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ODONTOLOGIA FORENSE: CONCEITO, ORIGEM,

APLICAÇÕES E HISTÓRIA DA PERÍCIA


Jefferson Laranja - e-mail: Jefflaranja@gmail.com
Curso de Odontologia
Instituto de Pós-Graduação - IPOG
Cuiabá, MT, 19 de agosto de 2018

Resumo

Este artigo mostra as contribuições feitas pela odontologia para ciência forense, como
referencia no processo de identificação de corpos cujo reconhecimento devido à destruição é
difícil por outros métodos. Odontologia forense é a aplicação do conhecimento odontológico
para identificação e útil no Direito do Trabalho, Civil e Criminal. É o ramo da odontologia
que trata da manipulação e o controle correto das provas dental e avaliação e apresentação dos
resultados dentais que podem ter interesse da justiça. A identificação humana post-mortem é
uma das grandes áreas de estudo e pesquisa da Medicina Dentária Forense, o que faz com que
os médicos dentistas forenses sejam elementos indispensáveis de uma equipe forense. A
identificação através de técnicas dentárias tem ganho cada vez maior importância em
consequência do aumento progressivo da criminalidade e, sobretudo, da frequência com que
ocorrem desastres, tais como acidentes rodoviários de grandes proporções, incêndios,
explosões, acidentes de viação, atos de terrorismo, entre outros. Odontologia Forense pode ser
entendida como o estudo da odontologia nas suas relações com a lei, através da aplicação
Direito de Odontologia, e outra vertente forense onde o conhecimento dental ajuda o direito
de resolver certos problemas.

Palavras-chave: Odontologia Forense; Odontologia legal; História da Perícia.

1. INTRODUÇÃO

A Odontologia Forense é o ramo da Medicina Legal restrito à região de cabeça e


pescoço, compreendendo as perícias no vivo, morto, nas ossadas, em fragmentos e em
trabalhos odontológicos anteriores. Engloba o adequado exame, manuseio, preparação e
apresentação das evidências odontológicas a serviço da justiça.
Não existem duas pessoas com o mesmo arco dental. A partir desta ideia, existe um
crescimento na área de Medicina Legal e Forense, com o objetivo de utilizar procedimentos
odontológicos no auxílio de problemas de identificação (VANRELL, 2002).
Neste sentido os médicos dentistas forenses aplicam os conhecimentos específicos da
Medicina Dentária à área médico-legal. Os aspectos fisiológicos e as variações
adquiridas do aparelho estomatognático como reflexo da atividade socioeconômica
do Homem podem ser utilizados na Medicina Legal, abrangendo áreas que vão desde
a avaliação do dano orofacial pós-traumático (no âmbito da clínica médico-legal do
direito penal, civil ou do trabalho), até à identificação de indivíduos mortos ou à
identificação de agressores (FAMEP, 2016).
De acordo com Vanrell (2009) a identificação dos seres humanos, é um
conjunto de fatores e procedimentos técnicos que analisa e compara identificações
pertinentes aos indivíduos, buscando registros e coincidências de dados obtidos.
Estes dados podem ser realizados através de vários métodos destacando-se
a análise papiloscópica quando os tecidos moles encontram-se preservados e
também a identificação odontolegal ou antropológica quando o cadáver apresenta-se em
decomposição, carbonizado ou esqueletizado. Esta identificação é de grande
importância no meio pericial, pois apresenta grande confiabilidade dos resultados e
também praticidade da técnica (COSTA; SILVA, 2006)
O presente estudo de revisão tem por objetivo mostrar, de forma resumida, o
conceito, a origem, a aplicação e uma breve historia, como parte importante das Ciências
Forenses.

2. ODONTOLOGIA FORENSE: CONCEITO

Por definição e de acordo com o Conselho Federal de Odontologia (CFO), órgão que
normatiza a profissão odontológica no país, a odontologia legal seria um ramo da ciência
dentária que teria como objetivo “a pesquisa dos fenômenos psíquicos, físicos, químicos e
biológicos que podem atingir ou ter atingido o homem, vivo, morto ou ossada, e mesmo
fragmentos ou vestígios, resultando lesões parciais ou totais reversíveis ou
irreversíveis”(Resolução do CFO nº 63 de 8 de abril de 2005).
Nos casos em que é necessário realizar a identificação de corpos que se encontram
queimados, decompostos, esqueletizados, mutilados ou fragmentados por qualquer outra
razão, é extremamente comum à dentição estar intacta e ser a única fonte de informação para
esta investigação.
De acordo com Galvão (1996), em situações de identificação cadavérica, quando se
dispõe da ficha odontológica do desaparecido, é perfeitamente possível sua identificação pela
comparação do odontograma do cadáver com o fornecido pelo Dentista da pessoa
desaparecida.
Desta maneira, diante da gama de técnicas disponíveis, as utilizadas pela
Odontologia Forense são de grande valor para este propósito. Assim, define-se que a
Odontologia Forense constitui, a rigor, um dos ramos da Medicina Legal, com a qual
colabora, fazendo ou complementando exames especializados relativos à arcada dentária e
anexos; tratamentos executados; peças dentárias e/ou protéticas; vestígios da ação lesiva
provocadas por dentes (mordeduras), etc. (VANRELL, 2002).
SILVA (1936) definiu “a Odontologia Legal como a arte de aplicar os
conhecimentos odontológicos à ação dos poderes públicos (Executivo, Judiciário e
Legislativo)” (p. 290).
LEITE (1962) considerou a Odontologia Legal como “a ciência que correlaciona
conhecimentos odontológicos e jurídicos e os aplica ao serviço da Justiça” (p. 311).
Para KEISER-NIELSEN (1968),

A Odontologia Legal pode ser definida como aquele ramo da Odontologia que,
visando ao interesse judicial, trabalha com o exame adequado de evidência
odontológica e com a avaliação e apresentação adequadas dos achados
odontológicos (p. 668).

BRIÑÓN (1982) destacou que:


A Odontologia Legal é um ramo da ciência odontológica, definindo-a como a
aplicação dos conhecimentos odontológicos aos problemas legais ou derivados do
legislar, capaz de fazer suas próprias avaliações, cujos objetivos são diferentes da
prática da rotina odontológica, e seu campo de ação é dado pelo subsistema
estomatognático (p. 461).

Segundo Cabral (2003) os aspectos históricos da perícia passou por uma evolução
histórica importante para alcançar seu significado no mundo moderno. Por exemplo, na antiga
civilização do Egito, encontram-se vestígios de perícias; Sesóstris havia partilhado suas terras
com seus súditos que ficaram obrigados a pagar tributos com a colheita de suas terras.
Quando o rio despojava alguém de sua cota agrária, o lesado procurava o rei e, este enviava
seus “inspetores” para averiguar o dano. Esses “inspetores” eram pessoas de confiança e
entendidas do assunto.
Portanto, a odontologia legal é uma prática antiga que vem se adaptando ao
surgimento de novas técnicas e de profissionais especializados em diversas áreas. A
Odontologia Forense é uma ciência que contribui para essa prática e também vêm passando
por adaptações ao longo dos anos, adaptações estas que se mostram cada vez mais importante
no auxilio das investigações trabalhistas, administrativas, civis e principalmente criminais.
3. ODONTOLOGIA FORENSE: ORIGEM

A identificação dentária aparece em casos isolados na história escrita e formas


primitivas de identificação dentária podem ter sido usadas em tempos pré- históricos
(LUNTZ, 1977).
Para CUNHA (1952), o Código de Hamurabi, Rei de Assíria, no ano 2080 A.C., foi
o primeiro esboço de legislação sobre medicina e a mais antiga referência de ordem legal feita
aos dentes, e já preceituava: “Se alguém romper um dente a um homem, seu próprio dente
deverá ser rompido; quando ele for um homem livre, deverá pagar de uma a três minas de
prata” (P. 288).
A primeira evidência de dados dentários usados com fins forenses é associada a
Nero, imperador de Roma (45-70 D.C). Tácito, nos Anais, descreve que Agripina, mãe de
Nero, e Popea decidiram matar Lollia Paulina, enciumadas de sua beleza. Quando os sicários
trouxeram a cabeça de Lollia, estava tão deformada que era irreconhecível. Agripina a
identificou, porque ordenou entreabrir seus lábios e observou que seus dentes tinham certas
peculiaridades (LUNTZ, 1977).
A primeira referência da Odontologia Legal na história Americana corresponde à
identificação do cadáver do General Joseph Warren, por Paul Revere, em 1776 (RING, 1986).
Paul Revere praticou a Odontologia de 1768 a 1778. Foi notável principalmente pelo seu
papel na guerra da Independência dos Estados Unidos da América do Norte. Em princípios de
1775, Revere construiu uma prótese fixa com fios de prata para seu íntimo amigo Dr. Joseph
Warren. Warren foi conhecido pelos seus pontos de vista progressistas na prática da medicina
e como um dos dirigentes que iniciou a chispa que desencadeou a guerra de independência
estadunidense. Foi morto na batalha de Bunker Hill por uma bala que lhe perfurou o crânio.
Em 1897, a lamentável catástrofe ocorrida em Paris, no incêndio do Bazar da
Caridade, onde cerca de 190 pessoas perderam a vida tragicamente, a identificação de vários
cadáveres realizou-se graças à contribuição de profissionais Cirurgiões-dentistas, fato este
que, pela grande relevância social, tornou-se conhecido no mundo inteiro. Este incêndio
despertou o interesse do médico Oscar Amoedo em Odontologia forense. Passou a ser
considerado, historicamente, como o fundador desta área na ciência forense. Os relatórios
envolvendo as investigações realizadas por Cirurgiões-dentistas nessa tragédia viriam a
cristalizar parte da tese de doutorado defendida pelo Dr. Oscar Amoedo, em 1898. Portanto,
faz um século que a Odontologia Legal foi observada como especialidade (SAMICO, 1953;
MELANI, 1998).
A Odontologia Legal nasceu do ponto de vista formal e científico a partir do ano de
1898, quando Oscar Amoedo, de origem cubana, destacou a importância dessa especialidade,
publicando seu livro “L’Art Dentaire em Médicine Légale”, sendo o primeiro tratado de
Odontologia Legal. Esta obra recolhe, de maneira sistemática, os principais problemas
odontológicos relacionados com o Direito. A partir deste momento, a Odontologia Legal
desenvolveu-se de uma forma paulatina e progressiva (OLIVEIRA et al., 1998).

4. ODONTOLOGIA FORENSE: APLICAÇÕES

A Odontologia Forense ou Odontologia Legal é a especialidade odontológica que


trabalha diretamente com a justiça podendo atuar nas esferas: cíveis, criminais e trabalhistas,
bem como em processos éticos e administrativos (CFO, 1997).
A prática forense tem importante papel na identificação de indivíduos em catástrofes
(aviação, terremotos, tsunamis), na investigação de crimes, em estudos étnicos e na
identificação de corpos decompostos ou desfigurados (vítimas de trem, veículos automotores,
explosões, etc) (NEDEL et al., 2009)
Dentro da área cível, o perito poderá atuar, por exemplo, em demandas de pacientes
contra profissionais em casos de supostos erros; em causas onde o profissional aciona o
paciente para recebimentos de honorários; e em demandas para estimativa de idade com fins
de produção de documentação inexistente, principalmente em crianças de lares adotivos
(CFO, 1997).
Já na área criminal, a atuação se dá em processos de identificação humana, em casos
de acidentes em massa, crimes e demais situações onde os corpos se encontram carbonizados,
em avançado estado de decomposição ou esqueletizados (NEDEL et al., 2009).
De acordo com o manual de procedimentos de atendimento a desastres, a análise
odontológica, o DNA e a análise de impressões digitais, são os métodos de eleição para
identificação das vítimas. São os chamados de métodos primários de identificação. Ainda na
área criminal, o perito atua também para estimativa de idade em averiguação de maioridade,
avaliação de marcas de mordida em cenas de crime, ou em casos de maus tratos a crianças e
idosos (KAVITHA et al., 2009).
As perícias trabalhistas envolvem infortúnios envolvendo o sistema estomatognático
que possam acometer os servidores em seu trabalho, bem como a avaliação de doenças bucais
relacionadas ao processo laboral (CFO, 2005).
As perícias administrativas são voltadas para as auditorias realizadas dentro de
operadoras de planos odontológicos, onde serão avaliados os procedimentos realizados pelos
cirurgiões dentistas conveniados. A atuação também se dá através de exames periciais
envolvendo materiais desenvolvidos para a área odontológica, auxiliando na produção e testes
dos mesmos, antes de serem lançados ao mercado.
As chamadas perícias éticas são as perícias realizadas internamente nos conselhos de
odontologia, onde os profissionais serão julgados eticamente por suas condutas.

Importante salientar que a atuação do odontolegista não é limitada à dentição, mas


também tecidos da região de cabeça e pescoço. Estudos antropométricos de crânio e dentes
ajudam a traçar estimativas de características corporais como idade, peso, sexo, idade e grupo
étnico (item último questionável devido a miscigenação) (NEDEL et al., 2009).
A Odontologia Legal desempenha um papel de suma importância em situações em
que a identificação encontra-se extremamente difícil como acontece com corpos
carbonizados, dilacerados, situação comum em acidentes aéreos. Um exemplo disto foi o
trabalho realizado na identificação dos corpos das vitimas do acidente aéreo envolvendo o
Boeing 737 da empresa Gol Linha Aéreas voo 1907 ocorrido em 29 de setembro de 2006, no
qual 154 pessoas morreram, dentre elas, 19 vítimas foram identificadas por técnicas da
Odontologia Legal (CUNHA et al, 2007).
A atuação da Odontologia Legal restringe-se a análise, perícia e avaliação de eventos
relacionados com a área de competência do cirurgião-dentista podendo, se as circunstâncias o
exigirem estender-se a outras áreas, se disso depender à busca da verdade, no estrito interesse
da justiça e da administração (SILVA, 1997).
As áreas de competência para a atuação do especialista em Odontologia Legal
incluem: identificação humana; perícia em foro civil, criminal e trabalhista; perícia em área
administrativa; perícia, avaliação e planejamento em infortunística; tanatologia forense;
elaboração de autos, laudos e pareceres, relatórios e atestados; traumatologia odontolegal;
balística forense; perícia logística no vivo, no morto, íntegro ou em suas partes em
fragmentos; perícias em vestígios correlatos, inclusive de manchas ou líquidos oriundos da
cavidade bucal ou nela presentes; exames por imagem para fins periciais; de ontologia
odontológica; orientação odontolegal para o exercício profissional e exames por imagens para
fins odontolegais (SALES E SILVA, 2004; SILVA, 1997; VANRELL, 2002).
Para esclarecer à justiça problemas que lhe são pertinentes, a perícia utiliza um
conjunto de indagações realizadas em pessoas, em cadáveres, em animais e em coisas. De
acordo com Mirabete (2003) a perícia não é um simples meio de prova, mas sim um elemento
subsidiário, emanado de um órgão auxiliar da justiça para a valoração da prova ou solução da
prova destinada à descoberta da verdade.
Outro papel importante é a estimativa de idade por meio da análise da arcada
dentária, dentre outras características, quando houver dúvidas envolvendo possíveis menores
para adoção (foro cível), ou punição de delinquentes (foro criminal) (MELO, et al 2010).
No que se refere à área trabalhista, a perícia odontolegal é direcionada aos acidentes
ocorridos na região da face e cavidade oral, principalmente nas manifestações orais que
acometem determinados trabalhadores como é o caso da intoxicação por cádmio, por
exemplo, que causa uma lesão característica em forma de anel amarelado na região do colo
dentário. As perícias de convênio vêm sendo cada vez mais solicitadas a fim de combater as
fraudes administrativas (SALES e SILVA, 2004).
A Odontologia Legal é de grande utilidade na área antropológica para desvendar
alguns mistérios e dúvidas na História, em que é possível fazer identificação no crânio
esqueletizado para se determinar a espécie, sexo, idade, estatura e biótipo (GALVÃO, 2005).
De acordo com Pardini (2001), o dentista possui papel ativo frente à nova realidade e
deve participar de equipes laboratoriais que tenham como objetivo a busca de opções técnicas
para a realização de exames de confiabilidade incontestável. Nos crimes violentos,
principalmente de natureza sexual, a odontologia legal não se restringe à região da face e
cavidade oral, pois marcas de mordida e saliva são comumente encontradas em várias partes
do corpo da vitima.

5. HISTÓRIA DA PERÍCIA EM ODONTOLOGIA FORENSE

Eis que cada pessoa possui individualidades em quantidade e qualidade, em seu arco
dental, que por si só podem determinar correta identidade. Entretanto, quando o arco dental
não se apresenta completo, mas apenas com alguns elementos dentários devido a exodontias,
avulsões, fraturas etc., às vezes contando com um único dente, e claro que a problema de
identificação se tornara mais complexo, ou seja, quanta menor for a numero de dados que se
possui, menor a possibilidade de identificação. Uma das situações em que a identificação
dental nos oferece singular importância ocorre nos casos de grandes catástrofes onde as
corpos sofrem ações destruidoras pela fragmentação ou pela presença de fogo, a que restringe
a pratica dos procedimentos mais elementares de reconhecimento, como identificação pela
fisionomia, papiloscopia e outros semelhantes (VANRELL, 2002).
Com a instituição dos Estados Modernos ou Estados de Direito, a justiça privada foi
substituída pela justiça Pública ou Oficial, assumindo o Estado o encargo e o monopólio de
definir e realizar o direito aplicável diante do litígio (CINTIA, 1993).
Assim, a autoridade judicial, tendo de decidir causas dentre as mais diversas e
complexas, precisaria conhecer todas as especialidades do saber humano. Por isso, há a
necessidade de a Justiça recorrer a peritos, especialistas nas diferentes áreas de conhecimento
(GRECCO FILHO, 1994).
Em tese, qualquer setor da atividade humana, profissional ou não, está em condições
de oferecer subsídio dessa natureza e com essa finalidade. Dessa forma a Odontologia pode
contribuir de maneira importante no esclarecimento de fatos de interesse jurídico
(GONÇALVES et al. 9 , 1999).
A atuação do odontolegista é regulada pelos artigos 63 e 64 da Resolução CFO –
63/2005, que é intitulada “Consolidação das normas para procedimentos nos Conselhos de
Odontologia”. De acordo com essa resolução, a atuação do profissional especialista em
Odontologia Legal restringe-se à análise, perícia e avaliação de eventos relacionados com a
área de competência do cirurgião-dentista, podendo estender-se a outras áreas, se disso
depender a busca da verdade, no estrito interesse da justiça e da administração (CFO, 2005) .
Dentre as áreas de competência do odontolegista, vale ressaltar a atuação em perícias
criminais, tanatologia forense e identificação humana, meios pelos quais o cirurgião-dentista
pode auxiliar a solucionar crimes e identificar vítimas. Os peritos devem possuir
conhecimentos bioló- gicos específicos e noções do pensamento jurídico, visto que auxiliam
em uma decisão judicial e seu laudo pode determinar a resolução de um caso. No entanto, a
atuação do perito é limitada, pois ele não julga, não defende e não acusa; seu dever é
examinar e relatar os fatos necessários para o esclarecimento de um processo (PERES et al,
2007).
Os peritos podem ser oficiais e não oficiais. Os peritos oficiais exercem a função por
atribuição de cargo público (médicos legistas, peritos criminais e odontolegistas), realizam os
exames de corpo de delito e outras perícias requisitadas, cabendo-lhes os exames, a
elaboração e a assinatura dos laudos correspondentes. Já os peritos não oficiais são aqueles
designados para suprirem a falta de peritos oficiais, ou para substituí-los, quando, por
qualquer motivo, estiverem estes impedidos ou impossibilitados de trabalhar (PERES et al,
2007).

5.1. Perícia

A perícia é a busca de provas de que a justiça precisa para esclarecer pontos que
envolvem o acontecimento. Pode ser classificada de acordo com a matéria a ser esclarecida
(agrária, contábil, odontológica, médica etc.) (MARANHÃO, 2000) e primordialmente em
função da relação que existe entre o perito e o examinando (direta ou indireta). As perícias
diretas são aquelas nas quais o perito examina a pessoa em questão e emite um relatório
(laudo), e as indiretas são baseadas em registros, relatórios, peças processuais, ou prontuários
de atendimento em outros serviços, sendo emitido um relatório (parecer) sobre o caso em
questão (CROCE e CROCE JÚNIOR, 1998; XAVIER FILHO, 1996).
Para a realização da perícia os peritos contam com o exame médico-legal, que é
realizado sobre os vivos; exame de necroscopia, feita sobre cadáveres; exame de exumação,
realizado mediante a retirada do cadáver da sepultura; e exame laboratorial, para verificar
toxicologia e identificação de DNA. A perícia odontolegal poderá ser realizada em Foro Civil,
Criminal, Trabalhista e Sede Administrativa (SALES E SILVA, 2004; SILVA, 1997).
Na área Civil os tipos de perícias onde o odontolegista pode atuar são: ressarcimento
de danos, arbitramento judicial de honorários profissionais, exclusão de paternidade,
estimativa da idade, e avaliação de equipamentos odontológicos (SALES e SILVA, 2004;
SILVA, 1997).
Na área Criminal pode-se atuar na identificação no vivo, no cadáver e em perícias
antropológicas (no crânio esqueletizado). Atua também em perícias de lesões corporais,
determinação da idade, perícias de manchas, determinação da embriaguez alcoólica e outros
exames periciais (SALES e SILVA, 2004; SILVA, 1997).
Em questões Trabalhistas o odontolegista realiza perícias quando o acidente atinge a
face e a boca ou quando existem doenças profissionais com manifestação bucal (SALES e
SILVA, 2004; SILVA, 1997).
As perícias odontolegais na área criminal incluem: identificação no vivo (idade não
comprovada de delinquentes, marcas de mordida em alimentos ou na vítima), no cadáver
(corpos carbonizados, dilacerados, estado avançado de putrefação, afogados, acidentes de
massa), antropológicas (no crânio esqueletizado para verificar espécie, sexo, idade, estatura,
biótipo); lesões corporais ou perícias de traumatologia; determinação da idade; perícia de
manchas (diagnóstico diferencial de manchas de saliva); exame de embriaguez (saliva)
(SILVEIRA, 2006) .
O odontolegista deve, na perícia, utilizar as vias de cabeça e pescoço e fazer
anotações, desenhos, esquemas, fotografias e tudo que for necessário para que o exame fique
bem descrito. O ideal é que não sejam necessários esclarecimentos posteriores, por meio de
um segundo exame com o corpo já em decomposição ou esqueletizado, na medida em que
não trará as mesmas informações.
Entende-se como perícia o conjunto de procedimentos médicos/odontológicos e
técnicos que têm como finalidade o esclarecimento de um fato de interesse da justiça. A
perícia médico-odontolegal consiste em procedimentos que auxiliam a justiça, tendo como
finalidade produzir uma prova que vai ser materializada com o laudo. Tal perícia é praticada
por médico ou cirurgião-dentista por meio de exames clínicos, radiográficos, laboratoriais,
necroscópicos ou outros.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo exposto neste artigo é lícito concluir que a colaboração da Medicina


Dentária Forense nos processos de identificação humana é de valor irrefutável. O campo de
atuação do médico dentista nos processos de identificação humana, não se restringe ao exame
dos vestígios dentários, estendendo-se a várias áreas do saber, como exemplo: Antropologia,
Genética, Bioquímica, Balística, Tanatologia, Radiologia, Informática, entre outras.
As Delegações e os Gabinetes Médico-Legais não devem prescindir, na sua equipe
de identificação, dos conhecimentos específicos do médico dentista, assim como o médico
dentista também não deve abdicar da atuação integrada numa equipe de identificação, que
inclua: médico-legista, médico-anatomopatologista, psicólogo, antropólogo, farmacêutico-
bioquímico, entre outros, pois o fim maior de todas as Ciências Forenses é o esclarecimento
técnico e preciso à justiça.
A Odontologia Legal, no decorrer dos anos, acompanha a evolução técnico-científca
e com isso vem se mostrando como uma ferramenta importante e eficaz no auxílio da
verificação da verdade jurídica.
A odontologia legal, como demonstrada no presente artigo, é uma ferramenta de
importante auxílio na busca da verdade. Vários seriam os campos de atuação do odontólogo
forense na inter-relação com as diversas áreas do Direito. A produção de provas materiais em
suas atividades corroboraria para julgamentos mais justos, com medidas corretas e mais
razoáveis.
Neste contexto, pôde-se observar e concluir, neste estudo, que a presença do
odontolegista é essencial para a realização da identificação humana.
Portanto, a odontologia legal adquire um papel relevante no processo de
identificação, sendo de fundamental importância à presença do odontolegista dentro da equipe
de perícia médico-legal, fornecendo esclarecimentos à justiça de maneira eficaz.
Convém ressaltar que em muitos estados da federação, o trabalho dos profissionais
envolvidos com essa área da odontologia é desconhecido por operadores do direito e de quem
dele necessitar e para um melhor aproveitamento de suas atividades, campanhas poderiam ser
realizadas, por exemplo, pelas entidades de classe envolvidas ou os governos para uma maior
divulgação dessa nobre especialidade odontológica.
7. REFERÊNCIAS

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