximais em Q[x].

(a) I = {f (x) ∈ Q | f (1) = f (3) = 0 };

(b) I = {f (x) ∈ Q | f (2) = 0 };



(c) I = {f (x) ∈ Q | f ( 2) = 0 }.

8. Mostre que um polinômio f (x) ∈ R[x] de gr[f (x)] = 2 é irredutı́vel


se, e somente se, f (x) = a(x − α)2 + β 2 onde a, α, β ∈ R e β 6= 0.

9. Mostre que um polinômio f (x) ∈ C[x] é irredutı́vel se, e somente


se, f (x) = ax + b onde a, b ∈ C e a 6= 0.

5.3.2 Algumas respostas, sugestões e soluções

1. (a) f (x) = x3 + 4x + 2 é irredutı́vel sobre Q;

(b) f (x) = x4 + 8 é irredutı́vel sobre Q;

(c) f (x) = x7 − x + 1 não é irredutı́vel sobre R;

(d) f (x) = x2 + x + 1 é irredutı́vel sobre R.

2. (a) x4 − 4 = (x2 − 2)(x2 + 2);


√ √
(b) x4 − 4 = (x − 2)(x + 2)(x2 + 2);
√ √ √ √
(c) x4 − 4 = (x − 2)(x + 2)(x − 2i)(x + 2i).

3.

4.

5. x2 + 1, x2 + x + 1, 2x2 + x + 1, 2x2 + 2 e 2x2 + 2x + 1.


156

6. Seja f (x) = x3 + x + 1 ∈ Z5 [x]. Temos que

f (0) = 1, f (1) = 3, f (2) = 1, f (3) = 1 e f (4) = 4.

Portanto, f (x) é irredutı́vel em Z5 .

7. (a) Não;

(b) Sim;

(c) Não.

8.

9.

5.4 Critério de Eisenstein

A verificação de irredutibilidade de um polinômio sobre um corpo


é, em geral, um problema difı́cil. Veremos nesta seção condições
suficientes para que um polinômio f (x) ∈ Q[x] seja irredutı́vel sobre
Q. É claro que multiplicando f (x) pelo “mı́nimo múltiplo comum ” dos
coeficientes de f (x) temos que f (x) ∈ Z[x].
Veremos inicialmente que irredutibilidade de f (x) ∈ Z[x] sobre Z
implica em irredutibilidade de f (x) ∈ Z[x] sobre Q.

Proposição 5.4.1. [Lema de Gauss] Seja f (x) ∈ Z[x] tal que f (x)
seja irredutı́vel sobre Z. Então f (x) é irredutı́vel sobre Q.

Prova. Suponha por absurdo que f (x) seja redutı́vel sobre Q. As-
sim, existem r(x), s(x) ∈ Q[x] tais que:

f (x) = r(x)s(x) com 1 < gr[r(x)], gr[s(x)] < gr[f (x)].

Seja m o produto dos mı́nimo múltiplo comum dos coeficientes de r(x)


e s(x). Assim, multiplicando por m na última equação, temos que:

mf (x) = r1 (x)s1 (x) com r1 (x), s1 (x) ∈ Z[x]. (5.4.3)


157

Assim, temos que:

r1 (x) = a0 + a1 (x) + · · · + ar xr e s1 (x) = b0 + b1 (x) + · · · + bs xs ∈ Z[x].

Se m = 1, temos que f (x) é redutı́vel sobre Z, o qual é uma


contradição.
Se m > 1, seja p primo tal que p|m. Vamos provar que:

p|ai , i ∈ {1, 2, · · · , r} ou p|bj , j ∈ {1, 2, · · · , s}.

Com efeito, se existem i e j tal que p


I ai e p
I bi , consideramos i e j
os menores possı́veis com esta condição.
Como p|m então p divide o coeficiente de xi+j do polinômio
mf (x) = r1 (x)s1 (x), isto é,

p|(a0 bi+j + a1 bi+j−1 + · · · + ai bj + · · · + ai+j−1 b1 + ai+j b0 ).

Pela escolha de i e j, p divide todos os termos da expressão exceto


ai bj , do coeficiente de xi+j do polinômio r1 (x)s1 (x). Sendo que p divide
toda expressão, segue-se que:

p|ai bj =⇒ p|ai ou p|bj , pois p é primo,

o qual é uma contradição.


Assim, se p é primo

p|ai , i ∈ {1, 2, · · · , r} ou p|bj , j ∈ {1, 2, · · · , s}.

Sem perda de generalidade, podemos supor que p|ai , i ∈ {, 1, 2, · · · , r}.


Dividindo por p a equação (5.4.3), obtemos a equação:

m1 f (x) = r2 (x)s2 (x) com r2 (x), s2 (x) ∈ Z[x]. (5.4.4)

Como o número de fatores primos de m é finito, então prosseguindo


o raciocı́cio, chegaremos que

f (x) = r ∗ (x)s∗ (x) com r∗(x), s∗(x) ∈ Z[x]. (5.4.5)

o qual é uma contradição, pois f (x) é irredutı́vel sobre Z.


158

Teorema 5.4.2. [Critério de Eisenstein] Seja f (x) = a0 + a1 x+ a2 x2 +


· · · + an xn ∈ Z[x] com gr[f (x)] = n. Se existe um primo p tal que:

(a) p|a0 , a1 , · · · , an−1 ;

(b) p|an ;

(c) p2 |a0 .

Então f (x) é irredutı́vel sobre Q.

Prova. É suficiente provar que f (x) é irredutı́vel sobre Z, pois caso


isso ocorra, o Lema de Gauss assegura que f (x) é irredutı́vel sobre
Q.
Suponha por absurdo que f (x) seja redutı́vel sobre Z. Assim exis-
tem r(x), s(x) ∈ Q[x] tais que:

f (x) = r(x)s(x) com 1 < gr[r(x)], gr[s(x)] < gr[f (x)] = n.

Donde

r(x) = c0 + c1 (x) + · · · + cr xr e s(x) = b0 + b1 (x) + · · · + bs xs ∈ Z[x],

com n = r + s. Ora, p|a0 = b0 c0 =⇒ p|b0 ou p|c0 , como p2 |a0 então


p divide apenas um dos números b0 ou c0 . Digamos que p|b0 e p|c0 .
Sendo an = bs cr o coeficiente do termo xn = xs+r , e por hipótese
p|an , então p|bs . Agora, seja j tal que p|bj , considerando j o menor
possı́vel com esta condição, onde 0 < j < s ≤ n.
Temos que:

aj = c0 bj + c1 bj−1 + · · · + aj−1 b1 + aj b0 .

Como p|b0 , b1 , · · · , bj−1 , p|bj e p|c0 , logo p|aj .


Por outro lado, p|a1 , a2 , · · · , an−1 e p|an , daı́ j = n, o qual é uma
contradição.
Portanto, f (x) é irredutı́vel sobre Z.
159

Exemplo 5.4.1. O polinômio f (x) = x3 − 2x + 2 é irredutı́vel em Q. De


fato: usando o Critério de Eisenstein para p = 2, temos:

2|a0 = 2, 2|a1 = −2, 2|a2 = 0, 2|a3 = 1 e 4 = 22 |a0 = 2.

Exemplo 5.4.2. O polinômio f (x) = 2x4 + 6x3 + 12x2 + 24x + 6 é


irredutı́vel em Q. Com efeito: usando o Critério de Eisenstein para
p = 3, temos:

3|a0 = 6, 3|a1 = 24, 3|a2 = 12, 3|a3 = 6 3|a4 = 2 e 9 = 32 |a0 = 6.

Exemplo 5.4.3. O polinômio f (x) = xn − p para n ≥ 1 e p primo


é irredutı́vel em Q. De fato: usando o Critério de Eisenstein para o
próprio p, temos:

p|a0 = p, p|a1 = a2 = · · · = an−1 = 0, p|an = 1 e p2|a0 = p.

Proposição 5.4.3. Seja K um corpo e a ∈ K . Então

1. A função ψ dada por:

ψ : K[x] −→ K[x]
f (x) 7−→ ψ[f (x)] = f (x + a).
é um isomorfimo (automorfismo) de K[x]

2. f (x) é irredutı́vel sobre K se, e somente se, f (x + a) é irredutı́vel


sobre K.

Prova. A cargo do prezado leitor.

Exemplo 5.4.4. O polinômio f (x) = x4 + x3 + x2 + x + 1 é irredutı́vel


em Q. De fato: Como não podemos usar o Critério de Eisenstein para
f (x), vamos usar a proposição anterior no caso em que a = 1. Assim

f (x + 1) = (x + 1)4 + (x + 1)3 + (x + 1)2 + (x + 1) + 1

f (x + 1) = (x4 + 4x3 + 6x2 + 4x + 1) + (x3 + 3x2 + 3x + 1) + (x2 + 2x + 1) + (x

f (x + 1) = x4 + 5x3 + 10x2 + 10x + 5.


160

Agora, utilizando o Critério de Eisenstein para p = 5 no polinômio


f (x + 1), temos

5|a0 = 5, 5|a1 = 10, 5|a2 = 10, 5|a3 = 5 35|a4 = 1 e 25 = 52|a0 = 5.

Logo f (x + 1) é irredutı́vel em Q, e por conseguinte, f (x) é irredutı́vel


em Q.

Em alguns casos que precisamos verificar se f (x) é irredutı́vel em


Q, o qual não podemos aplicar os resultados anteriores, ou talvez seja
mais complicado, podemos utilizar o seguinte resultado.

Proposição 5.4.4. Seja p um número primo postivo e seja o corpo


Zp = {0, 1, · · · , p − 1}. Dado f (x) = a0 + a1 x + a2 x2 + · · · + an xn ∈ Z[x]
vamos definir o polinômio f (x) ∈ Zp [x] do seguinte modo:

f (x) = a0 + a1 x + a2 x2 + · · · + an xn ∈ Zp [x].

Se p|an e f(x) é irredutı́vel sobre Zp então f (x) é irredutı́vel sobre Q.

Prova. É suficiente provar que f (x) é irredutı́vel sobre Z, pois caso


isso ocorra, o Lema de Gauss assegura que f (x) é irredutı́vel sobre
Q.
Suponha por absurdo que f (x) seja redutı́vel sobre Z. Assim exis-
tem r(x), s(x) ∈ Z[x] tais que

f (x) = r(x)s(x) com 1 < gr[r(x)], gr[s(x)] < gr[f (x)] = n, (5.4.6)

onde

r(x) = c0 + c1 (x) + · · · + cr xr e s(x) = b0 + b1 (x) + · · · + bs xs ∈ Z[x],

com n = r + s.
Da equação (5.4.6) segue-se que:

f(x) = r(x)s(x) onde r(x), s(x) ∈ Zp [x]. (5.4.7)

Sendo an = bs cr , e por hipótese p|an , então p|bs e p|cr . Assim:

bs 6= 0 e cr 6= 0

logo, gr[s(x)] = s e gr[r(x)] = r, e daı́, f (x) é redutı́vel sobre Zp o


qual é uma contradição. Portanto, f (x) é irredutı́vel sobre Z.
161

Exemplo 5.4.5. O polinômio f (x) = x3 + 1001x + 31000000000000 é irre-


dutı́vel em Q. De fato: vamos usar a proposição anterior no caso em
que p = 2, donde Z2 = {0, 1}. Assim

f(x) = x3 + 10001x + 31000000000000

f(x) = x3 + x + 1.

Pois 1001 ≡ 1 (mod 2) e 3 ≡ 1 (mod 2) =⇒ 31000000000000 ≡ 1 (mod 2).


Sendo que 2|a3 = 1, resta verificar que f (x) = x3 + x+ 1 não possui
raı́zes em Z2 , ou seja, f (x) é irredutı́vel em Z2 , pois gr[f(x)] = 3.
Temos que:

3 3
f (0) = 0 + 0 + 1 = 1 6= 0 e f(1) = 1 + 1 + 1 = 1 6= 0.

Assim, f(x) é irredutı́vel em Z2 e 2|a3 = 1. Então f (x) é irredutı́vel


em Q.

Exemplo 5.4.6. O polinômio f (x) = x4 + 4x2 + 7x + 1 é irredutı́vel em


Q. De fato: vamos usar a proposição anterior no caso em que p = 3,
donde Z3 = {0, 1, 2}. Assim:

f (x) = x4 + 4x2 + 7x + 1

f (x) = x4 + x2 + x + 1.

Sendo que 2|a4 = 1, resta verificar que f(x) = x4 + x2 + x + 1


não possui raı́zes em Z3 e que o mesmo não se decompôe em dois
polinômios de grau 2, pois gr[f(x)] = 4.
Temos primeiramente que:

4 2
f (0) = 0 + 0 + 0 + 1 = 1 6= 0;
4 2
f (1) = 1 + 1 + 1 + 1 = 1 6= 0;
4 2
f (2) = 2 + 2 + 2 + 1 = 2 6= 0.

Resta provar que f (x) não se decompôe em dois polinômios de grau


2, ou seja,

x4 + x2 + x + 1 = (x2 + ax + b)(x2 + cx + d) com a, b, c, d ∈ Z3 .


162

Da igualdade de polinômios, obtemos o seguinte sistema:




 a+c=0


 ac + b + d = 1



 cd + ad = 1


bd = 1

Da última equação do sistema temos que b = d = 1 ou b = d =


2. Então combinando a primeira equação com a terceira equação
do sistema acima, ocorre uma contradição. Logo f (x) não pode se
decompor em dois polinômios de grau 2. Assim, f(x) é irredutı́vel em
Z3 e 3|a3 = 1, e portanto f (x) é irredutı́vel em Q.

5.4.1 Exercı́cios

1. Mostre que os seguintes polinômios f (x) ∈ Z são irredutı́veis


sobre Q:

(a) f (x) = x4 + 4x + 2;

(b) f (x) = x8 − 7;

(c) f (x) = x5 + 15x4 + 25x2 + 15;

(d) f (x) = x6 + x5 + x4 + x3 + x2 + x + 1;

(e) f (x) = x3 + 6x2 + 5x + 25;

(f) f (x) = x4 + 8x3 + x2 + 2x + 5.

2. Determine quais dos seguintes polinômios f (x) ∈ Z são irre-


dutı́veis sobre Q:

(a) f (x) = 2x2 − 8x + 6;

(b) f (x) = x3 − 2x + 3;

(c) f (x) = x3 + x + 1;

(d) f (x) = x4 + 2x2 + 1;

(e) f (x) = x4 + 8.
163

3. Determine quais dos seguintes polinômios sobre os seguintes


corpos K são irredutı́veis.:

(a) f (x) = x7 + 8x5 + 6x3 + 4x + 2, K = Q;

(b) f (x) = x3 − 6x2 + 3x + 1, K = Q;

(c) f (x) = x5 + 723x2 + 340506x + 10000, K = R;

(d) f (x) = x3 + x2 + 1, K = Z5 ;

(e) f (x) = x4 + 2x2 + 2x + 1, K = Z3 .

5.4.2 Algumas respostas, sugestões e soluções

1. Mostre que os seguintes polinômios f (x) ∈ Z são irredutı́veis


sobre Q.:

(a) Use critério de Eisenstein para p = 2;

(b) Use critério de Eisenstein para p = 7;

(c) Use critério de Eisenstein para p = 5;

(d) Calcule f (x + 1) e use critério de Eisenstein;

(e) Trabalhe no corpo Z2 ;

(f) Trabalhe no corpo Z2 .

2. Determine quais dos seguintes polinômios f (x) ∈ Z são irre-


dutı́veis sobre Q:

(a) Não;

(b) Sim;

(c) Sim;

(d) Não;

(e) Sim.

3. Determine quais dos seguintes polinômios sobre os seguintes


corpos K são irredutı́veis.:
164

(a) Sim;

(b) Sim;

(c) Não;

(d) Sim;

(e) Não.

Você também pode gostar