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A Responsabilidade Tributária sob a Ótica da Teoria

Dualista da Obrigação

A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA SOB A ÓTICA DA TEORIA DUALISTA


DA OBRIGAÇÃO
Tributary Responsability from the Perspective of Dualistic Theory of Obligation
Revista de Direito Tributário Contemporâneo | vol. 2/2016 | p. 17 - 33 | Set - Out /
2016
DTR\2016\23947

Luis Claudio Ferreira Cantanhêde


Mestre em Direito pela PUC-SP; Especialista em Direito Tributário pela PUC-SP;
Especialista em Direito do Estado pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado
de São Paulo-ESPGE; Professor conferencista do Instituto Brasileiro de Estudos
Tributários-IBET. Professor na Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São
Paulo-ESPGE. Coordenador da Especialização em Direito Tributário Analítico da Escola
Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo-ESPGE. Procurador do Estado de
São Paulo. lcferreiracantanhede@gmail.com

Área do Direito: Tributário


Resumo: Trata-se de artigo voltado à análise do tema da responsabilidade tributária sob
a ótica da teoria dualista da obrigação, tomando por referencial teórico-jurídico o
construtivismo lógico-semântico.

Palavras-chave: Direito - Tributo - Obrigação - Responsabilidade - Terceiros


Abstract: Consisted of, from the assuptions of logical-semantic constructivism, analyze
the phenomenon of tributary liability from the perspective of dualistic theory of
obligation.

Keywords: Law - Tax - Liability - Third party


Sumário:

1A norma de responsabilidade sob a ótica da teoria dualista da obrigação - 2A norma de


responsabilidade como norma de direito material. - 3A norma de responsabilidade do
obrigado e de terceiros – O antecedente complexo - 4A responsabilidade tributária no
contexto da teoria dualista da obrigação - 5Considerações finais - 6Referências
bibliográficas

1 A norma de responsabilidade sob a ótica da teoria dualista da obrigação

Busca-se, neste artigo, situar o tema da responsabilidade dentro do panorama da teoria


geral do direito, sob a visão dualista da obrigação, que analisa o vínculo que se
estabelece entre os sujeitos de uma relação obrigacional para nele entrever dois
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elementos diversos, a que nomeia débito/responsabilidade. Caio Mário da Silva Pereira
vê essa dualidade já no âmbito do vínculo obrigacional, como deflui de suas lições:

“Os escritores modernos, contudo, insurgem-se contra esta concepção unitária e


enunciam a noção dualista, procedendo a uma análise do vínculo obrigacional, que
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decompõem em dois fatores: o débito e a responsabilidade.”

Transportando essas noções para o sistema de referência dentro do qual se busca


edificar este trabalho, qual seja, o do construtivismo lógico-semântico, pode-se entrever
nesta visão, que, uma vez constituída a norma individual e concreta que, em seu
consequente, vincula credor e devedor em torno da prestação obrigacional, esta já
traria, também, o vínculo de sujeição patrimonial, ou seja, o dever de prestar nasceria
juntamente com o de submissão patrimonial, ambos objeto de uma mesma relação
jurídica.

De outra senda, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho parecem colocar os
vínculos da obrigação, do dever de prestar, e da responsabilidade, dever de sujeição
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patrimonial, em relações jurídicas diversas:

“Não se deve confundir, ainda, obrigação (debitum) e responsabilidade (obligatio), por


somente se configurar essa última quando a prestação pactuada não é adimplida pelo
devedor. A primeira corresponde, em sentido estrito, ao dever do sujeito passivo de
satisfazer a prestação positiva ou negativa em benefício do credor, enquanto a outra se
refere à autorização, dada pela lei, ao credor que não foi satisfeito, de acionar o
devedor, alcançando seu patrimônio, que responderá pela prestação.

Em geral, toda obrigação descumprida permite a responsabilização patrimonial do


devedor, não obstante existam obrigações sem responsabilidade (obrigações naturais –
debitum sem obligatio), como as dívidas de jogo e as pretensões prescritas. Por outro
lado, poderá haver responsabilidade sem obrigação (obligatio sem debitum), a exemplo
do que ocorre com o fiador, que poderá ser responsabilizado pelo inadimplemento do
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devedor, sem que a obrigação seja sua.”

Trilha a mesma vereda Rui Stoco, para quem a obrigação seria um dever jurídico
originário e a responsabilidade um dever jurídico sucessivo, o que permite concluir, dada
a relação de sucessividade estabelecida entre ambos, que figuram como objeto de
relações jurídicas distintas.

“Mostra-se oportuno distinguir “reponsabilidade” de “obrigação”. Esta, como


anteriormente observado, significa um dever jurídico originário, enquanto aquela – a
responsabilidade – traduz um dever jurídico sucessivo, decorrente da violação da
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obrigação.”

É cediço, nos quadrantes do construtivismo lógico-semântico, que a norma jurídica em


sentido estrito é construída pelo intérprete a partir do contato que trava com os
enunciados prescritivos hauridos a partir dos suportes físicos que constituem o texto (em
sentido estrito) do direito positivo, aspecto objetivo das comunicações deôntico-jurídicas.
Tal construção deve respeitar um esquema formal único (homogeneidade sintática),
hipotético-condicional, estruturado com um antecedente e um consequente, aquele
descrevendo, abstrata ou concretamente, um fato e este pondo, em virtude da
ocorrência do fato, uma relação jurídica vinculando dois ou mais sujeitos de direito em
torno de uma prestação.

Partindo desse patamar teórico para analisar a teoria dualista da obrigação, cabe afirmar
que a relação obrigacional funda-se em um fato jurídico para vincular o credor e o
devedor em torno de uma prestação e que a relação de responsabilidade tem por
fundamento justamente o inadimplemento da prestação para, vinculando os aludidos
sujeitos, permitir que um deles – o credor – busque no patrimônio do responsável,
segundo a forma preconizada pelo direito, a prestação inadimplida ou seu equivalente
monetário.

Apresenta-se, com isso, a diferença semântica entre as normas em questão (da norma
que põe a obrigação e da norma que põe a responsabilidade), que diferem tanto no
antecedente (a de responsabilidade exige o inadimplemento), quanto no consequente (a
de responsabilidade prevê uma permissão ao sujeito ativo, enquanto que a obrigacional
impõe uma obrigação ao sujeito passivo), o que permite concluir serem os vínculos da
obrigação e da responsabilidade objeto de normas jurídicas distintas e não elementos de
um mesmo vínculo, ou seja, objeto de uma mesma relação jurídica.
2 A norma de responsabilidade como norma de direito material.

A dualidade atribuída ao vínculo da obrigação levou os processualistas a identificarem no


vínculo de responsabilidade uma relação jurídica de natureza processual, como sujeição
aos meios executórios, como se vê nas lições de Alexandre Freitas Câmara:

“A responsabilidade patrimonial opera, como dito, no campo processual, e não no


substancial. Isto se dá porque a responsabilidade patrimonial não corresponde a uma
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relação entre credor e devedor, mas entre o Estado e o responsável, podendo aquele
invadir o patrimônio deste para o fim de sujeitar bens que o integram, para permitir,
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assim, a atuação da vontade concreta do direito positivo.”

Não parece ser esta a melhor interpretação para o fenômeno da responsabilidade,


enquadrando-o como um instituto de direito processual, pois, se a norma de
responsabilidade fosse processual e vinculasse o Estado ao responsável, permitindo
àquele invadir o patrimônio deste para sujeitá-lo ao cumprimento da prestação
inadimplida, ela somente seria constituída no processo de execução, palco no qual o
Estado-juiz expropria os bens do devedor para satisfação do credor, quando se sabe que
o direito à obtenção da tutela jurisdicional executiva impõe a existência de uma
obrigação inadimplida devidamente reduzida à linguagem em um título executivo, o que
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fica claro quando se lê o disposto no art. 786 do CPC/2015 (LGL\2015\1656).

A inadimplência no cumprimento da prestação obrigacional, que figura no pressuposto


da norma de responsabilidade, preexiste à execução, mostrando-se adequado concluir
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que a aludida norma não vincula o Estado ao devedor inadimplente, mas antes
estabelece vínculo jurídico entre o credor e o devedor permitindo àquele que busque, na
forma preconizada pelo ordenamento jurídico, a sujeição do patrimônio deste para a
obtenção da prestação inadimplida, ou seu equivalente monetário.

E se trata mesmo de uma permissão, pois fica ao talante do credor exercer o direito
decorrente da inadimplência em busca da sujeição preconizada no consequente da
norma de responsabilidade. Se não quiser, não ajuizará a demanda executiva e não se
estabelecerá, entre o responsável e o Estado-juiz, qualquer relação jurídico-processual,
embora para ele, credor, enquanto não prescrita a sua pretensão, permaneça aberta a
possibilidade de requerer a prestação jurisdicional executiva.

Essa natureza da responsabilidade como norma de direito material a vincular o credor ao


responsável fica ainda mais evidente quando se verifica o que dispõe o art. 775 do
CPC/2015 (LGL\2015\1656), pelo qual “O exequente tem o direito de desistir de toda a
execução ou de apenas alguma medida executiva”, em razão do que parece estar com a
razão José Frederico Marques, quando afirma que a responsabilização ocorrida no plano
processual (sujeição nas palavras do autor) está, necessariamente, conexa a uma
anterior situação de direito material que apenas se realiza no campo processual, isso
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porque nessas situações não é permitida a autotutela.

“Não nos parece, porém, que a sujeição do devedor seja apenas processual. A
responsabilidade executória, como bem observa SALVATORE PUGLIATTI, embora
constitua, dentro da relação processual, uma situação autônoma de sujeição, deve estar
conexa à anterior situação de responsabilidade atinente ao direito substancial.

(...)

Há, portanto, responsabilidade patrimonial e responsabilidade processual. Errôneo


afirmar-se, como CARNELUTTI e outros, que a responsabilidade patrimonial, imanente a
toda obligatio, é apenas de direito processual. Por existir prestação exigível e para
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satisfazê-la, é que os bens do devedor respondem pela obrigação.”

Por tudo, a norma de responsabilidade deve ser vista em separado da norma


obrigacional, tendo como pressuposto o inadimplemento da prestação que figura como
objeto desta. Ademais, terá ela natureza material, isso porque o vínculo surge entre o
credor e o responsável e tem por objeto a permissão para aquele sujeitar o patrimônio
deste com vistas ao adimplemento da prestação já vencida. Haverá sempre um vínculo
de direito material impondo a responsabilidade.

É, portanto, adequado chamar de responsável àquele que, em virtude de uma norma de


direito material que traz em seu antecedente o inadimplemento de uma obrigação, figure
no consequente dessa mesma norma numa posição de sujeição, posto que permitido ao
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credor da prestação inadimplida voltar-se contra ele para buscar em seu patrimônio o
montante necessário para o pagamento da dívida.

O inadimplemento do dever jurídico objeto da relação obrigacional figura como condição


necessária para a incidência da norma de responsabilidade, permitindo ao credor, vítima
do inadimplemento, segundo a forma admitida pelo ordenamento jurídico, buscar no
patrimônio do responsável, o cumprimento da prestação.
3 A norma de responsabilidade do obrigado e de terceiros – O antecedente complexo

A partir dessas considerações, no plano dinâmico, a relação estabelecida entre as


normas jurídicas da obrigação e da responsabilidade apareceriam no seguinte contexto:
1) norma individual e concreta da obrigação; 2) inadimplemento da obrigação como
evento que uma vez constituído em linguagem competente dará ensejo ao surgimento
do vínculo de responsabilidade; 3) norma da responsabilidade individual e concreta –
que tem como antecedente o fato jurídico do inadimplemento da prestação que figura
como objeto da norma obrigacional.

Resta, ainda, uma questão a ser dirimida, que diz respeito à possibilidade de se impor
responsabilidade a pessoas em virtude do descumprimento da prestação objeto de uma
relação obrigacional em cujo íntimo não figuraram como sujeitos passivos, ou seja, é
possível que terceiros não obrigados possam ser responsabilizados pelo inadimplemento
de obrigação alheia?

Creio que a resposta a essa questão é afirmativa, como se verifica na doutrina de Silvio
de Salvo Venosa, para quem:

“Por outro lado, a bipartição do vínculo em débito e responsabilidade, existente na


relação obrigacional, fica bem clara nos casos de exceção à regra geral: há situações em
que, excepcionalmente, ora falta um, ora falta outro elemento. Nas obrigações naturais,
que estudaremos a seguir, existe o débito, mas o credor não está legitimado a exigir seu
cumprimento. Aqui há débito, mas não há responsabilidade. No contrato de fiança, ao
contrário, alguém, o fiador, responsabiliza-se pelo débito de terceiro. Nesse caso, há
responsabilidade, mas não há débito. Portanto, nessas exceções, nas quais o débito e a
responsabilidade não estão juntos, observam-se claramente os dois elementos do
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vínculo.”

Trilham a mesma vereda as lições de Caio Mário da Silva Pereira:

“Frequentemente, os dois fatores andam juntos, um ao lado do outro, um correlato do


outro, pois que é pelo fato de haver débito que o credor tem a faculdade de provocar a
execução forçada. Aliás, não falta a observação (Pacchioni) de que pelo Direito moderno
o mesmo fato gerador do débito produz contemporaneamente a responsabilidade, ao
que acrescentamos que é normalmente, já que eventualmente pode a responsabilidade (
obligatum esse) surgir com autonomia, como se diria no garantir alguém uma dívida
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preexistente, de terceiro.”

Nas situações onde a responsabilidade é atribuída a terceiros haverá duas normas de


responsabilidade, aquela que tem como antecedente tão somente o inadimplemento da
obrigação e prevê como responsável aquele que figurava como sujeito passivo na norma
obrigacional, e uma outra que, por impor a terceiro não obrigado, ou seja, que não tinha
o dever jurídico de prestar o objeto da norma obrigacional, a responsabilidade
decorrente do inadimplemento, trará no relato de seu antecedente, aliado ao
inadimplemento, outro fato, que variará de acordo com o que dispõem os enunciados
prescritivos que lhe impõe a responsabilidade.

Ao esquema representativo da dinâmica normativa da responsabilidade seria


acrescentada uma outra norma, que corresponderia à norma de responsabilidade de
terceiros, cujo antecedente, além da descrição denotativa do evento inadimplemento,
traria outro fato, dando ensejo a um antecedente molecular, que seria justamente
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aquele que vincularia o terceiro à situação em questão, permitindo ao credor titular do


direito subjetivo objeto da norma obrigacional inadimplido, buscar em seu patrimônio a
satisfação do crédito.
4 A responsabilidade tributária no contexto da teoria dualista da obrigação

A responsabilidade tributária, como enfatizado acima, será modalidade de sujeição


passiva na regra matriz de incidência tributária quando o responsável figurar logo no
contexto do seu critério pessoal passivo. De outro lado, o mesmo fenômeno, poderá
aparecer encarnado nas vestes formais que caracterizam o esquema sintático de uma
norma em sentido estrito, que não se confunde com a regra matriz de incidência
tributária.

O responsável, no contexto da teoria geral do direito, foi identificado como aquele que
figura no polo passivo de uma norma primária diferente da norma que põe a obrigação
tributária em sentido estrito, que traz no antecedente o fato do inadimplemento da
obrigação e no consequente a relação jurídica cujo conteúdo consiste na permissão ao
credor de, segundo o procedimento preconizado pelo direito positivo, sujeitar o
responsável ao cumprimento da prestação, ou de seu equivalente pecuniário.

Diante dessa dualidade normativa, norma da obrigação e norma de responsabilidade,


cabe uma primeira afirmação sobre o modo como o Código Tributário Nacional trata o
responsável, atinente à constatação de que ao falar do responsável como sujeito passivo
na regra matriz de incidência tributária (art. 121, parágrafo único, II, do CTN
(LGL\1966\26)), está falando de obrigado, posto que esse responsável, que figurará
como devedor após a incidência daquela norma, mesmo não tendo relação pessoal e
direta com o fato descrito no elemento material da norma que põe a obrigação
tributária, somente será responsável, no sentido teórico-geral, após a constituição do
fato do inadimplemento, quando ostentará, em conjunto, as duas qualidades, de
obrigado e de responsável, respondendo por obrigação própria, não de terceiro.

Entretanto, haverá situações, atinentes aos enunciados prescritivos de responsabilidade


de sucessores e terceiros previstos no Código Tributário Nacional (arts. 129 a 135), onde
a norma em sentido estrito construída trará àqueles ali nomeados como responsáveis
apenas a responsabilidade decorrente do inadimplemento de uma obrigação tributária de
cujo íntimo não participaram.

Aqui se evidencia a importância da adoção da teoria dualista da obrigação, em que se


optou por ver os vínculos da obrigação e da responsabilidade como objeto de normas
jurídicas de direito material distintas, a primeira trazendo como objeto a relação jurídica
que impõe o dever de prestar vinculando o obrigado (devedor – sujeito passivo) ao
credor, em torno de uma prestação cujo adimplemento constitui direito subjetivo deste e
dever jurídico daquele, e a segunda ostentando como pressuposto necessário de sua
incidência o inadimplemento daquela prestação, vinculando, no prescritor, o credor ao
responsável, permitindo ao primeiro buscar o adimplemento forçado da prestação no
patrimônio deste, segundo o modo preconizado pelo direito positivo.

Esse responsável (sujeito passivo da norma de responsabilidade) pode ou não coincidir


com o obrigado (sujeito passivo da norma obrigacional). Se coincidir, a aplicação da
norma de responsabilidade dependerá, tão somente, da verificação do fato
inadimplemento. Caso não haja tal coincidência, quando se terá o fenômeno da
responsabilidade por obrigação “alheia”, ao fato jurídico do inadimplemento deve-se
juntar outro ou outros para permitir a imposição de responsabilidade (dever de sujeição)
ao terceiro, situações em que o inadimplemento será condição necessária, porém
insuficiente para a incidência da norma de responsabilidade.

O nascimento, nos aludidos casos, da obrigação já para aquele que o Código Tributário
Nacional chama de responsável (sucessor ou terceiro) dependerá de estarem presentes
os pressupostos (eventos) previstos nos enunciados prescritivos que lhe impõem a
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responsabilidade por ocasião da ocorrência do evento denotador de riqueza, posto que,


conforme dispõe o art. 144 do CTN (LGL\1966\26), o lançamento reporta-se à data da
ocorrência do fato gerador.

É que neste caso, o evento desencadeador da responsabilidade, sendo contemporâneo


ao que servirá de norte para a edificação do fato jurídico tributário (elemento material
do antecedente da norma produto da incidência da regra matriz), acaba por impor que
se construa a norma geral e abstrata respectiva (regra matriz de incidência tributária)
tomando em consideração os enunciados prescritivos instituidores de responsabilidade,
caso pretenda, o fisco, efetuar a cobrança da prestação em face do responsável, seja
sucessor, seja terceiro.

Nesta hipótese, o responsável tributário sempre será obrigado e, consequentemente,


responderá por obrigação própria, caso reste inadimplida a prestação obrigacional
tributária, não cabendo cogitar da possibilidade de colocá-lo somente no polo passivo da
norma de responsabilidade.

Ademais, é preciso ter em conta que, tratando-se de lançamento de ofício, esse limite
temporal amplia-se de modo que, se ocorrido, no plano fático-social, o evento que
determina a responsabilidade até a data do lançamento, deve-se interpretar o já
mencionado art. 144 do CTN (LGL\1966\26), que determina que o lançamento
reporta-se à data da ocorrência do fato gerador, em conjunto com o que dispõe o art.
142 do mesmo diploma legal, para concluir que ao responsável tributário deverá ser
imposta a condição de obrigado, tomando em consideração, a autoridade lançadora,
toda a situação fática ocorrida até a data do lançamento.

Assim é, afirma-se, porque o art. 142 regula exclusivamente os casos de constituição da


obrigação tributária pelo fisco, designando que o lançamento é ato privativo da
autoridade administrativa, a quem cabe, dentre outras coisas, identificar o sujeito
passivo (contribuinte ou responsável) e, se o caso, aplicar a penalidade cabível. Se a
autoridade fiscal deve tomar em consideração atos ilícitos praticados após a ocorrência
do evento tributário para aplicar a penalidade cabível, com mais razão deve considerar o
contexto fático existente até aquela data para a identificação do sujeito passivo da
obrigação tributária, lançando mão dos enunciados prescritivos de responsabilidade, os
quais, nesse caso, contribuirão para a construção da regra matriz de incidência
tributária.

Essa hipótese fica bastante clara quando se reflete acerca do processo de positivação
das obrigações tributárias cujas normas devem ser constituídas por ato do
contribuinte/responsável (lançamento por homologação), mas este permanece inerte,
impondo a necessidade do fisco efetuar o lançamento de ofício substitutivo, ocasião em
que certifica o fato descumprimento do referido dever instrumental e efetua a
constituição da obrigação tributária, para o que deve tomar o contexto fático-social
(eventos) existente até ali para constituir a norma obrigacional, seja em face do
contribuinte, seja em face dos sucessores ou terceiros, desde que cumpra o ônus de
constituir em linguagem competente os fatos que permitem atribuir-lhes a sujeição
passiva.

Neste caso, cabe ao Fisco constituir a norma obrigacional tal qual deveria ter feito o
particular desidioso (que deixou de constituir a obrigação contra si) e, verificando a
ocorrência do fato jurídico determinante da sucessão ou da responsabilidade de
terceiros, tomar esse fato em consideração para edificar o critério subjetivo da regra
matriz de modo a abranger também o responsável.

Problematizando mais ainda o exemplo, se, entretanto, houver a perda da personalidade


jurídica daquele que seria o contribuinte, não lhe restará alternativa, que não constituir a
obrigação somente em face dos responsáveis, uma vez que deter personalidade jurídica
é condição necessária para figurar no elemento subjetivo de qualquer relação jurídica,
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inclusive das tributárias.
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De outro lado, se o evento que figura como desencadeador da responsabilidade de


terceiros e sucessores ocorrer após o lançamento, quando este se der de ofício, ou após
o evento denotador de riqueza tributável, para os casos em que a constituição da
obrigação tributária tiver se dado por ato do particular, aí sim poderá ser imputada a
este responsável (terceiro ou sucessor), tão somente a responsabilidade pela obrigação
tributária constituída em face de outrem, ocasião em que a norma de responsabilidade,
como já afirmado em anterior oportunidade, trará um antecedente complexo, com dois
fatos, um deles o do inadimplemento da obrigação e o outro aquele específico
desencadeador da responsabilidade de terceiros ou sucessores.

Esse mesmo raciocínio pretende-se cabível para todos os casos de responsabilidade


previstos no Código Tributário Nacional entre os arts. 129 e 135, o que se demonstrará
nos tópicos seguintes.
4.1 A responsabilidade dos sucessores

Os enunciados prescritivos do Código Tributário Nacional que versam especificamente


sobre o tema da responsabilidade dos sucessores constam dos arts. 129 a 133. São eles
determinantes para o intérprete identificar os casos em que os sucessores serão
obrigados, ou seja, sujeitos passivos na norma produto da incidência da regra matriz, ou
quando serão apenas responsáveis, no sentido teórico-geral, quando responderão pelo
inadimplemento de uma obrigação tributária surgida em face do sucedido.

Isso porque, como já referido em outras passagens, a depender do momento em que


ocorre o fato da sucessão, ao aplicador será possível constituir em face do sucessor a
obrigação tributária, ou tão somente a responsabilidade decorrente do inadimplemento
de uma obrigação tributária surgida em face do sucedido.

Quando o fato jurídico determinante da sucessão for anterior ao lançamento de ofício,


caberá à autoridade fiscal lançadora constituir em face do sucessor a obrigação
tributária, o que será imperioso quando não sobrar ao sucedido personalidade jurídica,
uma vez que neste caso qualquer obrigação em face deste constituída não ostentará um
de seus elementos necessários, o que acarretará sua nulidade.

No caso em que ao sucedido sobrar personalidade jurídica, por ocasião do lançamento


abrem-se três possibilidades ao fisco, constituir a obrigação tributária em face do
sucessor, constituí-la em face do sucedido, ou, ainda, em face de ambos.

Em outra vereda, se o fato da sucessão for posterior à constituição da obrigação


tributária, contra o sucessor poderá ser constituída tão somente a norma de
responsabilidade, quando inadimplida a obrigação surgida contra o sucedido, permitindo
ao credor que se volte contra o responsável sucessor e em seu patrimônio busque o
adimplemento forçado da obrigação inadimplida pelo sucedido.

Em todos os casos em que o sucessor for chamado a responder pela obrigação


inadimplida pelo sucedido, nos casos de responsabilidade por obrigação alheia, além do
fato jurídico do inadimplemento, no antecedente da aludida norma também se fará
presente outro fato jurídico, qual seja, o da sucessão, pois sempre que houver
responsabilidade por obrigação alheia, o antecedente da norma que a impõe será
molecular, formado pela união de pelo menos dois fatos, o do inadimplemento aliado ao
determinante da responsabilização, no caso, o da sucessão.
4.2 A responsabilidade de terceiros

Do mesmo modo que ocorre com os casos elencados no tópico anterior, na


responsabilidade de terceiros, na forma dos arts. 134 e 135 do CTN (LGL\1966\26), os
respectivos terceiros podem figurar como obrigados no contexto da regra matriz de
incidência tributária, quando os respectivos enunciados prescritivos contribuirão para a
edificação do critério subjetivo passivo da regra matriz de incidência tributária, ou ainda
poderão figurar, tão somente, como responsáveis no sentido teórico-geral, quando
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Dualista da Obrigação

haverá enquadramento de suas manifestações normativas no esquema formal


característico das normas em sentido estrito.

Neste último caso, não será imposta ao terceiro responsável a obrigação, mas tão
somente a responsabilidade, tomado o termo na acepção teórico-geral. Com base nos
mesmos enunciados prescritivos serão introduzidas no ordenamento jurídico normas em
sentido estrito que imporão ao terceiro responsável o dever de sujeição patrimonial para
a obtenção forçada da prestação tributária inadimplida por outrem.

Nessa perspectiva, é importante aludir e enfatizar que não há qualquer contradição entre
o reconhecimento da possibilidade do terceiro responsável ser posto como obrigado no
contexto da regra matriz de incidência tributária e o disposto no art. 3.º do CTN
(LGL\1966\26), que coloca como requisito necessário para que uma prestação pecuniária
constitua tributo, que não consubstancie sanção imposta em razão da prática de ato
ilícito, de infração.

Embora a prática do ilícito seja característica nos casos que o Código Tributário Nacional
prevê sob a égide da responsabilidade de terceiros, nota-se que estes terceiros figurarão
como obrigados em virtude dos respectivos enunciados prescritivos que lhes atribuem tal
responsabilidade serem utilizados para a edificação do aspecto subjetivo da regra matriz,
o que não implicará qualquer alteração do aspecto material de seu termo antecedente,
que continuará descrevendo fato jurídico lícito denotador de riqueza.

O aludido ato ilícito desencadeia a responsabilidade e permite que os enunciados


prescritivos que a preveem passem a colaborar na construção do critério subjetivo da
regra matriz, ampliando o âmbito pessoal sobre o qual pode laborar o fisco, mas nada
altera no que concerne ao aspecto material, pelo que o tributo, a prestação pecuniária,
conquanto constituída em face de um terceiro, que se encontra como sujeito passivo em
decorrência de ter praticado um ato ilícito, permanece tendo como pressuposto o fato
descrito em seu aspecto material, que é lícito.
4.2.1 A responsabilidade fundada no disposto no art. 134 do CTN

O caput do art. 134 do CTN (LGL\1966\26) fala em impossibilidade de exigência do


cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, impondo, em virtude disso, aos
responsáveis elencados em seus incisos, responsabilidade pela obrigação inadimplida,
sempre que tenham intervindo de forma culposa omissiva ou comissiva.

Essa intervenção, infere-se a partir dos incisos do aludido dispositivo legal, pode ocorrer
tanto no contexto do evento demonstrador de riqueza tributável, como também em
momento posterior, desde que implique a falta de pagamento do tributo e a
impossibilidade de cobrança daquele que ostenta a sujeição passiva na obrigação
tributária em sentido estrito.

Pode-se concluir, assim, que os casos de responsabilidade de terceiros postos pelo artigo
em comento implicarão, em virtude da previsão de que deve ser comprovada a
impossibilidade de obter-se o adimplemento no patrimônio do obrigado, aos terceiros tão
somente a responsabilidade, na significação teórico-geral, por obrigação alheia, posto
que esta nascerá em face daquele que está previsto como sujeito passivo na regra
matriz de incidência e somente depois de verificado o inadimplemento e a
impossibilidade de obter o adimplemento forçado no seu patrimônio, que o fisco poderá
voltar-se aos responsáveis elencados em seus incisos, atribuindo-lhes a responsabilidade
pelo montante correspondente ao tributo inadimplido.

Uma última advertência impõe-se: por expressa injunção legal, a obrigação surgida para
o responsável não abrange o montante eventualmente devido pelo obrigado a título de
penalidade que não decorra da mora no adimplemento da obrigação, o que está previsto
no parágrafo único do art. 134 do CTN (LGL\1966\26).
4.2.2 A responsabilidade fundada no disposto no art. 135 do CTN
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A Responsabilidade Tributária sob a Ótica da Teoria
Dualista da Obrigação

Também para as hipóteses de responsabilidade de terceiros que encontram fundamento


no disposto no art. 135 do CTN (LGL\1966\26), vai-se buscar verificar se, nos casos
previstos na lei tributária, surgirá para o terceiro a obrigação tributária, ou, tão somente,
a responsabilidade, no sentido teórico-geral, decorrente do inadimplemento de obrigação
alheia.

Para tanto, exsurge imprescindível enfrentar alguns problemas semânticos que


atormentam aqueles que se dedicam à análise do aludido dispositivo legal, com vistas à
construção de seu conteúdo de significação, posto que, a depender da postura adotada,
as respostas aos problemas postos no parágrafo anterior cambiarão significativamente.

Nesta senda, o primeiro problema a solucionar respeita à significação da expressão “São


pessoalmente responsáveis pelos créditos...”, constante da redação de seu caput, posto
que a grande discussão que vige aqui se refere ao efeito da aplicação da norma de
responsabilidade, se ela afasta a sujeição passiva do contribuinte/substituto, impondo
que figure como sujeito passivo apenas aqueles mencionados nos incisos do artigo em
comento.

Adianta-se, para que não haja muito suspense, que a resposta que se dará à questão é
negativa. O advérbio “pessoalmente”, que consta da expressão descrita, não impõe que
a obrigação pelo crédito tributário será exclusiva daqueles mencionados em seus incisos,
quando verificados os requisitos do caput, mas apenas enfatiza que eles podem ser
postos como sujeitos passivos da obrigação tributária ou, ainda, que deverão responder
pela obrigação tributária surgida com seu patrimônio, sem que se perquira acerca do
13
sujeito passivo contribuinte/substituto ser capaz ou não de efetuar o pagamento.

Com isso, pode-se analisar o segundo problema semântico, que exige elucidação da
significação do termo “ resultantes ”, constante no caput do mesmo dispositivo para
prescrever que as hipóteses de responsabilidade nele previstas limitam-se às obrigações
tributárias que resultem de atos praticados com excesso de poderes, infração de lei,
contrato social ou estatutos.

Quanto a esse aspecto, Maria Rita Ferragut afirma que o vocábulo limita a incidência do
dispositivo apenas aos casos em que o ato ilícito é anterior ao evento tributário previsto
na regra matriz de incidência tributária, conforme se verifica no seguinte excerto de sua
obra:

“Comprova-se com base nessa estrutura que, como o art. 135 determina que o fato
ilícito resulte na obrigação tributária, ele deverá ser, necessariamente, anterior a ela,
para poder implicá-la.

Verifica-se, também, que, se a inadimplência ocorre em momento posterior à obrigação


tributária, o art. 135 não a contemplou como fato típico. A inadimplência não implica a
obrigação, e sim é decorrência do descumprimento de seu objeto.

Por fim, depreendemos que a ocultação do fato jurídico tributário também não é infração
típica do art. 135. Sem dúvida alguma, esse fato é lícito, mas seu fundamento de
validade é tão somente o art. 137 do CTN (LGL\1966\26). E por quê? Porque a ocultação
não resulta na obrigação tributária. O que resulta é o fato ocultado (e posteriormente
14
vertido em linguagem, diga-se).”

Esta interpretação considera que a estrutura sintática da norma jurídica (em sentido
estrito) é hipotético-condicional, em função do que, pela imputação deôntica, o termo
consequente aparece como decorrência do antecedente, e sendo a obrigação tributária,
a relação jurídica que ocupa a posição sintática de consequente da norma
jurídico-tributária, causada (causalidade jurídica ou imputação deôntica) pelo fato
descrito no pressuposto normativo, conclui que o fato jurídico desencadeador da
responsabilidade tributária fundada no art. 135 deverá, também, ser o causador (em
plano extrajurídico – causalidade natural) do evento jurídico-tributário, o qual, tendo
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A Responsabilidade Tributária sob a Ótica da Teoria
Dualista da Obrigação

sido causado por ele (o fato gerador da responsabilidade), dará causa à obrigação
tributária em sentido estrito, tal qual houvesse entre eles uma relação de transitividade.

Entretanto, essa posição não é unânime, havendo respeitável doutrina que postula ser
bastante para a responsabilização na forma do artigo em discussão que o ato infracional
implique o inadimplemento da obrigação tributária, conforme se depreende do seguinte
excerto da obra de Andréa M. Darzé:

“Assim, não basta, por exemplo, que a pessoa jurídica deve tributos para que a (sic)
diretor possa vir a ser chamado a satisfazê-lo. É preciso mais que isso: a comprovação,
por meio da linguagem das provas, que atuou com excesso de poderes ou infração à lei
ou ao contrato social e que dessa sua atitude decorreu a inadimplência da sociedade
perante o Fisco.

Noutras palavras, duas são as condições para a incidência do presente dispositivo legal: i
. que os sócios, diretores, gerentes ou representantes pratiquem atos de gestão e ii. Que
o inadimplemento da obrigação tributária decorra de atos contrários à lei, contratos e
15
estatutos.”

Quando os Tribunais admitem a responsabilidade tributária fundada no encerramento


irregular e incluem a hipótese dentre aquelas do art. 135 do CTN (LGL\1966\26), fica
claro que respondem à dúvida semântica de forma a permitir a responsabilização mesmo
16
que os ilícitos sejam posteriores à ocorrência do evento tributário.

Definida a posição acerca dos problemas semânticos relatados, pode-se afirmar que o
responsável, na forma do art. 135 do CTN (LGL\1966\26), poderá ostentar a condição de
obrigado na relação jurídica posta em virtude da aplicação da regra matriz de incidência
tributária, podendo, também, ser, pelo seu inadimplemento, responsabilizado, desde que
reste comprovado que tenha praticado infração à lei, contrato social ou estatuto, tudo
dependendo do cotejo entre o momento da ocorrência do evento ilícito e aquele em que
houve o lançamento.

Assim, quando o ilícito ocorrer após o lançamento, entendido na forma do art. 142 do
CTN (LGL\1966\26) (ato privativo da autoridade administrativa), a obrigação surgirá
contra o sujeito passivo previsto na regra matriz de incidência tributária sem que se
possa valer, aquela autoridade, dos enunciados prescritivos do mencionado artigo para
edificação do elemento subjetivo da relação (o que é óbvio, uma vez que não ocorrido
qualquer ilícito), que, inadimplindo-a, passará a ser responsável (sentido teórico-geral),
posto que permitido ao credor buscar em seu patrimônio o montante necessário ao
pagamento de seu crédito.

Ocorre que, comprovada a prática de infração determinante da inadimplência da


obrigação após sua constituição, qualquer daqueles referidos nos incisos do art. 135
poderão ser responsabilizados em decorrência do inadimplemento. Neste caso, a norma
de responsabilidade, tomado o termo em seu sentido teórico-geral, dos terceiros
ostentará um antecedente molecular, aliando o fato do inadimplemento à infração
praticada, para, no suposto, permitir ao credor voltar-se contra o infrator para em seu
patrimônio buscar a satisfação de seu direito.

De outro lado, nos casos em que a infração antecede a constituição do crédito tributário,
quando ela poderá originar à própria obrigação, ou mesmo dar ensejo ao seu
inadimplemento, este último caso vislumbrado a partir da noção de lançamento de ofício
substitutivo, quando a obrigação tributária é constituída quando já deveria ter sido paga,
caso o contribuinte tivesse efetivado a autoconstituição, cabe à autoridade fiscal
lançadora constituir, no mesmo veículo introdutor (lançamento), a obrigação tributária
em face do contribuinte e do terceiro responsável, tomando por base, agora, para a
edificação do critério subjetivo da regra matriz, além dos enunciados prescritivos da lei
instituidora do tributo, aqueles previstos no art. 135 do CTN (LGL\1966\26).

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A Responsabilidade Tributária sob a Ótica da Teoria
Dualista da Obrigação

Assim é, porque, diferentemente do que se dá nos casos do art. 134 do referido diploma
legal, nos casos em voga não há imposição de que haja comprovação da impossibilidade
de exigir o cumprimento da obrigação em face do contribuinte/substituto, o permite,
desde logo, contra o terceiro responsável ser constituída a obrigação, sem a necessidade
de se intentar a cobrança em face daquele e, somente após comprovada sua absoluta
inadimplência, responsabilizar-se o terceiro.
5 Considerações finais

A teoria dualista da obrigação separa os vínculos da obrigação e da responsabilidade,


que configuram, na realidade, normas jurídicas distintas, tendo, a norma de
responsabilidade, como pressuposto de sua incidência, o inadimplemento da obrigação
objeto da norma que lhe antecede tanto lógica, quanto cronologicamente (a norma
obrigacional).

A responsabilidade pode recair sobre o obrigado, como sobre terceira pessoa que não
compôs a relação jurídica obrigacional, situação na qual, além do fato inadimplemento,
outro fato comporá o termo antecedente da respectiva norma de responsabilidade,
permitindo ao credor sujeitar, segundo a forma preconizada pelo direito positivo, este
terceiro ao adimplemento forçado da prestação obrigacional.

Essa visão permite uma ampliação do espectro de normas em sentido estrito que podem
ser construídas a partir dos enunciados prescritivos atinentes ao tema encontrados no
Código Tributário Nacional, além de permitir uma nova visão sobre o tema do
estabelecimento de responsabilidade no bojo de processos de execução fiscal.
6 Referências bibliográficas

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A Responsabilidade Tributária sob a Ótica da Teoria
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Paulo: Ed. RT, 2011.

1 “Essa relação de crédito foi resgatada do Direito Romano pelo direito alemão, por meio
da conhecida ‘teoria dualista’ das obrigações (com reflexo nas relações jurídicas),
separando de forma lógica o crédito/débito (Schuld) e a garantia/responsabilidade
(Haftung)” (BECHO, Renato Lopes. Sujeição passiva e responsabilidade tributária, p.
153).

2 PEREIRA. Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 26. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2014. vol. II – Teoria geral das obrigações, p. 25.

3 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 10.
ed. São Paulo: Saraiva, 2009. vol. II – Obrigações, p. 10.

4 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil doutrina e jurisprudência. 8. ed. São


Paulo: Ed. RT, 2011, p. 136.

5 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. II, p. 194.

6 Art. 786. A execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação
certa, líquida e exigível consubstanciada em título executivo.

7 O sintagma da norma jurídica completa, dotado de um termo primário, que seria a


norma de direito material, e de um termo secundário, que seria a norma de direito
processual, esta vinculando o titular do direito previsto na norma primária e
descumprido ao Estado-juiz, que, por sua vez, ocupando o polo passivo da norma
secundária, teria o dever (estaria obrigado) de prestar-lhe a tutela jurisdicional apta a
solucionar o conflito de interesses levado ao seu conhecimento.

8 Note-se que, se implementada a execução fiscal administrativa, a sujeição patrimonial


imposta ao devedor em virtude da norma de responsabilidade prescindirá
completamente da intervenção do Estado-juiz, quando haverá autotutela do Estado-fisco
no que concerne à cobrança dos débitos fiscais.

9 MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Campinas:


Millennium, 1999. vol. V, p. 50-51.

10 Direito civil, teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos, p. 43.

11 Instituições de Direito Civil, vol. II – Teoria geral das obrigações, p. 26.


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A Responsabilidade Tributária sob a Ótica da Teoria
Dualista da Obrigação

12 “Visto como foi, distância abissal separa as duas circunstâncias, sumamente


relevantes para a descrição do fenômeno jurídico das imposições tributárias: a
possibilidade de um ente, ao qual o direito positivo não atribui personalidade jurídica, vir
a concretizar situação estabelecida na lei fiscal, desencadeando efeitos tributários; e a
aptidão para integrar a relação jurídica tributária, nexo que surge, automática e
infalivelmente, por força da ocorrência dos fatos descritos.
Alguma coisa exsurge com a veemência das afirmações verdadeiras: não se disse, ainda,
com clareza e de modo peremptório, que o sujeito capaz de realizar o fato jurídico
tributário, ou dele participar, pode, perfeitamente, não ter personalidade jurídica de
direito privado, contudo, o sujeito passivo da obrigação tributária haverá de tê-lo,
impreterivelmente.” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário fundamentos
jurídicos da incidência, p. 226-227).

13 Esta posição, segundo Andrea M. Darzé, que assume postura oposta à sustentada, é
adotada de forma predominante na comunidade jurídica, como se vislumbra a partir da
seguinte passagem de sua obra: “Em termos mais diretos, a aplicação da norma
sancionatória implica a anulação do crédito tributário já lançado contra o contribuinte ou
impede o seu lançamento, por força da ineficácia técnica sintática que produz
relativamente ao enunciado da sujeição passiva da regra matriz em sentido amplo. Este,
todavia, não é o posicionamento que predomina na comunidade do discurso científico,
tampouco entre os integrantes do Fisco”. (grifos nossos) (Responsabilidade tributária
solidariedade e subsidiariedade, p. 180).

14 Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002, p. 142-143.

15 Responsabilidade tributária solidariedade e subsidiariedade, p. 174-175.

16 : “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu


domicílio, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da
execução fiscal para o sócio-gerente". Dentre os julgados tomados como referência para
a edição da súmula, cita-se o EREsp 716412/PR, que enquadra o caso do encerramento
irregular como infração à lei subsumida ao que dispõe o art. 135, III, do CTN
(LGL\1966\26), o que corrobora a tese aqui defendida, no sentido de que a aludida
transitividade entre o ato ilícito gerador de responsabilidade, o evento tributário
devidamente constituído em linguagem e a obrigação tributária em sentido estrito não se
impõe, sendo contingente, portanto.

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