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2015 FOCO Escola Contemporânea PDF
2015 FOCO Escola Contemporânea PDF
Resumo
O paradigma cartesiano, em termos gerais, acredita que os fenômenos físicos podem ser
reduzidos em partes mais simples, sua prática pedagógica está baseada em ações mecânicas e
autoritárias que provocam que o aluno escute, leia, decore e repita. Paradigma que inclui mitos,
crenças e atitudes que podem influir na percepção docente e, portanto, na aceitação inconsciente
da violência escolar. Para analisar este tema usaremos o conceito de cognição social que se
refere a processos mentais mediante os quais os sujeitos selecionam, interpretam e usam a
informação para fazer julgamentos e tomar decisões. Assim, a partir dessa temática e da
conclusão do “Curso de Altas Habilidades / Superdotação numa Perspectiva Inclusiva”,
organizado pelo Centro de Atividades de Altas Habilidades / Superdotação (CAAH/S) na cidade
de Macapá, que se cogitou a construção deste artigo com o objetivo de revisar o paradigma
educativo cartesiano e sua prática nas salas de aula com intuito de analisar se o mesmo é um
empecilho para detectar oportunamente as AH/SD em crianças, levando-as assim a um
envolvimento com a violência escolar. A metodologia do artigo está embasada numa pesquisa
bibliográfica, exploratória e descritiva que inclui livros e publicações periódicas que abordam as
temáticas anteriormente comentadas e as teorias de Howard Gardner e de Joseph Renzulli. Para
concluir: a violência pode ser observada tanto por ação quanto por omissão, assim negar as
necessidades dos alunos AH/SD por inabilidade na sua identificação ou por desinteresse é um
ato violento que pode chegar a ser considerado como violência paradigmática.
1
Formado em Psicologia e Administração, com pós-graduação em Hipnoterapia Ericksoniana e Programação
Neurolinguística. Atualmente fazendo graduação do curso de Letras na Universidade UNOPAR. Professor de
Psicologia nas Universidades Universidad CUT (México) E Universidad del Desarrollo Profesional (México).
Professor de Inglês e espanhol no Cultural Norte Americano (Macapá).
2
Mestranda em Educação pela Faculdade Integrada de Goiás (Goiás), especialista em Novas Linguagens e Novas
Abordagens para o Ensino da Língua Portuguesa pela Faculdade Atual (Macapá), graduada em Licenciatura Plena
em Letras e Literaturas Vernáculas com Habilitação em Língua Portuguesa, Funcionária Pública da Secretaria de
Educação do Estado do Amapá, professora orientadora e de atendimento a alunos com Altas
Habilidades/Superdotação no Centro de Atendimento a Alunos com Altas Habilidades / Superdotação
(CAAHS/AP).
1 INTRODUÇÃO
Todos os seres humanos têm direito a uma educação de acordo com suas necessidades,
características e diferenças individuais, que encoraje seus talentos e que respeite sua integridade
como pessoas. Uma educação inclusiva que abranja não somente aos alunos com deficiências,
mas também aos alunos com Altas Habilidades / Superdotação (AH/SD) que se sobressaem “por
ter duas características marcantes que são a rapidez de aprendizagem e a facilidade com que
esses indivíduos se engajam na sua área de interesse” (VIRGOLIM, 2003, p.28). Segundo a
Doutora em Educação, Marcília de Morais Dalosto, na sua tese “O aluno com Altas Habilidades
/ Superdotação e o Bullying: Manifestações, prevalência e impactos”, o indivíduo AH/SD é
definido:
No intuito de contribuir para uma educação de qualidade em todo Brasil, e não somente
em algumas escolas ou regiões, o objetivo do presente artigo é revisar o paradigma educativo
17
cartesiano e sua prática nas salas de aula para analisar se o mesmo é um empecilho na detecção
oportuna das AH/SD em alunos, levando-os assim a um envolvimento com a violência escolar.
O paradigma cartesiano propôs a fragmentação do conhecimento em áreas específicas de
cursos nas quais os professores explicam o conteúdo no quadro e a classe acompanha em
silêncio, com o papel de expectadores passivos, para assimilar, memorizar e reproduzir esse
conteúdo. Deste modo, a prática pedagógica é baseada em ações mecânicas e autoritárias que
provocam que o aluno escute, leia, decore e repita.
Quando as escolas baseiam suas práticas educativas no paradigma cartesiano contribuem
com o descompasso entre a obsolescência dos conteúdos escolares e as mudanças sociais.
Transformações que vêm manifestando-se nos últimos anos e que precisam de uma educação
inclusiva, voltada ao convívio da democracia, ao exercício da cidadania e ao surgimento do
homem global com centros educativos que propiciem a criação do conhecimento. Mas
infelizmente, a maioria das escolas ainda baseiam seus projetos políticos pedagógicos no
paradigma cartesiano que inclui ideias, mitos e crenças que compartilhados pelos professores,
criam cognições, atitudes e condutas que influem na sua prática educativa e no uso de conteúdos
obsoletos.
Para analisar essas cognições compartilhadas pelos professores utilizaremos o conceito de
Cognição Social, na perspectiva da Psicologia Social, que se refere a processos mediante os
quais os sujeitos selecionam, interpretam e usam a informação para fazer julgamentos e tomar
decisões. Deste modo, existe a possibilidade de que alguns professores ainda compartilhem
crenças e atitudes que os levem a considerar a violência como um exagero, uma exceção ou
como um fato isolado, a tal ponto, que essas crenças influam na sua inabilidade para identificar
as condutas agressivas vivenciadas por eles no âmbito escolar.
O tema da violência nas escolas é muito sério na atualidade; tem impacto na formação da
personalidade das crianças; é um empecilho no desenvolvimento de alunos AH/SD; é um
fenômeno de crescente relevância na educação atual brasileira3; é um fato de importância para a
segurança nas escolas; e é fator na etiologia das neuroses em adultos. De tal modo, uma análise
deste tipo e posteriormente uma pesquisa que tente entender a gênese da violência nas salas de
aula sob a perspectiva sócio-psicológica para sua prevenção, terão benefícios tanto para as
crianças que sofrem e praticam a agressão, quanto para a sociedade em geral. Reconhecendo
assim, que uma pessoa com saúde mental será uma pessoa que procure o bem-estar pessoal e
3
“Três documentos legais formam a base de entendimento com relação ao desenvolvimento e educação de crianças
e adolescentes: a constituição da República Federativa do Brasil; o Estatuto da Criança e do Adolescente; e a
Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas. Em todos esses documentos, estão
previstos os direitos ao respeito e à dignidade, sendo a educação entendida como um meio de prover pleno
desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania” (LÓPEZ NETO, 2005, p.165).
Os alunos e alunas atingidos pela violência na escola tendem a sofrer uma “série de
consequências em detrimento de sua saúde mental, tais como ansiedade, depressão, medo a
assistir à escola, nas relações sociais, ideias suicidas e até suicídios reais” (VARELA, 2009, p.4).
Do mesmo modo, “as crianças e adolescentes que sofrem ou praticam bullying podem vir a
necessitar de múltiplos serviços como os de saúde mental, justiça da infância e adolescência,
educação especial e programas sociais” (LÓPEZ NETO, 2005, p.168), o que aumenta os custos
orçamentários do Governo Federal para atingir a toda essa demanda. Desta forma, a pesquisa põe
ênfase na prevenção do fenômeno da violência escolar, devido ao fato de que é sempre melhor
prevenir as causas do que tentar compreender as consequências o que redundará num benefício
para a sociedade. Estudos mostram que as pessoas que vivem a violência escolar têm
dificuldades diante de situações de conflito, assim, “são pessoas carentes de ferramentas para a
adequada gestão do conflito (autocontrole, capacidade de diálogo, capacidade de empatia),
podem afrontá-lo com agressão ou violência” (SEVILLA, 2006, p.2), portanto, seria possível
reduzir significativamente a incidência desses transtornos com uma adequada facilitação de
ferramentas aos discentes.
4
Confronte-se PIÑERO, 2010, p.39.
19
No Brasil, a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à
Adolescência (ABRAPIA) desenvolveu o Programa de Redução do Comportamento
Agressivo entre estudantes onde encontraram que dos cinco mil quinhentos alunos
pesquisados de quinta a oitava série do Ensino Fundamental 40.5% admitiram estar
diretamente envolvidos em atos de bullying, 60.2% afirmaram que o bullying ocorre
mais frequentemente dentro das salas de aula, e entre os alunos autores de bullying,
51.8% disseram que não receberam nenhum tipo de orientação ou advertência quanto à
incorreção de seus atos (LÓPEZ NETO, 2005, p.166).
2 DESENVOLVIMENTO
A OMS indica em torno de 3,5 a 5% da população escolar como sendo de pessoas com
referências de AH/SD, contudo existem estudos que advertem uma porcentagem maior,
como o da Associação Brasileira para superdotados do Rio Grande do Sul (ABSD-RS),
realizados no ano de 2001, no qual evidencia um índice de 7,78% de alunos AH/SD
(NEGRINI, 2008, p.278).
Um levantamento feito pela OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta que há oito
milhões de superdotados no Brasil. Mas o indicador da organização utiliza apenas o Q.I.
(Coeficiente de Inteligência) como medidor de altas habilidades. Quem entende do
assunto e considera o teste ultrapassado, avalia que o número pode ser muito maior se
considerarmos as inteligências múltiplas do psicólogo Howard Gardner para medir a
capacidade de um indivíduo (BURGARDT, 2008, s/p).
Assim sendo, a quantidade de alunos com AH/SD aumenta quando se toma em conta a
Teoria das Múltiplas Inteligências do psicólogo Howard Gardner que define a inteligência como
a “capacidade de resolver problemas ou de criar produtos que sejam valorizados dentro de um ou
mais cenários culturais” (GARDNER, 1994, p.7). Gardner entendeu que o conceito da
inteligência Q.I. não era suficiente para descrever a grande quantidade de habilidades cognitivas
humanas, deste modo definiu diferentes tipos de inteligência: lógica-matemática, linguística,
espacial, musical, corporal sinestésica, interpessoal, intrapessoal, naturalista e existencial6.
Assim, Howard Gardner afirma no seu livro “Estruturas da mente: a Teoria das Múltiplas
Inteligências” que:
5
As primeiras consistiriam na capacidade de processar informações, integrar experiências e se engajar em
pensamento abstrato. As habilidades específicas consistiriam na capacidade de adquirir conhecimento, destreza ou
habilidade para realizar uma ou mais atividades do tipo especializado.
6
O conceito de inteligência existencial está ainda em estudo.
21
O Censo escolar da Educação Básica 2012 informa a existência de 10.902 alunos com
AH/SD em classes regulares (INEP BRASIL, 2014). Sabendo-se que, o total de alunos
matriculados nas escolas brasileiras soma mais de 50 milhões, é curioso perceber que os alunos
com AH/SD representam apenas 0,02% deste total. Portanto, partindo da hipótese mais
conservadora no referente à estimativa total de alunos AH/SD na rede educacional brasileira e
tomando em conta o total de alunos matriculados com o cálculo da OMS (3 a 5%), podemos
deduzir que ainda faltam mais de dois milhões de alunos AH/SD a serem identificados nas
escolas brasileiras. Deste modo, é importante analisar as consequências da falta de identificação
desses alunos para entender essa discrepância de números. Com relação a esses dados, Virgolim
menciona:
Seja como for procedida a identificação dos alunos com altas habilidades, é de especial
importância compreender que o fracasso em identificar corretamente e atender as
necessidades especiais desta população pode colocar o aluno em risco de fracasso
escolar e comprometer seriamente seu desenvolvimento sócio emocional, impedindo-o
de realizar plenamente o seu potencial (VIRGOLIM, 2007, p.58).
7
É importante mencionar que nem todos os alunos AH/SD são violentados, contudo, infelizmente existe também a
possibilidade que alguns deles se tornem agressores.
23
Um aspecto importante na violência escolar contra alunos AH/SD refere-se ao fato de
existirem mitos com respeito ao conceito das AH/SD, tais como: a superdotação é sinônimo de
genialidade; a criança superdotada necessariamente terá um bom rendimento na escola8; o
superdotado é um fenômeno muito raro, sendo poucas as crianças e jovens de nossas escolas que
podem ser de fato considerados superdotados ou para alunos com AH/SD tudo é fácil e não
precisam esforçar-se.
[...] com base nas leituras sobre os mitos acerca das AH/SD, bem como a temática da
Inclusão, questionei a possível relação entre os apelidos clássicos: NERDs, CDFs,
“puxa-saco”, entre outros com o Bullying que vitimiza (sic) o aluno com AH/SD
(OLIVEIRA, 2012, p.18).
Mas, para entender como esses mitos repercutem na prática educativa inicialmente se
analisará, em forma geral, o conceito de violência escolar, sua relevância atual e suas
consequências. Posteriormente se considerará o paradigma cartesiano e sua prática existente em
algumas escolas na atualidade e finalmente se aferirá em como esse paradigma influi na
percepção dos principais atores educativos, sob a perspectiva da cognição social.
A violência escolar ou bullying9 é um dos conceitos mais difundidos na atualidade pela
mídia e é objeto de análise em diferentes âmbitos. Só entre os anos 1996 e 2012 pode-se
conhecer tragédias como a de Moses Lake (Washington), onde dois estudantes e uma professora
foram feridos, mantidos reféns durante dez minutos e mortos pelo aluno Barry Loukaitis de
catorze anos em fevereiro de 1996; ou a de Littleton (Colorado) quando catorze estudantes e um
professor foram mortos e vinte e três alunos foram feridos na escola Columbine, por Eric Harris
e Dylan Klebold, no dia 20 de abril de 1999; e mais recentemente em Newtown (Connecticut)
onde Adam Lanza, de 20 anos, assassinou vinte crianças e seis adultos num tiroteio na escola
primária de Sandy Hook em 14 de dezembro de 2012. Poderíamos nomear múltiplas tragédias
pelo mundo afora que variam em número de mortos, feridos e danos psicológicos para as vítimas
e a sociedade em geral.
No Brasil, tragédias como a vivida na Escola Municipal do Rio de Janeiro Tasso da
Silveira no 7 de abril de 2011, ou mais recentemente a notícia de que a professora Rosileide
Queiros de Oliveira da Escola Municipal Alcina Dantas Feijão em São Paulo foi baleada por um
aluno de dez anos que depois cometeu suicídio, mostram a urgência de abordar o tema da
8
“O professor de música de Beethoven uma vez disse que, como compositor, ele era ‘sem esperança’. Isaac Newton
tirava notas baixas na escola e Albert Einstein tinha dificuldades de ler e soletrar e foi reprovado em matemática”.
(VIRGOLIM, 2007, p.39).
9
Para efeitos do artigo, os termos bullying e “violência na escola” vão ser sinônimos. O termo o bullying desde a
perspectiva do presente estudo é inadequado porque tende a estigmatizar aos envolvidos no fenômeno. A palavra
bullying é proveniente do anglicismo que significa “uma pessoa cruel e brutal” (a cruel and brutal fellow)
(PRINCETON, 2011) ou a pessoa que usa sua força ou poder para assustar ou machucar gente mais fraca (A person
who uses their strength or power to frighten or hurt weaker people). Assim este não é só um tema semântico, já que
a terminologia se deriva de um conceito que influi na cognição social.
Este Fenômeno pode ser expresso de diversas maneiras, visto que o agressor se utiliza
de muitos meios e diversas formas de atingir suas vítimas. Entre as principais formas de
manifestação da agressão de um bully, destaquei as agressões físicas, verbais, morais,
intelectuais, virtuais, psicológicas, materiais e sexuais (OLIVEIRA, 2012, p.61).
Nesse sentido, e para fins desse artigo, consideraremos a violência escolar de tipo
intelectual como a mais significativa para elucidar como o bullying pode estar relacionado com
as AH/SD:
O Bullying Intelectual pode estar caracterizado por ser aquele tipo de violência
ocasionada por agressores que apelidam suas vítimas de NERDs e CDFs em função do
desempenho acima da média da turma que a vítima apresenta, ou a apelidam de burra,
ignorante, retardada, entre outros apelidos, por seu baixo rendimento em alguma
disciplina escolar (OLIVEIRA, 2012, p.62).
Com alicerces na ideia de que vítimas da violência escolar são escolhidas pelas suas
diferenças individuais, o estudo “Perfil del niño superdotado en México”, realizado pelo Centro
de atenção ao talento (Centro de Atención al Talento CEDAT), detectou que as crianças com
Superdotação são as que mais sofrem o acosso escolar. De fato 82%, sofreram violência escolar
nos seus entornos educativos10.
Tomando em conta a não identificação dos potenciais de alunos AH/SD e o crescimento
da violência escolar se estabelece a premissa de que esses potenciais não identificados podem em
várias situações serem canalizados para fins destrutivos: desde jovens envolvidos em crimes
tecnológicos conhecidos como hackers, ou casos extremos de atiradores em escolas que
possuíam um grau alto de inteligência, como exemplo Barry Loukaitis (tragédia de Moses Lake)
que foi um estudante com honrarias, com um Q.I. de 116, tal como o Doutor Langman se refere
a seguir:
Um dos aspectos fascinantes dos atiradores em escolas é que geralmente são bons
estudantes, Contrário ao que possa ser esperado, eles não são estudantes da faixa baixa
do espectro académico. Os atiradores não são fracassos acadêmicos, eles são brilhantes,
e inclusive superdotados. Dylan Klebold esteve vários anos num programa de crianças
10
Centro de Atención al Talento (CEDAT) (EL UNIVERSAL, 2012).
25
superdotadas. Michael Carneal” tinha um Q.I. na faixa superior. Eric Harris era um
excelente estudante que participava ativamente na sala de aula e que recebia elogios
constantes de seus professores (LANGMAN, 2009, p.1, grifo do autor).11
Seguindo essa sucessão ideias, a mestre Miriam de Oliveira Maciel na sua dissertação de
mestrado “Alunos com Altas Habilidades / Superdotação e o Fenômeno Bullying” menciona:
11
Tradução livre pelos autores.
12
Um paradigma é uma palavra de origem grega (parádeigma) e significa “algo que serve de exemplo geral ou de
modelo; conjunto das formas que servem de modelo de derivação ou de flexão; conjunto de termos ou elementos
que podem ocorrer na mesma posição ou contexto” (PRIBERAM, 2008). É um modelo ou representação de um
padrão a ser seguido. E, portanto, inclui teorias e conhecimentos que originam um estudo posterior; é uma referência
inicial, como base de modelo para estudos e pesquisas.
13
Afortunadamente existem boas experiências no Brasil referente à superação do paradigma educacional cartesiano
14
“O paradigma cartesiano teve sua origem histórica em Galileu Galilei, que introduziu a descrição matemática da
natureza reconhecendo a relevância das propriedades quantificáveis da matéria. Contaminado por esses estudos,
Descartes (1596-1650) propôs o ‘Discurso do Método’ com os pressupostos: jamais acolher alguma coisa como
verdade sem evidência concreta; dividir cada um dos conceitos em tantas parcelas quanto possível para resolvê-las;
partir da ordem dos conceitos mais simples para os mais complexos para conduzir o conhecimento; e buscar em toda
parte enumerações tão completas e revisões tão gerais, que provocasse a certeza de nada omitir” (BEHRENS, 2005,
p.18-19).
15
Se privilegia o fim, o resultado, enquanto se esquece do processo. Nesse sentido, se a educação implica um
processo, as práticas são contrarias ao método ideal.
27
professor use ou não a tecnologia, o relevante é que essa tecnologia seja o instrumento para
influenciar a formação de alunos reflexivos, críticos e investigadores contínuos.
Na atualidade, o que se observa é um descompasso da educação com o avanço
paradigmático que a sociedade vem desenvolvendo, que pode ser observado na disjuntiva entre o
que o aluno aprende na escola e o que dele se requer no mundo do trabalho. Muitas empresas
reclamam que os alunos que chegam a trabalhar pela primeira vez, não possuem os
conhecimentos básicos requeridos para o desenvolvimento de sua atividade laboral:
A escola, de modo geral, prima pela competitividade entre os alunos, o que enfatiza a
cultura da violência em seu espaço. Prima também, por métodos de ensino que estão,
muitas vezes, dissociados da realidade que os alunos enfrentam na sociedade, o que
torna os conteúdos escolares desinteressantes e inúteis, na concepção desses alunos
(OLIVEIRA, 2012, p.121).
Vítimas de uma educação que não permite o México competir, falar e relacionar-se com
o mundo. Vítimas de uma escola pública que cria cidadãos apáticos, treinados para
obedecer no lugar de atuar. Educados para memorizar em vez de questionar. Treinados
para aceitar os problemas no lugar de perguntar-se como encontrar uma solução.
Educados para ajoelhar-se diante da autoridade em vez de pedir-lhe resultados. E diante
da catástrofe conhecida, o que mais surpreende é a complacência, a resignação, a
16
justificação governamental e a tolerância social. (DRESSER, 2011, p.33-34) .
[…] onde 56 por cento dos mexicanos avaliados pela prova PISA estão entre os níveis 0
e 1, isto é, sem as habilidades mínimas para afrontar as demandas dum mundo
globalizado e competitivo. Dados duma catástrofe; números que enfatizam aquilo que o
escritor James Baldwin advertiu: os países não são destruídos pela maldade más pela
18
fraqueza, pela preguiça. (DRESSER, 2011, p.34-35) .
E finalmente exemplifica a prática educativa que a maior parte das escolas no México
oferecem aos alunos:
16
Tradução livre pelos autores.
17
Programa Internacional de Avaliação de Alunos (em inglês Programme for International Sudent Assessment -
PISA). O programa é coordenado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
18
Tradução livre pelos autores.
A cognição social pode ser entendida como o conhecimento acerca de qualquer “objeto
humano”, seja indivíduo, si próprio, grupos, papéis ou instituições [...] são estruturas e
processos mediante os quais os sujeitos selecionam, interpretam, recordam e usam a
informação social para fazer julgamentos e tomar decisões (PEREIRA, 2014, p.197).
Se analisamos esse conceito no campo dos paradigmas, poderíamos dizer que cada
revolução cientifica ou paradigmática20 se apresenta com uma cognição social específica que,
para efeitos desse artigo, denominaremos cognição paradigmática.
Esta sugere um exercício de compartilhar enfoques e ideias, chegando inclusive à
normalização de práticas preestabelecidas. Por conseguinte, implica que os professores podem
possuir uma cognição que se enquadra ao paradigma vigente e que se transforma em valores,
princípios éticos, estereótipos, prejuízos, crenças e mitos.
19
Tradução livre pelos autores.
20
Para Kuhn, no seu livro “A estrutura das revoluções científicas”, um paradigma é: “aquilo que os membros de
uma comunidade científica partilham e, inversamente, uma comunidade cientifica consiste em homens que
partilham um paradigma” (KUHN, 1970, p.219). Kuhn sugere no seu livro que existem teorias que ao longo do
tempo vão modificando-se em movimentos transformadores, adaptando-se as novas questões da ciência; os
paradigmas atingem níveis críticos quando existem um grande número de questões que não podem ser resolvidas, e,
portanto, o paradigma entra num período de crise, dividindo à comunidade cientifica entre o paradigma tradicional e
um novo paradigma. Isso é o que Kuhn denomina “revolução cientifica”. É bem sabido que essa mudança de
paradigmas gera múltiplas discussões, trata-se de um processo lento que se estende por um período
consideravelmente longo de tempo.
29
Assim, ao estudar os mitos relacionados a AH/SD, estes “podem influenciar nas relações
interpessoais, causando, muitas vezes, reações agressivas nas pessoas que não apresentam
AH/SD” (OLIVEIRA, 2012, p.72).
Além dessa normalização, outro fator que influi na cognição paradigmática é o conceito
de necessidade21 social, isto é, as observações devem ser consistentes com as normas e costumes
sociais. O ser humano tem a tendência de compartilhá-las para aderir-se ao ponto de vista
coletivo o que se torna um empecilho para a prática profissional dos professores e para o
aprendizado dos alunos. Isso pode ser exemplificado no campo da violência escolar22 em relação
ao termo bullying, bem como, aos mitos relacionados aos alunos AH/SD.
Pelo fato de ainda não existir um consenso do termo bullying, é importante analisar a
cognição que tanto os professores como a sociedade têm sobre a violência escolar e assim
mostrar a importância do conceito de cognição social que está sendo analisando: Durante séculos
a cognição social da violência tem sido normalizada como uma ocorrência cotidiana, o que Nilia
Viscardi, no informe sobre “Violência na escola: América Latina e caribe” (UNESCO) denomina
de naturalização, que acontece em situações que se percebem como normais e que fazem parte
do desenvolvimento das crianças:
A violência nas escolas vem sendo considerada como uma exceção ou como um fato
isolado que só acontece em outros países ou regiões, mas os efeitos que provoca são tão sérios
que obrigam às escolas, às famílias e à sociedade em geral a assumir a responsabilidade ética
para enfrentá-los e solucioná-los. Nesse sentido, quando a psicologia desenvolve uma
perspectiva de naturalização:
21
Desirability em inglês.
22
É importante definir o conceito de violência escolar para evitar equívocos. Todo mundo fala do bullying de um
jeito corriqueiro e com repercussões muito importantes para o estudo do tema. Aliás, é um dos assuntos mais
relevantes de nossa época. Mas as diferentes manifestações da violência na escola e a pouca claridade dos termos
relativos a ela, tornam o seu estudo insuficientemente claro e, portanto, pouco inteligível. Como as palavras que
disse o senador Roberto Requião o dia 26 de abril de 2011: "Temos que acabar com o abuso, o bullying que sofremos
nas mãos de uma imprensa às vezes provocadora e muitas vezes irresponsável" (GUERREIRO, 2011). O que
ocasiona confusão no termo.
23
Tradução livre pelos autores.
Os resultados apontam que a percentagem dos futuros professores que creem que se
exagera ao falar do fenômeno da violência nas escolas aumentou a 15% e os futuros
professores que consideram que é normal que ocorram esses atos acresceu a 12%
(ALONSO, 2009, p.132).
“A ideia prévia que se tem sobre qualquer situação ou circunstância dá lugar a certas
crenças, e como consequência formam atitudes; por isso é importante conhecer a opinião que o
professor tem sobre os alunos” (CABEZAS, 2006, p.3). Por exemplo, a ideia de que a agressão é
uma fase normal no desenvolvimento das crianças e que as condutas agressivas ajudam a
endurecer aos alunos prejudicam o entendimento do problema; aliás, as falsas crenças também
têm relação ao gênero dos professores, enquanto “os homens tendem a enxergar o fenômeno
como uma coisa normal e como consequência não atuam tão oportunamente como as
professoras, que mostram maiores níveis de empatia em relação aos alunos” (CABEZAS, 2006,
p.3). Deste modo, “a aparente aceitação dos adultos e a consequente sensação de impunidade
favorecem a perpetuação do comportamento agressivo” (LÓPEZ NETO, 2005, p.166).
Ideias, mitos e crenças que compartilhados pela sociedade e pelos professores, criam
cognições, atitudes e condutas que influem na prática educativa. Se a realidade destes alunos não
se encaixa na cognição paradigmática, então essa realidade simplesmente será apagada, ignorada
ou mal-entendida.
Quase quarenta por cento das crianças superdotadas a nível intelectual não consegue
finalizar o ensino médio por não se sentirem estimulados no sistema educativo atual,
assegura MENSA, uma organização dirigida a pessoas com elevado coeficiente
24
intelectual (EL PAIS, 2008).
Desta forma, entende-se ser correto definir como violência paradigmática aquela que é
feita pelas escolas e pelos professores aos alunos AH/SD (tanto por inabilidade na sua
identificação quanto por desinteresse), quando baseiam suas ações educativas no paradigma
cartesiano. Assim, a violência paradigmática: é um conjunto de omissões e atitudes agressivas
que transgridem e violam25 os direitos dos alunos AH/SD, quando não respeitam suas diferenças
e têm suas necessidades individuais ignoradas; segue uma cognição que alude ao exercício de
compartilhar e normalizar ideias, enfoques e práticas de caráter intencional e repetitivo com base
24
Tradução livre pelos autores.
25
No sentido de “desrespeito de norma, lei, acordo. Desrespeitar, infringir, quebrantar, quebrar, transgredir”
(PRIBERAM, 2008).
31
na metodologia usada na sala de aula; é praticada por um ou vários agressores contra uma ou
mais vítimas que se encontram impossibilitadas de defender-se e se configura como um
desequilíbrio de poder entre escola e aluno.
A doutora Virgolim, no artigo “A criança superdotada e a questão da diferença: um olhar
sobre suas necessidades emocionais, sociais e cognitivas”, menciona:
3 CONCLUSÕES
26
Referre-se ao cyber-bullying como uma conduta violenta e repetitiva que se leva a cabo mediante o uso de mídia
eletrônica.
27
Outro exemplo de violência por omissão se refere aos idosos, quando se não se proporcionam as condições
necessárias para seu bem-estar (comida, roupas, medicamentos).
33
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