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Supremo Tribunal Federal

Supremo Tribunal Federal


Diário da Justiça Eletrônico | Jun / 2018
Revista dos Tribunais | vol. 997 | p. 646 | | JRP\2018\404086

STF - Segundo AgRg na Rcl 27.229 - 2.ª Turma - j. 15/6/2018 - julgado por Luiz Edson Fachin - DJe
27/6/2018 - Área do Direito: Constitucional; Penal
RECLAMAÇÃO – Colaboração premiada – Indeferimento dos pedidos deapresentação de
informações e de acesso a meio de obtenção de prova –Inadmissibilidade – Acordos
preliminares dos corréus colaboradores quenão formalizados, tornando a prova
inexistente – Defesa, ademais, queteve plena ciência probatória, não violando a ampla
defesa e a SúmulaVinculante 14 do STF.
Ementa Oficial:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. MATÉRIA CRIMINAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO À SÚMULA
VINCULANTE
14. SUCEDÂNEO RECURSAL. INVIABILIDADE. COLABORAÇÃO PREMIADA. INEXISTÊNCIA DE
CELEBRAÇÃO DE ACORDO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DE CORROBORAÇÃO.
AUSÊNCIA DE ADERÊNCIA ESTRITA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A inexistência de argumentação apta a infirmar o julgamento monocrático conduz à manutenção
da decisão recorrida.
2. A reclamação constitucional pressupõe relação de aderência estrita entre o ato impugnado e o
paradigma invocado como violado, bem como “não se qualifica como sucedâneo recursal nem
configura instrumento viabilizador do reexame do conteúdo do ato reclamado, eis que tal finalidade
revela-se estranha à destinação constitucional subjacente à instituição dessa medida processual”
(Rcl 4381 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 22/06/2011).
3. A teor da Súmula Vinculante 14, constitui “direito do defensor, no interesse do representado, ter
acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório
realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de
defesa”, sendo que, conforme a jurisprudência desta Suprema Corte, tal prerrogativa não alcança
diligências em formação ou em andamento. Precedentes.
4. No caso concreto, as instâncias ordinárias, o Ministério Público e a própria defesa do reclamante
apontaram a inexistência de celebração de acordo de colaboração premiada cujo acesso é postulado,
de modo que não se verifica demonstração de sonegação à defesa de elementos de prova já
documentados em procedimento investigatório, conforme exigência expressa do comando sumular.
5. Quanto à inovadora alegação veiculada em sede de agravo regimental, tem-se que os corréus
foram inquiridos em Juízo sob o crivo do contraditório, ocasião em que, segundo as instâncias
ordinárias, teriam adotado postura colaborativa. A regularidade da concessão de sanção premial em
decorrência da reconhecida colaboração, mesmo sem a formalização de ato negocial envolvendo o
Ministério Público, bem como a alegação de ausência de apresentação de elementos de
corroboração, não traduzem relação de perfeita identidade a legitimar o exame em sede de
reclamação da alegada violação ao paradigma tido como violado, resguardando-se ao interessado,
por óbvio, a impugnação pela via adequada.
6. Agravo regimental desprovido.
15/06/2018
SEGUNDA TURMA
SEGUNDO AG.REG. NA RECLAMAÇÃO 27.229 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
AGTE.(S) :LUIZ INACIO LULA DA SILVA
ADV.(A/S) :CRISTIANO ZANIN MARTINS
AGDO.(A/S) :NÃO INDICADO
COMENTÁRIO
Cadeia de custódia na delação premiada. Transparência e accountability. A possibilidade

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de concessão de benefícios ao colaborador independentemente da existência de um


acordo formal
A Lei 12.850/2013 trouxe um detalhamento mais aprofundado do instituto da delação premiada em
nosso ordenamento. Todavia, há diversas lacunas na legislação que deveriam ser colmatadas pelo
próprio legislador ou ante a permanência de omissão pela jurisprudência ou doutrina.
Infelizmente, a lei silenciou na forma inicial de proceder o acordo de delação. A lei não prevê de
modo expresso a documentação das tratativas frustradas antes da celebração do acordo de delação.
1. “A questão a ser sublinhada é a existência de modos opacos de funcionamento do dispositivo da
negociação. Não se trata (necessariamente) de ilícitos, mas de blefes, jogadas arriscadas e cartadas
do tipo ultimato: é pegar ou largar. O dispositivo, em geral, atende ao seguinte cronograma:1.
Reunião preliminar (Debriefing) de intenção sobre a apresentação do produto informação (prova a
se delatar);2. Assinatura de Termo de Confidencialidade, em que as partes se comprometem a não
divulgar, nem a usar, o material disponibilizado sem a negociação final;3. Formulação dos “anexos”,
papel de protagonismo do colaborador/delator e advogados. A metodologia dos “anexos” autoriza o
fatiamento da informação com ou sem valor de troca;4. Reunião de apresentação dos “anexos”, com
indicação do conteúdo da prova, sem necessariamente todos os documentos comprobatórios;5.
Reunião de apresentação dos benefícios – valor de compra – das mercadorias probatórias, a partir
dos anexos;6. Reunião de debate e negociação sobre o conteúdo da proposta: estabelecimento do
preço;7. Assinatura do acordo, com detalhamento do produto a ser entregue e as obrigações
recíprocas;8. Depoimentos prévios gravados em áudio e vídeo, conduzidos pelo Ministério Público e
sob supervisão dos defensores, com os delatores/colaboradores;9. Apresentação da proposta de
homologação ao juízo competente, devidamente fixado o conteúdo das obrigações recíprocas; 10.
Homologação judicial do “contrato de compra e venda de informações”, em juízo;11. Possível recall
com a inserção, exclusão de informações e novas cláusulas, inclusive revisando as anteriores.”
(MORAIS DA ROSA, Alexandre. Uma proposta das etapas da cooperação premiada diante da
ausência de regras claras. In: GOMES, Luiz Flávio; SILVA, Marcelo Rodrigues da; MANDARINO,
Renan Posella (Org.). Colaboração Premiada: novas perspectivas para o sistema jurídico-penal. Belo
Horizonte: Editora D’Plácido, 2018. p. 86-87.)
Não se trata de desconfiar do MP e de réus colaboradores, mas, por uma questão de transparência,
é fundamental que haja a documentação de todas as tratativas realizadas, a fim de, por exemplo,
verificar o motivo pelo qual o Parquet não pretende celebrar o acordo de delação do investigado
Tício, ou para certificar que o colaborador foi o primeiro da organização criminosa a procurar o MP
etc.
É relevante esse ponto porque existe um dever de Accountability sobre a forma do exercício de
negociação penal por parte dos membros do Ministério Público. O poder de negociar que a lei
concedeu vem conexo a um dever de prestar contas sobre as vantagens da negociação e os prêmios
ofertados ao réu colaborador.
Há de se discutir sobre a cadeia de custódia da prova na hipótese de colaborações premiadas.
Insisto que essa documentação é benéfica ao próprio MP que pode demonstrar objetivamente
porque preferiu negociar com réu Tício ao invés de Mélvio.
2. Um dos aspectos mais delicados na temática da aquisição de fontes de prova consiste em
preservar a idoneidade de todo o trabalho que tende a ser realizado sigilosamente, em um ambiente
de reserva que, se não for respeitado, compromete o conjunto de informações que eventualmente
venham a ser obtidas dessa forma. Trata-se de evitar o fenômeno da “break on the chain of
custody”. [...] A preservação destes elementos probatórios, portanto, insere-se no âmbito de
juridicidade que, observada a inexistência de previsão legal, deve ser suprido pelo juiz para garantir
ao processo a sua qualidade de entidade epistêmica.No direito brasileiro, praticamente não há
referências doutrinárias à cadeia de custódia, designação pela qual é conhecido o dispositivo que
pretende assegurar a integridade dos elementos probatórios, não obstante o seu significado em
termos de redução de complexidade da garantia constitucional contra a prova ilícita.As razões são
conhecidas e foram enunciadas no Capítulo I.Ainda assim, a bibliografia sobre perícia criminal não
ignora o tema. Vale a reprodução das lições de Alberi Espindula: “Finalidade da cadeia de
custódiaClaro está que a finalidade em se garantir a cadeia de custódia é para assegurar a
idoneidade dos objetos e bens escolhidos pela perícia ou apreendidos pela autoridade policial, a fim
de evitar qualquer tipo de dúvida quanto à sua origem e caminho percorrido durante a investigação
criminal e o respectivo processo judicial.Importante esclarecer que a cadeia de custódia não está
restrita só ao âmbito da perícia criminal, mas envolve desde a delegacia policial, quanto apreende
algum objeto e já deve observar com rigor tais procedimentos da cadeia de custódia. Podemos
voltar mais ainda: qualquer policial, seja ele civil ou militar, que for receptor de algum objeto
material que possa estar relacionado a alguma ocorrência, deve também – já no seu recebimento ou
achado – proceder com os cuidados da aplicação da cadeia de custódia. E essas preocupações vão

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além da polícia e da perícia, estendendo-se aos momentos de trâmite desses objetos da fase do
processo criminal, tanto no ministério público quanto na própria justiça. Os procedimentos da cadeia
de custódia devem continuar até o processo ter transitado em julgado.Muitas situações já são
conhecidas sobre fatos dessa natureza, nas quais é levantada a suspeição sobre as condições de
determinado objeto ou sobre a própria certeza de ser aquele o material que de fato foi apreendido
ou periciado. Assim, o valor probatório de uma evidência ou documento será válido se não tiver sua
origem e tramitação questionada. Qualquer questionamento acarretará prejuízo para processo como
um todo.”. (PRADO, Geraldo. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia de
custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo: Marcial Pons, 2014. p. 77 e 79-80.) Em
sentido contrário: “7. Ausência de prova de cadeia de custódia é questão de peso e não de validade
da provaComo vimos, a cadeia de custódia é um dos métodos de autenticação de evidência que é
comumente usado no caso de itens fungíveis. Além disso, sustentamos que existe uma presunção
de boa-fé e de regularidade da prova, e que estas podem, junto a indicativos de identidade e
conservação, prestar-se a “autenticar” a prova, isto é, comprovar que ela é o que se diz que ela é,
independentemente de uma prova detalhada da cadeia de custódia.Entender diferente,
demonstramos, exigiria um regresso infinito de provas, o que é absolutamente inviável, porque não
só a prova estaria sujeita à demonstração da cadeia de prova, mas essa mesma demonstração
estaria sujeita a nova prova, e assim por diante. Notamos que mesmo que fosse demonstrada de
modo perfeito a cadeia de custódia, por hipótese (pois isso seria impossível), sempre continuariam
existindo infinitas possibilidades de falsidade da prova, e por isso, insistimos, dependemos dos
princípios vigentes de boa-fé e regularidade da prova. Observamos, ainda, como decorrência disso
tudo, que é da defesa o ônus de apontar concretamente falhas da cadeia de custódia, que não
podem se resumir em mera especulação, para que a prova tenha seu valor decrescido.Vamos,
agora, um pouco além. Mesmo nos casos em que a cadeia de custódia se faça relevante (nos casos
de itens fungíveis), eventual problema na sua higidez é resolvido como questão de peso (valoração
da prova) e não de validade. O rompimento na demonstração da cadeia de custódia em uma ou
mais das suas conexões (links), ainda que gere lacunas, não ensejará no Brasil, jamais, a
inadmissibilidade da prova, mas deverá ser objeto de análise no âmbito da valoração do peso
daquela prova ou, mais tecnicamente, do peso da hipótese que é suportado por aquela hipótese.A
importação metonímica e acrítica de uma construção teórica já sedimentada no direito estrangeiro,
porém incipiente no território pátrio, pode provocar distorções científicas capazes de obnubilar a
percepção dos aplicadores do Direito. Apoiamos a adoção de institutos que funcionam em sistemas
de justiça criminal eficientes, em prol da melhoria de nosso sistema que peca por extrema
ineficiência; não obstante, isso deve passar por reflexão crítica.Nessa linha de intelecção, é
manifesto o erro quando advogados militantes e acadêmicos reportam-se ao direito anglo-saxão –
frequentemente invocado como paradigma de sistema jurídico desenvolvido – para apresentar ao
cenário nacional as bases da tese da comprovação da cadeia de custódia da prova, porém
arrematam seus arrazoados com a assertiva de que a quebra de um dos elos da corrente de
rastreamento acarrete, em qualquer caso, a exclusão da evidência no processo penal.Semelhante
percepção apresenta-se deveras reducionista e infiel à principiologia que inspira a matéria desde sua
gênese. Como anteriormente se explicou, no sistema norte-americano a “autenticação” da prova –
de que a comprovação da cadeia de custódia é uma modalidade – é um requisito de admissibilidade
da prova apenas porque lá, e não cá, existe um filtro prévio, pelo juiz togado, das provas que serão
exibidas perante o júri. É para evitar desperdício de tempo e confusão dos jurados, que são leigos,
que tal filtro é realizado.” (DALLAGNOL, Deltan Martinazzo; CÂMARA, Juliana de Azevedo Santa
Rosa. A cadeia de custódia da prova. In: SALGADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro
de. A prova no enfrentamento à macrocriminalidade. Salvador: Juspodivm, 2015. p. 381-382.)
A cadeia de custódia da prova deve ser exigida também em relação aos meios de obtenção de
prova. Verifica-se, claramente, que a documentação das fases preliminares é positiva para o MP e
para a defesa. Poder-se-ia pensar que o delatado não tem interesse em ter acesso a essa fase, uma
vez que deve se defender das provas trazidas pelo delator e não da palavra do delator e muito
menos de um acordo incompleto.
Em verdade, a ampla defesa não pode se resumir nesse aspecto. Um exemplo importante seria a
possibilidade de arguição de suspeição do membro do Ministério Público, situação em que a
documentação das tratativas do acordo serviria de importante meio de prova ou o acesso às
tratativas pode demonstrar outras linhas de investigação para a acusação ou para a defesa.
No caso julgado pelo STF em comento, não existiu a documentação das tratativas, razão pela qual
foi entendido que nada havia a ser mostrado à defesa.
A lógica do acórdão é que, sem a celebração formal do acordo, não há documentos que devam ser
apresentados em juízo. Nas páginas 7 e 9 do acórdão, a questão central se revela:
[...] existem conversas com o Ministério Público, não há a formalização de um acordo, muito menos

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a homologação deste acordo pelo Judiciário, mas há sim conversas estabelecidas por este advogado,
e pelos advogados hoje que atuam em nome de Léo Pinheiro, com o Ministério Público, é isso, aliás
isso seria dito textualmente pela defesa.[...]
[...] Ministério Público Federal: - Não há nenhum acordo informal do Ministério Público, seja com
esse réu ou quaisquer dos outros já interrogados, o que há são negociações de acordo de
colaboração com alguns executivos da empreiteira OAS, como já foi afirmado inclusive na audiência
em que foi inquirido Léo Pinheiro.[...]
A grande questão nesse ponto é o significado jurídico de conversas do MP com um possível delator.
A informalidade tolerada pelo acórdão é prejudicial ao Estado Democrático de Direito.
Não existe juridicamente a figura de “conversas”, trata-se por óbvio de uma tratativa de
colaboração premiada que deve ser documentada de modo a atender também ao princípio da
impessoalidade.
Uma questão relevante que deve ser igualmente destacada é a validade da concessão do benefício
mesmo que não haja a formalização do acordo. O relator afirmou expressamente às fls. 12:
No caso concreto, os corréus teriam colaborado mesmo sem a formalização de acordo de
colaboração. Ocorre que tal comportamento processual, cuja legalidade e aptidão probatória não se
encontram em exame nesta ocasião, não representa violação ao comando da Súmula Vinculante 14.
O STF não apreciou no caso concreto a validade de prêmio sem acordo de delação. Todavia, é
direito sim do colaborador, independentemente de homologação ou acordo, se houver o
fornecimento de provas relevantes para o esclarecimento do caso, ter os benefícios da lei
reconhecidos de ofício pelo juiz.
3. Portanto, a ampla defesa do delatado não dependerá da existência ou não de um acordo de
colaboração premiada ou da validade ou invalidade da decisão que o homologa. O contraditório será
exercido em relação às provas decorrentes dos atos de delação (unilateral) ou de colaboração
(bilateral). Em outras palavras, o delatado não se defende do acordo nem da homologação. O
delatado se defende das provas que o procedimento colaborativo produzir [...]Considerando a
existência de benefícios penais que independem de ajuste bilateral (acordo), a invalidação, de ofício
ou por provocação de terceiro da decisão de homologação, terá escasso efeito prático (falta de
interesse de agir), pois as utilidades buscadas pelo terceiro (parte ilegítima e sem interesse) com tal
medida poderão ser por ele obtidas na discussão probatória encetada pelo próprio terceiro
(delatado), no procedimento cautelar ou na ação penal que sofrer: “O acordo de colaboração
premiada – que se constitui em negócio jurídico personalíssimo, firmado entre a acusação e o
colaborador – tem, portanto, existência autônoma em relação aos elementos de convicção
fornecidos pelo colaborador.” (STJ, Recl. 31.629/PR, Corte Especial, rel. Min. Nancy Andrighi, j.
20.09.2017.)Se o colaborador de boa-fé efetivamente cumprir o acordo, não importa se a
homologação judicial foi ilegal, pois terá ele direito a benefícios por sua prestação positiva à
apuração (direito subjetivo público), sejam os da Lei 12.850/2013, sejam os residuais previstos nas
várias leis de delação premiada ou no diploma genérico, a Lei 9.807/1999.O colaborador eficiente e
de boa-fé com homologação invalidada por fato de outrem tampouco sofrerá prejuízo, se não deu
causa a isso, em função dos princípios da confiança, da legalidade e da moralidade. O juiz da
sentença está obrigado a conceder os benefícios legais ajustados e homologados, se houver
efetividade da colaboração, que só este juiz pode avaliar e ponderar, ouvido o Ministério Público,
autor da ação penal.No instante do julgamento de mérito, salvo no tocante à competência para
homologar e à atribuição para pactuar, não pode o juiz, de ofício, reformar, em desfavor do
colaborador, a decisão de homologação, pois o acordo será ato jurídico perfeito e terá havido
preclusão ou coisa julgada. A homologação tem conteúdo decisório, e o acordo deverá ser
considerado na decisão de procedência ou improcedência da acusação a ser tomada em relação ao
colaborador.A legalidade, a regularidade e a voluntariedade do acordo já homologado são temas que
devem ser vistos sempre no interesse do colaborador, quanto à adjudicação dos benefícios. Para o
Ministério Público, a consideração judicial dessas questões se traduz em invalidação probatória.”
(ARAS, Vladimir. Rescisão da decisão de homologação de acordo de colaboração premiada. In:
GOMES, Luiz Flávio; SILVA, Marcelo Rodrigues da; MANDARINO, Renan Posella (Org.). Colaboração
Premiada: novas perspectivas para o sistema jurídico-penal. Belo Horizonte: Editora D’Plácido,
2018. p. 567-568.)
Pode parecer um paradoxo: qual a vantagem então de se exigir documentação de tratativas se é
possível o benefício direto sem mesmo o MP concordar com a colaboração processual?
Apesar de ser possível o juiz reconhecer o benefício, a celebração do acordo garante melhor a
situação jurídica do réu que pretende colaborar, razão pela qual é mais vantajoso para o réu
celebrar um acordo de delação do que tentar a sorte esperando que o juiz reconheça no seu

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depoimento, mais no fornecimento unilateral de provas, um ato concreto de colaboração.


É de se destacar, portanto, que o STF não apreciou nesse ponto a reclamação no caso concreto por
questão processual como se observa do item 5 da ementa:
Quanto à inovadora alegação veiculada em sede de agravo regimental, tem-se que os corréus foram
inquiridos em Juízo sob o crivo do contraditório, ocasião em que, segundo as instâncias ordinárias,
teriam adotado postura colaborativa. A regularidade da concessão de sanção premial em
decorrência da reconhecida colaboração, mesmo sem a formalização de ato negocial envolvendo o
Ministério Público, bem como a alegação de ausência de apresentação de elementos de
corroboração, não traduzem relação de perfeita identidade a legitimar o exame em sede de
reclamação da alegada violação ao paradigma tido como violado, resguardando-se ao interessado,
por óbvio, a impugnação pela via adequada.
O processo penal é, simultaneamente, o escudo e a espada, como lembrado em uma brilhante
metáfora. Talvez a delação premiada seja o ponto em que fica mais evidente essa natureza dúplice.
Oxalá, o STF saiba utilizar com sabedoria dos potenciais do escudo e da espada não ferindo
inocentes e nem deixando desarmados aqueles que precisam de proteção contra abusos do estado
ou de particulares.
4. Noção de que o empenho internacional na afirmação dos direitos humanos dependia também de
se reconhecer obrigações de caráter positivo a cargo dos Estados membros, destinadas a superar
eventuais obstáculos internos que possam significar contenção, ou mesmo impedir a fruição plena
dos direitos do homem, e que, em muitas situações, a atuação estatal deveria se dar pelo
instrumento penal, levou a se reconhecer uma dupla função dos direitos humanos na relação com a
justiça penal. Em reconhecida figura de linguagem, refere-se à justiça criminal com a dupla função
de servir como escudo e como espada dos direitos fundamentais. Assim, o direito penal precisa ser
visto também como instrumento fundamental de proteção integral dos direitos – e também dos
deveres – fundamentais. As expressões são mencionadas, por ex., por TULKENS, Françoise. The
paradoxical relationship between criminal law and human rights. Journal of International Criminal
Justice, Oxford, v. 9, n. 3, p. 578, july 2011, a qual atribui a origem da locução: “the dual ‘shield’
and ‘sword’ function of criminal justice” a uma exposição feita pela ex-juíza da Corte Penal
Internacional Christine Van den Wyngaert em 1995. Com senso diverso, apenas pela ótica da pessoa
ofendida, ou seja, no sentido de que o processo opera tanto como fundamental instrumento de
proteção e mecanismo destinado a satisfazer o ensejo de justiça, mas que pode também reproduzir
uma experiência traumática a vítimas vulneráveis, a exigir, assim, que a vítima seja protegida
“pelo” e “do” processo, funcionando, portanto, como: “Lo scudo e la spada”. É o título da obra
ALLEGREZZA, Silvia et al. Lo scudo e la spada, esigenze di protezione e poteri delle vittime nel
processo penale tra Europa e Italia. Torino: G. Giappichelli, 2012. FISCHER, Douglas; PEREIRA,
Valdez Frederico. As Obrigações Processuais Penais Positivas: Segundo as Cortes Europeia e
Interamericana de Direitos Humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018. p. 13-14.
Américo Bedê Freire Junior
Professor do Programa de Pós-graduação stricto sensu – doutorado e mestrado – da FDV. Doutor
em Direitos Fundamentais FDV/ES. Mestre em Direitos Fundamentais da FDV/ES. Professor de
Processo Penal da FDV/ES. Juiz Federal Titular da 2ª Vara Criminal em Vitória/ES. Professor
coordenador do Grupo de Pesquisa “Hermenêutica jurídica e jurisdição constitucional” da FDV/ES.
bede@jfes.jus.br
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo
Tribunal Federal, em sessão virtual, de 8 a 14 de junho de 2018, sob a Presidência do Senhor
Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por
unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 15 de junho de 2018.
Ministro EDSON FACHIN
Relator
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR): Trata-se de agravo regimental interposto
pela defesa de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA contra decisão monocrática que negou seguimento à
reclamação.
A defesa impugna nesta reclamação decisão proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção

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Judiciária de Curitiba/PR “que indeferiu o pedido de apresentação de informações e de acesso à


parte já documentada relativa a acordos de colaboração premiada negociados com José Adelmário
Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhães Medeiros”.
Narra ainda que, “durante a instrução do referido processo, a Defesa do ora Reclamante tomou
conhecimento, por meio de portais de comunicação, que corréus dessa mesma ação – José
Adelmário Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhães Medeiros – estavam em tratativas, com o
Ministério Público Federal, para firmar acordos de colaboração”.
Diante de tais informações, a defesa “questionou os referidos corréus acerca de eventuais
negociações de acordos de colaboração premiada com o Ministério Público Federal, em seus
interrogatórios no processo n. 5046512- 94.2016.4.04.7000, tendo ambos confirmado as
informações veiculadas pela mídia”.
Acrescenta que “[n]ão é possível saber sobre os temas que os colaboradores informais ou potenciais
colaboradores se obrigaram a falar e tampouco o prêmio que a eles está sendo prometido para fazer
referências ao nome do Reclamante”, razão pela qual a defesa requereu “a disponibilização dos
Termos de Colaboração Premiada ou do status da negociação”, o que foi apreciados nos seguintes
termos (grifei):
“A questão já foi objeto das audiências de interrogatório, nas quais os acusados declararam que
estariam tentando celebrar um acordo de colaboração premiada, mas que nada teria sido
ultimado e nenhuma oferta de benefício concreto teria já sido realizada.
Então a questão resta prejudicada.
Não cabe ainda exigir a apresentação de informações sobre eventual e incerto acordo de
colaboração não-celebrado.
Defiro apenas o requerido para que o MPF, nas alegações finais, informe, caso eventual
acordo tenha sido celebrado e não esteja sob sigilo decretado por jurisdição de hierarquia
superior, o seu teor.”
Compreende a defesa que “o douto Magistrado adiou o conhecimento da informação e de diligência
já documentadas ao Paciente, cerceando a ampla defesa mediante redução do tempo para se
trabalhar com a informação - gerando também ofensa ao contraditório, ao devido processo legal, à
lealdade processual, à paridade de armas e à isonomia”.
Sintetiza a defesa (grifei):
“A decisão proferida nos autos do processo n. 5046512- 94.2016.4.04.7000, em 15/05/2017, ao
negar ao ora Reclamante e seus patronos acesso ao teor do processo relativo às aludidas
colaborações premiadas, ou ao menos o seu status, estabelecendo como momento processual
para a apresentação de tais informações as alegações finais ministeriais - ou seja, encerrada a
instrução e superada a fase de diligências complementares, quando a defesa não poderá mais
submeter tais colaborações ao crivo da ampla defesa -, viola frontalmente a Súmula
Vinculante n. 14.“
Por tais razões, requereu-se a concessão de “acesso à íntegra das diligências documentadas
referentes aos processos de colaboração premiada que envolvem o Reclamante, devendo a ação
penal ser suspensa até que sejam juntados aos autos todos os documentos referentes aos acordos
de colaboração, quando deverá ser aberta vista à Defesa, concedendo-se prazo razoável para que
possa exercer a sua ampla defesa”.
A liminar foi indeferida (e.doc. 25), provimento atacado mediante agravo regimental inadmitido
(e.doc.s 28 e 38).
Foram prestadas informações pelo Juízo reclamado (e.doc. 37).
A PGR opinou pela improcedência da reclamação (e.doc. 39), destacando-se o seguinte (grifei):
“Consoante informações consultadas no sítio eletrônico do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a
Ação Penal n. 5046512- 94.2016.4.04.7000 já foi sentenciada.
Obviamente, a decisão não tem por fundamento, em absoluto, quaisquer elementos de
prova decorrentes dos aludidos acordos de colaboração premiada. Isso se deve ao fato de
que tais acordos não foram celebrados – e nada garante que serão.
As tratativas preliminares à celebração de acordo de colaboração premiada não
configuram, em si, procedimento investigatório autônomo. Trata-se de fase pré-negocial, na
qual cabe ao Ministério Público, tendo por norte, sempre, o atendimento do interesse público,
perseguir os resultados previstos nos incisos do art. 4º da Lei 12.850/2013, oferecendo em

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contrapartida os benefícios contidos no caput e nos §§ 2º, 4º e 5º do referido artigo.


O sigilo durante essa fase é, mais do que necessário para a efetividade do futuro acordo a ser
celebrado, intrínseco à natureza personalíssima do negócio jurídico processual que a colaboração
premiada configura. Se o acordo não for celebrado, nenhum elemento referente às
tratativas preliminares poderá ser usado por quaisquer das partes ou por terceiros, não
tendo valor jurídico, constituindo prova ilícita, caso venha a ser utilizado por alguém. Tal
circunstância, por si só, inviabiliza o acesso de estranhos a esse material.
(…)
No caso dos autos, não há acordos de colaboração premiada firmados com José Adelmário
Pinheiro Filho ou com Agenor Franklin Magalhães Medeiros.
(…)
Ademais, essas negociações preliminares de colaboração premiada não configuram
elementos de prova já documentados em procedimento investigatório, que são o objeto do
enunciado da Súmula Vinculante n. 14. Também, no caso, não interessam ao exercício do
direito de defesa, visto que as tratativas aludidas pelo reclamante não subsidiaram quer a opinio
delicti, quer a sentença condenatória já proferida.
(…)
As afirmações do reclamante de que “o douto Magistrado adiou o conhecimento da informação e de
diligência já documentadas ao Paciente, cerceando a ampla defesa mediante redução do tempo para
se trabalhar com a informação […]” consistem em suposição despida de qualquer sentido. Não há
nenhum elemento de prova obtido a partir dessas tratativas preliminares já documentado
em qualquer procedimento investigativo que seja.
A presente reclamação tem, apenas, o flagrante propósito de protelar a tramitação da ação penal
instaurada na primeira instância, a partir de argumento manifestamente insubsistente. Tal modus
operandi em nada surpreende, visto que assim foi a atuação da defesa técnica do reclamante
durante toda a instrução processual perante o juízo de primeiro grau.”
Por meio de decisão unipessoal, julguei improcedente o pedido formulado (e.doc. 43).
Dessa decisão a defesa interpôs agravo regimental (e.doc. 44). Além de reiterar, em linhas gerais,
os termos da inicial, acrescenta a defesa a notícia de superveniência de sentença condenatória.
Aponta que o Juízo reclamado “chegou a transcrever as declarações de Léo Pinheiro, como
fundamento de sua sentença, ao menos dezoito vezes”.
Enfatiza que, “muito embora a sentença não tenha utilizado diretamente acordos de
colaboração premiada desses corréus, porquanto ainda não formalizados, utilizou as suas
declarações como se isso fossem.”
Relata que a “contribuição desses corréus – embora sem acordos de colaboração premiada
celebrados – foi reconhecida na sentença condenatória, na qual o Reclamado concedeu benefícios
sem previsão em lei, invadindo a competência do juízo das execuções penais”.
Sustenta que “não foi necessário que os corréus apresentassem elementos de corroboração do
quanto alegado”, bem como que tais pessoas foram inquiridas “sem prestar compromisso de dizer a
verdade”. Explicita ainda o seguinte:
“Confiou-se, esse tempo todo, que um juízo condenatório jamais seria baseado nas palavras de
corréus sem o compromisso de dizer a verdade – não sem ao menos apresentarem elementos de
corroboração.”
Salienta que “[a]inda não se tem notícias dos acordos de colaboração premiada, no entanto, os
corréus foram devidamente recompensados na ação penal em questão.”
Frisa que se deve “ter claro que os depoimentos dos corréus – prestados sem o compromisso de
dizer a verdade, nunca é demais frisar – não foram acompanhados de quaisquer provas de
corroboração, não tendo, assim, sido oportunizado à Defesa submeter qualquer elemento ao
contraditório.“
Por tais razões, veicula sua pretensão recursal nos seguintes termos:
“seja o Agravo apresentado à Turma para julgamento colegiado e, consequentemente, seja o
processo anulado a partir da decisão de 15.05.2017, para que seja concedido acesso à íntegra das
diligências documentadas referentes aos processos de colaboração premiada que envolvem o
Agravante, ou, caso ainda não seja possível, seja a ação penal suspensa até que juntados aos autos
todos os documentos referentes aos acordos de colaboração, quando deverá ser aberta vista à

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Defesa, concedendo-se prazo razoável para que possa exercer a sua ampla defesa e, somente após
essa fase, seja o processo retomado, com prolação de nova sentença”.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR): 1. Conforme relatado, o que se discute nos
autos, sob a ótica da preservação da autoridade da Súmula Vinculante 14, é a higidez da decisão
reclamada que, nas palavras da defesa, “indeferiu o pedido de apresentação de informações e de
acesso à parte já documentada relativa a acordos de colaboração premiada negociados com José
Adelmário Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhães Medeiros”.
O pedido, formulado à luz da Súmula Vinculante 14, volta-se à garantia de “acesso à íntegra das
diligências documentadas referentes aos processos de colaboração premiada que envolvem o
Reclamante”, sendo que o requerimento de suspensão da ação penal até o atendimento do pleito
defensivo possui contornos acautelatórios que não se inserem, ao menos diretamente, no
disciplinado pelo paradigma tido como violado.
Ademais, a pretensão recursal a ser examinada deve guardar simetria com a matéria veiculada pela
defesa e analisada na decisão recorrida. Vale dizer, o que se avalia, nesta ocasião, é a regularidade
da decisão monocrática recorrida que assentou, forte na ausência de formalização de acordos de
colaboração, que o ato reclamado não contrariou o prescrito pela Súmula Vinculante 14.
Cumpre enfatizar, ainda, que a jurisprudência da Suprema Corte é tranquila no sentido da
impossibilidade de inovação recursal em sede de agravo regimental:
“Inadmissível a inovação recursal, mormente em sede de agravo regimental.” (Rcl 27732 AgR,
Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 04/04/2018)
“Não se admite no agravo regimental a inovação de fundamentos.” (ARE 959413 AgR, Relator(a):
Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 06/10/2017)
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o agravo interno está
sujeito aos limites da devolutividade delimitados no apelo extremo. Precedente.” (ARE 976508 AgR,
Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 30/09/2016)
“A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que é inviável inovar, em sede de agravo
regimental, os pedidos não contidos no recurso extraordinário.” (ARE 904208 ED, Relator(a): Min.
GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 27/10/2015)
Esse cenário, a meu ver, impede o enfrentamento do pleito anulatório.
Nada obstante, conforme esmiuçado adiante, tenho que a decisão reclamada não configura violação
à Súmula Vinculante 14, providência apta a repelir, integralmente, a insurgência defensiva.
2. Nos termos da Constituição Federal, compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar
originariamente “a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de
suas decisões” (art. 102, I, l).
Enfatizo que a reclamação não se presta ao amplo reexame da higidez constitucional e legal do ato
impugnado, sob pena de conferir-se contornos de sucedâneo recursal ao instrumento, o que é
fortemente repelido pela jurisprudência desta Suprema Corte.
Em idêntico sentido, menciono julgamento de lavra do ilustre decano do STF no sentido de que a
reclamação “não se qualifica como sucedâneo recursal nem configura instrumento
viabilizador do reexame do conteúdo do ato reclamado, eis que tal finalidade revela-se
estranha à destinação constitucional subjacente à instituição dessa medida processual” (Rcl 4381
AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 22/06/2011, grifei).
Cito ainda, por relevante, trecho de ensinamento doutrinário do eminente Min. Marco Aurélio, em
publicação veiculada em homenagem à Professora Teresa Arruda Alvim:
“Ao lado da preservação da competência, o exame a ser realizado na reclamação faz-se
mediante o cotejo entre o ato impugnado e o paradigma apontado como violado. Não se
confunde com a análise recursal, voltada à aferição do acerto, ou não, do entendimento
lançado no pronunciamento recorrido. Descabe utilizá-la como sucedâneo de recurso ou,
até mesmo, de incidente de uniformização de jurisprudência.” (A reclamação no Código de
Processo Civil de 2015 e a jurisprudência do Supremo. In Questões relevantes sobre recursos, ações
de impugnação e mecanismos de uniformização de jurisprudência. Coordenadores: Cláudia Elisabete
Schwerz Cahali, Cassio Scarpinella Bueno, Bruno Dantas e Rita Dias Nolasco. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2017, p. 413, grifei )

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Daí que a Suprema Corte exige, para fins de admissão da reclamação calcada na inobservância de
autoridade de decisão, relação de perfeita aderência entre tais pronunciamentos:
“A aderência estrita do objeto do ato reclamado ao conteúdo das decisões paradigmas é requisito de
admissibilidade da reclamação constitucional.” (Rcl 27685 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI,
Segunda Turma, julgado em 01/12/2017)
“A aderência estrita entre o objeto do ato reclamado e o conteúdo da decisão do STF dotada de
efeito vinculante e eficácia erga omnes apontada pelo reclamante é requisito para a admissibilidade
da reclamação constitucional.” (Rcl 27521 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado
em 07/11/2017)
A partir do requisito atinente à aderência estrita é possível extrair, a meu juízo, a obrigatoriedade de
que o conteúdo do ato impugnado configure desrespeito direto ao anterior pronunciamento da
Suprema Corte.
Em outras palavras: não basta que o ato reclamado vá além; exige-se concreta contrariedade no
que tange à autoridade do paradigma. Pois, como bem mencionado pelo eminente Min. Marco
Aurélio, a reclamação não “se confunde com a análise recursal, voltada à aferição do acerto, ou não
do entendimento lançado no pronunciamento recorrido.”
3. No caso concreto, alega-se que o ato imputável à autoridade reclamada contrariaria a Súmula
Vinculante 14, que prescreve o seguinte:
“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência
de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.”
Como se vê, o verbete sumular disciplina o acesso do defensor a elementos de prova
documentados em procedimento investigatório e que, no interesse do representado, digam
respeito ao exercício do direito de defesa.
Na mesma direção, a jurisprudência do STF compreende que referido enunciado sumular vinculante
assegura ao defensor legalmente constituído o direito de acesso às provas produzidas “e
formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas ,consequentemente, as
informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não
documentadas no próprio inquérito ou processo judicial” (HC 93.767, Rel. Min. CELSO DE
MELLO, Segunda Turma, DJe de 01.04.2014, grifei).
Em idêntico sentido, colho compreensão assentada em voto, de lavra do eminente Min. Cezar
Peluso, proferido na espacialidade da aprovação do verbete sumular vinculante 14, em que
consignado que o acesso do investigado não alcança diligências em andamento ou em fase de
deliberação:
“(…) duas coisas devem ser distinguidas nos inquéritos policiais: uma coisa são os elementos de
provas já documentados. Quanto a estes elementos de prova já documentados, não encontro modo
de restringir o direito dos advogados em defesa dos interesses do cliente envolvido nas
investigações. Outra coisa são todos os demais movimentos, atos, ações e diligências da
autoridade policial que também compõem o inquérito. A autoridade policial pode, por
exemplo, proferir despacho que determine certas diligências cujo conhecimento pode
frustrá-las; a esses despachos, a essas diligências, o advogado não tem direito de acesso
prévio, porque seria concorrer com a autoridade policial na investigação e,
evidentemente, inviabilizá-la. Por isso, da ementa consta textualmente: 'ter acesso amplo aos
elementos que, já documentados. Isto é, elementos de prova. Por isso, tal ementa, a meu ver,
resguarda os interesses da investigação criminal, não apenas das diligências em andamento,
mas ainda das diligências que estão em fase de deliberação. A autoridade policial fica
autorizada a não dar ciência prévia desses dados ao advogado, a qual poderia
comprometer o resultado final da investigação.” (trecho do voto do Min. CEZAR PELUSO,
proferido na PSV 1, Relator(a): Min. MENEZES DIREITO, Tribunal Pleno, julgado em 02/02/2009,
grifei)
Na mesma linha:
“O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos
autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de
diligências em curso (...).” (HC 90232, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma,
julgado em 18/12/2006)
A Súmula Vinculante em apreço, portanto, fixa os lindes a fim de que o acusado ou investigado
tenha acesso a determinadas informações e providências investigatórias, excluindo tal possibilidade

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em caso de diligências em formação e, consequentemente, não formalmente incorporadas aos autos


de apuração.
O que se debate, nesta oportunidade, é se o ato reclamado desrespeitou essas balizas.
Cabe observar que, embora, conforme a jurisprudência desta Suprema Corte, o acordo de
colaboração consubstancie meio de obtenção de prova, e não elemento de prova propriamente dito,
os precedentes desta Segunda Turma são no sentido da viabilidade de exame de acesso a tais
informações em sede de reclamação, cujo acolhimento desafia a presença dos seguintes requisitos:
“É ônus da defesa requerer o acesso ao juiz que supervisiona as investigações. O acesso deve ser
garantido caso estejam presentes dois requisitos. Um, positivo: o ato de colaboração deve apontar a
responsabilidade criminal do requerente (INQ 3.983, rel. min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno,
julgado em 3.3.2016). Outro, negativo: o ato de colaboração não deve referir-se à diligência
em andamento.” (Rcl 24116, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 13/
12/2016, grifei)
Fixadas essas premissas teóricas, passo ao exame do caso concreto.
4. A decisão reclamada, na parcela em que impugnada, é do seguinte teor:
“2.l Pleiteia a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva para que o MPF esclareça o status das
negociações de acordos de colaboração com José Adelmário Pinheiro Filho e Agenor
Franklin Magalhães Medeiros e os benefícios oferecidos.
A questão já foi objeto das audiências de interrogatório, nas quais os acusados declararam que
estariam tentando celebrar um acordo de colaboração premiada, mas que nada teria sido
ultimado e nenhuma oferta de benefício concreto teria já sido realizada.
Então a questão resta prejudicada.
Não cabe ainda exigir a apresentação de informações sobre eventual e incerto acordo de
colaboração não-celebrado.
Defiro apenas o requerido para que o MPF, nas alegações finais, informe, caso eventual acordo
tenha sido celebrado e não esteja sob sigilo decretado por jurisdição de hierarquia
superior, o seu teor.”
De fato, verifico que a questão já havia sido examinada em sede de audiência, conforme
documentação exibida pela ilustre defesa, nos termos do contido no interrogatório de José
Aldemário Pinheiro Filho:
“Defesa:- Excelência, tem uma questão de ordem. Juiz Federal:- Qual seria, doutor?
Defesa:- Na data de ontem o jornal Folha de São Paulo publicou uma reportagem dizendo que o
interrogando estaria negociando uma acordo de delação premiada, diz a reportagem que o teor do
depoimento a ser prestado hoje teria sido negociado com o Ministério Público, e também hoje uma
matéria do jornal Valor Econômico vai na mesma linha, então, em atenção à lealdade processual, eu
gostaria que vossa excelência indagasse ao Ministério Público se existe um processo de
delação premiada e qual é o status desse processo.
(…)
Defesa:- Excelência, respondendo a indagação do eminente advogado, sim, existem conversas
com o Ministério Público, não há a formalização de um acordo, muito menos a
homologação deste acordo pelo Judiciário, mas há sim conversas estabelecidas por este
advogado, e pelos advogados hoje que atuam em nome de Léo Pinheiro, com o Ministério
Público, é isso, aliás isso seria dito textualmente pela defesa.
Juiz Federal:- Alguma coisa a acrescentar o Ministério Público?
Ministério Público Federal:- Não, excelência.
Defesa:- Só uma questão, excelência. O eminente advogado leu uma matéria na Folha de São Paulo
dizendo que, a matéria diz, segundo eu posso ter entendido, que a defesa teria negociado esse
depoimento com o Ministério Público, isso de fato não ocorreu.
(…)
Juiz Federal:- Foi mencionado que o senhor estaria num processo, o seu defensor ou o Ministério
Público, estaria em processo de negociação de um acordo de colaboração premiada, como
não existe esse acordo o senhor não depõe ali sob a égide da 12.850, não existe um acordo
formalizado, não obstante eu vou advertir ao senhor que se for sua intenção realmente
colaborar, que a única coisa que interessa a justiça é a verdade dos fatos, certo?

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José Adelmário Pinheiro Filho:- Correto.


Juiz Federal:- Nada interessa à justiça que o senhor exagere ou o senhor exclua no seu depoimento,
certo?
José Adelmário Pinheiro Filho:- Certo.
Juiz Federal:- E mesmo sem a égide de um acordo de colaboração, embora o senhor mantenha
ainda esse direito ao silêncio, embora o senhor possa até faltar com a verdade sem que o senhor
sofra alguma penalidade, existem alguns tipos penais no nosso código penal como, por exemplo, a
denunciação caluniosa, então se o senhor, mesmo sem acordo, atribuir falsamente a alguém
a prática de um crime o senhor responde criminalmente.
José Adelmário Pinheiro Filho:- Correto.”
Questão semelhante foi enfrentada na ocasião do interrogatório de Agenor Franklin Magalhães
Medeiros:
“Defesa:- Excelência, tenho uma questão de ordem. Juiz Federal:- Qual seria?
Defesa:- Depois que vossa excelência adiou o depoimento do ex-presidente Lula de 03 para 10
deste mês, começou a haver um movimento de pedidos de reinquirição e de colaborações informais,
o portal UOL noticia hoje que o interrogando estaria num processo de colaboração informal, então
eu gostaria de perguntar ao Ministério Público se existe esse acordo informal ou se já alguma
tratativa de delação premiada com o interrogando?
Juiz Federal:- O Ministério Público pode esclarecer?
Ministério Público Federal:- Não há nenhum acordo informal do Ministério Público, seja com
esse réu ou quaisquer dos outros já interrogados, o que há são negociações de acordo de
colaboração com alguns executivos da empreiteira OAS, como já foi afirmado inclusive na
audiência em que foi inquirido Léo Pinheiro.
(…)
Ministério Público Federal:- Doutor Cristiano, sim, existem tratativas em andamento, não existe
nenhum acordo formalizado e a orientação de falar a verdade e de colaborar parte da
defesa que eu estou assumindo agora, não só nesse caso como nos outros, e é um direito
que lhe assiste.
(…)
Defesa:- Perfeito. Já foi inclusive reconhecido aqui pelo Ministério Público que o senhor está num
processo de delação premiada, numa negociação, o senhor pode me dizer em que fase
está essa negociação?
Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Olha, jamais eu estive com qualquer procurador e os
meus advogados é que estão conversando, então o que eu estou revelando, não é revelando, o
meu depoimento aqui hoje a princípio eu não tenho nenhum benefício definido até agora em
relação ao que eu estou falando, zero de benefícios até agora, desconheço. Agora, os meus
advogados estão conversando, conversando, isso é uma decisão minha e uma decisão dos
meus advogados.
Defesa:- Certo, mas já existe uma proposta então de benefícios?
Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Não existe proposta nenhuma.
Defesa:- O senhor está negociando delação sem benefícios?
Agenor Franklin Magalhães Medeiros:- Zero propostas, pelo menos até o momento que eu entrei
aqui, agora, os meus advogados, conversando com eles, proposta não existe, existem conversas.”
A inexistência de acordo de colaboração premiada entre o Ministério Público e os corréus também foi
reiterada pela autoridade reclamada em sede de informações:
“(...) as informações disponíveis ao Juízo é que a suposta colaboração das duas referidas
pessoas ainda se encontra na fase de tratativas entre eles, seus defensores e a Procuradoria
Geral da República.
Então não há acordo de colaboração formalizado ou depoimentos tomados, com o que a
Defesa pretende acesso a elementos que não ainda existem, o que é de impossível
atendimento.” Esse entendimento foi reforçado em sentença superveniente.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por sua vez, ao manter a sentença condenatória,
ponderou:

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“Não bastasse a farta prova testemunhal e documental acima referida, o caso concreto conta com as
confissões, em Juízo, realizadas por JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO (evento 809) e por AGENOR
FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS (evento 789).
Ambos, diga-se, são réus que não ostentam acordo de colaboração premiada entabulado
com o Ministério Público Federal. Nenhum benefício legal lhes foi previamente outorgado
quando de seu interrogatório e, ainda assim, assumiram sua responsabilidade criminal em face
do magistrado e agora irão responder nos exatos termos da legislação penal brasileira.” (trecho do
voto do Desembargador Federal Leandro Paulsen, grifei) “(...) que a contribuição de AGENOR
FRANKLIN MAGALHÃES MEDEIROS não ocorreu no bojo de um acordo de colaboração em
sentido estrito, cuja natureza negocial e premial tem sido proclamada pelo Supremo
Tribunal Federal.” (trecho do voto do Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus, grifei)
Na mesma linha, assentou o Procurador-Geral da República, em manifestação colhida nestes autos,
que “tais acordos não foram celebrados e nada garante que serão.”
A propósito, a própria defesa, ao arrazoar recurso especial interposto, reconhece a ausência de
formalização de acordo de colaboração premiada entre o Ministério Público e os corréus:
“185. Isto porque, embora ainda não tivesse celebrado acordo de colaboração quando
resolveu autodenunciar-se por esse episódio, resta claro que o Léo Pinheiro o fez, a toda
evidência, como delator informal, para ser agraciado pela generosidade do Juiz sentenciante.”
Imperioso assinalar que a reclamação não permite dissenso quanto a essa premissa. Vale dizer,
portanto, que o exame encetado no âmbito desta Suprema Corte, à luz do aduzido nas instâncias
antecedentes, deve partir, a meu ver, da inocorrência de celebração do aludido negócio jurídico
processual personalíssimo.
Não há como reconhecer, nessa ótica, sonegação de fornecimento de elementos de prova
produzidos contra o representado e já documentados em procedimento investigatório, como
expressamente exige o paradigma tido como violado. Em verdade, a defesa insurge-se contra o
indeferimento de acesso a meio de obtenção de prova inexistente ou, no muito, em fase de
formação, o que não se amolda ao escopo do verbete sumular.
Cumpre acrescentar que, conforme já enfatizei em voto proferido na ADI 5508, em que se discute a
extensão da atribuição do Delegado de Polícia nessa ambiência, a colaboração premiada é realidade
jurídica, em si, mais ampla do que o acordo de colaboração premiada. Assentei naquela ocasião o
seguinte:
“Com efeito, há a possibilidade jurídica de um investigado, acusado, ou mesmo alguém já
condenado, colaborar com a Justiça Criminal e obter benefício em forma de sanção premial, sem
que, necessariamente, tenha de celebrar um acordo de colaboração com um agente do Estado.
(…)
A novidade instituída pela Lei 12.850/13 reside no oferecimento de maior garantia ao candidato a
colaborador de que os benefícios decorrentes de sua colaboração efetivamente lhes serão atribuídos.
Antes da regulamentação do acordo, um imputado que desejasse colaborar não contava com a
estipulação prévia, por parte do Estado, dos benefícios a que teria direito caso optasse por
descortinar os fatos nos quais se achasse envolvido numa amplitude maior. Restava ao investigado
colaborar e aguardar para que os benefícios abstratamente previstos na lei lhes fossem
concretizados no momento da sentença.
Com a institucionalização do acordo, estabeleceu-se modalidade de colaboração por meio da qual
direitos e deveres do colaborador são previamente negociados com o Estado, descritos e
estipulados, conferindo-se lhe, desde que cumpra com suas próprias obrigações, direito subjetivo
aos benefícios assentados no termo.”
No caso concreto, os corréus teriam colaborado mesmo sem a formalização de acordo de
colaboração.
Ocorre que tal comportamento processual, cuja legalidade e aptidão probatória não se encontram
em exame nesta ocasião, não representa violação ao comando da Súmula Vinculante 14, o que
impede o acolhimento pretendido:
“Agravo regimental na reclamação. Alegada violação da Súmula Vinculante nº 14 da Corte. Não
ocorrência. Inexistência de identidade fática entre o conteúdo da decisão reclamada e o
comando da súmula vinculante alegadamente desrespeitada. Impropriedade do uso da
reclamação. Pretendida submissão imediata do litígio ao exame direto do Supremo
Tribunal Federal. Impossibilidade. Precedentes. Agravo regimental não provido.” (Rcl 23770
AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 07/02/2017, grifei)

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Ao contrário, tal proceder apenas evidencia que a colaboração teve como norte o exercício da ampla
defesa, sem figurar como fruto de ato negocial ou de meio de obtenção de prova de natureza pré ou
extraprocessual.
Segundo o afirmado pelas instâncias antecedentes, o que foi confirmado pelo Ministério Público, os
corréus teriam colaborado exclusivamente no transcorrer da instrução processual da ação penal,
naturalmente submetida ao crivo do contraditório. Verifico, nessa perspectiva, que não foram
sopesados pelas instâncias ordinárias elementos produzidos pelos corréus fora dessa ambiência
instrutória, a revelar que a defesa teve assegurada plena ciência no que toca aos elementos
supostamente incriminadores fornecidos pelos corréus.
As razões recursais da defesa corroboram essa informação:
“Ainda, quanto ao entendimento do Eminente Relator no sentido de não haver real prejuízo à defesa
por terem sido os interrogatórios prestados em juízo e submetidos ao contraditório, deve-se ter
claro que os depoimentos dos corréus – prestados sem o compromisso de dizer a verdade, nunca
é demais frisar – não foram acompanhados de quaisquer provas de corroboração, não tendo,
assim, sido oportunizado à Defesa submeter qualquer elemento ao contraditório.”
Na mesma linha são as razões veiculadas em sede especial:
“171. A leitura do acórdão recorrido evidencia que o depoimento do corréu Léo Pinheiro, ex-
Presidente da OAS, foi o argumento essencial do decreto condenatório.”
Cito, por oportuno, a seguinte passagem do parecer da Procuradoria-Geral da República:
“Não há nenhum elemento de prova obtido a partir dessas tratativas preliminares já
documentado em qualquer procedimento investigativo que seja.”
Em suma, nos termos do sustentado pela defesa, não há acordo de colaboração formalizado, sendo
que, segundo a defesa, a colaboração dos corréus teria ficado circunscrita à prestação de
declarações orais desacompanhadas de elementos de corroboração.
Não há, nessa ordem de ideias, menção a elemento de prova documentado e incorporado
a procedimento investigatório cujo acesso não tenha sido franqueado ao reclamante.
O que há, a meu ver, é o inconformismo voltado à insuficiência probatória da chamada de corréu.
Vale dizer, questiona-se, ainda que tangencialmente, o valor probante e a própria credibilidade
desses elementos, sobretudo em razão de um alegado caráter decisivo dessas informações,
supostamente colhidas sem corroboração, no equacionamento do conjunto fático-probatório.
Nessa linha, transcrevo segmento das razões do agravo regimental em exame:
“(...) muito embora a sentença não tenha utilizado diretamente acordos de colaboração
premiada desses corréus, porquanto ainda não formalizados, utilizou as suas declarações
como se isso fossem.
(…)
Ainda não se tem notícias dos acordos de colaboração premiada, no entanto, os corréus
foram devidamente recompensados na ação penal em questão.”
O questionamento acerca da higidez da apontada postura colaborativa desacompanhada de acordo
de colaboração, embora afigure- se legítimo, escorreito e relevante, não se insere na destinação
constitucional da reclamação, na medida em que não se vincula ao prescrito pelo paradigma, que é
limitado a garantir o acesso defensivo aos elementos de prova já incorporados à apuração.
Além disso, cabe ressaltar que a reclamação não comporta o reexame de matéria fático-probatória,
de modo que não se revela viável, nesta sede, a pretendida avaliação da decisividade das
declarações fornecidas pelos corréus, tampouco aferir a procedência da alegação de que se trataria
de colaboração despida de elementos materiais que corroborem as informações relatadas em
audiência realizada em sede judicial.
Acrescento ainda que, no caso em apreço, a autoridade reclamada propiciou o fornecimento de
informação à defesa acerca do status da colaboração premiada que, ao tempo da prolação da
decisão, encontrava- se em fase de tratativas. Ou seja, ficou explicitada nos autos a informação no
sentido de que os corréus mantinham diálogos com o Ministério Público e que almejavam a
celebração de acordo de colaboração.
Mais do que isso, a autoridade reclamada impôs à acusação o dever jurídico de informar, antes das
alegações finais da defesa, se existia acordo celebrado ou homologado. Embora isso pudesse
representar eventual adiamento do conhecimento dos termos jungidos ao meio de obtenção de
prova, cumpre reiterar que, na hipótese específica, não houve formalização de acordo, conforme

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assentado pelas instâncias antecedentes e expressamente reforçado pela Procuradoria-Geral da


República, de modo que sequer ocorreu retardo no acesso a elementos de prova.
Não se noticia, outrossim, a produção de quaisquer elementos de prova a partir das negociações
iniciadas e que não teriam culminado na celebração de acordo. Nessa ótica, também não há como
potencializar a alegação de necessidade de ciência acerca de quais benefícios teriam sido ofertados,
na medida em que, além de constituir medida personalíssima, a sanção premial, no caso concreto,
decorre exclusivamente do exame do Estado-Juiz, e não de autovinculação estatal decorrente de
atuação negocial presentada pela acusação.
Portanto, independentemente da formalização de avença, os corréus teriam fornecido informações
durante a fase instrutória, proceder que, como já dito, espelha exercício do direito de defesa, e não
meio de obtenção de prova decorrente de contexto negocial, razão pela qual não guarda relação de
perfeita simetria com o paradigma tido como desrespeitado.
Em suma, a defesa teve acesso às declarações prestadas pelos corréus em Juízo, alega inexistir a
apresentação de elementos de corroboração e, quanto às negociações iniciadas, cumpre reiterar o
afirmado pela Procuradoria-Geral da República no sentido de que “[n]ão há nenhum elemento de
prova obtido a partir dessas tratativas preliminares já documentado em qualquer procedimento
investigativo que seja”, cenário que não traduz violação à Súmula Vinculante 14.
5. Diante do exposto, nego provimento ao agravo regimental.
EXTRATO DE ATA
SEGUNDO AG.REG. NA RECLAMAÇÃO 27.229
PROCED. : DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. EDSON FACHIN
AGTE.(S) : LUIZ INACIO LULA DA SILVA
ADV.(A/S) : CRISTIANO ZANIN MARTINS (32190/DF, 153599/RJ, 172730/SP)
AGDO.(A/S) : NÃO INDICADO
Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto
do Relator. Segunda Turma, Sessão Virtual de 8.6.2018 a 14.6.2018.
Composição: Ministros Ricardo Lewandowski (Presidente), Celso de Mello, Gilmar Mendes, Dias
Toffoli e Edson Fachin.
Disponibilizou processos para esta sessão o Ministro Alexandre de Moraes, não tendo participado do
julgamento desses feitos o Ministro Edson Fachin por suceder, na Segunda Turma, o Ministro Teori
Zavascki.
Ravena Siqueira
Secretária

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