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PROPRIEDADES TÉRMICAS
Estrutura e Propriedades de Materiais Cerâmicos
Capítulo VIII: Propriedades Térmicas
Prof. Angelus G. P. da Silva
PROPRIEDADES TÉRMICAS
Apesar de todas estas influências, o calor específico dos materiais segue um comportamento
comum e tende a um valor bem definido 3R (R é a constante universal dos gases) em altas
temperaturas, independente da estrutura e da composição química. Este comportamento está
mostrado na Figura 8.1 para algumas cerâmicas. O calor específico expressa os mecanismos de
absorção de calor que têm os materiais. Este comportamento comum significa que os mais diversos
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Figura 8.2: Placa de espessura Δx submetida a uma diferença de temperatura ΔT. Um fluxo de calor
Φ atravessa a placa por uma seção de área A.
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ΔT
Φ=k (3)
Δx
A constante k é a condutividade térmica. Esta expressão (3) tem certa correspondência com a
lei de Ohm, que relaciona a corrente elétrica (i) que passa através de um material com a tensão (V)
aplicada no material, expressa por
V
i= (4)
R
V é equivalente ao gradiente de temperatura (quanto maior a diferença de temperatura maior o
transporte de calor), i é equivalente ao fluxo de calor e a resistência elétrica (R) é equivalente ao
inverso da condutividade térmica. A resistência elétrica representa a resistência que o material
oferece ao transporte de carga elétrica. A condutividade térmica está relacionada à facilidade que o
material oferece ao transporte de calor. A unidade de condutividade térmica é W/m.K ou
cal/s.cm.°C.
Os metais em geral apresentam condutividade térmica bem maior que as cerâmicas. Isto está
relacionado ao mecanismo de transporte de calor. Três mecanismos de transporte de calor merecem
destaque aqui: a transmissão por elétrons, a transmissão por fônons e a transmissão por radiação.
Quando existem elétrons livres em número elevado, eles podem ser uma forma importante de
transmissão de calor. Os metais possuem elétrons livres. Eles podem se movimentar pela estrutura.
Os elétrons livres que estão localizados nas partes mais quentes do corpo recebem energia e quando
se movem para as partes mais frias, levam consigo este calor.
Os átomos que constituem a rede cristalina estão em constante movimento, como mencionado
na seção 8.1. A rede cristalina pode ser vista como átomos ligados entre si através de molas.
Quando um átomo é deslocado, deforma as molas às quais está ligado e estas deslocam os demais
átomos ligados a elas. Isto acontece por toda a estrutura e todos os átomos vibram. A vibração
destes átomos se assemelha a uma onda se propagando pela rede cristalina. A vibração total da rede
pode ser descrita como a superposição de muitas destas ondas. A estas ondas dá-se o nome de
fônons. Toda onda transporta energia, portanto os fônons gerados por vibrações nas regiões de
temperatura mais elevada propagam-se até as regiões de menor temperatura, transportando o calor.
Este mecanismo de condução de calor, em geral, não é tão eficiente quanto a condução eletrônica,
mas pode ser bastante eficaz, como no diamante.
Todo corpo aquecido emite luz. A luz é uma onda eletromagnética, portanto transporta
energia. A propagação do calor através da luz chama-se propagação por calor radiante. A freqüência
da luz emitida, portanto a energia por ela transportada, depende da temperatura do corpo que a
emitiu. No caso dos metais, a luz é absorvida e não consegue se propagar pela estrutura, portanto
este mecanismo não contribui para o transporte de calor. Para as cerâmicas isto não ocorre. Os
materiais cerâmicos são transparentes à radiação, ou seja, ela pode se propagar através da estrutura.
Entretanto, este mecanismo só se torna significante para o transporte de calor em temperaturas
elevadas, quando a luz emitida possui boa quantidade de energia. Assim, o mecanismo de radiação
é importante para os materiais cerâmicos apenas em temperaturas elevadas.
Para temperaturas mais baixas, o mecanismo de transmissão de calor mais importante para as
cerâmicas é a condução por fônons, pois não há elétrons livres como nos metais.
Com respeito à condução de calor por elétrons ou por fônons, a condutividade pode ser escrita
pela relação dada a seguir
λ
k = s.c. (5)
3
em que s representa o calor específico (a quantidade de calor por unidade de volume disponível
para ser transportada), c representa a velocidade e a quantidade de portadores de calor, ou seja, de
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Figura 8.3: Livre caminho médio dos fônons para a solução sólida contínua MgO-NiO com teores
crescentes de NiO. Fonte: D. Richerson.
A condutividade térmica também depende da temperatura. Em geral, ela cai com o aumento
da temperatura. A razão para isto pode ser vista analisando-se a expressão (5). A velocidade do
portador de calor pouco depende da temperatura. O calor específico aumenta com a temperatura,
mas tende assintoticamente a um limite. O livre caminho médio, ao contrário, diminui
continuamente com o aumento da temperatura, pois o aumento da temperatura aumenta a
irregularidade da rede (posicionamento ordenado dos átomos) e isto dificulta a propagação dos
fônons. O efeito final será, portanto, a diminuição da condutividade térmica por condução de
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As expressões (6) e (7) podem ser facilmente derivadas supondo que a orientação paralela ao
fluxo de calor é equivalente a uma associação em paralelo de resistores elétricos e a orientação
perpendicular é equivalente a uma associação em série de resistores elétricos. No primeiro caso, o
fluxo de calor é a soma dos fluxos em cada camada. No segundo caso, a temperatura sofre uma
queda em cada camada.
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Figura 8.5: Condutividade térmica do BeO em função da porosidade medida através da densidade.
Números entre parêntesis representam a porosidade em fração volumétrica. Fonte: D. Richerson.
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ponto do equilíbrio), a força atrativa atua sobre os átomos, tentando trazê-los de volta ao equilíbrio.
Diminuindo-se a distância interatômica deste mesmo valor (à esquerda do ponto de equilíbrio), a
força repulsiva atua sobre os átomos, tentando trazê-los de volta ao equilíbrio, porém com uma de
intensidade maior do que aquela aplicada pela força atrativa no caso anterior.
As intensidades das forças de atração e repulsão dependem da energia de ligação. Quanto
maior a energia de ligação maior será a intensidade destas forças. Além disso, a diferença de
intensidade das forças atrativa e repulsiva aumenta quando a energia de ligação diminui.
Resumindo: quanto menor a energia de ligação mais fácil é remover os átomos ligados de suas
posições de equilíbrio e mais fácil será afasta-los do que aproxima-los. As figuras 8.7 representam
a força total em função da distância interatômica para alta e baixa energia de ligação.
Figura 8.6: Quando os átomos saem da posição de equilíbrio sofrem forças de atração ou repulsão.
A força de repulsão é maior que a de atração, para um mesmo deslocamento.
(a) (b)
Figura 8.7: A assimetria da curva de força em torno do ponto de equilíbrio é menor para o caso de
baixa energia de ligação (a) do que de alta energia de ligação (b).
Devido à energia térmica, os átomos não estão parados em suas posições de equilíbrio. Eles
vibram. Quanto maior a temperatura maior a amplitude da vibração. No entanto, a amplitude da
vibração também depende da energia de ligação. Quanto maior a energia de ligação menor é a
amplitude de vibração. Se os átomos estivessem parados, eles estariam parados em seus pontos de
equilíbrio. A distância entre os átomos seria a distância de equilíbrio. Como estão vibrando,
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podemos falar em uma distância média. Conforme visto anteriormente, é mais fácil aumentar a
distância entre os átomos do que diminui-la. Sendo assim, durante a vibração, os átomos tendem a
aumentar a distância média, pois a amplitude de vibração quando os átomos se afastam é maior que
a amplitude de vibração quando os átomos se aproximam. Esta é a explicação para a expansão
térmica e sua dependência da temperatura.
A dilatação térmica é representada pelo coeficiente de expansão térmica (CET), definida
como
Δl
l
α= 0 (9)
ΔT
onde l0 é o comprimento inicial, Δl é a variação de comprimento e ΔT a variação de temperatura. A
unidade de CET é °C-1. Entretanto, como seus valores são muito pequenos, são freqüentemente
representados como ppm/°C.
A Figura 8.8 mostra a curva da expansão percentual versus temperatura para vários materiais
poliméricos, metálicos e cerâmicos. A inclinação das curvas (sua derivada) é o CET. Note que elas
não são retas. Elas são ligeiramente côncavas. Isto está ligado ao aumento do CET com a
temperatura. Observe que o vidro de sílica fundida e o LiAlSi2O6 (LAS) possuem CET baixíssimos.
Figura 8.8: Expansão térmica linear em função da temperatura para diversos materiais poliméricos,
metálicos e cerâmicos. A tangente da curva é o coeficiente de expansão térmica. Fonte: D.
Richerson.
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É sabido (ver capítulo sobre ligações químicas) que a energia de ligação está diretamente
relacionada com o ponto de fusão dos materiais. Para fundir um material, é necessário quebrar as
ligações entre seus átomos. Quanto maior a energia de ligação mais difícil será sua quebra.
Portanto, maior será o ponto de fusão. A influência que tem a energia de ligação sobre o CET é
expresso pela Figura 8.9, mostrando que para muitas cerâmicas, a relação entre CET e o ponto de
fusão (PF) tem a forma
k
α= (10)
PF
, onde k é uma constante, mas pode assumir diversos valores.
A expansão térmica não é influenciada apenas pela energia de ligação. A estrutura cristalina e
o empacotamento atômico da estrutura também influenciam a CET. Em geral, quanto mais
compacta a estrutura maior o CET. Isto se deve ao fato de que estruturas mais abertas (menos
compactas) possuem vazios internos que podem ser ocupados quando a distância interatômica
aumenta, em decorrência do aumento da temperatura. Este assunto será comentado posteriormente.
Para estruturas cristalinas cúbicas, a expansão térmica é a mesma ao longo dos três eixos
principais, porém para estruturas não cúbicas, a expansão térmica varia, ou seja, é anisotrópica. A
Tabela 8.1 lista o CET de diversos materiais cerâmicos em diferentes direções cristalinas. Como
regra vale que quanto maior a distância interatômica maior será a expansão. Em algumas direções o
CET é tão grande que há contração (CET negativo) na direção perpendicular para as devidas
acomodações dos átomos, como é o caso para a calcita, para o quartzo e para o LiAlSi2O6.
Figura 8.9: Relação entre ponto de fusão e coeficiente de expansão térmica para diversos materiais
cerâmicos. Há uma relação inversa entre estas propriedades. Fonte: D. Richerson.
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Tabela 8.1: Coeficiente de expansão térmica para vários materiais cerâmicos em várias direções,
demonstrando a anisotropia. Fonte: D. Richerson.
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Figura 8.10: Transformações de fase podem ser responsáveis por grande variação do coeficiente de
expansão térmica. Fonte: D. Richerson.
Materiais de estrutura aberta podem apresentar baixíssimos CETs. Veja a Figura 8.8. Isto
reside no fato de que os espaços vazios da estrutura podem ser usados para acomodar o aumento da
distância interatômica através da rotação de subestruturas atômicas. A Figura 8.11 ilustra a estrutura
do NaZr2P3O12 (fosfato de sódio-zircônio). Esta estrutura é formada pelo empilhamento de
octaedros e tetraedros que compartilham vértices. Note quanto espaço existe na estrutura. Quando a
temperatura aumenta, a distância entre os átomos dos tetraedros e octaedros aumenta. Isto provoca a
rotação destes poliedros, sem provocar expansão da estrutura. O espaço torna-se melhor ocupado.
Para o quartzo, o aumento da temperatura provoca a rotação dos tetraedros Si-O. Veja Figura
8.12(a). Isto produz o alinhamento dos átomos que antes estavam em zig-zag. Na direção do zig-
zag, a estrutura apresenta grande expansão, porém pode apresentar até mesmo contração na direção
perpendicular. Isto está esquematizado na Figura 8.12(b).
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Figura 8.11: Estrutura do NaZr2P3O12 (fosfato de sódio-zircônio). Os muitos espaços vazios entre os
poliedros acomodam o aumento da distância interatômica. Os poliedros sofrem rotação e se
acomodam, evitando a expansão da estrutura. Fonte: D. Richerson.
(a) (b)
Figura 8.12: (a) a estrutura do quartzo em baixa temperatura é distorcida, lembrando um zig-zag.
Esta estrutura se alinha em temperaturas mais elevadas. O efeito deste alinhamento é a expansão da
estrutura na direção do alinhamento. A direção perpendicular pode sofrer inclusive uma contração,
como mostra a figura (b). Fonte: D. Richerson.
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8.4. Exercícios
1- Demonstre que a condutividade térmica de uma peça constituída por duas placas paralelas de
1 λ λ
mesma espessuras L1 e L2 é dada por = 1 + 2 , onde λ1=L1/(L1+L2), λ2=L2/(L1+L2), k1 e k2
k k1 k 2
são as condutividades térmicas dos materiais da primeira e segunda placas, respectivamente.
ΔT
Considere a montagem mostrada na figura abaixo e use a expressão Φ = k para a
L
demonstração.
2- Uma amostra foi aquecida de 30º a 500ºC e expandiu 0,283%. Determine seu coeficiente de
expansão térmica média.
3- Responda:
a) Como explicar a dilatação térmica em nível atômico?
b) Qual sua relação com a temperatura?
c) Qual sua relação com a energia de ligação?
4- Responda:
a) Quais os mecanismos de transporte de calor em sólidos?
b) Faça uma comparação entre a condutividade térmica dos metais e das cerâmicas. Como atuam
os mecanismos de condução nestes materiais?
c) Qual o efeito da temperatura e da presença de átomos de soluto na condutividade térmico dos
materiais? Explique.
d) Qual o efeito dos poros na condutividade térmica dos materiais?
e) Isolamentos térmicos para fornos são construídos com camadas intercaladas de materiais de
diferentes condutividades térmicas. Estas camadas são colocadas perpendicularmente à
direção do fluxo de calor. Por que isso? Por que não colocar as camadas paralelas ao fluxo de
calor?
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8.5. Referências
W.D. CALLISTER Jr., Materials Science & Engineering. An Introduction. Third Edition. Editora
John Wiley & Sons, 1994.
L.H. VAN VLACK, Propriedades dos Materiais Cerâmicos. Editora da Universidade de São
Paulo, 1973.
D.W. RICHERSON, Modern Ceramic Engineering. Properties, Processing and Use in Design.
Segunda Edição. Editora Marcel Dekker. 1992.
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