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[Pino palpitando sobre Kant]

Essa discussão é fatalmente inútil, mas vou tentar dar um panorama geral para explicitar
porquê sou anti-kantiano; visto que o sistema kantiano é fechado, não aberto, isso significa que
se aceitarmos as premissas iniciais, o resto é consequência. Mas qual seria o problema, afinal?
Bom, a tendência iluminista de trazer tudo que outrora esteve no céu, para a terra, mas o que
encontramos até então foi pó. A tendência empírico-materialista da modernidade teve forte
impacto após a metafísica de Leibniz parecer muito distanciada para o baixo nível intelectual
europeu (principalmente o francês) causado por uma série de fatores; não é atoa que os
metafísicos viraram piada, principalmente por conta da mediocridade volteriana e toda sua
influência sobre o pensamento iluminista.

A filosofia moderna - e em especial a kantiana - fez inconscientemente aquilo que os sofistas


haviam feito quando ganharam espaço em Atenas, no passado, no entanto, Górgias declarou a
impossibilidade de conhecer o mundo, na modernidade foi declarado o fim da Metafísica e a
busca pelos "limites do conhecimento". É claro que Kant não era do mesmo nível que um
Górgias, pelo menos sua obra era um tanto mais sofisticada quanto a daquele filósofo que
pouco ou nada sobrou fragmentariamente. Acreditando ter acordado do "sono dogmático", que
nunca existiu, tudo que fez foi fazer da filosofia ainda mais seca, edificada, e buscando
interpretações mais próximas da imediatez da vida substancial. Não é atoa que Hegel diz o
seguinte em F. E.:

"8 - [Diese Forderung] Corresponde a tal exigência o esforço tenso e impaciente, de um zelo
quase em chamas, para retirar os homens do afundamento no sensível, no vulgar e no
singular, e dirigir seu olhar para as estrelas; como se os homens, de todo esquecidos do divino,
estivessem a ponto de contentar-se com pó e água, como os vermes. Outrora tinham um céu
dotado de vastos tesouros de pensamentos e imagens. A significação de tudo que existe
estava no fio de luz que o unia ao céu; então, em vez de permanecer neste [mundo] presente,
o olhar deslizava além, rumo à essência divina: a uma presença no além - se assim se pode
dizer. O olhar do espírito deveria, à força, ser dirigido ao terreno e ali mantido. Muito tempo se
passou antes de se introduzir na obtusidade e perdição em que jazia o sentido deste mundo, a
claridade que só o outro mundo possuía; para tomar o presente, como tal, digno do interesse e
da atenção que levam o nome de experiência. Agora parece haver necessidade do contrário: o
sentido está tão enraizado no que é terreno, que se faz mister uma força igual para erguê-lo
dali. O espírito se mostra tão pobre que parece aspirar, para seu reconforto, ao mísero
sentimento do divino em geral como um viajante no deserto anseia por uma gota d'água. Pela
insignificância daquilo com que o espírito se satisfaz, pode-se medir a grandeza do que
perdeu."

Mas atacar um filósofo dessa maneira seria nietzschiano demais; vejamos onde residem os
problemas da filosofia transcendental.
A principal pergunta que Kant se propõe a investigar e responder em seus dez anos
escrevendo Crítica da Razão Pura é a seguinte: como são possíveis juízos sintéticos a priori?
Nesse pergunta já podemos encontrar uma densidade de conceitos, não vou atacá-la
diretamente, mas somente observar o que está por trás do "a priori", e mais especificamente do
a priori puro.
A priori [puro], em Kant, trata-se de todo conhecimento que não só possui (1) universalidade
rigorosa e expressa por isso necessidade, como também (2) é o conhecimento onde não se
encontra nada de empírico. O conhecimento empírico é formado por aquilo que recebemos
direta ou indiretamente (no caso dos impuros) das impressões dos sentidos por meio da
experiência. Todo conhecimento empírico tem origem a posteriori, seja impuro – como no
exemplo da casa e seus alicerces que ele expõe logo no começo – seja “puro” a posteriori, ou
seja, uma experiência direta com a coisa acontecendo.
É claro que Kant nos mostra uma “fórmula” mais elaborada para distinguir conhecimento puro
de empírico, nesta passagem ele expõe com clareza:
“A questão agora é quanto a um critério pelo qual podemos distinguir com segurança uma
cognição pura de uma cognição empírica. A experiência, sem dúvida, nos ensina que este ou
aquele objeto é constituído de tal e tal maneira, mas não que não poderia existir de outra
forma. Agora, em primeiro lugar, se temos uma proposição que contém a idéia de necessidade
em sua própria concepção, ela é a priori. Se, além disso, não deriva de nenhuma outra
proposição, a menos que envolva igualmente a ideia de necessidade, é absolutamente a priori.
Em segundo lugar, um julgamento empírico nunca exibe universalidade estrita e absoluta, mas
apenas assumida e comparativa (por indução); portanto, o máximo que podemos dizer é que,
até onde observamos até agora, não há exceção a essa ou àquela regra. Se, por outro lado,
um julgamento traz consigo uma universalidade estrita e absoluta. A universalidade empírica é,
portanto, apenas uma extensão arbitrária de validade, daquilo que pode ser predicado de uma
proposição válida na maioria dos casos, àquilo que é afirmado de uma proposição que é válida
em todos; como, por exemplo, na afirmação: “Todos os corpos são pesados”. Quando, pelo
contrário, a universalidade estrita caracteriza um julgamento, indica necessariamente outra
fonte peculiar de conhecimento, a saber, uma faculdade de cognição a priori. A necessidade e
a universalidade estrita, portanto, são testes infalíveis para distinguir o conhecimento puro do
conhecimento empírico e estão inseparavelmente conectados uns com os outros. Mas, como
no uso desses critérios, a limitação empírica é às vezes mais facilmente detectada do que a
contingência do julgamento.” (KANT, 2003, II).
Ele ainda nos dá a entender que é possível irmos “retirando tudo que é empírico da coisa” até
chegar a algo puro; como diz ele próprio:
“(...) se tiramos gradualmente de nossas concepções de um corpo tudo o que pode ser referido
à mera experiência sensorial - cor, dureza ou suavidade, peso, até mesmo impenetrabilidade -
o corpo então desaparecerá; mas o espaço que ocupava ainda permanece, e isso é
absolutamente impossível de aniquilar no pensamento. Mais uma vez, se tiramos, da mesma
forma, da nossa concepção empírica de qualquer objeto, corpóreo ou incorpóreo, todas as
propriedades que a mera experiência nos ensinou a conectar com ela, ainda não podemos
desconsiderar aquelas através das quais nós a cogitamos como substância, ou aderir à
substância, embora nossa concepção de substância seja mais determinada que a de um
objeto.” (KANT, 2003, II).

A questão é que não se pode regressar dessa forma na natureza de um objeto, sem, antes,
assumirmos que exista algo que seja totalmente puro - até aqui, ele está certíssimo, o
problema é quando adentra e acredita que o puro é uma coisa que não é pura, mas sim um ser
em-si e para-si; ora, mas o conceito de substância, só é possível graças a experiência, não o
contrário, mostrando assim que não há uma real distância entre conhecimento empírico e
conhecimento puro da forma como ele expõe, eu não posso retirar todo o leite e transformá-lo
em queijo sem que esse leite perca sua essência, ou melhor, se eu regressar na ordem dos
laticínios até o laticínio mais puro, o mais puro é ainda leite em si mesmo, do contrário, não é
nada, essas analogias podem ajudar a esclarecer um pouco: já que todo do empírico posso
chegar ao puro - de fato, é possível, reitero, mas não do modo exposto pela filosofia
transcendental. Se observo os seguintes objetos: cachorro, poste e humano, posso desses
entes abstrair algumas coisas, mas jamais posso considerar que dentro de mim hajam
pressupostos transcendentais empiricamente formados que possibilitam a completa apreensão
e representação da coisa sem assumir que estas coisas nunca estiveram ali, são seres-Outros
- só aqui já prova de onde elas vem originalmente - tais quais os entes “completos”. O que nos
resta é aceitar que assunção do entendimento kantiano da forma elaborada é arbitrária e não
corresponde ao entendimento mesmo, já que tem em si uma efetividade que não é a sua, mas
a de outro, externamente.

Resumidamente, estou apenas repetindo o que já disse acima, e por até então permaneci em
silêncio ao aguardo de uma resposta espaldada em argumentos e não de uma tentativa erística
com uma pergunta desnecessária, uma vez que está implícito meu acordo com Hegel em
relação ao kantismo com uma pergunta desvirtuosa, da qual pressupõe um erro
consequencialista da filosofia kantiana + outras correntes positivo-analíticas; e o que repito? O
seguinte: que a única verdade do idealismo é a asserção: "Eu sou Eu", ou seja, eu sou para
mim objeto e essência; quando se afirma isso, está a se dizer que a consciência-de-si, em si
mesma, é para-si: o Eu, então, nada mais é que a verdadeira pureza, a pura essencialidade do
essente - ou seja, do meu eu para comigo Eu, meu ser para comigo mesmo: é a verdadeira
pureza, uma categoria simples, não uma categoria arbitrária a "qual, quando é, [já]
desvaneceu, e quando desvaneceu, é de novo produzido.” - que, nesse sentido, trata-se das
categorias "puras" do entendimento em Kant. Hegel ainda critica Kant ao dizer que somente um
mal idealismo colocaria frente a frente a consciência frente ao Universal essente, já que uma
categoria sempre corresponde abstraidamente aos objetos nas intuições formando
representações.

Enfim, se quiser que a discussão continue, que estabeleçamos alguns princípios ou não
chegará a lugar algum; ou pelo menos prove que a asserção exposta é falsa, do contrário pode
continuar aí com seus lacaios com dois dígitos de QI.
[Rian destruindo o palpiteiro Pino, que o bloqueou para que o mesmo não conseguisse ver
suas críticas (palpites)]

São pontos tão fáceis de se atacar que eu posso fazer isso de forma centrada e enumerada,
embora eu duvide que você vai ter coragem de me desbloquear. Ou você achava mesmo que
eu iria ficar aqui de braços cruzados enquanto você esquiva de tudo o que eu falei, me enrola e
me bloqueia para eu não ver suas respostas? Muito bem.

1- A primeira parte é puro blá-blá-blá inútil e sem muita substancialidade, cheia de afirmações,
mas vazia de fundamentação. Eu só acho muito engraçado como você critica a evolução do
pensamento metafísico em relação ao começo do Iluminismo (acreditando ingenuamente que
só existiu um, quando o termo é mais adequadamente usado para expressar no mínimo três
etapas diferentes), destacando principalmente a Escola de Leibniz-Wolff, e então procede se
afirmando como hegeliano. Será que não é do seu conhecimento que Hegel está mais próximo
de Kant nesse quesito, e que ele invarialmente departe da concepção e escolas metafísicas
anteriores? Que na verdade, ele é visto muitas das vezes como a culminação do que precedeu
por Kant? Me impressiona sua ignorância nesse sentido, pois é algo que até autores
hegelianos orgulhosamente falam desde toda a evolução do idealismo alemão e a mudança
gerada a partir de Kant.

2- A crítica inteira procede tentando atacar a distinção entre a priori puro/impuro. Essa é a
forma mais fácil de se identificar um palpiteiro em Kant, pois essa distinção era vista como
meramente propedêutica por ele mesmo, e pouco substancial para seus propósitos. As
pessoas gostam de atacar somente pois ela é presente nas primeiras páginas da CRP, e a
maioria das pessoas só foi até aí.

Btw, a sua afirmação sobre algo empírico é errada, visto que genético-temporalmente todo
conhecimento provém direta ou indiretamente da experiência (embora nem todo conhecimento
seja fundamentado nela). Pela sua definição, tudo seria empírico. Isso é básico. Então a melhor
forma de distinguir as duas coisas é: um conhecimento a priori é aquele que, embora
genético-temporalmente exige a presença de sensações, não requer a consciência de qualquer
conteúdo sensorial em particular. Um conhecimento empírico, de outro modo, requer que essa
particularização seja feita (em termos de sua qualidade, padrões de ocorrência, a sua indicação
das qualidades físico-sensoriais que as corresponde na consciência e etc). Simple as that, e
isso é confirmado depois na Analítica dos Princípios.

Depois você comete um erro terrível, que é dizer que a distinção “puro” e “impuro” dizem
respeito ao conhecimento EMPÍRICO, falando da aberração de um “conhecimento empírico
impuro” e um “conhecimento empírico puro”. Não, filho. A distinção puro/impuro diz respeito ao
conhecimento a priori, não ao posteriori. O exemplo da casa e dos alicerces é um exemplo de
conhecimento a priori impuro (veja B3). Não há essas divisões para o conhecimento empírico/a
posteriori, ao contrário do que você palpiteiristicamente afirma.
Você também comete outro erro ao dizer que o conhecimento a priori puro, como o exemplo da
casa, envolve uma experiência direta com as coisas acontecendo. Na verdade, não tem nada a
ver. O conhecimento a priori impuro se relaciona apenas com o fato de que se há, naquele
juízo, a pressuposição da particularização de algum elemento empírico - o que significa que
juízos a priori impuros são instanciações de juízos a priori puros na experiência, como aqueles
nos Princípios do Entendimento Puro. O caso da casa é uma instanciação, como ficará claro
depois, do princípio da causalidade (segunda analogia da experiência), que é a priori, mas esse
exemplo é impuro pois envolve elementos empíricos nessa instanciação.
3- Você já começa se utilizando de uma concepção errada para criticar Kant. Quem te disse
que ele pensa que “o puro é uma coisa não-pura” sendo que é afirmado justamente o contrário,
que uma vez eliminado todos os elementos contingenciais, o que resta é puro (no caso, o
espaço e o conceito de substância)? Isso sequer tem concordância lógico-sintática, filho. Se
você aceita aquela definição de puro, não há motivos para não considerar aquilo ali. Se você
usa outra definição de puro, está utilizando tão somente de uma falácia de equivocação.

O conceito de substância não é possível só graças a experiência, pois se você tivesse lido a
Dedução Metafísica das Categorias, saberia que a substância é um conceito já pressuposto
para a própria experiência acontecer - a categoria da substância que é esquematizada
transcendentalmente na determinação temporal da permanência no tempo, de acordo com a
primeira analogia da experiência, i.e o substrato de todos os fenômenos e o que permanece na
mudança. É por isso que ele reivindica ser algo puro (tal como ele reivindica no caso do
espaço, como forma pura da Sensibilidade). Para ir contra isso, você tem que refutar a
Dedução Metafísica, que ele tem em mente, e que é feita muito depois dessa mera asserção
propedêutica.

Obviamente precisamos da experiência para formar conceitos empíricos relacionados a isso -


visto que, como afirmado desde o início do livro, todo o conhecimento começa
genético-temporalmente na experiência. Mas a substância, enquanto categoria, é pressuposta
por esses conceitos, e é o que torna a própria experiência possível, e estava sendo
pressuposta o tempo todo para eles acontecerem, embora só através da investigação
transcendental nos demos conta disso. Esse é o ponto de Kant.

4- Segue-se que tudo o que você afirmou não prova seu ponto. Suas analogias não fazem
qualquer sentido pois você está regressando, em tipos de objetos diferentes, tão somente ao
que corresponde a conceitos de “puro” que não tem qualquer relação com o conceito
epistemológico em Kant (no caso do leite, diz respeito a sua composição química, por
exemplo). O que você falou é de interesse da ontologia,não de uma distinção
epistemologica.Isso é uma falácia da equivocação. Nada do que você falou prova algum ponto
seu.

5- Seu exemplo dos objetos é mais ridículo e aqui eu exponho sua ignorância: quem foi que
disse que existem “pressupostos TRANSCENDENTAIS EMPIRICAMENTE FORMADOS”? Isso
sequer faz sentido, filho. Se é transcendental, é condição formal e pressuposta para a
formação ou conceituação empírica. Na verdade, na Dedução Transcendental, Kant chega a
contrastar essas duas posições (a de que as categorias são o que tornam o que é empírico
possível, i.e transcendentais; ou o que é empírico torna elas possíveis).

Agora: que em todos esses sujeitos enlencados eles “nunca estiveram aí”, é algo básico para
qualquer pessoa que estudou a diferença entre a distinção que Kant faz. Separado das
sínteses que tornam possível a unidade desses objetos na minha representação deles, o que
resta são somente multiplicidades caóticas e indistinguidas que não correspondem a quaisquer
desses conceitos, e portanto, não poderiam ser identificados com estes - i.e, como objetos de
experiência humana espácio-temporais e presentes e atuantes no nexo da Natureza. Onde
Kant discordaria disso é algo que ainda resta você me explicar, e muito mais, como algo que
reforça o ponto dele pode servir de critica.

6- Minha pergunta não foi eristíca e não pressupõe “consequencialismo kantiano”. É uma
pergunta sobre qual interpretação de Hegel você usa. Existem comentadores como Pippin ou
Longuenesse que discordam disso. Então eu não pressuponho qualquer elemento específico
ao kantismo nisso. Você apenas acha “desvirtuosa” pois é incapaz de responder. Mas eu
repito: você aceita ou não a imanência do conceitual em Hegel?

7- O resto é puro blá-blá-blá seu, colapsando fichteanismo e idealismo absoluto. Uma resposta
só faria sentido se eu soubesse primeiro se você aceita a imanência do conceitual em Hegel,
visto que a concepção do Eu nele pressupõe a crítica ao Eu Transcendental em Kant, que por
sua vez, pressupõe a imanência conceitual. Então por favor, responda ali em vez de se
esquivar como tem feito direto.

Além disso, você colapsa os sentidos de “categoria” expostos, algo que o próprio Hegel
discordaria. Categoria em Kant tem o mesmo sentido que meta-conceito, função
lógico-discursiva, enquanto você usa de outra forma.

Por último, é falso que as categorias correspondem abstraidamente aos objetos na intuição.
Elas são puramente intelectuais, e como tal, não pressupõe qualquer conteúdo sensível (nem o
espaço e o tempo) ou qualquer intuição. É só no esquematismo transcendental que elas são
aplicadas a estes objetos por meio das determinações temporais em acordância com elas. Mas
em si, são desprovidas desse conteúdo em seu nível mais geral. É justamente por isso que a
DT se faz necessária - sem isso, seriam no máximo pensamentos subjetivos nosso e
desprovidos de realidade objetiva, como já afirmava o ceticismo humeano.

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